sexta-feira, 20 de agosto de 2010

URANTIA JESUS DE NAZARÉ II

DOCUMENTO 134

OS ANOS DE TRANSIÇÃO
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Durante a viagem pelo Mediterrâneo, Jesus tinha estudado cuidadosamente as pessoas que conhecera e os países pelos quais passara e, por volta dessa época, ele chegou à sua decisão final quanto ao restante da sua vida na Terra. Ele havia considerado plenamente, e aprovara finalmente o plano o qual previa que nascesse de pais judeus na Palestina e, pois, deliberadamente voltara à Galiléia para aguardar o começo do trabalho da sua vida como um mestre público da verdade; ele começara a fazer planos para uma carreira pública na terra do povo do seu pai José, e fez isso por sua própria vontade.

134:0:2 14832 Jesus tinha descoberto por meio da sua experiência pessoal e humana que a Palestina era o melhor lugar em todo o mundo romano para desenvolver os últimos capítulos, e para as cenas finais, da sua vida terrena. Pela primeira vez ele estava plenamente satisfeito com o programa de manifestar abertamente a sua natureza verdadeira e de revelar a sua identidade divina entre os judeus e os gentios da sua Palestina natal. E decidira definitivamente terminar a sua vida na Terra e completar a sua carreira de existência mortal na mesma terra em que ele entrara na experiência humana, como uma criança indefesa. A sua carreira em Urântia começara entre os judeus na Palestina, e ele escolhera terminar a sua vida na Palestina e entre os judeus.

1. O TRIGÉSIMO ANO (24 d. C. )




134:1:1 14833 Depois de deixar Gonod e Ganid em Charax (em dezembro, do ano 23 d. C. ), Jesus retornou, pelo caminho de Ur, para a Babilônia, onde juntou-se a uma caravana do deserto que estava a caminho de Damasco. De Damasco ele foi para Nazaré, parando por apenas umas poucas horas em Cafarnaum, onde fez uma pausa para visitar a família de Zebedeu. Lá ele encontrou-se com o seu irmão Tiago, que tinha vindo já há algum tempo para trabalhar no seu lugar na oficina de barcos de Zebedeu. Depois de falar com Tiago e Judá (que também se encontrava em Cafarnaum, por acaso) e depois de transferir para o seu irmão Tiago a pequena casa que João Zebedeu tinha conseguido comprar, Jesus foi para Nazaré.

134:1:2 14834 Ao finalizar a sua viagem pelo Mediterrâneo Jesus tinha recebido dinheiro suficiente para fazer frente às suas despesas, a fim de viver até quase a época do começo da sua ministração pública. Todavia, à parte Zebedeu em Cafarnaum e as pessoas que ele conheceu nessa extraordinária viagem, o mundo nunca soube que ele tinha feito essa viagem. A sua família sempre havia acreditado que passara esse tempo em estudos na Alexandria. Jesus nunca veio a confirmar essas crenças, nem fez nenhuma negação aberta sobre esses mal-entendidos.

134:1:3 14835 Durante a sua estada de umas poucas semanas em Nazaré, Jesus conversou com a sua família e com amigos, passou algum tempo na oficina de reparos com o seu irmão José, mas devotou a maior parte da sua atenção a Rute e a Maria. Rute então tinha quase quinze anos, e era essa a primeira oportunidade para Jesus ter longas conversas com ela, desde que ela se tinha transformado em uma jovem crescida.

134:1:4 14841 Simão e Judá, ambos, durante algum tempo, tinham desejado casar, mas, não gostando da idéia de fazê-lo sem o consentimento de Jesus, haviam adiado o acontecimento, esperando pelo retorno do seu irmão mais velho. Embora todos considerassem Tiago como o cabeça da família, para a maior parte das questões, quando se tratava de casar-se, eles queriam a bênção de Jesus. E assim, Simão e Judá, casaram-se em uma cerimônia dupla no princípio de março desse ano, de 24 d. C. Todos os outros filhos estavam agora casados; apenas Rute, a mais jovem, permanecera em casa com Maria.

134:1:5 14842 Jesus conversava com os membros individuais da sua família muito normal e naturalmente, mas, quando eles estavam todos juntos, tão pouco tinha ele a dizer que eles próprios observavam sobre isso entre si. Maria ficava especialmente desconcertada por esse comportamento inusitadamente peculiar do seu primeiro filho.

134:1:6 14843 Na época em que Jesus estava preparando-se para deixar Nazaré, o condutor de uma grande caravana que estava passando pela cidade foi tomado por uma doença violenta e Jesus, sendo um conhecedor de línguas, se fez voluntário para ocupar o lugar dele. Já que essa viagem iria requisitar a sua ausência por um ano e, desde que todos os seus irmãos estavam casados e a sua mãe vivia em casa com Rute, Jesus convocou uma reunião familiar na qual propôs que a sua mãe e Rute fossem a Cafarnaum para viver na casa que ele tinha muito recentemente dado a Tiago. E desse modo, uns poucos dias depois que Jesus partiu com a caravana, Maria e Rute mudaram-se para Cafarnaum, onde viveram, pelo resto da vida de Maria, na casa que Jesus tinha provido. José e a sua família mudaram-se para a velha casa de Nazaré.

134:1:7 14844 Esse foi um dos mais inusitados anos da experiência interior do Filho do Homem; um grande progresso foi feito para efetivar uma harmonia de funcionamento entre a sua mente humana e o Ajustador residente. O Ajustador tinha estado ativamente empenhado em reorganizar o pensamento e em treinar a mente para os grandes acontecimentos que pertenciam a um futuro então não muito distante. A personalidade de Jesus estava preparando-se para a sua grande mudança de atitude para com o mundo. Esses eram os tempos de transição, o estágio transitivo entre aquele ser que começara a vida como um Deus, surgindo como um homem, e que agora estava preparando-se para completar a sua carreira terrena como um homem, surgindo como Deus.

2. A VIAGEM DA CARAVANA AO MAR CÁSPIO


134:2:1 14845 Era primeiro de abril, do ano 24 d. C. , quando Jesus partiu de Nazaré na viagem da caravana à região do Mar Cáspio. A caravana à qual Jesus aderiu como condutor estava indo de Jerusalém, passando por Damasco e pelo Lago da Úrmia, atravessando a Assíria, a Média e a Pártia, indo para o sudeste da região do Mar Cáspio. Demorou um ano inteiro antes que ele retornasse dessa viagem.

134:2:2 14846 Para Jesus essa viagem, com a caravana, foi uma outra aventura de exploração e de ministério pessoal. Ele teve uma experiência interessante com a sua família da caravana – passageiros, guardas e condutores de camelos. As várias dezenas de homens, mulheres e crianças que residiam ao longo do trajeto seguido pela caravana, viveram vidas mais ricas devido ao seu contato com Jesus que, para eles, era o extraordinário chefe de uma caravana comum. Nem todos que desfrutaram da sua ministração pessoal nessa ocasião se beneficiaram devidamente dela, mas a grande maioria daqueles que se encontraram e falaram com ele tornaram-se melhores, pelo resto das suas vidas naturais.

134:2:3 14847 De todas as suas viagens pelo mundo, foi essa viagem pelo Mar Cáspio que levou Jesus o mais perto do Oriente e que o capacitou a ter um entendimento melhor dos povos do Extremo Oriente. Ele fez contatos cordiais e pessoais com todas as raças sobreviventes de Urântia, excetuando a vermelha. Ele apreciou igualmente prestar o seu ministério pessoal a cada uma dessas várias raças e povos miscigenados, e todas elas foram receptivas à verdade viva que ele lhes trouxe. Os europeus do Extremo Ocidente e os asiáticos do Extremo Oriente, do mesmo modo, deram atenção às suas palavras de esperança e de vida eterna e foram igualmente influenciados pela prática do serviço amoroso e da ministração espiritual que ele tão benevolamente desenvolveu entre eles.

134:2:4 14851 A viagem da caravana teve êxito em todos os sentidos. Esse foi um episódio bastante interessante na vida humana de Jesus, pois ele funcionou durante esse ano como um executivo, sendo responsável pelo material confiado ao seu encargo e pelo salvo-conduto dos viajantes que constituíam o grupo da caravana. E ele desincumbiu-se o mais fiel, eficiente e sabiamente possível dos seus múltiplos deveres.

134:2:5 14852 No retorno da região do Mar Cáspio, Jesus entregou a direção da caravana no Lago da Úrmia, onde permaneceu por pouco mais de duas semanas. Ele retornou como um passageiro, com uma caravana posterior, até Damasco, onde os donos dos camelos suplicaram-lhe que permanecesse a serviço deles. Ele rejeitou essa oferta e viajou com a caravana para Cafarnaum, chegando no dia primeiro de abril do ano 25 d. C. . Jesus não mais considerava Nazaré como o seu lar. Cafarnaum passou a ser a casa de Jesus, Tiago, Maria e Rute. Jesus, contudo, nunca mais viveu com a sua família; quando estava em Cafarnaum, ele fazia da casa de Zebedeu o seu lar.

3. OS ENSINAMENTOS NA ÚRMIA


134:3:1 14853 A caminho do Mar Cáspio, Jesus tinha parado vários dias para descansar e recuperar-se, na velha cidade persa da Úrmia, nas margens do lado oeste do Lago da Úrmia. Na maior das ilhas de um arquipélago situado a pouca distância das margens, perto da Úrmia, estava localizado um grande prédio – um anfiteatro para conferências – dedicado ao “espírito da religião”. Essa estrutura era realmente um templo da filosofia das religiões.

134:3:2 14854 Esse templo da religião tinha sido construído por um rico mercador, cidadão da Úrmia, e pelos seus três filhos. Esse homem chamava-se Cimboitom, e tinha entre os seus ancestrais muitos povos diferentes.

134:3:3 14855 As conferências e os debates nessa escola de religião começavam às dez horas da manhã, nos dias da semana. As sessões da tarde começavam às três horas, e os debates da noite eram abertos às oito horas. Cimboitom ou um dos seus três filhos sempre presidiam a essas sessões de ensinamentos, de discussões e de debates. O fundador dessa escola singular de religiões viveu e morreu sem ter jamais revelado as suas crenças religiosas pessoais.

134:3:4 14856 Em várias ocasiões Jesus participou dessas discussões e, antes que tivesse deixado a Úrmia, Cimboitom fez um acordo com Jesus, para que ele permanecesse com eles por duas semanas, depois da sua viagem de volta, para então dar vinte e quatro palestras sobre “A Irmandade dos Homens”, e para conduzir doze sessões noturnas de perguntas, de discussões e debates sobre as suas palestras em particular e sobre a irmandade dos homens em geral.

134:3:5 14857 Em cumprimento a esse acordo, Jesus interrompeu a viagem na volta e concedeu as palestras. Esses foram os mais sistemáticos e formais de todos os ensinamentos do Mestre em Urântia. Nunca antes, nem depois, ele disse tanto sobre uma questão única como a que estava contida nessas palestras e discussões sobre a irmandade dos homens. Na realidade essas palestras foram sobre o “Reino de Deus” e os “reinos dos homens”.

134:3:6 14861 Mais de trinta religiões e cultos religiosos estavam representados na faculdade desse templo de filosofia religiosa. Esses educadores eram escolhidos, sustentados e totalmente acreditados pelos seus respectivos grupos religiosos. Nessa época havia cerca de setenta e cinco instrutores na faculdade, e eles viviam em cabanas, cada uma acomodando cerca de doze pessoas. A cada lua nova esses grupos eram alterados, escolhendo-se pela sorte. A intolerância, o espírito de contenda, ou qualquer outra disposição que interferisse na boa marcha da comunidade, provocaria a deposição pronta e sumária do instrutor causador da ofensa. Ele era dispensado, sem maiores cerimônias, e o que vinha logo atrás dele, imediatamente era colocado em seu lugar.

134:3:7 14862 Esses instrutores das várias religiões faziam um grande esforço para mostrar quão semelhantes eram as suas religiões com respeito às coisas fundamentais dessa vida e da próxima. Para que se ganhasse um assento nessa faculdade tinha que ser adotada apenas uma doutrina – cada instrutor devia representar uma religião que reconhecia Deus –, alguma espécie de Deidade suprema. Havia cinco instrutores independentes, na faculdade, que não representavam nenhuma religião organizada, e foi como um instrutor independente que Jesus apareceu perante eles.

134:3:8 14863 [Quando nós, os seres intermediários, preparávamos inicialmente o sumário dos ensinamentos de Jesus, na Úrmia, surgiu um desacordo, entre os serafins das igrejas e os serafins do progresso, questionando quanto à sabedoria de incluir esses ensinamentos nas Revelações de Urântia. As condições do século vinte, que prevalecem tanto na religião quanto nos governos dos humanos, são tão diferentes das que existiam na época de Jesus, que foi realmente difícil adaptar os ensinamentos do Mestre na Úrmia, aos problemas do Reino de Deus e aos reinos dos homens, tais como eles existem neste século. Nós nunca fomos capazes de formular um documento sobre os ensinamentos do Mestre, que fosse aceitável para ambos os grupos desses serafins do governo planetário. Finalmente, o Melquisedeque catedrático da comissão reveladora apontou uma comissão de três, da nossa ordem, para preparar a nossa visão dos ensinamentos do Mestre na Úrmia, de um modo adaptado às condições religiosas e políticas deste século, em Urântia. E desse modo nós, os três seres intermediários secundários apontados, completamos essa adaptação dos ensinamentos de Jesus, restabelecendo os seus pronunciamentos do modo como nós os aplicaríamos à condição do mundo nos dias atuais e, agora, nós apresentamos estes documentos como eles ficaram depois de terem sido editados pelo Melquisedeque catedrático da comissão reveladora.]

4. A SOBERANIA – DIVINA E HUMANA


134:4:1 14864 A irmandade dos homens é fundada na paternidade de Deus. A família de Deus deriva-se do amor de Deus – Deus é amor. Deus, o Pai, ama divinamente os Seus filhos, a todos eles.

134:4:2 14865 O Reino do céu, o governo divino, é fundado no fato da soberania divina – Deus é espírito. E já que Deus é espírito, este Reino é espiritual. O Reino do céu não é nem material nem meramente intelectual; é uma relação espiritual entre Deus e o homem.

134:4:3 14866 Se as religiões diferentes reconhecem a soberania espiritual de Deus, o Pai, então todas essas religiões permanecerão em paz. Apenas quando uma religião assume que de um certo modo é superior a todas as outras, e que possui autoridade exclusiva sobre outras religiões, é que essa religião ousará ser intolerante com as outras religiões ou atrever-se-á a perseguir outros crentes religiosos.

134:4:4 14871 A paz religiosa – a irmandade – não pode nunca existir a menos que todas as religiões estejam dispostas a despojar-se completamente de toda autoridade eclesiástica e a abandonar todo conceito de soberania espiritual. Apenas Deus é soberano em espírito.

134:4:5 14872 Vós não podeis ter igualdade entre as religiões (liberdade religiosa) sem ter guerras religiosas, a menos que todas as religiões consintam em transferir toda a soberania a algum nível supra-humano, ao próprio Deus.

134:4:6 14873 O Reino do céu nos corações dos homens criará a unidade religiosa (não necessariamente a uniformidade), porque todo e qualquer grupo religioso composto de tais crentes religiosos será livre de todas as noções de autoridade eclesiástica – a soberania religiosa.

134:4:7 14874 Deus é espírito e Deus dá um fragmento do seu eu espiritual para residir no coração do homem. Espiritualmente, todos os homens são iguais. O Reino do céu é livre de castas, de classes, de níveis sociais e de grupos econômicos. Vós sois todos irmãos.

134:4:8 14875 Entretanto, no momento em que vós perdeis de vista a soberania do espírito de Deus o Pai, alguma religião começará a afirmar a sua superioridade sobre outras religiões; e então, em vez de paz na Terra e de boa vontade entre os homens, as desavenças e as recriminações começarão, e mesmo as guerras religiosas ou, ao menos, as guerras entre os religiosos.

134:4:9 14876 Os seres de livre-arbítrio que se consideram como iguais, a menos que mutuamente entendam como sujeitos a alguma supra-soberania, a alguma autoridade sobre e acima deles próprios, mais cedo ou mais tarde serão tentados a experimentar a sua capacidade de ganhar poder e autoridade sobre outras pessoas e grupos. O conceito de igualdade nunca traz a paz, exceto no caso do reconhecimento mútuo de alguma influência supracontroladora da supra-soberania.

134:4:10 14877 Os religiosos da Úrmia viveram juntos em relativa paz e tranqüilidade porque eles tinham abandonado completamente todas as suas noções de soberania religiosa. Espiritualmente, todos eles acreditavam em um Deus soberano; socialmente, a autoridade plena e incontestável recaía sobre o presidente deles – Cimboitom. E eles bem sabiam o que aconteceria a qualquer instrutor que ousasse impor-se aos seus companheiros instrutores. Não poderá haver nenhuma paz religiosa duradoura em Urântia até que todos os grupos religiosos abandonem livremente todas as suas noções de favoritismo divino, de povo escolhido e de soberania religiosa. Apenas quando Deus, o Pai, tornar-Se supremo, os homens tornar-se-ão irmãos religiosos e viverão juntos em paz religiosa na Terra.

5. A SOBERANIA POLÍTICA


134:5:1 14878 [Conquanto os ensinamentos do Mestre a respeito da soberania de Deus sejam uma verdade – complicada apenas pelo surgimento subseqüente de uma religião, entre as religiões do mundo, sobre o Mestre –, as suas apresentações, a respeito da soberania política, são amplamente complicadas pela evolução política da vida das nações durante os últimos dezenove séculos, e até mais. Nos tempos de Jesus havia apenas dois grandes poderes mundiais – o império romano no Ocidente e o Império Han no Oriente – e estes estavam bastante separados pelo reino Pártio e por outras terras intermediárias, das regiões do Mar Cáspio e do Turquestão. Nós partimos, portanto, na apresentação seguinte, mais da essência dos ensinamentos do Mestre na Úrmia, a respeito da soberania política, ao mesmo tempo tentando descrever a importância de tais ensinamentos, enquanto são aplicáveis ao estágio peculiarmente crítico da evolução da soberania política no século vinte depois de Cristo.]

134:5:2 14879 A guerra em Urântia nunca terminará enquanto as nações apegarem-se às noções ilusórias de soberania nacional ilimitada. Há apenas dois níveis de soberania relativa em um mundo habitado: o livre-arbítrio espiritual do indivíduo mortal e a soberania coletiva da humanidade, como um todo. Entre o nível do ser humano individual e o nível da humanidade total, todos os agrupamentos e associações são relativos, transitórios e têm valor apenas pelo que podem melhorar no bem-estar, na felicidade e no progresso do indivíduo e do planeta, como um grande todo – o homem e a humanidade.

134:5:3 14881 Os educadores religiosos devem lembrar-se sempre de que a soberania espiritual de Deus está acima de qualquer lealdade espiritual que possa ser interposta como intermediária. Algum dia os governantes civis aprenderão que os Altíssimos dirigem os reinos dos homens.

134:5:4 14882 Essa direção dos Altíssimos nos reinos dos homens não é para o benefício de qualquer grupo especialmente favorecido de mortais. Não existe uma coisa tal com um “povo escolhido”. O governo dos Altíssimos, os supracontroladores da evolução política, é um governo destinado a fomentar o maior bem ao maior número possível entre todos os homens e durante o maior espaço de tempo.

134:5:5 14883 A soberania é poder, e cresce com a organização. Esse crescimento da organização do poder político é bom e próprio, pois tende a abranger segmentos sempre mais amplos do total da humanidade. Contudo, esse mesmo crescimento das organizações políticas cria um problema em cada estágio intermediário entre a organização inicial e natural do poder político – a família – e a consumação final do crescimento político – o governo de toda a humanidade, por toda a humanidade e para toda a humanidade.

134:5:6 14884 Começando com o poder parental, no grupo familiar, a soberania política evolui, por organização, à medida que as famílias superponham-se em clãs consangüíneos e se unem, por várias razões, em unidades tribais – agrupamentos políticos supraconsagüíneos. E então, por intermédio dos negócios, do comércio e de conquistas, as tribos tornam-se unificadas como uma nação, enquanto as próprias nações algumas vezes tornam-se unificadas como um império.

134:5:7 14885 À medida que a soberania passa dos grupos menores para os maiores, as guerras diminuem. Isto é, as guerras menores, entre as nações menores, ficam mais raras, mas o potencial para as guerras maiores cresce à medida que as nações que exercem a soberania tornam-se cada vez maiores. Em breve, quando todo o mundo tiver sido explorado e ocupado, enquanto poucas são as nações fortes e poderosas, quando essas nações grandes e supostamente soberanas tocam as fronteiras, quando apenas os oceanos as separam, então o quadro estará pronto para as guerras maiores, para os conflitos mundiais. As nações chamadas soberanas não podem acotovelar-se sem gerar conflitos e fazer guerras.

134:5:8 14886 A dificuldade na evolução da soberania política, desde a família até toda a humanidade, repousa na resistência inercial demonstrada em todos os níveis intermediários. As famílias, nessa ocasião, desafiaram o seu clã, enquanto os clãs e as tribos têm, freqüentemente, subvertido a soberania do estado territorial. Cada novo progresso, na evolução da soberania política, é (e tem sempre sido) embaraçado e impedido pelos “estágios-andaimes-temporários” dos desenvolvimentos anteriores na organização política. E isso é verdade porque as lealdades humanas, uma vez mobilizadas, são difíceis de mudar. A mesma lealdade que torna possível a evolução da tribo, torna difícil a evolução da supertribo – o estado territorial. E a mesma lealdade (o patriotismo) que torna possível a evolução do estado territorial complica bastante o desenvolvimento evolucionário do governo de toda a humanidade.

134:5:9 14887 A soberania política é criada graças ao abandono do autodeterminismo, primeiro da parte do indivíduo dentro da família e, então, pelas famílias e clãs em relação à tribo e aos agrupamentos maiores. Essa transferência progressiva da autodeterminação de organizações pequenas para organizações políticas cada vez maiores tem, geralmente, tido seqüência, sem desaceleração, no Oriente, desde o estabelecimento das dinastias Ming e Mogul.

134:5:10 14891 No Ocidente, por mais de mil anos, ela prevaleceu até o fim da guerra mundial, quando um desafortunado movimento retrógrado reverteu, temporariamente, essa tendência normal, restabelecendo a soberania política submergida de numerosos grupos pequenos na Europa. Urântia não desfrutará de uma paz duradoura antes que as nações chamadas soberanas coloquem, inteligente e plenamente, os seus poderes soberanos nas mãos da irmandade dos homens – o governo da humanidade. O internacionalismo – as ligas de nações – nunca pode trazer a paz permanente à humanidade. As confederações das nações, de amplitude mundial, efetivamente impedirão guerras menores e controlarão aceitavelmente as nações menores, mas elas não impedirão as guerras mundiais, nem controlarão três, quatro, ou cinco dos governos mais poderosos. Em face de conflitos reais, um desses poderes mundiais retirar-se-á da liga e irá declarar guerra. Vós não podereis impedir as nações de entrar na guerra, enquanto elas permanecerem infectadas com o vírus enganoso da soberania nacional. O internacionalismo é um passo na direção certa. Uma força policial internacional impedirá muitas guerras menores, mas não será eficaz para impedir as guerras maiores, os conflitos entre os grandes governos militares da Terra.

134:5:11 14892 À medida que decrescer o número das nações verdadeiramente soberanas (os grandes poderes), crescerão tanto a oportunidade quanto a necessidade de governo para a humanidade. Quando há apenas uns poucos poderes (grandes), realmente soberanos, ou eles devem lançar-se na luta de vida ou morte pela supremacia nacional (imperial), ou então, pelo abandono voluntário de algumas prerrogativas da soberania, eles devem criar o núcleo essencial do poder supranacional que servirá de começo à soberania real de toda a humanidade.

134:5:12 14893 A paz não virá a Urântia até que todas as chamadas nações soberanas coloquem os seus poderes de fazer guerra nas mãos de um governo representante de toda a humanidade. A soberania política é inata aos povos do mundo. Quando todos os povos de Urântia criarem um governo mundial, eles terão o direito e o poder de fazer dele um governo SOBERANO; e quando esse representante, ou poder democrático mundial, controlar as terras do mundo, o seu ar e as suas forças navais, a paz na Terra e a boa vontade entre os homens poderá prevalecer – mas não antes disso.

134:5:13 14894 Para usar uma importante ilustração dos séculos dezenove e vinte: os quarenta e oito estados da União Federal Americana vêm, há muito, desfrutando da paz. Eles não mais tiveram guerras entre si próprios. Eles entregaram a sua soberania ao governo federal e, por meio de um arbitramento, em caso de guerra, abandonaram todas as reivindicações ilusórias de autodeterminação. Enquanto cada estado regular os seus assuntos internos, ele não se preocupará com relações exteriores, tarifas, imigração, assuntos militares ou com o comércio interestadual. Nem os estados individualmente preocupam-se com as questões da cidadania. Os quarenta e oito estados sofrem a devastação da guerra apenas quando a soberania do governo federal é de algum modo ameaçada.

134:5:14 14895 Esses quarenta e oito estados, tendo abandonado o duplo sofisma da soberania e da autodeterminação, desfrutam da paz e da tranqüilidade interestadual. Assim, as nações de Urântia começam a gozar da paz, quando elas abandonam livremente as suas respectivas soberanias, colocando-as nas mãos de um governo global – a soberania da irmandade dos homens. Nesse Estado mundial, as pequenas nações serão tão poderosas quanto as grandes, mesmo o pequeno estado de Rode Island tem os seus dois senadores no Congresso americano, do mesmo modo que os populosos estados de Nova Iorque ou o estado imenso do Texas.

134:5:15 14901 A soberania limitada (do Estado) desses quarenta e oito estados foi criada pelos homens e para os homens. A soberania do supra-Estado (o nacional) da União Federal Americana foi criada pelos treze estados originais, dentre esses, para o seu próprio benefício e para o benefício dos homens. Em alguma época, a soberania supranacional dos governos planetários da humanidade será similarmente criada pelas nações, para o seu próprio benefício e para benefício de todos os homens.

134:5:16 14902 Os cidadãos não nascem para o benefício dos governos; os governos são organizações criadas e legadas para o benefício dos homens. Não pode haver um fim para a evolução da soberania política sem o surgimento do governo da soberania de todos os homens. Todas as outras soberanias são relativas em valor, de significado apenas intermediário e de status subordinado.

134:5:17 14903 Com o progresso científico, as guerras tornar-se-ão mais e mais devastadoras, até que se tornem quase racialmente suicidas. Quantas guerras mundiais devem ser lutadas e quantas ligas das nações devem fracassar, antes que os homens estejam dispostos a estabelecer o governo da humanidade e que comecem a gozar das bênçãos da paz permanente e prosperem na tranqüilidade da boa vontade – da boa vontade de âmbito mundial – entre os homens?

6. LEI, LIBERDADE E SOBERANIA


134:6:1 14904 Se um homem almeja a independência – a liberdade –, ele deve lembrar-se de que todos os outros homens anseiam pela mesma autonomia. Os grupos desses mortais amantes da liberdade não podem viver juntos em paz sem tornarem-se obedientes a leis, regras e regulamentos tais que concedam a cada uma das suas pessoas o mesmo grau de liberdade, salvaguardando, ao mesmo tempo, um grau igual de liberdade a todos os outros companheiros mortais. Se um homem deve ser absolutamente livre, então um outro deve tornar-se um escravo absoluto. E a natureza relativa da liberdade é, econômica e politicamente, uma verdade social. A liberdade é a dádiva da civilização, tornada possível por força da LEI.

134:6:2 14905 A religião torna espiritualmente possível realizar a irmandade dos homens, mas isso exigirá um governo da humanidade, para regulamentar a questão social, econômica e política, ligada a essa meta de felicidade e de eficiência humana.

134:6:3 14906 Enquanto a soberania política do mundo estiver dividida e nas mãos de um grupo de Estados-nações, haverá guerras e rumores de guerras – e nação levantar-se-á contra nação. A Inglaterra, a Escócia e o País de Gales estiveram sempre em luta, uns contra os outros, até que se abdicaram das respectivas soberanias, confiando-as ao Reino Unido.

134:6:4 14907 Uma outra guerra mundial ensinará às nações ditas soberanas a formar alguma espécie de federação, criando assim o instrumento para impedir as pequenas guerras, guerras entre as nações menores. Mas as guerras globais continuarão enquanto o governo da humanidade não for criado. A soberania global impedirá as guerras globais – nenhuma outra coisa poderá fazê-lo.

134:6:5 14908 Os quarenta e oito estados livres da América vivem juntos em paz. Há entre os cidadãos, desses quarenta e oito estados, todas as raças e as diversas nacionalidades provenientes da Europa que sempre estão em guerra. Esses americanos representam quase todas as religiões, seitas religiosas e cultos de todo o amplo mundo, mas ali na América do Norte eles vivem juntos em paz. E tudo isso se faz possível porque os quarenta e oito estados entregaram a sua soberania e abandonaram todas as noções de supostos direitos de autodeterminação.

134:6:6 14909 Não é uma questão de armamento ou de desarmamento. E a questão do recrutamento militar ser voluntário ou obrigatório também não pesa nessa questão de manter a paz mundial. Se vós tomardes das mãos das nações fortes todas as formas de armamentos mecânicos modernos e todos os tipos de explosivos, elas irão lutar com os punhos, com pedras e cassetetes, enquanto estiverem aferradas às suas ilusões de direito divino à soberania nacional.

134:6:7 14911 A guerra não é a grande e terrível doença do homem; a guerra é um sintoma, um resultado. A doença, de fato, é o vírus da soberania nacional.

134:6:8 14912 As nações de Urântia não têm tido a verdadeira soberania; elas nunca tiveram uma soberania que pudesse protegê-las das pilhagens e devastações das guerras mundiais. Na criação do governo global da humanidade, as nações não estão abdicando da sua soberania tanto quanto estão de fato criando uma soberania mundial real, autêntica e duradoura que, daí por diante, será plenamente capaz de protegê-las de toda a guerra. Os assuntos locais serão controlados pelos governos locais; os assuntos nacionais, pelos governos nacionais; os assuntos internacionais serão administrados pelo governo planetário.

134:6:9 14913 A paz mundial não pode ser mantida por tratados, pela diplomacia, pelas políticas exteriores, ou alianças, ou pelo equilíbrio dos poderes, nem por qualquer outro tipo de substituto para negociar com as soberanias do nacionalismo. A lei mundial deve vir a existir e deve ser imposta pelo governo do planeta – a soberania de toda a humanidade.

134:6:10 14914 O indivíduo gozará de muito mais liberdade sob o governo mundial. Os cidadãos das grandes potências, hoje, são taxados, regulados e controlados quase que opressivamente, e uma boa parte dessa interferência atual nas liberdades individuais desaparecerá quando os governos nacionais estiverem dispostos a confiar a sua soberania, no que diz respeito aos assuntos internacionais, nas mãos do governo geral do planeta.

134:6:11 14915 Sob um governo de todo o globo os grupos das nações terão uma oportunidade real de realizar e de desfrutar das liberdades pessoais genuínas da democracia. E isso porá fim à falácia da autodeterminação. Com a regulamentação para todo o planeta, do dinheiro e do comércio, virá uma nova era de paz mundial. Logo, uma linguagem global poderá vir a evoluir, e haverá pelo menos alguma esperança de que algum dia surja uma religião única global – ou religiões com um ponto de vista planetário.

134:6:12 14916 A segurança coletiva nunca proporcionará a paz enquanto a coletividade não incluir toda a humanidade.

134:6:13 14917 A soberania política do governo representativo da humanidade trará uma paz perene à Terra, e a irmandade espiritual dos homens assegurará para sempre a boa vontade entre todos os homens. E não há outro modo pelo qual a paz na Terra e a boa vontade entre os homens possam realizar-se.

134:6:14 14918 Depois da morte de Cimboitom, os seus filhos tiveram muitas dificuldades em manter a faculdade em paz. As repercussões dos ensinamentos de Jesus teriam sido muito maiores se os educadores cristãos posteriores que se juntaram à faculdade da Úrmia tivessem demonstrado mais sabedoria e praticado mais a tolerância.

134:6:15 14919 O filho mais velho de Cimboitom pediu ajuda a Abner, na Filadélfia, mas a escolha que Abner fez dos professores foi infeliz, pois eles mostraram-se inflexíveis e intransigentes. Esses professores buscaram fazer com que a sua religião predominasse sobre as outras crenças. Eles jamais suspeitaram de que as conferências do condutor de caravanas, às quais sempre eles se referiam, tinham sido feitas pessoalmente pelo próprio Jesus.

134:6:16 149110 Como a confusão cresceu na faculdade, os três irmãos retiraram o seu apoio financeiro e, em cinco anos, a escola fechou. Mais tarde foi reaberta para ser um templo mitraico e, finalmente, foi incendiada em conseqüência de uma das suas celebrações orgíacas.

7. O TRIGÉSIMO PRIMEIRO ANO (25 d. C. )




134:7:1 14921 Quando Jesus voltou da viagem ao Mar Cáspio, ele sabia que as suas viagens pelo mundo tinham como que acabado. Ele fez apenas uma viagem mais, para fora da Palestina, e que foi para a Síria. Depois de uma breve visita a Cafarnaum, ele foi a Nazaré, parando lá uns poucos dias com o fito de fazer visitas. No meio do mês de abril ele saiu de Nazaré, indo para Tiro. De lá ele viajou para o norte, ficando alguns dias em Sidom, mas o seu destino era a Antióquia.

134:7:2 14922 Esse é o ano das peregrinações solitárias de Jesus pela Palestina e pela Síria. Durante esse ano de viagens, ele ficou conhecido por vários nomes em diferentes partes do país: Carpinteiro de Nazaré, Construtor de barcos de Cafarnaum, Escriba de Damasco e Mestre de Alexandria.

134:7:3 14923 Em Antióquia o Filho do Homem viveu por mais de dois meses, trabalhando, observando, estudando, conversando, ministrando e, durante todo o tempo, aprendendo como vive o homem, como ele pensa, sente e reage ao ambiente da existência humana. Por três semanas, durante esse período, ele trabalhou como fabricante de tendas. E permaneceu por mais tempo na Antióquia do que em qualquer outro lugar que visitou nessa viagem. Dez anos mais tarde, quando o apóstolo Paulo estava pregando na Antióquia e ouviu os seus seguidores falarem das doutrinas do Escriba de Damasco, ele mal sabia que os seus alunos tinham ouvido a voz, e escutado aos ensinamentos do próprio Mestre.

134:7:4 14924 Da Antióquia Jesus viajou para o sul, pela costa, até Cesaréia, onde ele permaneceu por umas poucas semanas, continuando pela costa até Jopa. De Jopa ele foi em direção ao interior para a Jamnia, Ashdod e Gaza. De Gaza ele tomou a estrada que vai para o interior até Beersheba, onde ele permaneceu por uma semana.

134:7:5 14925 Jesus então começou a sua viagem final, como indivíduo, e, particularmente, pelo centro da Palestina, indo de Beersheba, no sul, para Dan, ao norte. Nessa viagem para o norte ele parou em Hebrom, em Belém (onde ele viu o local do seu nascimento), Jerusalém (ele não visitou a Betânia), Beirute, Líbano, Sicar, Sechem, Samaria, Geba, Enganim, En-dor, Madon; passando por Magdala e Cafarnaum, ele viajou para o norte; e, seguindo a leste das Águas de Merom, ele passou também por Carata, indo até Dan, ou a Cesaréia-Filipe.

134:7:6 14926 O Ajustador do Pensamento residente a partir de agora conduzia Jesus a deixar de lado os locais onde moram os homens e a dirigir-se até o monte Hermom, para que ele pudesse completar o seu trabalho de ter a sua mente humana sob a própria mestria e terminar a tarefa de realizar a consagração plena de si ao remanescente do trabalho da sua vida na Terra.

134:7:7 14927 Essa foi uma dessas épocas inusitadas e extraordinárias na vida terrena do Mestre em Urântia. Uma época, de importância similar foi a da experiência pela qual ele passou quando estava só nos montes perto de Pela, pouco depois do seu batismo. Esse período de isolamento no monte Hermom marcou o término da sua carreira puramente humana, isto é, o término técnico da auto-outorga mortal; ao passo que o isolamento posterior demarcou o começo da fase mais divina da auto-outorga. E Jesus viveu a sós com Deus durante seis semanas nas escarpas do monte Hermom.

8. A PERMANÊNCIA NO MONTE HERMOM


134:8:1 14928 Depois de passar algum tempo na vizinhança de Cesaréia-Filipe, Jesus aprontou os seus suprimentos e conseguiu uma besta de carga e um garoto de nome Tiglá, e então seguiu pela estrada de Damasco até uma aldeia conhecida como Be-Jenn, ao pé do monte Hermom. Ali, por volta de meados de agosto, do ano 25 d. C. , ele estabeleceu o seu acampamento e, deixando o seu suprimento sob a custódia de Tiglá, subiu as escarpas desoladas da montanha. Tiglá acompanhou Jesus, nesse primeiro dia montanha acima, até um determinado ponto a uns 2 000 metros de altitude acima do nível do mar, onde eles construíram um nicho de pedra no qual Tiglá devia colocar comida duas vezes por semana.

134:8:2 14931 No primeiro dia, depois de deixar Tiglá, Jesus havia subido a montanha apenas um pouco mais quando parou para orar. Entre outras coisas ele pediu ao seu Pai para enviar o seu serafim guardião para “ficar com Tiglá”. Ele pediu para que lhe fosse permitido subir, para ter a sua última luta a sós com as realidades da existência mortal. E o seu pedido foi-lhe concedido. E foi para a grande prova apenas com o seu Ajustador residente para guiá-lo e dar-lhe apoio.

134:8:3 14932 Jesus comeu frugalmente, enquanto estava na montanha; ele absteve-se inteiramente de comida apenas um dia ou dois por vez. Os seres supra-humanos que se confrontaram com ele, nessa montanha, e com quem ele combateu em espírito, e a quem ele derrotou em poder, eram reais; eram os seus arquiinimigos do sistema de Satânia; não eram fantasmas da imaginação que surgiram das fantasias intelectuais de um mortal enfraquecido e faminto, que não conseguia distinguir a realidade das visões de uma mente perturbada.

134:8:4 14933 Jesus passou as três últimas semanas de agosto e as primeiras três semanas de setembro no monte Hermom. Durante essas semanas, ele terminou a tarefa mortal de entrar e passar pelos círculos da compreensão mental e do controle da personalidade. Durante todo esse período de comunhão com o seu Pai celeste, o Ajustador residente também completou os serviços a ele atribuídos. A meta mortal dessa criatura terrena ali então foi alcançada. Apenas a fase final de afinação entre a mente e o Ajustador ficou ainda para ser consumada.

134:8:5 14934 Depois de mais de seis meses de comunhão ininterrupta com o seu Pai do Paraíso, Jesus tornou-se absolutamente seguro sobre a sua natureza e certo do seu triunfo sobre os níveis materiais da manifestação tempo-espacial da personalidade. Ele acreditou integralmente na ascendência da sua natureza divina sobre a sua natureza humana e não hesitou em afirmá-la.

134:8:6 14935 Perto do final da permanência nas montanhas, Jesus perguntou ao seu Pai se lhe poderia ser permitido manter uma conversa com os seus inimigos de Satânia, como Filho do Homem, como Joshua ben José. Esse pedido lhe foi concedido. Durante a última semana no monte Hermom, a grande tentação, a provação universal, aconteceu. Satã (representando Lúcifer) e Caligástia, o Príncipe Planetário rebelde, estiveram presentes junto a Jesus e foram tornados plenamente visíveis para ele. E, assim, pois, tal “tentação”, essa provação final de lealdade humana em face das exposições falaciosas das personalidades rebeldes, nada tivera a ver com alimentos, nem com pináculos de templos, nem com atos presunçosos. Nada teve a ver com os reinos deste mundo, teve, sim, a ver com a soberania de um universo poderoso e glorioso. O simbolismo, nas vossas escrituras, foi dirigido a idades anteriores, nas quais o pensamento do mundo ainda era infantil. E as gerações posteriores deveriam compreender quão grande foi a luta pela qual o Filho do Homem passou durante aquele dia memorável no monte Hermom.

134:8:7 14936 Às muitas propostas e contrapropostas dos emissários de Lúcifer, Jesus apenas respondeu: “Que prevaleça a vontade do meu Pai no Paraíso, e que a vós, meus filhos rebeldes, possam os Anciães dos Dias julgar-vos divinamente. Eu sou o vosso Criador-pai; não posso julgar-vos com justiça; a minha misericórdia vós já a desprezastes. Eu vos entrego ao julgamento dos Juízes de um universo maior”.

134:8:8 14941 Quanto a todos os expedientes e acordos sugeridos por Lúcifer, às propostas ilusórias sobre a auto-outorga de encarnação, Jesus apenas fez o comentário: “A vontade do meu Pai no Paraíso seja feita”. E, quando a severa provação chegou ao fim, o serafim destacado para ser o guardião voltou-se na direção de Jesus e levou até ele a sua ministração.

134:8:9 14942 Nessa tarde no final do verão, entre as árvores e no silêncio da natureza, Michael de Nebadon conquistou a soberania inquestionável do seu universo. Nesse dia, ele completou a tarefa preestabelecida, para os Filhos Criadores, de viver completamente a vida encarnada à semelhança da carne mortal nos mundos evolucionários do tempo e do espaço. O anúncio, para o universo, dessa memorável realização, não foi feito até o dia do seu batismo, meses depois, mas tudo aconteceu realmente naquele dia na montanha. E, quando Jesus desceu da sua estada no monte Hermom, a rebelião de Lúcifer em Satânia e a secessão de Caligástia em Urântia estavam virtualmente acalmadas. Jesus havia pago o último preço exigido dele para alcançar a soberania do seu universo, que por si mesma regulamenta sobre o status de todos os rebeldes e determina que todos os futuros levantes (se eles um dia ocorrerem) possam ser tratados sumária e efetivamente. E, desse modo, pode-se ver que a chamada “grande tentação” de Jesus aconteceu algum tempo antes do seu batismo e não pouco depois daquele evento.

134:8:10 14943 Ao final dessa permanência na montanha, quando Jesus estava descendo, encontrou Tiglá subindo no compromisso de levar a comida. Chamando-o para voltar, Jesus apenas disse: “O período de descanso chegou ao fim; devo agora voltar a cuidar dos assuntos do meu Pai”. Tornara-se um homem silencioso e estava muito mudado, quando voltaram para Dan, onde ele deixou o garoto e deu a ele o burro. Então ele prosseguiu para o sul, pelo mesmo caminho que tinha percorrido para chegar em Cafarnaum.

9. O TEMPO DE ESPERA


134:9:1 14944 Agora estava próximo o fim do verão; era a época do dia da reconciliação e da Festa de Tabernáculos. Jesus tinha um encontro de família em Cafarnaum durante o sábado e, no dia seguinte, partiu para Jerusalém com João, o filho de Zebedeu, indo para o leste do lago, e por Gerasa, e descendo pelo vale do Rio Jordão. Enquanto visitavam alguns dos seus companheiros, no caminho, João percebeu uma grande mudança em Jesus.

134:9:2 14945 Jesus e João pararam para passar a noite na Betânia com Lázaro e as suas irmãs, indo bem cedo na manhã seguinte para Jerusalém. Eles passaram quase três semanas na cidade e nas cercanias, ou pelo menos João passou. Muitas vezes João ia só até Jerusalém, enquanto Jesus caminhava pelas montanhas vizinhas, para ter muitos períodos de comunhão espiritual com o seu Pai no céu.

134:9:3 14946 Ambos estavam presentes aos serviços solenes do dia da reconciliação. João ficou muito impressionado com as cerimônias desses dias de ritual religioso judeu, mas Jesus permaneceu como um espectador pensativo e silencioso. Para o Filho do Homem esse espetáculo foi patético e deplorável. Ele viu tudo como uma falsa representação do caráter e dos atributos do seu Pai no céu. E considerou os acontecimentos daquele dia como uma caricatura dos fatos da justiça divina e das verdades da misericórdia infinita. Ele fervia de desejo de dar expansão à declaração da verdade real sobre o caráter amoroso do seu Pai e sobre a conduta misericordiosa no universo, mas o seu fiel Monitor admoestou-o de que a sua hora não tinha ainda chegado. Contudo, naquela noite na Betânia, Jesus fez inúmeros comentários que deixaram João bastante perturbado; e João nunca compreendeu totalmente o significado real do que Jesus dissera na conversa daquela noite.

134:9:4 14951 Jesus planejava ficar durante a semana da Festa de Tabernáculos com João. Essa festa era o feriado anual de toda a Palestina; era a época das férias judaicas. Embora Jesus não tenha participado da folia da ocasião, era evidente que lhe causava prazer e proporcionava satisfação ver como jovens e velhos se entregavam à alegria, descontraídos.

134:9:5 14952 No meio da semana de celebrações e antes de terminarem as festividades, Jesus despediu-se de João, dizendo que desejava retirar-se para as montanhas, onde melhor poderia comungar com o seu Pai do Paraíso. João teria ido com ele, mas Jesus insistiu para que ele ficasse para as festividades, dizendo: “Não é necessário que tu carregues o fardo do Filho do Homem; apenas o guardião deve manter-se de vigília enquanto a cidade dorme em paz”. Jesus não voltou para Jerusalém. Depois de quase uma semana a sós nas colinas perto de Betânia, ele partiu para Cafarnaum. A caminho de casa, passou um dia e uma noite a sós nas escarpas de Gilboa, perto do local onde o rei Saul tinha se matado; e, quando chegou a Cafarnaum, ele parecia mais alegre do que quando se despedira de João em Jerusalém.

134:9:6 14953 Na manhã seguinte Jesus foi à arca que continha os seus objetos pessoais, que havia deixado no escritório de Zebedeu, colocou o seu avental e apresentou-se para o trabalho, dizendo: “A mim me convém manter-me ocupado enquanto espero que chegue a minha hora”. E trabalhou por vários meses, até janeiro do ano seguinte, na oficina de barcos, ao lado do seu irmão Tiago. Depois desse período de trabalho com Jesus, não importando quais dúvidas viessem ainda a encobrir o entendimento que Tiago tivesse sobre o trabalho da vida do Filho do Homem, ele nunca mais perderia real e totalmente a sua fé na missão de Jesus.

134:9:7 14954 Durante esse período final do trabalho de Jesus na oficina de barcos, ele passou a maior parte do seu tempo no seu interior, fazendo o acabamento de alguma embarcação grande. Ele punha um grande cuidado em todo o seu trabalho manual e parecia ter uma grande satisfação de realização humana quando terminava uma peça digna de elogios. Embora gastasse pouco tempo com detalhes pequenos, ele era um artesão paciente quando se tratava da parte essencial de qualquer empreendimento.

134:9:8 14955 Com o passar do tempo, chegaram rumores, em Cafarnaum, sobre um tal de João que pregava enquanto batizava os penitentes no Rio Jordão, e João pregava: “O Reino do céu está ao alcance da mão; arrependei-vos e sejais batizados”. Jesus soube dessas informações enquanto João lentamente subia o Vale do Jordão, partindo do vau do rio, no ponto mais próximo de Jerusalém. Jesus, no entanto, continuou trabalhando, fazendo barcos, até que João tivesse subido o rio até um ponto perto de Pela, no mês de janeiro do ano seguinte, de 26 d. C. , quando ele depôs as suas ferramentas, declarando: “É chegada a minha hora” e, em breve, ele apresentou-se a João para o batismo.

134:9:9 14956 Todavia, uma grande mudança havia acontecido em Jesus. Poucas daquelas pessoas que tinham desfrutado das suas visitas e das suas ministrações, nas suas idas e vindas naquela terra, jamais reconheceriam, posteriormente, no educador público, a mesma pessoa que haviam conhecido e amado anteriormente como um indivíduo particular. E existia uma razão para que aqueles que se haviam beneficiado anteriormente dos seus serviços não o reconhecessem, posteriormente, no seu papel de um educador público cheio de autoridade. Durante longos anos essa transformação de mente e de espírito tinha estado em progresso, completando-se durante aquela temporada memorável no monte Hermom.

DOCUMENTO 135

JOÃO BATISTA
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João Batista nasceu aos 25 de março, do ano 7 a. C. , de acordo com a promessa feita por Gabriel a Isabel, em junho do ano anterior. Por cinco meses, Isabel manteve o segredo sobre a visitação de Gabriel; e, quando ela contou ao seu marido, Zacarias, ele ficou muito perturbado, e só acreditou na narrativa dela depois de ter tido um sonho inusitado, seis meses antes do nascimento de João. Excetuando-se a visita de Gabriel a Isabel e o sonho de Zacarias, não houve nada de inusitado ou sobrenatural relacionado com o nascimento de João Batista.

135:0:2 14962 Ao oitavo dia, João foi circuncidado segundo o costume judaico. Ele cresceu como uma criança comum, dia a dia e ano a ano, na pequena aldeia conhecida naqueles dias como a Cidade de Judá, localizada a cerca de seis quilômetros a oeste de Jerusalém.

135:0:3 14963 O acontecimento mais notável na primeira infância de João foi a visita, em companhia dos seus pais, a Jesus e à família de Nazaré. Essa visita ocorreu no mês de junho, do primeiro ano a. C. , quando ele tinha pouco mais de seis anos de idade.

135:0:4 14964 Depois do retorno de Nazaré, os pais de João começaram a educação sistemática do garoto. Não havia nenhuma escola de sinagoga nessa pequena aldeia; contudo, sendo um sacerdote, Zacarias era bastante bem instruído e Isabel tinha muito mais instrução do que o comum das mulheres judias; ela pertencia ao sacerdócio, sendo uma descendente das “filhas de Aarão”. Como João era o único filho, eles despendiam uma boa parte do seu tempo com a preparação mental dele e com a sua educação espiritual. Zacarias tinha apenas curtos períodos de serviço no templo em Jerusalém, de modo que se dedicava longamente a educar o seu filho.

135:0:5 14965 Zacarias e Isabel tinham uma pequena fazenda na qual eles criavam ovelhas. Não chegavam a ganhar a vida com essa terra, mas Zacarias tinha um soldo regular que recebia e que provinha da renda dedicada ao sacerdócio no templo,

1. JOÃO TORNA-SE UM NAZARITA


135:1:1 14966 Não havia escola em que João pudesse graduar-se na idade de quatorze anos, mas os seus pais tinham escolhido aquele ano como sendo o mais apropriado para que ele fizesse o voto formal de nazarita. E, desse modo, Zacarias e Isabel levaram o seu filho a Engedi, à beira do Mar Morto. Lá era a sede sulina da irmandade nazarita, e lá o jovem foi devida e solenemente introduzido na vida dentro dessa ordem. Depois dessas cerimônias e de fazer os votos de abstenção de todas as bebidas intoxicantes, de deixar o cabelo crescer e de abster-se de tocar nos mortos, a família rumou para Jerusalém, onde, diante do templo, João completou as oferendas que eram requeridas dos que faziam os votos dos nazaritas.

135:1:2 14967 João fez os mesmos votos que tinham sido administrados aos seus ilustres predecessores, Sansão e o profeta Samuel. Um nazarita vitalício era visto como uma personalidade santificada e sagrada. Os judeus encaravam um nazarita quase com o mesmo respeito e a veneração dedicada ao sumo sacerdote, e isso não era de se estranhar já que os nazaritas de consagração vitalícia eram as únicas pessoas, além dos altos sacerdotes, a quem era sempre permitido entrar no local santo, dos santos, de um templo.

135:1:3 14971 De Jerusalém, João retornou à sua casa, para cuidar das ovelhas de seu pai e cresceu até virar um homem forte e de caráter nobre.

135:1:4 14972 Aos dezesseis anos, João, em conseqüência de ter lido sobre Elias, ficou tão fortemente impressionado com o profeta do monte Carmelo, que decidiu adotar a sua maneira de vestir. Daquele dia em diante, João sempre usava uma veste de pele e um cinturão de couro. Aos dezesseis anos, ele tinha mais de um metro e oitenta de altura e estava já quase plenamente desenvolvido. Com os seus grandes cabelos soltos e o seu modo peculiar de vestir-se, ele era de fato um jovem pitoresco. E seus pais esperavam grandes coisas do único filho deles, uma criança prometida e um nazarita para toda a vida.

2. A MORTE DE ZACARIAS


135:2:1 14973 Após uma doença de muitos meses Zacarias morreu em julho, no ano 12 d. C. , quando João tinha um pouco mais de dezoito anos. Essa foi uma época de grande embaraço para João, pois o voto nazarita o proibia de ter contato com os mortos, ainda que da própria família. Embora João estivesse empenhado em cumprir as restrições do seu voto, a respeito da contaminação por meio dos mortos, ele duvidava que tivesse sido totalmente obediente às exigências da ordem nazarita; portanto, depois que o seu pai tinha sido enterrado ele foi a Jerusalém, onde, no nicho nazarita da praça das mulheres, ele ofereceu os sacrifícios necessários para a sua purificação.

135:2:2 14974 Em setembro desse ano, Isabel e João fizeram uma viagem a Nazaré para visitar Maria e Jesus. João estava quase se decidindo a começar o trabalho da sua vida, quando foi exortado, não apenas pelas palavras de Jesus mas também pelo seu exemplo, a retornar à sua casa, a tomar conta da sua mãe, e a esperar a “chegada da hora do Pai”. Após despedir-se de Jesus e Maria, no fim da agradável visita, João não viu Jesus de novo até o evento do seu batismo no Jordão.

135:2:3 14975 João e Isabel retornaram para a sua casa e começaram a fazer planos para o futuro. Posto que João recusou-se a aceitar o soldo de sacerdote que lhe era devido dos fundos do templo, no fim de dois anos eles não tinham como manter até a própria casa; e então decidiram ir para o sul levando o rebanho de ovelhas. Conseqüentemente, o verão em que João fez vinte anos testemunhou a mudança deles para Hebrom. No chamado “deserto da Judéia”, João guardava as suas ovelhas ao lado de um riacho, que era o afluente de uma corrente maior que chegava ao Mar Morto em Engedi. A colônia de Engedi incluía não apenas os nazaritas por consagração vitalícia ou de duração determinada, mas numerosos outros pastores ascetas que se congregavam nessa região com os seus rebanhos e que se confraternizavam com a irmandade nazarita. Eles mantinham-se com a criação de ovelhas e com as doações que os judeus ricos faziam à ordem.

135:2:4 14976 À medida que o tempo passava, João retornava menos assiduamente a Hebrom, enquanto fazia visitas mais freqüentes a Engedi. Ele era tão inteiramente diferente da maioria de nazaritas que achou muito difícil confraternizar-se plenamente com a irmandade. Todavia, ele gostava muito de Abner, líder e dirigente reconhecido da colônia de Engedi.

3. A VIDA DE UM PASTOR


135:3:1 14977 Ao longo do vale desse pequeno riacho, João construiu nada menos do que uma dúzia de abrigos de pedra e de currais noturnos, consistindo de pedras empilhadas, onde ele podia vigiar e guardar os seus rebanhos de ovelhas e cabras. A vida de João como pastor, permitia a ele ter uma boa parte do seu tempo para pensar. Conversava muito com Ezda, um jovem órfão de Betezur, a quem ele tinha de um certo modo adotado e que cuidava dos rebanhos quando ele fazia as suas viagens a Hebrom para ver a sua mãe e para vender ovelhas, bem como quando ele ia até Engedi para os serviços do sábado. João e o jovem viviam com muita simplicidade, sobrevivendo da carne, do leite de cabra, de mel silvestre e dos gafanhotos comestíveis daquela região. Essa sua dieta regular era complementada pelas provisões trazidas de Hebrom e de Engedi, de tempos em tempos.

135:3:2 14981 Isabel mantinha João informado sobre os assuntos da Palestina e do mundo; e a sua convicção ficava mais e mais profunda, de que a hora aproximava-se rapidamente, em que a velha ordem teria um fim; e de que ele próprio estava para tornar-se o arauto da chegada de uma nova idade, “o Reino do céu”. Esse rude pastor tinha uma grande predileção pelos escritos do profeta Daniel. Lera mil vezes a descrição que Daniel fizera da grande imagem que, segundo Zacarias lhe havia contado, representava a história dos grandes reinos do mundo, começando com a Babilônia e, então, a Pérsia, a Grécia e finalmente Roma. João percebia que Roma era já composta de povos e raças de línguas diferentes, que não poderia jamais se tornar um império fortemente embasado e firmemente consolidado. Ele acreditava que Roma, mesmo então, já estava dividida em Síria, Egito, Palestina e outras províncias. E, então, ele lia ainda “nos dias desses reis, o Deus dos céus irá estabelecer um Reino que nunca será destruído; e este Reino não será entregue a outro povo, mas partirá em pedaços e consumirá todos os outros reinos e permanecerá para sempre”. “E foi dado a ele o domínio, a glória e um Reino, de tal modo que todos os povos, de todas as nações e línguas, deveriam servir a ele. O seu domínio é um domínio perene, que não passará, e o seu Reino nunca será destruído”. “E o reino e o domínio e a grandeza do Reino sob todos os céus será dado ao povo dos santos do Altíssimo, cujo reino é um Reino eterno, e todos os domínios servirão e obedecerão a ele. ”

135:3:3 14982 João nunca foi completamente capaz de elevar-se acima da confusão produzida por aquilo que ele tinha escutado dos seus pais a respeito de Jesus e dessas passagens que lera nas escrituras. Em Daniel ele lera: “Eu vi, nas visões noturnas e eis que alguém como o Filho do Homem veio com as nuvens dos céus, e foi dado a ele o domínio e a glória e um reino”. Mas essas palavras do profeta não se harmonizaram com o que os seus pais tinham ensinado a ele. Nem a sua conversa com Jesus, na época da sua visita quando tinha dezoito anos, correspondia a essas afirmações das escrituras. Apesar dessa confusão, e diante de toda essa perplexidade, a sua mãe assegurou-lhe de que o seu primo distante, Jesus de Nazaré, era o verdadeiro Messias, que tinha vindo para assentar no trono de Davi, e que ele (João) tornar-se-ia o seu arauto avançado e seu principal apoio.

135:3:4 14983 De tudo o que ouvira da maldade e do vício de Roma e da devassidão e da esterilidade moral do império, daquilo que ele sabia sobre os atos perversos de Herodes Antipas e dos governadores da Judéia, João estava com a mente pronta a acreditar que o fim da idade era iminente. Parecia a esse nobre e rude filho da natureza que o mundo estava maduro para o fim da idade do homem e para o alvorecer da nova e divina idade – o Reino do céu. Um sentimento cresceu no coração de João, de que seria ele o último dos velhos profetas e o primeiro dos novos. E sentia-se vibrar com o impulso crescente de ir adiante e de proclamar a todos os homens: “Arrependei-vos! Colocai-vos limpos diante de Deus! Estejais prontos para o fim; preparai-vos para o aparecimento de uma ordem nova e eterna de assuntos sobre a terra, o Reino do céu”.

4. A MORTE DE ISABEL


135:4:1 14991 Em 17 de agosto, do ano 22 d. C. , quando João tinha vinte e oito anos, a sua mãe subitamente faleceu. Os amigos de Isabel, sabendo das restrições nazaritas a respeito do contato com os mortos, ainda que na própria família, fizeram todos os arranjos para o enterro de Isabel, antes de mandarem buscar João. Quando ele recebeu a comunicação da morte da sua mãe, ele ordenou a Ezda que conduzisse os seus rebanhos até Engedi e partiu para Hebrom.

135:4:2 14992 Ao retornar a Engedi, do funeral da sua mãe, entregou os seus rebanhos à confraria e afastou-se do mundo exterior para jejuar e orar. João conhecia apenas os velhos métodos de aproximar-se da divindade; ele conhecia apenas os registros como os de Elias, Samuel e Daniel. Elias era o seu ideal de profeta. Elias era o primeiro dos mestres de Israel a ser considerado um profeta; e João verdadeiramente acreditava que devia ser, ele próprio, o último dessa longa e ilustre linhagem de mensageiros dos céus.

135:4:3 14993 Por dois anos e meio, João viveu em Engedi, e persuadiu a maioria da confraria de que “o fim da idade estava bem próximo”; de que “o Reino do céu estava para se mostrar”. E todos os primeiros ensinamentos que recebera eram baseados na idéia judaica dominante e no conceito do Messias como o libertador prometido, aquele que livraria a nação judaica da dominação dos seus governantes gentios.

135:4:4 14994 Em todo esse período, João leu muito os escritos sagrados que encontrou na casa dos nazaritas em Engedi. Estava especialmente impressionado com Isaías e com Malaquias, o último dos profetas até aquela época. Leu e releu os cinco últimos capítulos de Isaías, e acreditava nessas profecias. E então ele leria em Malaquias: “Cuidai, Eu vos enviarei Elias, o profeta anterior à vinda do grande e terrível dia do Senhor; e ele fará os corações dos pais irem contra os filhos e os corações dos filhos irem contra os pais, de medo que Eu venha e golpeie a Terra com uma maldição”. E foi unicamente por causa dessa promessa de Malaquias, de que Elias iria retornar, que João viu-se impedido de sair pregando sobre o Reino vindouro bem como de exortar os seus companheiros judeus a fugirem da ira que viria. João estava amadurecido para a proclamação da mensagem do Reino vindouro, mas essa expectativa da vinda de Elias o deteve por dois anos mais. E sabia que ele não era Elias. O que então Malaquias queria dizer? A profecia seria literal ou figurada? Como poderia ele saber a verdade? Finalmente ousou pensar que, como o primeiro dos profetas era chamado Elias, então o último deveria ser conhecido, finalmente, pelo mesmo nome. Entretanto ele tinha dúvidas, dúvidas suficientes para não se permitir jamais vir a chamar a si mesmo de Elias.

135:4:5 14995 Foi a influência de Elias que levou João a adotar os seus métodos de ataque direto e áspero aos pecados e vícios dos seus contemporâneos. Ele procurou vestir-se como Elias, e esforçava-se para falar como Elias; em todos aspectos externos ele era como o profeta de outrora. Era um filho da natureza, e de tal modo robusto e pitoresco, que era um destemido e ousado pregador da retidão. João não era iletrado, conhecia bem as escrituras sagradas judias, mas não tinha cultura. Sabia como pensar claro, tinha uma fala poderosa, e era um denunciador inflamado. Dificilmente seria um exemplo para a sua idade, mas constituía uma reprovação eloqüente.

135:4:6 14996 Finalmente vislumbrou o método de proclamar a nova era, o Reino de Deus; decidiu que ele era quem tornar-se-ia o arauto do Messias; colocou de lado todas as dúvidas e partiu de Engedi, em um dia de março do ano 25 d. C. , para começar a sua curta mas brilhante carreira como pregador público.

5. O REINO DE DEUS


135:5:1 15001 Para compreender a mensagem de João, dever-se-ia ter em conta o status do povo judeu na época em que ele surgiu no cenário da ação. Por quase cem anos toda Israel tinha estado diante de um impasse; e todos se perdiam na tentativa de explicar a contínua subjugação a soberanos gentios. E não tinha sido ensinado por Moisés que a retidão era sempre recompensada com a prosperidade e o poder? Não era o povo escolhido de Deus? Por que o trono de Davi estava vazio e abandonado? À luz das doutrinas mosaicas e dos preceitos dos profetas, os judeus achavam difícil explicar a longa e continuada desolação nacional.

135:5:2 15002 Cerca de cem anos antes dos dias de Jesus e João, uma nova escola de educadores religiosos surgiu na Palestina, os apocalípticos. Esses novos educadores desenvolveram um sistema de crença, segundo o qual os sofrimentos e a humilhação dos judeus acontecia por estarem eles arcando com as conseqüências dos pecados da nação. Eles recaíam nas razões bem conhecidas, escolhidas para explicar o cativeiro da Babilônia e de outras épocas ainda anteriores. Contudo, assim ensinavam os apocalípticos, Israel deveria retomar a sua coragem; os dias de aflição estavam quase no fim; a lição do povo escolhido de Deus estava para terminar; a paciência de Deus com os gentios estrangeiros estava quase exaurida. O fim do domínio romano era sinônimo de fim da idade e, em um certo sentido, de fim do mundo. Esses novos pregadores apoiavam-se fortemente nas predições de Daniel, e consistentemente ensinavam que a criação estava para atingir o seu estágio final; os reinos deste mundo estavam a ponto de tornarem-se o Reino de Deus. Para a mente judaica daqueles dias esse era o significado daquela frase – o Reino do céu – que está nos ensinamentos tanto de Jesus quanto de João. Para os judeus da Palestina a frase “o Reino do céu” não tinha senão um significado: um estado absolutamente reto, no qual Deus (o Messias) governaria as nações da Terra na perfeição do poder, exatamente como Ele governava nos céus – “Seja feita a Sua vontade, na terra como no céu”.

135:5:3 15003 Nos dias de João, os judeus perguntavam-se com muita expectativa: “Quando, pois, virá o Reino?” Havia um sentimento geral de que o fim do domínio das nações gentias estava próximo. Havia, presente em todo o mundo judeu, uma esperança viva e uma intensa expectativa de que a consumação do desejo das idades ocorreria durante o período de vida daquela geração.

135:5:4 15004 Ainda que os judeus divergissem muito nas suas estimativas quanto à natureza do Reino que estava para vir, eles concordavam na sua crença de que o evento era iminente, palpável mesmo, já batendo à porta. Muitos que liam o Antigo Testamento literalmente aguardavam, com expectativa, por um novo rei na Palestina, por uma nação judaica regenerada, libertada de seus inimigos e presidida pelo sucessor do rei Davi, o Messias, que iria logo ser reconhecido como o governante justo e reto de todo o mundo. Outro grupo de judeus devotos, se bem que menor, sustentava uma visão muito diferente deste Reino de Deus. Ensinavam eles que o Reino que estava para vir não era deste mundo, que o mundo aproximava-se do seu fim certo, e que “um novo céu e uma nova terra” viriam para anunciar o estabelecimento do Reino de Deus; que este Reino era um domínio perene, que o pecado estava para acabar, e que os cidadãos do novo Reino iriam tornar-se imortais no seu gozo dessa bênção sem fim.

135:5:5 15005 Todos concordavam que alguma purgação drástica ou alguma disciplina de purificação fosse necessária para preceder o estabelecimento do novo Reino na Terra. Pelo que os literalistas ensinavam aconteceria uma guerra mundial, a qual iria destruir a todos aqueles que não acreditavam, enquanto os fiéis seriam levados a uma vitória universal e eterna. Os espiritualistas ensinavam que o Reino seria inaugurado por aquele grande julgamento de Deus, que iria relegar os injustos à sua bem merecida punição de destruição final, ao mesmo tempo em que elevaria os santos crentes do povo escolhido aos assentos elevados de honra e autoridade, com o Filho do Homem, que governaria sobre as nações redimidas em nome de Deus. E esse grupo acreditava até mesmo que muitos gentios devotos poderiam ser admitidos na comunidade do novo Reino.

135:5:6 15011 Alguns dos judeus apegavam-se à opinião de que Deus poderia possivelmente estabelecer esse novo Reino por intervenção direta e divina, mas a grande maioria acreditava que Ele iria interpor algum representante intermediário, o Messias. Esse o único significado possível que o termo Messias poderia ter nas mentes dos judeus da geração de João e Jesus. Messias não poderia possivelmente referir-se a alguém que meramente ensinasse a vontade de Deus ou que proclamasse a necessidade do viver reto. A todas essas pessoas sagradas os judeus davam o título de profetas. O Messias devia ser mais do que um profeta; o Messias devia trazer o estabelecimento do novo reinado, o Reino de Deus. Ninguém que falhasse em fazer isso poderia ser o Messias, no sentido judaico tradicional.

135:5:7 15012 Quem poderia ser esse Messias? E novamente os educadores judeus diferiam. Os mais velhos aferravam-se à doutrina do filho de Davi. Os mais jovens ensinavam que, já que o novo Reino era um Reino celeste, o novo governante poderia também ser uma personalidade divina, alguém que estivesse há muito à mão direita de Deus nos céus. E por estranho que possa parecer, aqueles que concebiam assim o governante do novo Reino, viam-no, não como um Messias humano, não como um mero homem, mas como “o Filho do Homem” – um Filho de Deus –, um Príncipe celeste, há muito esperado para assim assumir o governo feito novo, da Terra. Esse era o pano de fundo religioso, do mundo judaico, quando João entrou em cena proclamando: “Arrependei-vos, pois o Reino do céu está ao alcance das mãos!”

135:5:8 15013 Torna-se, portanto, claro que o anúncio feito por João, do Reino que viria, tinha nada menos do que meia dúzia de significações diferentes, nas mentes daqueles que ouviam a sua pregação apaixonada. Entretanto, qualquer que fosse o significado, atribuído às frases que João empregava, cada um desses vários grupos, que esperavam o advento do reino judaico, estava intrigado pelas proclamações desse pregador da retidão e do arrependimento, sincero, entusiasta e rudemente expedito, que tão solenemente exortava os seus ouvintes a “escapar da ira que está por vir”.

6. JOÃO COMEÇA A PREGAR


135:6:1 15014 No início do mês de março, do ano 25 d. C. , João viajou pela costa ocidental do Mar Morto e Rio Jordão acima, do lado oposto de Jericó, na antiga parte rasa sobre a qual Joshua e os filhos de Israel passaram para entrar pela primeira vez na terra prometida; e, atravessando até o outro lado do rio, ele estabeleceu-se próximo da entrada dessa parte rasa e começou a pregar ao povo que atravessava o rio em um sentido e no outro. Essa era a mais freqüentada das travessias do Jordão.

135:6:2 15015 Para todos aqueles que ouviam João, ficava claro que ele era mais do que um pregador. A grande maioria daqueles que escutavam aquele homem estranho, vindo do deserto da Judéia, partia acreditando que tinha ouvido a voz de um profeta. Não era de se espantar que as almas desses judeus cansados, mas esperançosos, ficassem profundamente excitadas com esse fenômeno. Nunca, em toda a história dos judeus, os filhos devotos de Abraão tinham desejado tanto a “consolação de Israel”, nem tinham, mais ardentemente, antecipado “a restauração do reino”. Em toda a história dos judeus, nunca, a mensagem de João, “o Reino do céu está ao alcance das mãos”, teria podido exercer um apelo tão profundo e universal como na época em que ele apareceu, tão misteriosamente, na margem dessa travessia ao sul do Jordão.

135:6:3 15021 Originalmente era um pastor, como Amós. Ele vestia-se como o Elias de outrora, e fulminava as suas repreensões e dardejava as suas advertências com o “espírito e o poder de Elias”. Não era de surpreender-se que esse estranho pregador criasse uma forte agitação em toda a Palestina, pois os viajantes levavam até longe as novidades que vinham das suas pregações no Jordão.

135:6:4 15022 Havia ainda uma outra característica, nova, no trabalho desse pregador nazarita: Ele batizava todos os seus crentes no Jordão “para a remissão dos pecados”. Embora o batismo não fosse uma cerimônia nova entre os judeus, eles nunca tinham visto o batismo ser feito como João o realizava agora. Havia muito que vinha sendo uma prática batizar assim os prosélitos gentios, para admiti-los na comunidade da parte externa da praça do templo, mas nunca tinha sido pedido aos judeus, eles próprios, que se submetessem ao batismo do arrependimento. Apenas quinze meses separavam a época em que João começou a pregar e a batizar, da sua detenção e da sua prisão, instigadas por Herodes Antipas; mas nesse curto período de tempo ele batizou bem mais de cem mil penitentes.

135:6:5 15023 João pregou por quatro meses no vau da Betânia antes de partir para o norte, subindo o Jordão. Dezenas de milhares de ouvintes, alguns apenas curiosos, mas muitos, sinceros e sérios, vieram para ouvi-lo de todas as partes da Judéia, da Piréia e da Samaria. Alguns vieram até mesmo da Galiléia.

135:6:6 15024 Em maio desse ano, enquanto ele ainda se retinha no vau da Betânia, os sacerdotes e os levitas enviaram uma delegação para inquirir de João se ele pretendia ser o Messias, e pela autoridade de quem ele pregava. A esses inquisidores João respondeu com essas palavras: “Ide e dizei aos vossos senhores que vós escutastes a ‘voz de alguém que grita no deserto’, como anunciou o profeta ao dizer: ‘preparai o caminho do Senhor, fazei uma estrada plana e reta até o nosso Deus. Cada vale deverá ser enchido e cada monte e colina deverá ser cortado; o chão acidentado deverá tornar-se plano, enquanto os locais encrespados devem tornar-se um vale plano; e toda a carne verá a salvação de Deus’ ”.

135:6:7 15025 João era um pregador heróico mas sem tato. Um dia, quando ele estava pregando e batizando, na margem ocidental do Jordão, um grupo de fariseus e alguns saduceus destacaram-se e se apresentaram para o batismo. Antes de levá-los até a água, João, dirigindo-se coletivamente a eles, disse: “Quem vos avisou para partir, como víboras diante do fogo, da ira que virá? Eu batizarei a vós, mas vos previno que vos será necessário produzir os frutos do arrependimento sincero, se quiserdes receber a remissão dos vossos pecados. Não é suficiente dizer-me que Abraão é o vosso pai. Eu declaro que, dessas doze pedras aqui diante de vós, Deus pode fazer surgir filhos dignos para Abraão. E, agora mesmo, o machado já está derrubando as árvores, até as suas raízes. Cada árvore que não dá bom fruto está destinada a ser cortada e jogada ao fogo”. (As doze pedras a que se referia eram as célebres pedras do memorial levantado por Joshua, para comemorar a travessia das “doze tribos” nesse mesmo ponto, quando eles entraram pela primeira vez na terra prometida. )

135:6:8 15026 João deu aulas aos seus discípulos, durante as quais ele os instruía sobre os detalhes da nova vida e esforçava-se para responder às suas inúmeras perguntas. Aconselhou aos educadores ensinar sobre o espírito tanto quanto sobre as letras da lei. Ele ensinou os ricos a alimentar os pobres; aos coletores de impostos, ele disse: “Extorquir não mais do que o que vos é devido”. Aos soldados, ele disse: “Não cometais a violência e não arrecadais nada de modo indevido – contentai-vos com os vossos soldos”. E ao mesmo tempo a todos aconselhava: “preparem-se para o fim das idades – o Reino do céu está ao alcance das mãos”.

7. A JORNADA DE JOÃO PARA O NORTE


135:7:1 15031 João ainda tinha idéias confusas sobre o Reino que estava para vir e o seu rei. Quanto mais ele pregava, mais confuso tornava-se; mas essa incerteza intelectual, a respeito da natureza do Reino que viria, em nada diminuía a sua convicção da chegada imediata deste Reino. João podia estar confuso na sua mente, mas nunca em espírito. Não tinha dúvida sobre a vinda do Reino, mas estava longe de ter certeza quanto ao fato de que fosse Jesus ou não o soberano daquele Reino. Enquanto João se atinha à idéia da restauração do trono de Davi, os ensinamentos dos seus pais, de que Jesus, nascido na cidade de Davi, seria o tão esperado libertador, parecia consistente; mas naqueles momentos em que se inclinava mais para a doutrina de um Reino espiritual e para o fim da idade temporal na Terra, ele ficava em uma dúvida cruel quanto ao papel que Jesus exerceria em tais eventos. Algumas vezes questionava tudo, mas não por muito tempo. Realmente ele gostaria de poder conversar sobre tudo aquilo com o seu primo, mas isso ia contra o acordo estabelecido entre eles.

135:7:2 15032 À medida que João viajava para o norte, mais ele pensava sobre Jesus. Parou em mais de uma dúzia de locais enquanto viajava Jordão acima. E foi no vilarejo de Adão onde primeiro referiu-se a “um outro que está para vir depois de mim”, em resposta à pergunta direta que os seus discípulos fizeram a ele: “Sois vós o Messias?” E ele continuou dizendo: “Depois de mim virá um que é maior do que eu, de cuja sandália não sou digno de afrouxar e desatar as correias. Eu vos batizo com água, mas ele irá batizá-los com o Espírito Santo. E com a sua pá na mão irá cuidadosamente limpar esse chão das ervas daninhas; ele recolherá o trigo no seu celeiro, mas o refugo ele o queimará com o fogo do julgamento”.

135:7:3 15033 Em resposta às perguntas dos seus discípulos João continuou a expandir os seus ensinamentos, acrescentando, dia a dia, mais indicações que servissem de ajuda e de conforto se comparadas à ambigüidade da sua mensagem inicial: “Arrependei-vos e sede batizados”. Nessa época, multidões chegavam da Galiléia e de Decápolis. Dezenas de crentes sinceros permaneciam com o seu adorado mestre, dia após dia.

8. O ENCONTRO DE JESUS E JOÃO


135:8:1 15034 Em dezembro do ano 25 d. C. , quando João chegou à vizinhança de Pela, na sua caminhada Jordão acima, a sua fama havia sido espalhada por toda a Palestina, e o seu trabalho transformara-se no principal assunto da conversa em todas as cidades em torno do lago da Galiléia. Jesus tinha falado favoravelmente à mensagem de João, e isso havia levado muitos de Cafarnaum a aderir ao culto do arrependimento e do bastismo de João. Tiago e João, os pescadores filhos de Zebedeu, tinham ido até lá em dezembro, pouco depois de João ter assumido a sua postura de pregador, perto de Pela, a fim de se oferecerem para o batismo. Eles iam ver João uma vez por semana e traziam de volta a Jesus notícias frescas e de primeira mão sobre o trabalho do evangelista.

135:8:2 15035 Tiago e Judá, irmãos de Jesus, haviam falado em irem até João para o batismo; e agora que Judá tinha vindo a Cafarnaum para os ofícios de sábado, ambos, Tiago e ele, depois de ouvirem o discurso de Jesus na sinagoga, decidiram aconselhar-se com ele a respeito dos seus planos. Isso foi no sábado, à noite, aos 12 de janeiro do ano 26 d. C. Jesus pediu a eles que adiassem a conversa até o dia seguinte, quando ele iria dar-lhes a sua resposta. Jesus dormiu pouquíssimo naquela noite, ficando em comunhão íntima com o Pai nos céus. E preparara tudo para almoçar com os seus irmãos e para aconselhá-los a respeito do batismo de João. Naquela manhã de domingo Jesus estava trabalhando como de costume na marcenaria dos barcos. Tiago e Judá tinham chegado com o almoço e estavam esperando por ele no depósito das madeiras, pois não era ainda a hora da pausa do meio-dia e eles sabiam que Jesus era muito pontual nessas questões.

135:8:3 15041 Pouco antes do descanso do meio-dia, Jesus deixou de lado as suas ferramentas, tirou o seu avental de trabalho e simplesmente anunciou aos três que trabalhavam com ele: “É chegada a minha hora”. Ele foi até os seus irmãos, Tiago e Judá, e repetiu: “A minha hora chegou – vamos até João”. E então eles partiram imediatamente para Pela, comendo o almoço enquanto viajavam. Isso foi no domingo, 13 de janeiro. Eles pararam à noite no Vale do Jordão e, no dia seguinte, chegaram no local em que João batizava, por volta do meio-dia.

135:8:4 15042 João mal tinha começado a batizar os candidatos do dia. Dezenas de arrependidos estavam na fila, à espera da sua vez, quando Jesus e os seus dois irmãos entraram nessa fila de homens e mulheres sinceros que passaram a crer no Reino que viria, segundo a pregação de João. João tinha perguntado aos filhos de Zebedeu sobre Jesus. Ele tinha ouvido falar sobre as observações de Jesus a respeito da sua pregação, e estava, dia após dia, esperando vê-lo entrar em cena, mas não esperava acolhê-lo na fila dos candidatos ao batismo.

135:8:5 15043 Absorvido pelos detalhes de um batismo rápido daquele grande número de convertidos, João não levantou os olhos para ver Jesus, até que o Filho do Homem estivesse bem diante dele. Quando João reconheceu Jesus, as cerimônias foram suspensas por um momento, enquanto ele cumprimentava o seu primo na carne e perguntava: “Mas porque vieste até dentro da água para saudar-me?” E Jesus respondeu: “Para submeter-me ao teu batismo”. João replicou: “Mas sou eu que tenho necessidade de ser batizado por ti. Por que vieste até a mim?” E Jesus murmurou a João: “Sê tolerante comigo agora, pois cabe a nós darmos esse exemplo aos meus irmãos que estão aqui comigo, e para que o povo possa saber que é chegada a minha hora”.

135:8:6 15044 Havia um tom de autoridade e de finalidade na voz de Jesus. João estava trêmulo de emoção, no momento em que se preparou para batizar Jesus de Nazaré no Jordão, ao meio-dia daquela segunda-feira, 14 de janeiro, do ano 26 d. C. Assim, João batizou Jesus e seus dois irmãos, Tiago e Judá. E quando João tinha já batizado esses três, ele dispensou os outros naquele dia, anunciando que ele iria reassumir os batismos no dia seguinte ao meio-dia. Quando o povo já partia, os quatro homens ainda de pé dentro d’água ouviram um som estranho, e logo surgiu uma aparição momentânea exatamente por sobre a cabeça de Jesus, e eles ouviram uma voz dizendo: “Este é o meu Filho adorado, em quem eu muito me comprazo”. Uma grande mudança produziu-se no semblante de Jesus que os deixou, saindo d’água em silêncio, indo na direção das colinas a leste. E nenhum homem viu Jesus de novo por quarenta dias.

135:8:7 15045 João seguiu Jesus até uma distância suficiente para contar a ele a história da visita de Gabriel à sua mãe, antes que ambos nascessem, do modo como por tantas vezes ele havia escutado dos lábios da sua mãe. E permitiu a Jesus continuar o seu caminho depois que disse: “Agora sei com certeza que és o Libertador”. Mas Jesus nada respondeu.

9. OS QUARENTA DIAS DE PREGAÇÃO


135:9:1 15051 Quando João retornou para os seus discípulos (agora havia uns vinte e cinco ou trinta que moravam com ele constantemente), ele os encontrou em uma sincera conferência, conversando sobre o que tinha acabado de acontecer em relação ao batismo de Jesus. E ficaram todos ainda mais atônitos quando João fez-lhes conhecer a história da visita de Gabriel a Maria, antes que Jesus nascesse, e também que Jesus não lhe disse nem uma palavra, mesmo depois que ele lhe tinha contado sobre isso. Naquela tarde, não houve nenhuma chuva, e esse grupo de trinta ou mais pessoas conversou longamente sob a noite estrelada. Perguntavam-se aonde Jesus tinha ido e quando eles o veriam de novo.

135:9:2 15052 Depois da experiência desse dia a pregação de João tinha um novo tom de certeza, nas proclamações a respeito do Reino que estava para vir e do Messias aguardado. Foi um período tenso, aqueles quarenta dias de espera, aguardando pelo retorno de Jesus. João, no entanto, continuou a pregar com grande força, e os seus discípulos começaram, nessa época, a pregar para as multidões transbordantes que se ajuntavam à volta de João no Jordão.

135:9:3 15053 No curso desses quarenta dias de espera, muitos rumores espalharam-se pelo campo, indo mesmo até Tiberíades e Jerusalém. Milhares vinham para ver a nova atração no acampamento de João, reputado como sendo o Messias, mas Jesus não estava lá para ser visto. Quando os discípulos de João afirmaram que o estranho homem de Deus tinha ido para as colinas, muitos duvidaram de toda a história.

135:9:4 15054 Cerca de três semanas depois que Jesus os tinha deixado, uma nova delegação de sacerdotes e de fariseus, vinda de Jerusalém, chegou na cena de Pela. Eles perguntaram a João diretamente se ele era Elias ou o profeta que Moisés prometeu. E quando João disse: “Não sou”, eles atreveram-se a perguntar-lhe: “Tu és o Messias?” E João respondeu: “Não sou eu”. E então esses homens de Jerusalém disseram: “Se não és Elias, nem o profeta, nem o Messias, então por que tu batizas o povo e crias todo esse alvoroço?” E João replicou: “Cabe àqueles que me ouviram e que receberam o meu batismo dizer quem eu sou, mas eu vos declaro que, enquanto eu batizo com água, esteve entre nós um que retornará para batizar-vos com o Espírito Santo”.

135:9:5 15055 Esses quarenta dias foram um período difícil para João e os seus discípulos. Quais deviam ser as relações entre João e Jesus? Uma centena de perguntas vieram à discussão. A política e as preferências egoísticas começaram a surgir. Discussões intensas surgiram em torno das várias idéias e conceitos do Messias. Tornar-se-ia ele um líder militar e um rei davídico? Iria ele aniquilar os exércitos romanos, como Joshua fez com os cananeus? Ou viria para estabelecer um Reino espiritual? João optou por decidir, com a minoria, que Jesus tinha vindo para estabelecer o Reino do céu, ainda que não tivesse claro na sua própria mente o que devia ser incluído nessa missão de estabelecimento do Reino do céu.

135:9:6 15056 Esses foram dias árduos na experiência de João, e ele orou pelo retorno de Jesus. Alguns dos discípulos de João organizaram grupos de exploração para ir à procura de Jesus, mas João os proibiu, dizendo: “Os nossos tempos estão nas mãos de Deus nos céus; Ele irá guiar o seu Filho escolhido”.

135:9:7 15057 E foi cedo, na manhã de sábado, 23 de fevereiro, que a comitiva de João, ocupada em comer a sua refeição matinal, ao olhar na direção norte avistou Jesus vindo até eles. À medida que Jesus se aproximava deles, João se pôs de pé em uma grande rocha e, levantando a sua voz sonora, disse: “Eis o Filho de Deus, o libertador do mundo! Foi sobre ele que eu disse: ‘Depois de mim haverá um que é o escolhido antes de mim, porque ele veio antes de mim’. Por causa disso, eu saí do deserto para pregar o arrependimento e para batizar com a água, proclamando que o Reino do céu está ao alcance das nossas mãos. E agora vem um que irá batizar-vos com o Espírito Santo. E eu vi o espírito divino descendo sobre esse homem, e ouvi a voz de Deus declarar: ‘Este é o meu Filho adorado em quem Eu muito me comprazo’”.

135:9:8 15061 Jesus rogou-lhes que voltassem à sua refeição, enquanto se assentava para comer com João; seus irmãos, Tiago e Judá, tinham voltado a Cafarnaum.

135:9:9 15062 Cedo, na manhã do dia seguinte, ele deixou João e os seus discípulos, indo de volta para a Galiléia. Não garantiu nada no que dizia respeito a quando eles iriam vê-lo de novo. Às perguntas de João sobre a sua própria pregação e missão, Jesus apenas disse: “O meu Pai irá guiar-te agora e no futuro, como o fez no passado”. E esses dois grandes homens separaram-se, naquela manhã, nas margens do Jordão, para nunca mais se falarem um ao outro na carne.

10. JOÃO VIAJA PARA O SUL


135:10:1 15063 Desde que Jesus tinha ido para o norte da Galiléia, João sentiu-se levado a voltar-se com os seus passos para o sul. Por conseguinte, no domingo de manhã, aos 3 de março, João e o restante dos seus discípulos começaram a sua jornada para o sul. Cerca de um quarto dos seguidores imediatos de João tinham, nesse meio tempo, partido para a Galiléia à procura de Jesus. Havia uma tristeza confusa em torno de João. Nunca mais ele pregou como o tinha feito antes de batizar Jesus. De algum modo ele sentiu que a responsabilidade do Reino por vir não mais estava nos seus ombros. Sentiu que o seu trabalho estava quase acabado; estava desconsolado e solitário. Contudo, ele pregou, batizou e viajou para o sul.

135:10:2 15064 Perto do vilarejo de Adão, João permaneceu por várias semanas e foi lá que ele fez o memorável ataque a Herodes Antipas, por ter tomado ilegalmente a esposa de outro homem. Em junho desse ano (26 d. C. ), João estava de volta à travessia do Jordão na Betânia, onde tinha iniciado a sua pregação do Reino vindouro, há mais de um ano. Nas semanas que se seguiram ao batismo de Jesus o caráter da pregação de João gradualmente transformou-se em uma proclamação de misericórdia pela gente comum, enquanto ele denunciava com veemência renovada a corrupção dos governantes políticos e religiosos.

135:10:3 15065 Herodes Antipas, em cujo território João tinha estado pregando, ficou alarmado com a idéia de que ele e os seus discípulos começassem uma rebelião. Herodes também se ressentia das críticas públicas de João, sobre os seus assuntos domésticos. Em vista de tudo isso, Herodes decidiu colocar João na prisão. Em conseqüência disso, muito cedo na manhã de 12 de junho, antes que chegasse a multidão para ouvir a pregação e testemunhar o batismo, os agentes de Herodes prenderam João. À medida que as semanas passavam e ele não era libertado, os seus discípulos espalharam-se por toda a Palestina, muitos deles indo até a Galiléia para juntarem-se aos seguidores de Jesus.

11. JOÃO NA PRISÃO


135:11:1 15066 João teve uma experiência solitária e um tanto amarga na prisão. A poucos dos seus seguidores foi permitido vê-lo. Ele ansiava por encontrar Jesus, mas tinha de contentar-se em ouvir os relatos da sua obra através daqueles seguidores seus que se tinham transformado em crentes do Filho do Homem. Muitas vezes era ele tentado a duvidar de Jesus e da sua missão divina. Se Jesus era o Messias, por que nada fez para libertá-lo desse inconcebível aprisionamento? Por mais de um ano e meio esse homem rude de Deus, amante do ar livre, definhou naquela prisão desprezível. E essa experiência foi um grande teste para a sua lealdade e fé em Jesus. De fato, toda essa experiência foi mesmo um grande teste para a fé de João, em Deus. Muitas vezes ele foi tentado a duvidar até mesmo da autenticidade da sua própria missão e experiência.

135:11:2 15071 Após ter estado na prisão por muitos meses, um grupo de discípulos seus veio até ele e, após contar sobre as atividades públicas de Jesus, disse: “Então, vejas tu, Mestre, pois aquele que estava contigo no alto Jordão prospera e recebe todos os que vêm a ele. Ele festeja até mesmo com publicanos e pecadores. Tu deste um testemunho corajoso sobre ele, e ainda assim ele nada faz para a vossa libertação”. Mas João respondeu aos seus amigos: “Esse homem nada pode fazer que não tenha sido dado a ele por seu Pai nos céus. Vós vos lembrais bem de que eu disse: ‘Não sou eu o Messias, mas sou um enviado antes para preparar o caminho para ele’. E isso eu fiz. O que possui a noiva é o noivo, mas o amigo do noivo, que está próximo dele e o escuta, rejubila-se grandemente por causa do ruído da sua voz. Essa minha alegria, portanto, cumpriu-se. Ele deve crescer, mas eu devo diminuir. Sou desta Terra e já passei a minha mensagem. Jesus de Nazaré desceu à Terra, vindo dos céus, e está acima de todos nós. O Filho do Homem desceu de Deus, e palavras de Deus ele irá dizer a vós. Pois o Pai nos céus não mede o espírito que dá a seu próprio Filho. O Pai ama o Seu Filho e irá logo colocar todas as coisas nas mãos desse Filho. Aquele que acredita no Filho tem a vida eterna. E essas palavras que eu disse são verdadeiras e perduráveis”.

135:11:3 15072 Esses discípulos ficaram assombrados com o pronunciamento de João, tanto que partiram em silêncio. João estava também muito agitado, pois percebeu que tinha acabado de fazer uma profecia. Nunca mais ele duvidou completamente da missão e da divindade de Jesus. Mas foi um desapontamento sentido, para João, que Jesus não tivesse enviado a ele nenhuma palavra, que não tivesse vindo vê-lo e que não tivesse exercido nenhum dos seus grandes poderes para libertá-lo da prisão. Jesus, no entanto, sabia de tudo isso. Tinha um grande amor por João, mas sendo agora conhecedor da sua natureza divina e sabendo plenamente das grandes coisas que estavam em preparação para João quando ele partisse deste mundo e também sabendo que o trabalho de João, na Terra, tinha acabado, ele obrigou-se a não interferir na evolução natural da carreira do grande pregador-profeta.

135:11:4 15073 Essa longa espera na prisão estava tornando-se humanamente intolerável. Uns poucos dias antes da sua morte, João novamente enviou mensageiros de confiança a Jesus, perguntando: “O meu trabalho está feito? Por que me enlanguesço na prisão? Sois verdadeiramente o Messias, ou devemos procurar outro?” E quando esses dois discípulos levaram essa mensagem a Jesus, o Filho do Homem respondeu: “Ide a João e dizei a ele que não me esqueci, e que ele deve suportar isso também, pois o conveniente é que cumpramos tudo o que é reto. Dizei a João o que vós vistes e ouvistes – que as boas-novas são pregadas aos pobres – e, finalmente, dizei ao amado precursor da minha missão na Terra, que ele será abundantemente abençoado na idade que está para vir se ele, de mim, não encontrar ocasião para duvidar e cair”. E essa foi a última palavra que João recebeu de Jesus. Essa mensagem confortou-o grandemente e muito fez para estabilizar a sua fé e para prepará-lo para o trágico fim da sua vida na carne, que veio pouco tempo depois dessa ocasião memorável.

12. A MORTE DE JOÃO BATISTA


135:12:1 15081 De fato, João estava trabalhando no sul da Peréia quando foi preso e levado imediatamente para a prisão da fortaleza de Macaerus, onde foi encarcerado até a sua execução. Herodes governava sobre a Peréia e a Galiléia; nessa época, mantinha residência na Peréia, tanto em Julias, quanto em Macaerus. Na Galiléia a residência oficial tinha sido levada de Séforis para a nova capital em Tiberíades.

135:12:2 15082 Herodes temia libertar João por medo de que ele instigasse a rebelião. Temia condená-lo à morte e que a multidão causasse motins na capital, pois milhares de pereianos acreditavam que João era um homem sagrado, um profeta. Portanto, Herodes mantinha o pregador nazarita na prisão, não sabendo o que mais fazer com ele. Muitas vezes João tinha estado perante Herodes, mas nunca concordara em sair dos domínios de Herodes, nem de abster-se de todas as atividades públicas se fosse libertado. E essa nova agitação a respeito de Jesus de Nazaré, que crescia firmemente, serviu de admoestação para Herodes, de que não era a hora de libertar João. Além disso, João era também uma vítima do ódio intenso e amargo de Herodias, a mulher ilegal de Herodes.

135:12:3 15083 Em inúmeras ocasiões Herodes falou com João sobre o Reino do céu; ao mesmo tempo em que ficava algumas vezes seriamente impressionado com a sua mensagem, tinha medo de libertá-lo da prisão.

135:12:4 15084 Já que, em Tiberíades, grande parte do edifício estava em construção, Herodes passava um tempo considerável nas suas residências pereianas, pois tinha predileção pela fortaleza de Macaerus. Muitos anos passariam antes que todos os prédios públicos e a residência oficial em Tiberíades estivessem completamente prontos.

135:12:5 15085 Para celebrar o seu aniversário Herodes fez uma grande festa no palácio em Macaerus, para os seus principais oficiais e outros homens de posição elevada nos conselhos do governo da Galiléia e Peréia. Já que Herodias tinha fracassado em causar a morte de João, por apelo direto a Herodes, ela estabeleceu para si mesma a tarefa de levar João à morte por meio de um plano astuto.

135:12:6 15086 No decorrer das festividades e entretenimentos daquela noite, Herodias apresentou a sua filha para dançar diante dos convivas. Herodes estava muito encantado com a dança da donzela e, chamando-a diante de si, disse: “Tu és encantadora. Estou muito satisfeito contigo. Peça a mim, neste meu aniversário, o que desejares, e eu darei a ti, ainda que seja a metade do meu reino”. E Herodes fazia tudo isso sob a influência de muito vinho. A donzela retirou-se e perguntou à sua mãe o que deveria ela pedir a Herodes. Herodias disse: “Vá a Herodes e peça a cabeça de João Batista”. E a jovem donzela, retornando à mesa do banquete, disse a Herodes: “Eu peço que me entregues imediatamente a cabeça de João Batista, em uma bandeja”.

135:12:7 15087 Herodes ficou cheio de medo e de tristeza, no entanto, tinha dado a sua palavra diante de todos os que se assentavam para banquetear-se com ele, e por isso não queria negar o pedido. E Herodes Antipas enviou um soldado com a ordem de trazer a cabeça de João. E João teve então a sua cabeça decepada, naquela noite, na prisão; e o soldado trouxe a cabeça do profeta em uma bandeja e apresentou-a à jovem donzela, no fundo da sala de banquete. E a donzela deu a bandeja à sua mãe. Quando os discípulos de João ouviram sobre isso, vieram à prisão buscar o corpo de João e, depois de colocá-lo em um túmulo, foram embora e contaram tudo a Jesus.

DOCUMENTO 136

O BATISMO E OS QUARENTA DIAS
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Jesus começou o seu trabalho público em um momento de interesse popular pela pregação de João e em uma época em que o povo judeu da Palestina aguardava ansiosamente o aparecimento do Messias. Havia um grande contraste entre João e Jesus. João era um operário sincero e ardente; e Jesus era um trabalhador calmo e feliz, umas poucas vezes apenas, em toda a sua vida, ele apressou-se. Jesus era um consolo e um conforto para o mundo e, de um certo modo, um exemplo; João não seria nunca nem um conforto, nem um exemplo. Ele pregava o Reino do céu, mas não participava da felicidade do mesmo. Se bem que Jesus falasse de João como o maior dos profetas da velha ordem, ele também dizia que o menor entre aqueles que vissem a grande luz do novo caminho e que por ela entrassem no Reino do céu seria, de fato, maior do que João.

136:0:2 15092 Quando João pregava o Reino que viria, o conteúdo da sua mensagem era: Arrependei-vos, fugi da ira que virá! Quando Jesus começou a pregar, a exortação ao arrependimento permaneceu, mas essa mensagem era sempre seguida por uma palavra divina sobre a boa-nova da alegria e da liberdade do novo Reino.

1. OS CONCEITOS DO MESSIAS ESPERADO


136:1:1 15093 Os judeus nutriam muitas idéias sobre o libertador esperado, e cada uma dessas diferentes escolas de ensinamentos messiânicos era capaz de apontar passagens nas escrituras dos hebreus que comprovavam o seu conteúdo. De um modo geral, os judeus consideravam a sua história nacional como se iniciando com Abraão e culminando com o Messias e a nova idade do Reino de Deus. Em tempos anteriores, eles tinham concebido esse libertador como “o servo do Senhor”, depois como “o Filho do Homem”, ao passo que mais recentemente alguns iam mesmo mais longe, a ponto de referirem-se ao Messias como o “Filho de Deus”. Não importava, contudo, que fosse chamado “a semente de Abraão” ou “o filho de Davi”, todos concordavam que o Messias devia ser o “ungido”. Assim, o conceito evoluía de “servo do Senhor” até “filho de Davi”, e de “Filho do Homem” até “Filho de Deus”.

136:1:2 15094 Nos dias de João e de Jesus, os judeus mais instruídos tinham desenvolvido, para o Messias que viria, a imagem do israelita perfeccionado e representativo, combinando, ao mesmo tempo, a idéia de “servo do Senhor” e a função tríplice de profeta, sacerdote e rei.

136:1:3 15095 Os judeus acreditavam com devoção que, assim como Moisés tinha libertado os seus pais da servidão egípcia mediante feitos prodigiosos e miraculosos, o Messias que estava por vir libertaria o povo judeu do domínio romano, com milagres ainda maiores, e pelo poder e maravilhas, em um triunfo racial. Os rabinos tinham reunido quase quinhentas passagens das escrituras que, não obstante as suas aparentes contradições, afirmavam profeticamente a vinda do Messias. Em meio a todos esses detalhes de tempo, técnica e função, eles perderam quase completamente de vista a personalidade do Messias prometido. Eles estavam à busca de uma restauração da glória nacional judaica – a exaltação temporal de Israel – mais do que da salvação do mundo. Torna-se evidente, pois, que Jesus de Nazaré jamais poderia satisfazer a esse conceito materialista de Messias, criado pela mente judaica. Muitas das famosas predições messiânicas dos judeus, caso tivessem visto essas sentenças proféticas sob uma luz diferente, teriam muito naturalmente preparado as suas mentes para um reconhecimento de Jesus como sendo aquele que colocaria fim a uma idade e que inauguraria uma nova e melhor dispensação, de misericórdia e salvação para todas as nações.

136:1:4 15101 Os judeus tinham crescido na crença da doutrina de Shekinah. Esse suposto símbolo da Presença Divina, todavia, não era visto no templo. Eles acreditavam que a vinda do Messias efetivaria a restauração dele. Eles mantinham idéias confusas sobre o pecado da raça e a suposta natureza má do homem. Alguns ensinavam que o pecado de Adão tinha amaldiçoado a raça humana e que o Messias iria retirar essa maldição e devolveria o homem ao favorecimento divino. Outros ensinavam que Deus, ao criar o homem, havia colocado no seu ser tanto a natureza do bem como a do mal; e que, quando Ele observou o que adveio disso, Ele ficou muito desapontado, e que “se arrependeu de assim ter Ele feito o homem”. E aqueles que ensinavam isso acreditavam que o Messias estava para vir a fim de redimir o homem da sua natureza inerentemente má.

136:1:5 15102 A maioria dos judeus acreditava que eles estavam enfraquecendo-se sob o domínio romano, por causa dos seus pecados nacionais e da tepidez dos prosélitos gentios. A nação judaica não estava arrependida, no seu coração; e, portanto, o Messias retardava a sua vinda. Havia muita conversa sobre o arrependimento; e daí o apelo poderoso e imediato da pregação de João: “Arrependei-vos e sede batizados, pois o Reino do céu está ao alcance da mão”. E, para qualquer judeu devoto, o Reino do céu podia significar uma coisa apenas: a vinda do Messias.

136:1:6 15103 Havia um aspecto da auto-outorga de Michael que era totalmente estranho à concepção judaica do Messias, que era o da união das duas naturezas, a humana e a divina. Os judeus, de várias maneiras, tinham concebido o Messias como um humano perfeccionado, como um super-homem e mesmo como um ser divino; mas eles nunca alimentaram o conceito da união do humano e do divino. E esse foi um grande bloqueio no qual tropeçaram os primeiros discípulos de Jesus. Eles compreenderam o conceito humano do Messias como sendo o filho de Davi, do modo como foi introduzido pelos profetas anteriores; como o Filho do Homem, na idéia super-humana de Daniel e de alguns dos profetas mais recentes; e mesmo como o Filho de Deus, como descrito pelo autor do Livro de Enoch e por alguns dos seus contemporâneos; mas nunca eles tinham, por um só momento, alimentado o conceito verdadeiro da união, em uma personalidade terrena, das duas naturezas, a humana e a divina. A encarnação do Criador, na forma da criatura, não tinha sido revelada de antemão. Estava sendo revelada apenas em Jesus; o mundo nada sabia dessas coisas, até que o Filho Criador foi feito carne e habitou entre os mortais deste reino.

2. O BATISMO DE JESUS


136:2:1 15104 Jesus foi batizado no apogeu das pregações de João, quando a Palestina estava inflamada pela esperança da sua mensagem – “o Reino de Deus está à mão” –, quando todo o mundo judeu empenhava-se em um exame de consciência sério e solene. O sentido judaico de solidariedade racial era muito profundo. Os judeus, não apenas acreditavam que os pecados de um pai poderiam afligir os seus filhos, mas acreditavam firmemente que o pecado de um indivíduo poderia amaldiçoar a nação. Desse modo, nem todos, entre aqueles que se submetiam ao batismo de João, consideravam a si próprios como sendo culpados dos pecados específicos denunciados por João. Muitas almas devotas foram batizadas por João pelo bem de Israel. Eles temiam que algum pecado de ignorância, da sua parte, pudesse retardar a vinda do Messias. Sentiam-se como uma nação culpada e amaldiçoada pelo pecado e apresentavam-se para o batismo no intuito de que, assim fazendo, pudessem manifestar os frutos da penitência da raça. Evidente é, pois, que Jesus, de nenhum modo, recebeu o batismo de João como um ritual de arrependimento, nem de remissão de pecados. Ao aceitar o batismo das mãos de João, Jesus estava apenas seguindo o exemplo de inúmeros israelitas pios.

136:2:2 15111 Quando Jesus de Nazaré foi até o Jordão, para ser batizado, ele era um mortal deste reino, que tinha atingido o pináculo da ascensão evolucionária humana, em todos os pontos relacionados à conquista da mente e à auto-identificação com o espírito. Era como um mortal perfeccionado, dos mundos evolucionários do tempo e do espaço que ele comparecia naquele dia ao Jordão. Uma sincronia perfeita e uma completa comunicação tinha sido estabelecida entre a mente mortal de Jesus e o espírito Ajustador residente, a dádiva divina do seu Pai no Paraíso. E, então, um Ajustador, tal como este, reside na mente de todos os seres humanos normais vivendo em Urântia, desde a ascensão de Michael à soberania do seu universo; excetuando o fato de que o Ajustador de Jesus tinha sido previamente preparado para essa missão especial, residindo, do mesmo modo, em um outro ser supra-humano encarnado à semelhança da carne mortal, Machiventa Melquisedeque.

136:2:3 15112 Habitualmente, quando um mortal do reino atinge níveis tão elevados de perfeição da personalidade, ocorrem aqueles fenômenos preliminares da elevação espiritual que culminam na fusão final da alma amadurecida do mortal com o seu Ajustador divino solidário. E essa mudança, aparentemente, deveria ter acontecido, na experiência da personalidade de Jesus de Nazaré, naquele mesmo dia em que ele foi ao Jordão com os seus dois irmãos, para ser batizado por João. Essa cerimônia foi o ato final da sua vida meramente humana em Urântia; e muitos observadores supra-humanos esperavam testemunhar a fusão do Ajustador com a mente residida, mas todos estavam destinados a desapontar-se. Algo novo, e até mesmo maior, ocorreu. Quando João colocou as suas mãos sobre Jesus, para batizá-lo, o Ajustador residente, para sempre, deixou a alma humana perfeccionada de Joshua ben José. E, nuns poucos momentos, essa entidade divina retornou de Divinington, como um Ajustador Personalizado, feito dirigente da sua espécie em todo o universo local de Nebadon. Assim, Jesus observou o seu próprio espírito divino anterior descendo no seu retorno para ele, na forma personalizada. E ouviu esse mesmo espírito, originário do Paraíso, falar agora, dizendo: “Este é o meu Filho amado, em quem Eu muito me comprazo”. E João, junto com os dois irmãos de Jesus, também ouvira essas palavras. Os discípulos de João, de pé na beira da água, não ouviram essas palavras nem viram a aparição do Ajustador Personalizado. Apenas os olhos de Jesus viram o Ajustador Personalizado.

136:2:4 15113 Após o Ajustador Personalizado, que retornara, agora mais elevado, assim ter falado, caiu o silêncio. E, enquanto os quatro permaneciam na água, Jesus, olhando para cima na direção do Ajustador que se aproximava, orou: “Meu Pai, que reina nos céus, santificado seja o Teu nome. Venha a nós o Teu Reino! Seja feita a Tua vontade, na Terra, como nos céus”. Quando ele estava orando, os “céus abriram-se”, e o Filho do Homem teve uma visão de si próprio, que foi apresentada pelo agora Personalizado Ajustador, como um Filho de Deus, do modo como ele era, antes de vir à Terra à semelhança da carne mortal; e como ele seria, quando a vida encarnada terminasse. Essa visão celeste foi percebida apenas por Jesus.

136:2:5 15121 Tinha sido a voz do Ajustador Personalizado que João e Jesus ouviram, falando em nome do Pai Universal; pois o Ajustador é como o Pai do Paraíso e provém Dele. Durante todo o restante da vida de Jesus na Terra, esse Ajustador Personalizado esteve solidário com ele, em todos os seus trabalhos; Jesus permaneceu em comunhão constante com esse exaltado Ajustador.

136:2:6 15122 Quando Jesus foi batizado, não se arrependeu de nenhuma ação errada; e não fez nenhuma confissão de pecado. O seu batismo foi o da consagração do cumprimento da vontade do Pai celeste. No seu batismo, ele ouviu o chamado inconfundível do seu Pai, o chamado final para ocupar-se dos assuntos do seu Pai; e então ele partiu para uma reclusão, em privacidade, por quarenta dias, para pensar sobre todas essas questões. Retirando-se assim, por um período, do contato ativo de personalidade com os seus companheiros terrenos, Jesus, sendo quem era e estando em Urântia, estava seguindo o mesmo procedimento previsto nos mundos moronciais, que segue um mortal ascendente que se fusiona com a sua presença interna do Pai Universal.

136:2:7 15123 Esse dia do batismo deu fim à vida puramente humana de Jesus. O Filho divino encontrou o seu Pai, o Pai Universal encontrou o Seu Filho encarnado e Eles falaram-se um ao outro.

136:2:8 15124 (Jesus tinha quase trinta e um anos e meio, quando foi batizado. Embora Lucas diga que Jesus foi batizado no décimo quinto ano do reinado de Tibério César, que teria sido no ano 29 d. C. , posto que Augusto morreu no ano 14 d. C. , deveria ser relembrado que Tibério foi co-imperador com Augusto, por dois anos e meio, antes da morte de Augusto; tendo tido moedas estampadas em sua honra, em outubro do ano 11 d. C. O décimo quinto ano do seu governo, na realidade, portanto foi esse mesmo ano de 26 d. C. , o mesmo do batismo de Jesus. E esse também foi o ano em que Pôncio Pilatos começou como governador da Judéia. )

3. OS QUARENTA DIAS


136:3:1 15125 Antes do seu batismo, Jesus tinha suportado a grande tentação da sua outorga mortal, quando ele foi molhado pelo orvalho do monte Hermom, por seis semanas. Lá, no monte Hermom, como um mortal deste reino, sem ajuda, ele tinha encontrado e derrotado Caligástia, o enganador de Urântia, o príncipe deste mundo. Nesse dia memorável, segundo os registros do universo, Jesus de Nazaré tinha tornado-se o Príncipe Planetário de Urântia. E esse Príncipe de Urântia, que seria logo proclamado o supremo Soberano Nebadon, tinha agora ido, por quarenta dias, em recolhimento, para formular os planos e determinar a técnica pela qual proclamaria o novo Reino de Deus, nos corações dos homens.

136:3:2 15126 Depois do seu batismo, ele entrou nos quarenta dias de ajustamento de si próprio às relações alteradas do mundo e do universo, ocasionadas pela personalização do seu Ajustador. Durante esse isolamento nas colinas pireianas, ele determinou a política a ser seguida e os métodos a serem empregados na nova e modificada fase da vida da Terra, que ele estava para inaugurar.

136:3:3 15127 Jesus não saiu em retiro com o propósito de jejuar, tampouco para afligir a sua alma. Ele não era um asceta, e tinha vindo para acabar para sempre com todas essas noções a respeito de Deus. As suas razões para procurar esse retiro foram inteiramente diferentes daquelas que tinham atuado sobre Moisés e Elias e, mesmo, sobre João Batista. Jesus já era, então, plenamente consciente a respeito da sua relação com o universo por ele próprio criado e, também, da sua relação com o universo dos universos, supervisionado pelo Pai do Paraíso, o seu Pai nos céus. Agora, ele se lembrava plenamente da missão de auto-outorga e das instruções administradas pelo seu irmão mais velho, Emanuel, antes que ele entrasse na sua encarnação de Urântia. Ele compreendia total e claramente, agora, todas essas múltiplas relações; e desejava ficar afastado, durante um período de meditação, em silêncio, de modo que pudesse pensar sobre os seus planos e decidir sobre quais procedimentos adotar na continuação dos seus trabalhos públicos em favor deste mundo e de todos os outros mundos do seu universo local.

136:3:4 15131 Enquanto perambulava pelas colinas, procurando um abrigo adequado, Jesus encontrou o dirigente executivo do seu universo, Gabriel, o Brilhante Estrela Matutino de Nebadon. Gabriel restabelecia agora a comunicação pessoal com o Filho Criador do universo; eles encontraram-se diretamente, pela primeira vez, desde que Michael tinha deixado os seus colaboradores em Salvington, quando foi a Edêntia preparar-se para iniciar a auto-outorga de Urântia. Gabriel, por ordem de Emanuel e sob a autoridade dos Anciães dos Dias de Uversa, dava agora a Jesus a informação indicativa de que a sua experiência de auto-outorga em Urântia estava praticamente acabada no que concernia à conquista da soberania perfeita do seu universo e ao fim da rebelião de Lúcifer. A primeira foi conquistada no dia do seu batismo, quando a personalização do seu Ajustador demonstrou que a sua outorga à semelhança da carne mortal estava completada e perfeita; e o segundo passou a ser um fato na história, naquele dia em que ele veio do monte Hermom, ao encontro de Tiglá, o jovem que o esperava. Jesus estava sendo informado agora, pelas autoridades mais elevadas do universo local e do supra-universo, que a sua obra de outorga estava completa naquilo que dizia respeito ao seu status pessoal, em relação à soberania e à rebelião. Ele já tinha recebido essa garantia, diretamente do Paraíso, na visão batismal e no fenômeno da personalização do seu Ajustador do Pensamento residente.

136:3:5 15132 Enquanto ele permanecia na montanha, falando com Gabriel, o Pai da Constelação de Edêntia apareceu, em pessoa, para Jesus e Gabriel, dizendo: “Os registros foram realizados. A soberania de Michael, Número 611 121, sobre o seu universo de Nebadon está completada e entregue à mão direita do Pai Universal. Eu trago a ti a liberação da auto-outorga vinda de Emanuel, o teu irmão e padrinho para esta encarnação de Urântia. Tens a liberdade para terminar, agora, ou em qualquer momento subseqüente, da maneira da tua própria escolha, a tua auto-outorga de encarnação; e ascender à mão direita do teu Pai, para receber a tua soberania e assumir o teu bem conquistado governo, incondicional, de todo o Nebadon. Eu também atesto que se encerra, segundo as formalidades dos registros do superuniverso, por autorização dos Anciães dos Dias, tudo o que existir ligado ao término de toda a rebelião-pecado, no teu universo, dotando-te com autoridade plena e ilimitada para lidar com todos e quaisquer possíveis levantes como esse, no futuro. Tecnicamente, a tua obra, em Urântia e na carne da criatura mortal, está terminada. O teu caminho, de agora em diante, é uma questão da tua própria escolha”.

136:3:6 15133 Quando o Pai Altíssimo de Edêntia foi embora, Jesus manteve uma longa conversa com Gabriel, a respeito do bem-estar do universo, e, enviando saudações a Emanuel, reiterou a sua promessa de que, no trabalho que ele estava para empreender em Urântia, ele lembrar-se-ia sempre dos conselhos que lhe tinham sido ministrados em Salvington, na sua missão de preparo para essa outorga.

136:3:7 15141 Em todos esses quarenta dias de isolamento, Tiago e João, os filhos de Zebedeu, estiveram empenhados em encontrar Jesus. Algumas vezes estiveram a pouca distância do local onde ele estava recolhido, mas nunca o encontraram.

4. OS PLANOS PARA O TRABALHO PÚBLICO


136:4:1 15142 Dia a dia, no alto das colinas, Jesus formulava os planos para o restante da sua outorga em Urântia. Primeiro ele decidiu não ensinar concomitantemente com João. Ele planejou permanecer em um relativo retiro até que o trabalho de João tivesse atingido o seu propósito, ou até que fosse interrompido subitamente pelo seu encarceramento. Jesus sabia bem que a pregação destemida e sem tato de João iria logo despertar os temores e a inimizade dos governantes civis. Em vista da situação precária de João, Jesus começou definitivamente a planejar o seu programa de trabalhos públicos, em favor do seu povo do mundo, ou seja, em prol de todos os mundos habitados de todo o seu vasto universo. A auto-outorga mortal de Michael acontecia em Urântia, mas para todos os mundos de Nebadon.

136:4:2 15143 A primeira coisa que Jesus fez, depois de repensar o plano geral, para a coordenação do seu programa com os movimentos de João, foi rever, em sua mente, as instruções de Emanuel. Cuidadosamente repassou o conselho dado a ele, a respeito dos seus métodos de trabalho e de que ele não devia deixar nenhum escrito permanente no planeta. Nunca mais Jesus escreveu em nada a não ser na areia. Na sua próxima visita a Nazaré, e para grande tristeza do seu irmão José, Jesus destruiu todos os seus escritos que tinham sido preservados em pranchas, na oficina de carpinteiro, e os que estavam dependurados nas paredes da velha casa. E Jesus ponderou muito bem sobre os conselhos de Emanuel, sobre a sua atitude econômica, social e política para com o mundo, do modo como ele o encontrasse.

136:4:3 15144 Jesus não jejuou durante esse período de quarenta dias de isolamento. O período mais longo que passou sem alimento foi o dos seus dois primeiros dias nas colinas, quando ele estava tão absorto nos seus pensamentos que se esqueceu totalmente de comer. Ao terceiro dia, contudo, ele saiu à procura de alimento. Nem foi ele tentado, durante esse tempo, por quaisquer espíritos do mal, nem por personalidades rebeldes em permanência neste mundo, nem de nenhum outro mundo.

136:4:4 15145 Esses quarenta dias foram a ocasião para a conferência final, entre a mente humana e a mente divina, ou melhor, para o primeiro funcionamento real dessas duas mentes, agora feitas uma. Os resultados desse importante período de meditação demonstraram conclusivamente que a mente divina tinha, de modo triunfal, dominado espiritualmente o intelecto humano. A mente do homem tinha transformado-se na mente de Deus desse momento em diante e, se bem que a individualidade e a mente do homem estivessem sempre presentes, essa mente humana espiritualizada sempre dizia: “Não a minha vontade, mas a Tua seja feita”.

136:4:5 15146 As transações desse tempo de eventos memoráveis não foram as visões fantásticas de uma mente enfraquecida pela longa fome, nem foram elas cheias dos simbolismos confusos e pueris que posteriormente ganharam registro como as “tentações de Jesus no deserto”. Esse foi mais um período para repensar sobre toda a carreira variada e cheia de eventos, da sua outorga de Urântia; e para o estabelecimento cuidadoso dos planos para a ministração futura, do modo como melhor servisse a esse mundo e que também contribuísse, em alguma coisa, para melhorar todas as outras esferas isoladas pela rebelião. Jesus pensou sobre todo o ciclo da vida humana em Urântia, desde os dias de Andon e Fonta, passando pelos da falta cometida por Adão e até os da ministração de Melquisedeque de Salém.

136:4:6 15147 Gabriel tinha lembrado a Jesus que havia dois modos pelos quais ele poderia manifestar a si próprio ao mundo, caso escolhesse permanecer ainda em Urântia por um período de tempo. E ficou claro para Jesus que a sua escolha nessa questão nada teria a ver, nem com a sua soberania sobre o universo, nem com o término da rebelião de Lúcifer. Esses dois modos de ministração ao mundo eram:

15151 1. O seu próprio modo – o modo que pudesse parecer o mais agradável e o de maior proveito, do ponto de vista das necessidades imediatas deste mundo e para a edificação presente do seu próprio universo.

15152 2. O modo do Pai – aquele que daria uma demonstração de um ideal de longo alcance da vida da criatura, como era visualizada pelas altas personalidades do Paraíso, na administração do universo dos universos.

136:4:7 15153 E assim tornava-se claro para Jesus, que havia dois caminhos, segundo os quais ele poderia ordenar o restante da sua vida terrena. Cada um desses caminhos tinha algo argumentando a seu favor, se fosse visto à luz da situação imediata. O Filho do Homem percebeu claramente que a sua escolha, entre esses dois modos de conduta, nada teria a ver com a sua recepção da soberania do universo; pois aquilo era uma questão já estabelecida e selada, nos registros do universo dos universos, e apenas aguardava a sua demanda pessoal. Contudo, foi indicado a Jesus que uma grande satisfação seria proporcionada ao seu irmão do Paraíso, Emanuel, se ele, Jesus, concluísse que seria adequado terminar a sua carreira terrena de encarnação tão nobremente quanto a tinha iniciado; submetendo-se sempre à vontade do Pai. Ao terceiro dia desse isolamento, Jesus prometeu a si próprio que retornaria ao mundo para terminar a sua carreira terrena; e que, em uma situação que envolvesse apenas um dos dois caminhos, ele escolheria sempre a vontade do Pai. E viveu o restante da sua vida terrena sempre fiel a essa resolução. Até o amargo fim mesmo, ele subordinou invariavelmente a sua vontade soberana à do seu Pai celeste.

136:4:8 15154 Os quarenta dias na montanha desértica não foram um período de grande tentação, mas, antes, o período das grandes decisões do Mestre. Durante esses dias de comunhão solitária consigo próprio e com a presença imediata do seu Pai –, o Ajustador Personalizado (ele não tinha mais um guardião seráfico pessoal) – ele encontrou, uma a uma, as grandes decisões que viriam a reger as suas políticas e a sua conduta, para o restante da sua carreira terrena. Posteriormente, a tradição de uma grande tentação ficou ligada a esse período de isolamento, por causa da confusão das narrativas fragmentadas das lutas do monte Hermom, e também porque o costume era o de que todos os grandes profetas e os líderes humanos tivessem começado as suas carreiras públicas submetendo-se a esses supostos períodos de jejum e oração. Tinha sido sempre da prática de Jesus, quando posto frente a quaisquer decisões novas ou sérias, retirar-se para uma comunhão com o seu próprio espírito, de um modo tal que ele pudesse buscar conhecer a vontade de Deus.

136:4:9 15155 Em todo esse plano, para o restante da sua vida terrena, Jesus esteve sempre dividido, no seu coração humano, entre dois rumos opostos de conduta:

136:4:10 15156 1. O do forte desejo que ele alimentava, de conduzir o seu povo – e todo o mundo – a acreditar nele, e de aceitar o seu novo Reino espiritual. E ele sabia muito bem sobre as idéias deles a respeito do Messias que viria.

136:4:11 15157 2. O de viver e trabalhar do modo como ele sabia ser o da aprovação do seu Pai, de conduzir o seu trabalho em favor de outros mundos em necessidade, e continuar a estabelecer o Reino, a revelar o Pai e a manifestar o seu caráter divino de amor.

136:4:12 15158 Nesses dias de acontecimentos memoráveis, Jesus viveu em uma caverna antiga de rocha, um abrigo de um lado das colinas, perto de uma aldeia algumas vezes chamada de Beit Adis. Ele bebia água de uma pequena fonte que vinha de um lado da montanha perto desse abrigo na rocha.

5. A PRIMEIRA GRANDE DECISÃO


136:5:1 15161 Ao terceiro dia, após ter começado esse diálogo com o seu Ajustador Personalizado, Jesus foi presenteado com a visão das hostes celestes de Nebadon; enviadas pelos seus comandantes para aguardarem e cumprirem a vontade do seu amado Soberano. Essa poderosa hoste abrangia doze legiões de serafins e números proporcionais de cada uma das ordens de inteligência do universo. E a primeira grande decisão de Jesus, no seu isolamento, tinha a ver com a sua escolha de fazer uso ou não dessas poderosas personalidades, para o programa seguinte do seu trabalho público em Urântia.

136:5:2 15162 Jesus decidiu que ele não utilizaria uma única personalidade sequer que fosse, desse vasto conjunto, a menos que se tornasse evidente que essa seria a vontade do Pai. Não obstante essa decisão geral, essa imensa hoste permaneceu com ele durante o restante da sua vida terrestre, sempre na prontidão para obedecer à menor expressão da vontade do seu Soberano. Jesus não via constantemente essas personalidades que o acompanhavam, com os seus olhos humanos; mas o seu Ajustador Personalizado solidário, constantemente, não apenas as via, mas podia comunicar-se com todas elas.

136:5:3 15163 Antes de voltar do retiro de quarenta dias nas montanhas, Jesus designou o comando direto dessa hoste ajudante de personalidades do universo, ao seu Ajustador recentemente Personalizado, e, por mais de quatro anos, do tempo de Urântia, essas seletas personalidades, de cada divisão de inteligências do universo, obediente e respeitosamente funcionaram sob a sábia condução desse exaltado e experiente Monitor Misterioso Personalizado. Ao assumir o comando desse conjunto poderoso, o Ajustador, tendo uma vez sido parte e essência do Pai do Paraíso, assegurou a Jesus que, em nenhum caso, a essas agências supra-humanas seria permitido servir ou manifestar-se, por qualquer motivo, em defesa da carreira terrena dele, a menos que se tornasse claro que o Pai desejava tal intervenção. Assim, por meio de uma grande decisão, Jesus privara a si próprio, voluntariamente, de toda a cooperação supra-humana, para todas as questões que tivessem a ver com o restante da sua carreira mortal, a menos que o Pai pudesse escolher independentemente participar desse ou daquele ato ou episódio dos trabalhos terrenos do Filho.

136:5:4 15164 Ao aceitar esse comando das hostes do universo, a serviço de Cristo Michael, o Ajustador Personalizado fez um grande esforço para mostrar a Jesus que, conquanto esse conjunto de criaturas do universo pudesse ser limitado, nas suas atividades no espaço, pela autoridade delegada pelo seu Criador, tais limitações deixavam de ser operativas, no que dizia respeito à sua função no tempo. E isso porque essa limitação dependia do fato de que os Ajustadores são seres não temporais, uma vez personalizados. E, desse modo, Jesus ficou advertido sobre o fato de que o controle que seria feito pelo Ajustador, das inteligências vivas colocadas sob o seu comando, seria completo e perfeito quanto às questões envolvendo o espaço, mas que não poderia haver limitações tão perfeitas a impor, no que concernisse ao tempo. Disse-lhe o Ajustador: “Irei, como tu me comandaste, impedir a interferência dessa hoste de inteligências do universo que aguarda para servir-te, de todos os modos, no que disser respeito à tua carreira terrena, exceto naqueles casos em que o Pai do Paraíso me ordenar liberar essas agências para cumprirem a Sua vontade divina, tal como pela tua escolha pode ser realizado. E o mesmo se dará nos casos em que tu possas optar ou agir por tua vontade divina-humana e que envolvam apenas alterações da ordem natural terrena quanto ao tempo. Em todos esses eventos eu serei impotente, e as tuas criaturas, aqui reunidas em perfeição e unidade de poder, do mesmo modo serão impotentes. Se as tuas naturezas unidas alimentarem um desejo, este mandato da tua escolha será logo executado. O teu desejo, em todas as questões como essas, constituirá uma ponte no tempo e a coisa projetada é existente. Sob o meu comando isso se constitui na mais completa limitação possível que possa ser imposta ao seu potencial de soberania. Na minha consciência, o tempo não existe e, portanto, não posso limitar as tuas criaturas em nada que se relacione a ele”.

136:5:5 15171 Assim Jesus ficou a par de como funcionaria a sua decisão de continuar vivendo como um homem entre os homens. Por uma simples decisão, tinha excluído todas as hostes do universo, à sua disposição, de inteligências variadas, de participarem do seu ministério público que se seguiria, com exceção somente daqueles assuntos para os quais o tempo fosse concernido. Tornou-se evidente, a partir daí, que qualquer acompanhamento, supostamente supranatural ou supra-humano possível, para o ministério de Jesus, teria pertinência apenas quanto à eliminação do tempo, a menos que o Pai nos céus ordenasse especificamente que fosse de outro modo. Nenhum milagre, nenhuma ministração de misericórdia, nem qualquer outro evento possível, que ocorresse nas obras restantes de Jesus na Terra, não poderia, possivelmente, ser de uma natureza ou caráter que transcendesse as leis naturais estabelecidas e funcionando regularmente nos assuntos dos homens, e do modo como vivem eles em Urântia, exceto nessa questão expressamente declarada do tempo. Nenhum limite, que fique claro, poderia ser colocado às manifestações da “vontade do Pai”. A eliminação do tempo, naquilo em que o desejo expresso desse Soberano, em potencial, de um universo, poderia apenas ser evitado, por ato expresso e direto da vontade desse homem-Deus; para que o tempo, enquanto relacionado ao ato, ou evento em questão, não devesse ser abreviado, nem eliminado. Para impedir o surgimento de aparentes milagres no tempo, tornava-se necessário que Jesus permanecesse continuamente consciente do tempo. Qualquer lapso, da sua parte, na sua consciência do tempo, se mantido em relação a algum desejo definido, seria equivalente à realização da coisa concebida na mente desse Filho Criador, sem a interferência do tempo.

136:5:6 15172 Através do controle e da supervisão do seu Ajustador Personalizado, solidário, era possível a Michael limitar perfeitamente as suas atividades pessoais terrenas, com referência ao espaço; mas não era possível, ao Filho do Homem, limitar assim o seu novo status terreno, como Soberano potencial de Nebadon, no que concernia ao tempo. E era esse o status de fato de Jesus de Nazaré, quando ele saiu para começar a sua ministração pública em Urântia.

6. A SEGUNDA DECISÃO


136:6:1 15173 Tendo estabelecido a sua política concernente a todas as personalidades, de todas as classes de inteligências criadas por ele, até onde isso podia ser determinado, em vista do potencial inerente ao seu novo status de divindade, Jesus agora voltava os seus pensamentos na direção de si mesmo. O que iria ele fazer, agora que estava totalmente consciente de ser o criador de todas as coisas e seres existentes neste universo, dessas prerrogativas de criador, nas situações recorrentes, de vida, com as quais iria confrontar-se imediatamente, tão logo retornasse à Galiléia, para reassumir o seu trabalho entre os homens? De fato, precisamente ali onde ele estava e já, naquelas montanhas solitárias, esse problema forçosamente se apresentava a ele, na questão de obter comida. Ao terceiro dia das suas meditações solitárias, o corpo humano ficou faminto. Deveria ele ir à procura de comida, como qualquer homem comum iria, ou deveria ele meramente exercer os seus poderes de criação normais e produzir a nutrição adequada ao corpo e pronta e à mão? Essa grande decisão do Mestre tinha sido descrita a vós como uma tentação – como um desafio, de inimigos supostos, para que ele “comandasse que essas pedras se transformassem em pães”.

136:6:2 15181 Jesus assim estabeleceu uma outra política, também consistente, para o restante dos seus trabalhos terrenos. No que concernisse às suas necessidades pessoais e, em geral mesmo, nas suas relações com outras personalidades, ele iria, agora, deliberadamente, escolher o caminho da existência normal terrena, para seguir por ele; definitivamente decidia contra uma política que transcendesse, violasse ou ultrajasse as suas próprias leis naturais estabelecidas. Entretanto, ele não poderia prometer a si próprio, como já tinha sido advertido pelo seu Ajustador Personalizado, que essas leis naturais não fossem intensamente aceleradas, sob certas circunstâncias concebíveis. Em princípio, Jesus decidiu que o trabalho da sua vida deveria ser organizado e ter prosseguimento, de acordo com a lei natural e em harmonia com a organização social existente. O Mestre escolheu, portanto, um programa de vida que era o equivalente a decidir contra os milagres e os prodígios. Novamente ele decidiu a favor da “vontade do Pai”; novamente rendia-se, colocando tudo nas mãos do seu Pai do Paraíso.

136:6:3 15182 A natureza humana de Jesus ditou que o primeiro dever era a autopreservação; essa é a atitude normal do homem natural, nos mundos do tempo e do espaço, e é, portanto, uma reação legítima para um mortal de Urântia. Mas Jesus não estava preocupado apenas com este mundo e com as criaturas dele; ele estava vivendo uma vida destinada a instruir e inspirar as múltiplas criaturas de todo um vasto universo.

136:6:4 15183 Antes da sua iluminação batismal, ele tinha vivido em perfeita submissão à vontade e ao guiamento do seu Pai celeste. Ele decidiu enfaticamente continuar na mesma dependência, mortal e implícita, da vontade do Pai. Propôs a si próprio o caminho antinatural – decidiu não buscar a autopreservação. Escolheu continuar seguindo a política de recusar-se a defender a si próprio. E formulou as suas conclusões, sobre as palavras da escritura, conhecidas da sua mente humana: “O homem não deve viver de pão somente, mas de toda a palavra que provém da boca de Deus”. Ao chegar a essa conclusão, com relação ao apetite da natureza física, representado pela fome de comida, o Filho do Homem fez a sua declaração final a respeito de todas as urgências da carne e dos impulsos naturais da natureza humana.

136:6:5 15184 Ele poderia usar o seu poder supra-humano, possivelmente, para os outros, mas para si mesmo, nunca. E ele seguiu essa política, de modo consistente, até o fim, quando zombeteiramente foi dito sobre ele: “Ele salvou os outros; a si próprio ele não pode salvar” – porque ele não queria.

136:6:6 15185 Os judeus estavam esperando por um Messias que fizesse prodígios ainda maiores do que os de Moisés, de quem se dizia ter feito a água brotar da rocha em um local desértico e ter alimentado os seus ancestrais, com o maná, no deserto. Jesus sabia que espécie de Messias os seus compatriotas esperavam, e ele tinha todos os poderes e prerrogativas para estar à altura das mais ardentes expectativas, mas ele decidiu-se contra um programa de tanta grandiosidade de poder e glória. Jesus considerava que essa seqüência de milagres esperados seria um retrocesso aos velhos tempos de magia ignorante, quando os curadores selvagens tratavam por meio de práticas degradadas. Para a salvação das suas criaturas, talvez ele pudesse acelerar a lei natural, mas transcender as suas próprias leis, fosse para o benefício de si próprio, fosse para impressionar os seus companheiros humanos, isso ele não faria. E a decisão do Mestre foi final.

136:6:7 15186 Jesus condoía-se pelo seu povo; ele compreendia plenamente o modo como eles tinham sido levados à expectativa do Messias que viria: o tempo em que “a terra dará seus frutos por dez mil vezes, e em um vinhedo haverá mil galhos, e cada galho dará mil cachos de uvas, e cada cacho terá mil uvas e cada uva produzirá um barril de vinho”. Os judeus acreditavam que o Messias inauguraria uma era de abundância miraculosa. Os hebreus há muito vinham nutrindo tradições de milagres e de lendas prodigiosas.

136:6:8 15191 Ele não era um Messias vindo para multiplicar os pães e o vinho. Ele veio, não para ministrar diante das necessidades temporais apenas; ele veio para revelar o seu Pai nos céus, aos seus filhos na Terra, buscando unir os seus filhos terrenos a Ele, em um esforço sincero para viver de modo a cumprir a vontade do Pai nos céus.

136:6:9 15192 Com essa decisão, Jesus de Nazaré retratou, a um universo atento, a loucura e o pecado de prostituir os talentos divinos e as habilidades dadas por Deus, para o engrandecimento pessoal ou para conquistas e glorificações puramente egoístas. Esse fora o pecado de Lúcifer e de Caligástia.

136:6:10 15193 Essa grande decisão de Jesus ilustra dramaticamente a verdade de que a satisfação egoísta e a gratificação sensual, em si e por si mesmas, não são capazes de conferir felicidade aos seres humanos em evolução. Há valores mais elevados, na existência mortal – a mestria intelectual e as realizações espirituais –, que, em muito, transcendem a gratificação necessária dos apetites e instintos puramente físicos do homem. Os dons naturais, de talento e capacidade do homem, deveriam devotar-se, sobretudo, ao desenvolvimento e ao enobrecimento dos seus mais elevados poderes de mente e de espírito.

136:6:11 15194 Jesus, assim, revelou às criaturas do seu universo, a técnica do novo e do melhor caminho, os valores morais mais altos do viver e das satisfações espirituais mais profundas da existência humana evolucionária, nos mundos do espaço.

7. A TERCEIRA DECISÃO


136:7:1 15195 Havendo tomado as suas decisões sobre questões tais como o alimento e a ministração física às necessidades do seu corpo material, o cuidado com a saúde, de si próprio e dos seus companheiros; outras questões estavam ainda para ser solucionadas. Qual seria a sua atitude, quando se confrontasse com a ameaça pessoal? Ele decidiu exercer uma vigilância e tomar precauções normais, quanto à sua segurança humana, para impedir o fim da sua carreira na carne, porém decidiu abster-se de qualquer intervenção supra-humana, quando a crise da sua vida na carne chegasse. Ao formular essa decisão, Jesus estava assentado à sombra de uma árvore em uma beirada saliente de rocha, tendo um precipício bem diante de si. Compreendia totalmente que poderia jogar-se, daquela borda, para o espaço, e que nada aconteceria para machucá-lo, desde que ele contrariasse a sua primeira grande decisão de não invocar a intervenção das suas inteligências celestes, para prosseguir no trabalho da sua vida em Urântia, e que ab-rogasse a sua segunda decisão que dizia respeito à sua atitude para com a preservação da sua vida.

136:7:2 15196 Jesus sabia que os seus compatriotas estavam esperando um Messias que estivesse acima da lei natural. E a ele tinha sido ensinada aquela escritura: “Nenhum mal recairá sobre ti, nenhuma praga se aproximará da tua morada. Pois Ele colocará os Seus anjos para encarregarem-se de ti, para zelar por ti, em todos os teus caminhos. Eles te levarão, nas próprias mãos, para que os teus pés não se choquem contra a pedra”. Essa espécie de presunção, esse desafio às leis da gravidade do seu Pai, justificar-se-ia, para protegê-lo de algum possível dano, por acaso, ou para ganhar a confiança de um povo mal instruído e desorientado? Esse procedimento, por mais gratificante que fosse, para aqueles judeus que buscavam sinais, seria, no entanto, não uma revelação do seu Pai, mas uma manipulação, questionável das leis estabelecidas do universo dos universos.

136:7:3 15197 Ao compreenderdes tudo isso e ao saberdes que o Mestre recusou-se a desafiar as suas leis naturais, estabelecidas para o seu trabalho, em tudo aquilo que envolvesse a sua conduta pessoal, sabereis logo, e com toda a certeza, que ele nunca caminhou sobre as águas, nem fez qualquer outra coisa que significasse um ultraje à sua ordem material de administrar o mundo. Claro está, todavia, que deveis ter em mente, sempre, que não tinha sido encontrado nenhum meio pelo qual ele pudesse estar totalmente livre da sua falta de controle sobre o elemento do tempo, para todas as questões colocadas sob a jurisdição do Ajustador Personalizado.

136:7:4 15201 Em toda a sua vida terrena, Jesus permaneceu consistentemente leal a essa decisão. Não importava que os fariseus escarnecessem dele, para terem um sinal, nem que os espectadores, no Calvário, o desafiassem a descer da cruz, ele aderiu firmemente à decisão tomada nesse momento nas montanhas.

8. A QUARTA DECISÃO


136:8:1 15202 O próximo grande problema com o qual esse Deus-homem debateu-se, e sobre o qual ele decidiu de acordo com a vontade do Pai nos céus, foi quanto ao emprego ou não de qualquer dos seus poderes supra-humanos; se deveria empregá-los com o propósito de atrair a atenção e de ganhar a adesão dos seus companheiros humanos. Deveria, de qualquer modo, emprestar os seus poderes universais para a gratificação da ânsia dos judeus, pelo espetacular e pelo maravilhoso? Ele decidiu que não devia. Firmou-se em uma política de procedimento que eliminava todas essas práticas, como método de levar a sua missão a ser notada pelos homens. E, de modo consistente, ele viveu dentro dessa grande decisão. Mesmo quando permitiu a manifestação de inúmeras ministrações de misericórdia, que abreviavam o tempo, ele admoestava quase que invariavelmente, aqueles que recebiam as suas ministrações de cura a não dizer a nenhum homem sobre os benefícios que tinham recebido. E sempre ele recusou o desafio sarcástico dos seus inimigos de “mostrar-nos um sinal” como prova e demonstração da sua divindade.

136:8:2 15203 Jesus, muito sabiamente, previu que a operação de milagres e a execução de prodígios poderiam atrair uma lealdade apenas superficial e exterior, por intimidar a mente material; essas atuações não revelariam Deus, nem salvariam os homens. Ele recusou-se a se tornar um mero operador de prodígios. E resolveu ocupar-se de uma única tarefa – o estabelecimento do Reino do céu.

136:8:3 15204 Durante todo esse monumental diálogo de Jesus, em comunhão consigo mesmo, o elemento humano que questiona, e que quase duvida, esteve presente, pois Jesus era homem tanto quanto Deus. Estava evidente que ele não iria nunca ser recebido, pelos judeus, como o Messias, caso não fizesse prodígios. Além disso, se ele consentisse em fazer uma coisa, que fosse, não natural, a mente humana saberia, com certeza, que estava em subserviência a uma mente verdadeiramente divina. E seria isso consistente com a “vontade do Pai”; que a mente divina fizesse essa concessão à natureza duvidante da mente humana? Jesus decidiu que não e apoiou-se na presença do Ajustador Personalizado, como prova suficiente da divindade em parceria com a humanidade.

136:8:4 15205 Jesus havia viajado muito; relembrou-se de Roma, Alexandria e Damasco. Conhecia os métodos do mundo – como as pessoas atingiam as suas metas, na política e no comércio, por meio de concessões e diplomacia. Utilizaria esse conhecimento para que a sua missão na Terra avançasse? Não! E decidiu, do mesmo modo, contra todas as concessões feitas à sabedoria do mundo e à influência da riqueza, para o estabelecimento do Reino. De novo escolheu depender exclusivamente da vontade do Pai.

136:8:5 15206 Jesus estava plenamente consciente das facilidades que se abrem, para aqueles com poderes como os seus. Ele conhecia muitos modos de atrair a atenção da nação; e o mundo inteiro poderia ter as suas atenções imediatamente focalizadas sobre ele. Logo a Páscoa seria celebrada em Jerusalém; a cidade seria atropelada pelos visitantes. Ele poderia ascender aos pináculos do templo e diante da multidão desconcertada caminhar no ar; essa seria a espécie de Messias que eles estavam buscando. E ele iria desapontá-los a todos, em seguida, já que não tinha vindo para restabelecer o trono de Davi. E ele sabia da futilidade do método de Caligástia, de tentar adiantar-se ao modo natural, lento e certo, de realizar o propósito divino. De novo, o Filho do Homem inclinava-se obedientemente para o caminho do Pai, à vontade do Pai.

136:8:6 15211 Jesus escolheu estabelecer o Reino do céu, nos corações da humanidade, pelos métodos naturais, comuns, difíceis e cheios de provações; exatamente aqueles procedimentos que as suas criaturas terrenas deveriam adotar, subseqüentemente, no seu trabalho de ampliar e estender este Reino do céu. Pois, o Filho do Homem, sabia muito bem que seria “através de muita atribulação, que muitos filhos de todas as épocas entrariam no Reino”. Jesus estava agora passando pelo grande teste do homem civilizado, o de ter o poder e de firmemente recusar-se a usá-lo, para propósitos puramente egoístas ou pessoais.

136:8:7 15212 Nas vossas considerações sobre a vida e a experiência do Filho do Homem, deveríeis sempre ter em mente que o Filho de Deus estava encarnado na mente de um ser humano do primeiro século, não na mente de um mortal do século vinte ou de qualquer outro século. Com isso temos a intenção de transmitir a idéia de que os dons humanos de Jesus eram os de aquisição natural. Ele era o produto dos fatores da hereditariedade e do meio ambiente do seu tempo, acrescentados da influência da sua instrução e da sua educação. A sua humanidade era genuína, natural, integralmente derivada e fomentada pelos antecedentes das condições reais do status intelectual, social e econômico daqueles dias e daquela geração. Se bem que houvesse sempre, na experiência desse Deus-homem, a possibilidade de que a mente divina transcendesse o intelecto humano, entretanto, quando a sua mente humana funcionava como tal, ela o fazia como uma verdadeira mente mortal o faria, sob as condições do ambiente humano daquela época.

136:8:8 15213 Jesus descortinou para todos os mundos do seu imenso universo a loucura que é criar situações artificiais, com o fito de exibir autoridade arbitrária, ou de permitir a si um poder excepcional no propósito de exaltar valores morais ou de acelerar o progresso espiritual. Jesus decidiu que, na sua missão na Terra, não se prestaria a repetir os desapontamentos do reino dos Macabeus. Ele recusou-se a prostituir os seus atributos divinos, para o propósito de conseguir uma popularidade imerecida ou para ganhar prestígio político. Ele não iria aprovar a transmutação da energia divina e criativa, em poder nacional ou em prestígio internacional. Jesus de Nazaré recusou a comprometer-se com o mal, e menos ainda a consorciar-se com o pecado. O Mestre pôs, triunfalmente, a lealdade à vontade do seu Pai acima de qualquer consideração terrena ou temporal.

9. A QUINTA DECISÃO


136:9:1 15214 Tendo estabelecido essas questões da política, no que eram pertinentes às suas relações individuais, com a lei natural e o poder espiritual, voltou a sua atenção para a escolha dos métodos a serem empregados na proclamação e no estabelecimento do Reino de Deus. João tinha já começado o seu trabalho; como poderia ele continuar a mensagem? Como deveria retomar a missão de João? Como deveria ele organizar os seus seguidores, em um esforço efetivo e em uma cooperação inteligente? Jesus estava agora chegando à decisão final que iria proibir que se considerasse a si próprio como o Messias judeu, ao menos como era popularmente concebido, o Messias, naqueles dias.

136:9:2 15221 Os judeus visualizavam um libertador que viria com um poder miraculoso, para pôr abaixo os inimigos de Israel e estabelecer os judeus como os governantes do mundo, livres de privações e de opressão. Jesus sabia que essa esperança nunca se realizaria. Ele sabia que o Reino do céu tinha a ver com a derrocada do mal nos corações dos homens, e que era uma questão de interesse puramente espiritual. Ele pensou sobre a conveniência de inaugurar o Reino espiritual com uma demonstração brilhante e deslumbrante de poder – e esse caminho teria sido permissível e totalmente dentro da jurisdição de Michael –, mas ele decidiu totalmente contra um plano assim. Ele não faria concessões às técnicas revolucionárias de Caligástia. Ele havia conquistado potencialmente o mundo pela submissão à vontade do Pai, e propunha-se a terminar o seu trabalho como ele o havia começado, e como Filho do Homem.

136:9:3 15222 Dificilmente podeis imaginar o que teria acontecido em Urântia, tivesse esse Deus-homem, agora na posse potencial de todo o poder nos céus e na Terra, decidido-se a desfraldar o estandarte da soberania e a invocar os batalhões na formação e militância da execução de maravilhas! Todavia, ele não faria tais concessões. Não serviria ao mal para que a adoração a Deus viesse presumivelmente como derivada disso. Ele conformar-se-ia segundo a vontade de Deus. Ele iria proclamar a um universo de olhos abertos sobre ele: “Vós ireis adorar o Senhor vosso Deus e a Ele apenas devereis servir”.

136:9:4 15223 Com o passar dos dias, Jesus percebeu com clareza crescente que espécie de revelador da verdade ele se tornaria. Discernia que o caminho de Deus não seria o caminho mais fácil. Começou a compreender que o cálice do remanescente da sua experiência humana pudesse possivelmente ser amargo, mas decidiu-se a beber dele.

136:9:5 15224 Mesmo a sua mente humana está despedindo-se do trono de Davi. Passo a passo essa mente humana prossegue no caminho do divino. A mente humana ainda faz perguntas, mas aceita infalivelmente as respostas divinas como direções finais nesta vida combinada de homem no mundo submetendo-se todo o tempo irrestritamente a fazer a vontade divina e eterna do Pai.

136:9:6 15225 Roma era a dona do mundo ocidental. O Filho do Homem, agora em isolamento e tomando essas decisões memoráveis, com as hostes dos céus sob seu comando, representava a última oportunidade dos judeus de alcançar o domínio do mundo; mas esse judeu nascido na Terra, que possuía uma sabedoria e um poder tão extraordinários, declinou usar os seus dons universais, fosse para o engrandecimento de si próprio, fosse para levar o seu povo ao trono. Ele viu, como eram, “os reinos deste mundo”, e possuía o poder para tomá-los. Os Altíssimos de Edêntia tinham colocado todos esses poderes nas suas mãos, mas ele não os queria. Os reinos da Terra eram coisas vis para interessarem ao Criador e Governante de um universo. Ele tinha apenas um objetivo, a continuidade da revelação de Deus ao homem, o estabelecimento do Reino, o governo do Pai celeste nos corações da humanidade.

136:9:7 15226 A idéia de batalha, de contenda e de massacres era repugnante para Jesus; ele não queria nada daquilo. Ele apareceria na Terra como o Príncipe da Paz, revelando um Deus de amor. Antes do seu batismo, de novo, ele tinha recusado a oferta dos zelotes de liderá-los em rebelião contra os opressores romanos. E agora ele tomava a sua decisão final a respeito daquelas escrituras que a sua mãe lhe havia ensinado, tais como: “O Senhor disse a mim: ‘Tu és o meu Filho; nesse dia Eu o concebi. Peça a mim e dar-te-ei os pagãos como herança e os confins da Terra para a tua posse. Tu irás quebrá-los com uma vara de ferro; tu irás fazê-los em pedaços como a um pote de cerâmica’ ”.

136:9:8 15227 Jesus de Nazaré chegou à conclusão de que esse modo de falar não se referia a ele. Afinal, e definitivamente, a mente humana do Filho do Homem fez uma limpeza em todas essas contradições e dificuldades messiânicas – as escrituras hebraicas, a educação dos pais e a do chazam, as expectativas judaicas e os desejos da ambição humana; e para sempre decidiu sobre o curso da sua obra. Retornaria à Galiléia e tranqüilamente começaria a proclamação do Reino e confiaria ao seu Pai (o Ajustador Personalizado) o trabalho dos detalhes do procedimento no dia a dia.

136:9:9 15231 Por meio dessas decisões, Jesus deu um exemplo digno para todas as pessoas em todos os mundos, em todo o seu vasto universo, quando ele recusou-se a dar provas materiais para questões espirituais, quando ele recusou-se a desafiar, com presunção, as leis naturais. E estabeleceu um exemplo inspirador de lealdade ao universo e de nobreza moral quando se recusou a se apegar ao poder temporal como prelúdio de glória espiritual.

136:9:10 15232 Se o Filho do Homem tinha quaisquer dúvidas sobre a sua missão e a natureza dela, quando subiu as colinas depois do seu batismo; nenhuma mais ele mantinha, quando desceu de volta para os seus companheiros, depois dos quarenta dias de isolamento e decisões.

136:9:11 15233 Jesus tinha formulado um programa para o estabelecimento do Reino do seu Pai. Ele não cuidará das gratificações físicas do povo. Não negociará o pão com as multidões como tinha visto muito recentemente ser feito em Roma. Não atrairá a atenção sobre si próprio por meio de fazer coisas prodigiosas, ainda que os judeus estejam esperando exatamente esse tipo de libertador. Nem procurará ganhar aceitação para a mensagem espiritual por meio de uma exibição de autoridade política ou de poder temporal.

136:9:12 15234 Ao rejeitar esses métodos de enaltecer o Reino vindouro aos olhos dos judeus expectantes, Jesus assegurou-se de que esses mesmos judeus iriam certa e finalmente rejeitar todos os seus clamores de autoridade e de divindade. Sabendo de tudo isso, Jesus, muito fez para prevenir os seus primeiros seguidores de aludir a ele como sendo o Messias.

136:9:13 15235 Em toda a sua ministração pública ele confrontou-se com a necessidade de lidar com três situações constantemente recorrentes: o pedido dos famintos de serem alimentados, a insistência a respeitos dos milagres e o pedido final que permitisse aos seus seguidores coroá-lo como rei. Jesus nunca se desviou, contudo, das decisões que tomou durante aqueles dias do seu isolamento nas colinas pereianas.

10. A SEXTA DECISÃO


136:10:1 15236 No último dia do seu isolamento memorável, antes de partir montanha abaixo para juntar-se a João e aos seus discípulos, o Filho do Homem tomou a sua decisão final. E tal decisão ele comunicou ao Ajustador Personalizado com estas palavras: “E para todas as outras questões, assim como para aquelas já registradas, prometo a ti que estarei submisso à vontade do meu Pai”. E quando assim tinha acabado de falar, tomou o caminho da descida da montanha. E a sua face resplandeceu com a glória da vitória espiritual e do cumprimento moral.

DOCUMENTO 137

O TEMPO DE ESPERA NA GALILÉIA
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Cedo pela manhã, no sábado, 23 de fevereiro do ano 26 d. C. , Jesus desceu das colinas para juntar-se à companhia de João, acampado em Pela. Durante todo aquele dia, Jesus misturou-se à multidão. Cuidou de um menino que se tinha ferido em uma queda e viajou para um lugarejo vizinho de Pela, para entregar a criança com segurança nas mãos dos pais dela.

1. A ESCOLHA DOS QUATRO PRIMEIROS APÓSTOLOS


137:1:1 15242 Durante esse sábado, dois dos principais discípulos de João passaram muito tempo com Jesus. De todos os seguidores de João, um, que se chamava André, era o mais profundamente impressionado com Jesus e o acompanhou na viagem a Pela, com o menino ferido. No caminho de volta, ao encontro de João, ele fez muitas perguntas a Jesus e, pouco antes de chegarem ao seu destino, eles pararam para uma pequena conversa, durante a qual André disse: “Eu tenho-te observado desde que tu vieste para Cafarnaum, e acredito que sejas o novo Mestre e, mesmo não entendendo todos os teus ensinamentos, eu me decidi inteiramente por seguir-te; eu me assentaria aos teus pés para aprender toda a verdade sobre o novo Reino”. E, com uma segurança sincera, Jesus deu as boas vindas a André como o primeiro dos seus apóstolos, daquele grupo de doze que devia trabalhar com ele, na tarefa de estabelecer o novo Reino de Deus nos corações dos homens.

137:1:2 15243 André vinha observando silenciosamente o trabalho de João e acreditava sinceramente nele; e tinha um irmão muito capaz e entusiasta, chamado Simão, que era um dos discípulos principais de João. Em verdade não seria um engano dizer que Simão era um dos principais esteios de João.

137:1:3 15244 Logo que Jesus e André voltaram para o campo, André procurou Simão, o seu irmão e, levando-o para um lado, informou-lhe estar convencido de que Jesus era o grande Mestre, e que se havia engajado como discípulo. André disse que Jesus tinha aceitado a sua oferta de serviço e sugeriu também a ele (Simão) que fosse até Jesus oferecer-se para irmanar-se no serviço do novo Reino. Simão disse: “Desde que esse homem veio trabalhar na oficina de Zebedeu, que eu sempre acreditei que ele fosse enviado por Deus, mas e João? Vamos abandoná-lo? Seria a coisa certa a fazer?” E então eles concordaram em ir imediatamente consultar João. João ficou entristecido com o pensamento de perder dois dos seus conselheiros mais capazes e dois promissores discípulos, mas bravamente respondeu às perguntas deles, dizendo: “Isso não é senão o começo; logo o meu trabalho terminará e todos nós nos tornaremos discípulos dele”. E então André acenou a Jesus para que se aproximasse, enquanto ele anunciava que o seu irmão desejava aderir ao serviço do novo Reino. E, dando as boas vindas a Simão como o seu segundo apóstolo, Jesus disse: “Simão, o teu entusiasmo é louvável, mas é perigoso para o trabalho do Reino. Aconselho-te a pensar mais antes de dizer algo. Eu mudaria o teu nome para Pedro”.

137:1:4 15251 Os pais do garoto ferido, que viviam em Pela, tinham convidado Jesus para que passasse a noite com eles e que fizesse daquele o seu lar, e ele prometeu que sim. Antes de deixar André e o seu irmão, Jesus disse: “Bem cedo, amanhã pela manhã, iremos à Galiléia”.

137:1:5 15252 Depois que Jesus tinha voltado a Pela, para passar a noite, e enquanto André e Simão estavam ainda discutindo sobre a natureza do seu serviço no estabelecimento do Reino que viria, Tiago e João, os filhos de Zebedeu, acabavam de chegar da sua longa e inútil procura por Jesus nas colinas. Quando ouviram Simão Pedro contar como ele e seu irmão, André, tinham tornado-se os primeiros conselheiros aceitos do novo Reino e que eles estavam para ir, com o seu novo Mestre, no dia seguinte bem cedo, para a Galiléia, Tiago e João, ambos, ficaram tristes. Eles tinham conhecido Jesus já há algum tempo e o amavam. Tinham procurado por ele durante muitos dias nas colinas e, agora que retornavam, ficavam sabendo que outros tinham sido preferidos antes deles. Perguntaram onde Jesus tinha ido e apressaram-se para encontrá-lo.

137:1:6 15253 Jesus estava adormecido quando eles chegaram na casa, mas acordaram-no dizendo: “Como é que, enquanto nós, que por tanto tempo vivemos contigo, estávamos procurando por ti nas colinas, tu preferiste outros antes de nós e escolheste André e Simão como teus primeiros colaboradores no novo Reino?” Jesus respondeu a eles: “Acalmai os vossos corações e perguntai a vós próprios: ‘quem mandou que procurásseis pelo Filho do Homem, quando ele estava tratando dos assuntos do seu Pai?’ ” Depois de terem contado, com detalhes, a sua longa busca nas montanhas, Jesus continuou ainda a sua instrução: “Vós devíeis aprender a procurar o segredo do novo Reino nos vossos próprios corações e não nas montanhas. O que vós estáveis procurando, achava-se já presente nas vossas almas. Sois de fato meus irmãos – e não necessitáveis ser recebidos por mim –, já éreis do Reino e devíeis ficar animados, aprontando-vos para também ir conosco amanhã até a Galiléia”. João, então, ousou perguntar, “Mas, Mestre, Tiago e eu seremos agregados teus no novo Reino, do mesmo modo que André e Simão?” E Jesus, colocando uma das mãos no ombro de cada um deles, disse: “Meus irmãos, vós já estivestes comigo no espírito do Reino, antes mesmo de os outros solicitarem ser recebidos. Vós, irmãos meus, não tendes necessidade de pedir para entrar no Reino; vós tendes estado comigo no Reino, desde o princípio. Perante os homens, outros poderão ter tido precedência sobre vós, mas também no meu coração eu já vos coloquei nos conselhos do Reino, antes mesmo de que tivésseis pensado em fazer esse pedido a mim. E mesmo assim poderíeis ter sido os primeiros, perante os homens, não tivésseis estado ausentes em uma tarefa bem intencionada, mas imposta por vós próprios, de procurar por alguém que não estava perdido. No Reino que está por vir, não vos deveis ocupar daquelas coisas que alimentam a vossa ansiedade, mas sim e todo o tempo ocupai-vos apenas em fazer a vontade do Pai que está nos céus”.

137:1:7 15254 Tiago e João receberam a reprimenda de bom grado; nunca mais foram invejosos de André e Simão. E se prepararam, junto com os seus dois companheiros apóstolos, a fim de partir para a Galiléia na manhã seguinte. Desse dia em diante, o termo apóstolo foi empregado para distinguir a família escolhida dos conselheiros de Jesus, da imensa multidão de discípulos crentes que iria segui-lo posteriormente.

137:1:8 15255 Tarde naquela noite, Tiago, João, André e Simão mantiveram uma conversa com João Batista e, com lágrimas nos olhos, mas a voz firme, o valente profeta judeu entregou dois dos seus discípulos principais para que se tornassem apóstolos do Príncipe Galileu do Reino que estava para vir.

2. A ESCOLHA DE FILIPE E NATANAEL


137:2:1 15261 No domingo de manhã, 24 de fevereiro do ano 26 d. C. , Jesus deixou João Batista no rio, próximo de Pela, para nunca mais vê-lo na carne.

137:2:2 15262 Naquele dia, como Jesus e os seus quatro discípulos-apóstolos partiam para a Galiléia, houve um grande tumulto no acampamento dos seguidores de João. A primeira grande divisão estava para acontecer. No dia anterior, João tinha feito o seu pronunciamento positivo a André e a Ezdras, de que Jesus era o Libertador. André decidiu seguir Jesus, mas Ezdras rejeitou aquele carpinteiro de maneiras suaves de Nazaré, proclamando aos seus companheiros: “O profeta Daniel declara que o Filho do Homem virá, com as nuvens dos céus, em poder e em grande glória. Esse carpinteiro da Galiléia, esse construtor de barcos de Cafarnaum, não pode ser o Libertador. Pode vir de Nazaré, uma tal dádiva de Deus? Esse Jesus é um parente de João e, por excesso de bondade de coração, o nosso instrutor enganou-se. Que permaneçamos afastados desse falso Messias”. Quando João fez uma reprimenda a Ezdras por essas afirmações, este se separou levando muitos discípulos e dirigindo-se para o sul. E esse grupo continuou a batizar em nome de João e finalmente fundou a seita daqueles que acreditavam em João, mas que se recusavam a aceitar Jesus. Um remanescente desse grupo sobrevive na Mesopotâmia até os dias atuais.

137:2:3 15263 Enquanto esse problema fermentava entre os seguidores de João, Jesus e os seus quatro discípulos-apóstolos adiantavam-se no seu caminho para a Galiléia. Antes de atravessarem o Jordão, para ir a Nazaré pelo caminho de Naim, Jesus, olhando para frente, estrada acima, viu um tal de Filipe de Betsaida, que vinha na direção deles, com um amigo. Jesus tinha conhecido Filipe há algum tempo, ele era também muito conhecido de todos os quatro novos apóstolos. Ele estava, com o seu amigo Natanael, a caminho de visitar João, em Pela, para aprender mais sobre a comentada vinda do Reino de Deus, e ficou encantado de saudar Jesus. Filipe tinha sido um admirador de Jesus desde que este veio a Cafarnaum pela primeira vez. Mas Natanael, que vivia em Caná, na Galiléia, não conhecia Jesus. Filipe adiantou-se para saudar os seus amigos, enquanto Natanael permaneceu à sombra de uma árvore à beira da estrada.

137:2:4 15264 Pedro levou Filipe para um lado e começou a explicar, referindo-se a si próprio, a André, a Tiago e a João, que todos eles tinham transformado-se em seguidores de Jesus, no novo Reino, e insistiu veementemente para que Filipe também fosse um voluntário desse serviço. Filipe ficou em um dilema. O que deveria fazer? Aqui, de repente – em uma beira de estrada, perto do Jordão –, aqui, punha-se ele diante de uma decisão imediata, sobre a mais importante questão de uma vida. Logo estaria ele em uma conversa sincera com Pedro, André e João, enquanto Jesus delineava para Tiago a viagem através da Galiléia e para Cafarnaum. Finalmente, André sugeriu a Filipe: “Por que não perguntar ao Mestre?”

137:2:5 15265 Subitamente Filipe se deu conta de que Jesus era realmente um grande homem, possivelmente o Messias, e decidiu acatar a decisão de Jesus nessa questão; e foi diretamente a ele, e perguntou: “Mestre, devo ir até João ou juntar-me aos meus amigos que te seguem?” E Jesus respondeu, “Siga-me”. Filipe ficou emocionado com a certeza de haver encontrado o Libertador.

137:2:6 15266 Filipe agora acenava ao grupo, para que esperassem onde estavam, enquanto ele voltou correndo para anunciar a nova da sua decisão ao seu amigo Natanael, que ainda ficara para trás, sob a amoreira, refletindo sobre as muitas coisas que ele tinha ouvido a respeito de João Batista, sobre o reino que viria, e do Messias esperado. Filipe interrompeu essas meditações, exclamando: “Eu encontrei o Libertador, aquele sobre quem Moisés e os profetas escreveram, e a quem João tem proclamado”. Natanael, levantando os olhos, inquiriu: “De onde vem esse mestre?” E Filipe respondeu: “Ele é Jesus de Nazaré, filho de José, o carpinteiro, mais recentemente residindo em Cafarnaum”. E então, um tanto chocado, Natanael perguntou: “Uma coisa boa assim pode vir de Nazaré?” Mas Filipe, tomando-o pelo braço, disse: “Venha e veja”.

137:2:7 15271 Filipe levou Natanael a Jesus, que, olhando benignamente no rosto do homem sincero que duvidava, disse: “Eis um israelita genuíno, para quem não há engano. Siga-me”. E Natanael, voltando-se para Filipe, disse: “Tu estás certo. Ele é de fato um mestre dos homens. Eu também o seguirei, se for digno disso”. E Jesus fez um gesto afirmativo a Natanael, dizendo de novo: “Siga-me”.

137:2:8 15272 Jesus tinha agora reunido a metade do seu futuro corpo de colaboradores íntimos, cinco que já o tinham conhecido há algum tempo e um estranho, Natanael. Sem mais demora atravessaram o Jordão e, passando pela aldeia de Naim, chegaram a Nazaré tarde naquela noite.

137:2:9 15273 Todos passaram a noite com José, na casa da infância de Jesus. Os companheiros de Jesus pouco entenderam por que o seu recém encontrado Mestre estava tão preocupado em destruir completamente cada vestígio dos seus escritos que ainda permaneciam pela casa na forma dos Dez Mandamentos e outras frases e preceitos. Esse procedimento, no entanto, junto com o fato de que eles nunca mais o tinham visto escrevendo depois disso – exceto no pó ou na areia –, causou uma profunda impressão nas suas mentes.

3. A VISITA A CAFARNAUM


137:3:1 15274 No dia seguinte Jesus enviou os seus apóstolos para Caná, já que todos eles tinham sido convidados para as bodas de uma donzela proeminente daquela cidade, enquanto ele se preparava para fazer uma rápida visita à sua mãe, em Cafarnaum, parando em Magdala para ver o seu irmão Judá.

137:3:2 15275 Antes de deixar Nazaré, os novos seguidores de Jesus contaram a José e a outros membros da família de Jesus sobre os maravilhosos acontecimentos recentes e deram livre expressão às suas crenças de que Jesus era o libertador, há muito esperado. E esses membros da família de Jesus conversaram sobre a questão, e José disse: “Talvez, afinal, a nossa mãe tivesse razão – pode ser que o nosso estranho irmão seja o rei que virá”.

137:3:3 15276 Judá tinha estado presente ao batismo de Jesus e, com o seu irmão Tiago, passou a acreditar firmemente na missão de Jesus na Terra. Se bem que, tanto Tiago quanto Judá, estivessem ambos muito perplexos quanto à natureza da missão do seu irmão, a mãe deles tinha feito renascer as suas primeiras esperanças em Jesus como o Messias, o Filho de Davi, e ela encorajou os seus filhos a ter fé no seu irmão como o libertador de Israel.

137:3:4 15277 Jesus chegou em Cafarnaum na segunda-feira à noite, mas não foi para a sua própria casa, onde viviam Tiago e a sua mãe; ele foi diretamente para a casa de Zebedeu. Todos os seus amigos em Cafarnaum perceberam uma grande e agradável mudança nele. Uma vez mais parecia estar relativamente alegre e mais parecido consigo próprio, como ele era durante os seus primeiros dias em Nazaré. Durante anos, antes do período do seu batismo e do isolamento, um pouco antes e um pouco depois, ele ficara mais reservado e contido. Agora, para todos, ele parecia exatamente como era antes. Havia nele algo de importância majestática e de aspecto elevado, mas de novo ele encontrava-se de coração leve e cheio de alegria.

137:3:5 15281 Maria estava emocionada com a expectativa. Ela sentia em antecipação que a promessa de Gabriel estava próxima de cumprir-se. Esperava que toda a Palestina logo ficasse surpreendida e assombrada com a revelação miraculosa do seu filho como o rei sobrenatural dos judeus. Mas às muitas perguntas que lhe faziam sua mãe, Tiago, Judas e Zebedeu, Jesus apenas retorquia a todas elas sorrindo: “É melhor que eu fique um pouco por aqui; eu devo cumprir a vontade do meu Pai, que está nos céus”.

137:3:6 15282 No dia seguinte, terça-feira, eles viajaram todos para Caná, para o casamento de Naomi, que iria acontecer no dia seguinte. E, apesar dos repetidos avisos de Jesus para que não dissessem nada a ninguém sobre ele, “até que venha a hora do Pai”, eles insistiram em espalhar a todos, discretamente, as novas de que eles tinham encontrado o Libertador. Cada um deles confiantemente esperava que Jesus assumisse logo a sua autoridade messiânica já naquelas bodas de Caná, e que ele o fizesse com um grande poder e grandeza sublime. Eles lembravam-se do que lhes tinha sido dito sobre os fenômenos ocorridos no seu batismo, e acreditaram que o seu futuro caminho na Terra seria marcado por manifestações crescentes de maravilhas sobrenaturais e de demonstrações miraculosas. E, desse modo, toda região estava preparando-se para reunir-se em Caná por causa da festa de casamento de Naomi e Johab, o filho de Natam.

137:3:7 15283 Havia anos que Maria não tinha estado tão contente. Ela viajou a Caná com o espírito de uma rainha-mãe a caminho de presenciar a coroação do seu filho. Desde que Jesus tinha feito treze anos que a sua família e os amigos não o viam tão despreocupado e feliz, tão cheio de consideração e de compreensão com os pedidos e os desejos dos seus companheiros, e compassivo de um modo tão tocante. E então todos sussurraram entre si, em pequenos grupos, perguntando-se sobre o que iria acontecer. O que essa estranha pessoa faria em seguida? Como iria ele anunciar a glória do Reino vindouro? E estavam todos emocionados com o pensamento de que estariam presentes e de que deveriam estar presentes para ver a revelação do poder e do potencial do Deus de Israel.

4. O MATRIMÔNIO DE CANÁ


137:4:1 15284 Na quarta-feira, por volta do meio-dia, quase mil convidados tinham chegado em Caná, mais de quatro vezes o número dos convidados listados para a festa de casamento. Era um costume judaico celebrar os matrimônios às quartas-feiras, e os convites tinham sido enviados com um mês de antecedência. No final da manhã e nas primeiras horas da tardinha parecia mais como uma recepção pública para Jesus do que um casamento. Todos queriam cumprimentar esse galileu tão próximo da fama, e ele estava sendo bastante cordial para com todos, jovens e velhos, judeus e gentios. E todos se regozijaram quando Jesus consentiu em liderar a procissão que antecede ao casamento.

137:4:2 15285 Jesus estava agora cuidadosamente consciente a respeito da sua existência humana, da sua preexistência divina, e do status das suas naturezas, a humana e a divina, combinadas, ou fusionadas. Com um equilíbrio perfeito, ele podia, em um momento, fazer o seu papel humano e assumir imediatamente as prerrogativas da personalidade de natureza divina.

137:4:3 15286 À medida que o dia passava, Jesus tornava-se crescentemente consciente de que o povo estava esperando que ele fizesse alguma coisa prodigiosa; e mais especialmente ele reconhecia que a sua família e os seus seis discípulos-apóstolos aguardavam que ele anunciasse apropriadamente o seu Reino vindouro por meio de alguma manifestação surpreendente e sobrenatural.

137:4:4 15291 No princípio da tarde Maria chamou Tiago e, juntos, eles atreveram-se a abordar Jesus para perguntar-lhe se ele admitiria confiar neles a ponto de informar-lhes a que horas, e em que momento das cerimônias do casamento, ele tinha planejado manifestar-se, como aquele que é “sobrenatural”. Tão logo acabaram de falar dessas questões a Jesus, perceberam que tinham despertado a sua indignação característica. Ele disse apenas: “Se me amais, então estejais dispostos a permanecer comigo, enquanto espero pela vontade do meu Pai que está nos céus”. A eloqüência da sua reprovação, contudo, estava na expressão do seu rosto.

137:4:5 15292 Essa atitude da sua mãe era um grande desapontamento para o Jesus humano, e a sua própria reação para com ela deixou-o ainda mais grave, pela proposta sugestiva de que ele permitisse a si próprio alguma demonstração externa da sua divindade. Essa era precisamente uma das coisas que ele havia decido não fazer, quando recentemente estivera isolado nas colinas. Por muitas horas, Maria esteve bastante deprimida. Ela disse a Tiago: “Eu não consigo compreendê-lo; o que tudo isso pode significar? Não terá fim essa conduta estranha da sua parte?” Tiago e Judá tentaram confortar a mãe, enquanto Jesus retirou-se para uma solidão de uma hora. Todavia, ele retornou à reunião e, uma vez mais, estava leve e cheio de alegria.

137:4:6 15293 O casamento prosseguiu com um silêncio de expectativa; e toda a cerimônia terminou, e não houve nenhum gesto, nenhuma palavra do convidado de honra. Então foi sussurrado que o carpinteiro e construtor de barcos, anunciado por João como “o Libertador”, iria mostrar a sua força durante as festividades da noite, talvez na ceia das bodas. Entretanto, toda a expectativa de uma tal demonstração ficou efetivamente anulada nas mentes dos seus seis discípulos-apóstolos, quando ele os reuniu, um pouco antes da ceia do casamento, e com grande sinceridade disse: “Não creiais que vim a este lugar para realizar algo de prodigioso, para a gratificação dos curiosos ou para a convicção dos que duvidam. Estamos aqui mais para esperar, aguardando pela vontade do nosso Pai que está nos céus”. No entanto, quando Maria e os outros o viram em consulta com os seus companheiros, ficaram totalmente persuadidos, nas suas próprias mentes, de que algo de extraordinário estava para acontecer. E todos eles assentaram-se para desfrutar da ceia de casamento e da noite de bom e festivo companheirismo.

137:4:7 15294 O pai do noivo tinha provido suficientemente de bastante vinho para todos os convidados listados para a festa do casamento, mas como poderia imaginar que o casamento do seu filho iria transformar-se em um evento tão intimamente ligado à esperada manifestação de Jesus como o libertador messiânico? Ele estava encantado de ter a honra de poder contar com o célebre galileu entre os seus convidados, mas, antes que a ceia do casamento tivesse terminado, os serviçais trouxeram a ele a notícia desconcertante de que estava faltando vinho. No momento em que a ceia formal tinha acabado e os convivas estavam perambulando no jardim, a mãe do noivo confidenciou a Maria que o suprimento de vinho tinha acabado. E Maria confiantemente disse: “Não te preocupes – vou falar com o meu filho. Ele vai ajudar-nos”. E assim ela ousou falar-lhe, apesar da reprovação de poucas horas antes.

137:4:8 15295 Durante um período de muitos anos, Maria sempre se voltara a Jesus para pedir-lhe ajuda em cada crise da vida de seu lar, em Nazaré, e por isso era tão natural para ela pensar nele nesse momento. Essa mãe ambiciosa, entretanto, tinha ainda outros motivos para apelar ao seu filho mais velho nessa ocasião. Jesus estava sozinho, em um canto do jardim, e sua mãe aproximou-se dele dizendo: “Meu filho, eles não têm mais vinho”. E Jesus respondeu: “Minha boa mulher, o que tenho eu a ver com isso?” E Maria disse: “Mas eu acredito que tua hora é chegada; não podes ajudar-nos?” Jesus replicou: “De novo eu declaro que não vim para fazer nada nesse sentido. Por que me perturbas de novo com essas questões?” E então, desmanchando-se em lágrimas, Maria suplicou a ele: “Mas, meu filho, eu prometi a eles que tu irias ajudar-nos; por favor, faz alguma coisa por mim?” E então Jesus falou: “Mulher, por que tinhas de fazer tais promessas? Que não as faças de novo. Em todas as coisas devemos aguardar a vontade do Pai nos céus”.

137:4:9 15301 Maria, a mãe de Jesus, ficou abatida; estava atordoada! Enquanto ela permanecia ali, imóvel diante dele, com as lágrimas caindo em seu rosto, o coração humano de Jesus tinha sido dominado de compaixão pela mulher que o tinha concebido na carne; e, inclinando-se para frente, ele colocou a sua mão ternamente na cabeça dela, dizendo: “Espere, espere, Mãe Maria, não lamentes pelas minhas palavras aparentemente duras, pois eu já não te disse muitas vezes que eu vim apenas para cumprir a vontade do Pai celeste? Eu faria de bom grado o que me pediste, se fosse uma parte da vontade do Pai” – e Jesus logo parou, hesitando. Maria pareceu sentir que alguma coisa estava acontecendo. Num pulo, ela jogou os braços em volta do pescoço de Jesus, beijou-o e correu para a sala dos serviçais, dizendo: “O que quer que meu filho tenha dito, façam-no”. Mas Jesus não tinha dito nada. Ele agora compreendia que tinha já dito demais – ou melhor, que tinha imaginado, desejando –, por demais.

137:4:10 15302 Maria dançava de júbilo. Ela não sabia como o vinho seria produzido, mas confiante acreditava que finalmente tinha persuadido o seu primeiro filho a afirmar a sua autoridade, a ousar dar um passo adiante e reivindicar a sua posição, e a exibir o seu poder messiânico. E, por causa da presença e da coligação de certos poderes e personalidades do universo, das quais todos os presentes ignoravam totalmente, ela não ficaria decepcionada. O vinho, que Maria desejara e que Jesus, o Deus-homem fez, humana e compassivamente, por aspirar, estava sendo produzido.

137:4:11 15303 À mão estavam seis grandes potes de pedra, cheios de água, em cada um cabendo quase oitenta litros. Essa água estava ali para ser usada nas cerimônias da purificação final da celebração do casamento. A agitação dos serviçais por causa desses vasos imensos de pedra, sob o comando ativo da sua mãe, atraiu a atenção de Jesus que, indo até lá, observou que eles estavam tirando vinho delas, com jarras repletas.

137:4:12 15304 Gradativamente Jesus tomava consciência do que acontecera. De todos aqueles, que estavam presentes à festa de casamento de Caná, Jesus era o mais surpreso. Os outros tinham aguardado que fizesse algo prodigioso, mas isso era exatamente o que ele tinha como propósito não fazer. E então, o Filho do Homem lembrou-se da advertência que o seu Ajustador Personalizado do Pensamento lhe tinha feito nas colinas. Ele lembrou-se de como o Ajustador o tinha prevenido sobre a incapacidade, que qualquer poder ou personalidade tinha, de privá-lo das suas prerrogativas de criador, na independência do tempo. Nessa ocasião, os transformadores do poder, os seres intermediários e todas as outras personalidades imprescindíveis estavam reunidos perto da água e de outros elementos necessários e, em presença do desejo expresso do Soberano Criador do Universo, não havia como evitar o aparecimento instantâneo do vinho. E essa ocorrência fez-se duplamente certa, pois o Ajustador Personalizado tinha sinalizado que a execução do desejo do Filho não era em nada uma contravenção à vontade do Pai.

137:4:13 15305 Mas isso, em nenhum sentido, era um milagre. Nenhuma lei da natureza foi modificada, ab-rogada ou mesmo transcendida. Nada aconteceu a não ser uma ab-rogação do tempo, em ligação com a reunião celeste dos elementos químicos necessários à elaboração do vinho. Em Caná, nessa ocasião, os agentes do Criador fizeram o vinho, exatamente pelo modo como é feito comumente, pelo processo natural, exceto que eles o fizeram independentemente do tempo, e com a intervenção de agências supra-humanas para reunir, do espaço, os elementos químicos necessários.

137:4:14 15311 Ademais estava evidente que a realização desse chamado milagre não era contrária à vontade do Pai do Paraíso, ou então não teria acontecido, posto que Jesus se submetia a si próprio, para todas as coisas, à vontade do Pai.

137:4:15 15312 Quando os serviçais tiraram esse novo vinho e o levaram ao padrinho, o “mestre-de-cerimônias”, ele o provou e chamou o noivo dizendo: “O costume é servir primeiro o melhor vinho, e, depois, quando os convidados já tiverem bebido o bastante, oferecer o vinho do fruto inferior; mas tu seguraste o melhor dos vinhos para o fim da festa”.

137:4:16 15313 Maria e os discípulos de Jesus estavam grandemente jubilosos com o suposto milagre, pois pensavam que Jesus o tinha executado intencionalmente, mas Jesus retirara-se para um canto abrigado do jardim e entrou em pensamento sério, por uns poucos breves momentos. Ele tinha finalmente decidido que o episódio acontecera fora do seu controle pessoal, dadas as circunstâncias, e, não sendo adverso à vontade do seu Pai, tinha sido inevitável. Quando ele retornou ao povo, foi olhado com temor; eles todos acreditaram nele como sendo o Messias. Contudo, Jesus estava dolorosamente perplexo, sabendo que eles acreditaram nele apenas por causa da ocorrência inusitada que tinham inadvertidamente presenciado. De novo, Jesus retirou-se para uns momentos no terraço de modo que pudesse pensar em tudo.

137:4:17 15314 Jesus agora compreendia totalmente que devia ficar constantemente em guarda, para que a indulgência da compaixão e da piedade não se tornasse responsável por repetidos episódios desse tipo. Contudo, muitos eventos similares ocorreram, antes que o Filho do Homem deixasse finalmente a sua vida mortal na carne.

5. DE VOLTA A CAFARNAUM


137:5:1 15315 Embora muitos dos convidados fossem ficar a semana inteira para as festividades do casamento, Jesus e os seus discípulos-apóstolos recém-escolhidos – Tiago, João, André, Pedro, Filipe e Natanael – partiram muito cedo na manhã seguinte, para Cafarnaum, sem despedirem-se de ninguém. A família de Jesus e todos os seus amigos em Caná estavam muito angustiados por ele tê-los deixado tão subitamente, e Judá, o irmão mais novo de Jesus, partiu à procura dele. Jesus e os seus apóstolos foram diretamente para a casa de Zebedeu, em Betsaida. Nessa viagem, Jesus falou sobre muitas coisas de importância para o Reino vindouro, com os seus recém-escolhidos seguidores, e avisou-lhes, especialmente, para não mencionarem a transformação da água em vinho. Ele também os aconselhou a evitar as cidades de Séfores e Tiberíades, nos seus trabalhos futuros.

137:5:2 15316 Depois do jantar, naquela noite, nesse lar de Zebedeu e Salomé, teve lugar um dos ensinamentos mais importantes de toda a carreira terrena de Jesus. Apenas os seis apóstolos estiveram presentes a esse encontro; Judá chegou quando eles já estavam para separar-se. Esses seis homens escolhidos tinham viajado de Caná até Betsaida com Jesus, caminhando, por assim dizer, no ar. Eles estavam cheios de expectativas e emocionados com o pensamento de terem sido selecionados como os companheiros mais próximos do Filho do Homem. No entanto, quando Jesus se pôs a explicar-lhes claramente quem ele era, e qual a sua missão na Terra e como ela poderia possivelmente terminar, eles ficaram atordoados. Não podiam entender o que ele estava dizendo. Ficaram mudos; e até mesmo Pedro estava chocado de um modo além de qualquer descrição. Apenas André, o profundo pensador, ousou responder às palavras aconselhadoras de Jesus. Quando Jesus percebeu que eles não tinham compreendido a sua mensagem, quando viu que as idéias deles, sobre o Messias judeu, estavam tão completamente cristalizadas, ele os mandou descansar, enquanto ele caminhava e conversava com o seu irmão Judá. E antes que Judá deixasse Jesus, ele disse com muito sentimento: “Meu pai-irmão, nunca te entendi. Não sei com certeza se tu és o que a minha mãe nos ensinou, e eu não compreendo o Reino vindouro, mas eu sei que tu és um poderoso homem de Deus. Eu ouvi a voz no Jordão, e creio em ti, não importa quem tu sejas”. E tendo acabado de falar, partiu, indo para a sua própria casa em Magdala.

137:5:3 15321 Naquela noite Jesus não dormiu. Envolto nas suas cobertas noturnas, assentou-se nas margens do lago, pensando, e pensando, até a madrugada do dia seguinte. Nas longas horas daquela noite de meditação, Jesus chegou a compreender claramente que ele nunca seria capaz de fazer os seus seguidores verem-no sob nenhuma outra luz além daquela do Messias longamente esperado. Finalmente, reconhecia que não havia nenhum outro modo de lançar a sua mensagem sobre o Reino, a não ser cumprindo a predição de João, como sendo aquele, por quem os judeus estavam esperando. Enfim, ainda que não fosse ele o tipo davídico de Messias, ele era verdadeiramente o cumprimento das afirmações proféticas das mentes mais bem orientadas espiritualmente dos profetas da velha ordem. Nunca mais ele negou completamente ser ele o Messias. E decidiu deixar a resolução dessa complicada situação ao encargo da vontade do Pai.

137:5:4 15322 Na manhã seguinte, Jesus juntou-se aos seus amigos para o desjejum, mas formavam um grupo melancólico. Conversou com eles no fim da refeição, reuniu-os em torno de si, dizendo: “A vontade do meu Pai é que permaneçamos um certo tempo nessa região. Vós escutastes João dizer que ele veio para preparar o caminho para o Reino; portanto é conveniente esperar que a pregação de João se realize. Quando o precursor do Filho do Homem tiver acabado o seu trabalho, começaremos nós a proclamação das boas-novas do Reino”. Ordenou aos seus apóstolos que retornassem às redes de pesca, enquanto ele se aprontava para ir com Zebedeu até a oficina de barcos, prometendo vê-los no dia seguinte na sinagoga, onde devia falar, no sábado, e marcando com eles um encontro para a tarde naquele mesmo sábado.

6. OS ACONTECIMENTOS DE UM DIA DE SÁBADO


137:6:1 15323 A primeira aparição pública de Jesus, depois do seu batismo, foi na sinagoga de Cafarnaum, no sábado, 2 de março, do ano 26 d. C. . A sinagoga estava transbordando de gente. As histórias do batismo no Jordão tinham agora aumentado, com as notícias frescas de Caná sobre a água e o vinho. Jesus deu assentos de honra aos seus seis apóstolos e, assentados com eles, estavam dois dos seus irmãos na carne, Tiago e Judá. A sua mãe, tendo retornado para Cafarnaum com Tiago, na noite anterior, estava também presente, ficando assentada no setor das mulheres na sinagoga. A audiência inteira encontrava-se tensa; todos esperavam presenciar alguma manifestação extraordinária de poder sobrenatural, que desse um testemunho adequado à natureza e à autoridade daquele que iria falar a eles naquele dia. Todavia, estavam fadados a desapontar-se.

137:6:2 15324 Quando Jesus levantou-se, o sacerdote da sinagoga passou a ele o rolo das escrituras, e ele leu, do profeta Isaías: “Assim disse o Senhor: ‘Os céus são o Meu trono, e a terra é o estrado dos Meus pés. Onde está a casa que vós construístes para Mim? E onde é o local da Minha morada? Todas essas coisas as Minhas mãos as fizeram’, diz o Senhor. ‘E olharei por esse homem, até mesmo ele que é pobre e de espírito contrito, e que treme com a Minha palavra’. Escutai as palavras do Senhor, vós que tremeis e que temeis: ‘Os vossos irmãos odiaram-nos e os jogaram fora por causa do Meu nome’. Mas que o Senhor seja glorificado. Ele aparecerá a vós em alegria, e todos os outros envergonhar-se-ão. Uma voz da cidade, uma voz do templo, uma voz do Senhor diz: ‘Antes que ela tivesse as dores, ela deu à luz; antes que as suas dores viessem, ela deu à luz um menino homem’. Quem ouviu uma coisa como essa? Terá a Terra sido feita para dar frutos em um só dia? Ou pode uma nação nascer de uma hora para outra? Contudo, assim diz o Senhor: ‘Eis que estenderei a paz como um rio, e a glória até mesmo dos gentios será como uma corrente que flui. Como um homem confortado pela sua mãe, assim Eu confortar-vos-ei. E vós sereis confortados mesmo em Jerusalém. E quando virdes essas coisas, o vosso coração irá regozijar-se’ ”.

137:6:3 15331 Quando acabou essa leitura, Jesus entregou de volta o rolo ao responsável por ele. Antes de assentar-se, ele simplesmente disse: “Sede pacientes e vereis a glória de Deus; e assim será com todos que permanecerem comigo e que assim aprenderão a cumprir a vontade do meu Pai que está nos céus”. E o povo foi para as suas casas, perguntando qual seria o significado de tudo aquilo.

137:6:4 15332 Naquela tarde, Jesus e os seus apóstolos, e ainda Tiago e Judá, entraram em um barco e afastaram-se um pouco da praia, onde eles ancoraram o barco enquanto ele lhes falava sobre o Reino vindouro. E eles compreenderam mais do que tinham entendido na quinta-feira à noite.

137:6:5 15333 Jesus os instruiu a retomar os seus deveres regulares, até que “a hora do Reino viesse”. E para encorajá-los, ele deu o exemplo, indo de volta a trabalhar regularmente na oficina de barcos. Explicando-lhes que eles deveriam gastar três horas, todas as noites, estudando e preparando-se para o seu trabalho futuro, Jesus disse ainda: “Todos nós permaneceremos por aqui até que o Pai me peça que os chame. Cada um de vós, agora, deve retornar ao seu trabalho costumeiro, como se nada tivesse acontecido. Não digam nada sobre mim a nenhum homem e lembrem-se de que o meu Reino não virá com barulho, nem com encanto, mas antes deve vir por meio da grande mudança que o meu Pai terá feito nos vossos corações e nos corações daqueles que serão chamados para juntarem-se a vós, nos conselhos do Reino. Agora sois meus amigos, confio em vós e vos amo; cedo transformar-vos-eis nos meus companheiros pessoais. Sede pacientes, sede gentis. Sede sempre obedientes à vontade do Pai. Estejais prontos para a chamada do Reino. Ao mesmo tempo em que vós ireis experimentar um grande júbilo no serviço do meu Pai, vós deveríeis também vos preparar para complicações, pois eu vos previno de que será apenas por meio de bastante atribulação que muitos entrarão no Reino. Mas, para aqueles que tiverem encontrado o Reino, o seu júbilo será pleno, e eles serão chamados os abençoados de toda a Terra. Contudo, não alimenteis falsas esperanças; o mundo tropeçará nas minhas palavras. E mesmo vós, meus amigos, não percebeis completamente o que estou revelando para as vossas mentes confusas. Não cometais erros; iremos adiante, no trabalho, para uma geração de buscadores de sinais. Eles demandarão que prodígios sejam feitos, como prova de que sou o enviado pelo meu Pai, e serão lentos para ver, na revelação do amor do meu Pai, as credenciais da minha missão”.

137:6:6 15334 Naquela noite, quando eles voltaram à terra, antes de pegarem o seu caminho, Jesus, de pé na beirada da água, orou: “Meu Pai, eu te agradeço por esses pequenos que já crêem, apesar das suas dúvidas. E por causa deles eu me coloquei à parte, para fazer a Tua vontade. E agora que eles possam aprender a ser um, assim como Tu e eu somos Um”.

7. OS QUATRO MESES DE APRENDIZADO


137:7:1 15335 Por quatro longos meses – março, abril, maio e junho – o tempo da permanência deles continuou; Jesus teve mais de cem reuniões longas e sinceras, se bem que alegres e jubilosas, com esses seis companheiros e com o seu próprio irmão Tiago. Devido à doença na sua família, Judá raramente estava em condições de freqüentar essas aulas. Tiago, o irmão de Jesus, não perdeu a fé nele, mas durante esses meses de espera e inação, Maria quase se desesperou com o seu filho. A sua fé, levada a tais alturas em Caná, afundava-se agora a níveis muito baixos. Ela conseguia apenas voltar à sua exclamação tão repetida: “Eu não posso compreendê-lo. Não consigo imaginar o que significa tudo isso”. Todavia, a esposa de Tiago muito fez para sustentar a coragem de Maria.

137:7:2 15341 Durante esses quatro meses, esses sete crentes e, entre eles, o seu próprio irmão na carne, estavam conhecendo Jesus; estavam acostumando-se com a idéia de viver com esse Deus-homem. Embora eles o chamassem de Rabbi, eles estavam aprendendo como não ter medo dele. Jesus possuía aquela incomparável graça de personalidade que o capacitava a viver entre eles, de modo que não se sentissem desamparados, por causa da sua divindade. Eles acharam realmente fácil ser “amigos de Deus”, Deus encarnado à semelhança da carne mortal. Esse tempo de espera testou severamente todo o grupo de crentes. Nada, absolutamente nada, de miraculoso aconteceu. Dia a dia eles iam para o seu trabalho comum, enquanto, noite após noite, se assentavam aos pés de Jesus. E eram mantidos juntos por essa personalidade sem par e pelas palavras cheias de graça que lhes dizia, noite após noite.

137:7:3 15342 Esse período de espera e de ensinamentos estava sendo especialmente desafiador para Simão Pedro. E repetidamente ele buscava persuadir Jesus a ir adiante com a pregação do Reino na Galiléia, enquanto João continuava a pregar na Judéia. Contudo, a resposta de Jesus a Pedro era sempre: “Sê paciente, Simão. Progride. Não estaremos nunca prontos demais, quando o Pai chamar. ” E André acalmaria Pedro, de quando em quando, com o seu conselho mais temperado e filosófico. André estava tremendamente impressionado com a naturalidade humana de Jesus. Ele nunca ficava cansado de contemplar como alguém, que podia viver tão perto de Deus, podia ser tão amigável e cheio de consideração com os homens.

137:7:4 15343 Durante todo esse período, Jesus só falou na sinagoga por duas vezes. Ao fim dessas várias semanas de espera, as notícias sobre o seu batismo e sobre o vinho em Caná tinham começado a diminuir. E Jesus assegurou-se de que nenhum milagre aparente acontecesse mais, durante esse tempo. Entretanto, ainda que eles vivessem muito quietamente em Betsaida, as notícias sobre os feitos estranhos de Jesus estavam sendo levadas a Herodes Antipas, que, por sua vez, enviou espiões para certificarem-se daquilo que ele estava fazendo. Herodes, no entanto, estava mais preocupado com a pregação de João. E decidiu não molestar Jesus, cujo trabalho continuava muito silenciosamente em Cafarnaum.

137:7:5 15344 Nesse tempo de espera, Jesus esforçou-se para ensinar aos seus discípulos qual deveria ser a atitude deles em relação aos vários grupos religiosos e aos partidos políticos da Palestina. As palavras de Jesus eram sempre: “Estamos procurando conquistar todos eles, mas não pertencemos a nenhum deles”.

137:7:6 15345 Os escribas e os rabinos, juntos, eram chamados fariseus. Eles referiam-se a si próprios como os “parceiros”. Sob muitos pontos de vista eles eram o grupo progressista, entre os judeus, tendo adotado muitos ensinamentos não claramente encontrados nas escrituras dos hebreus, tais como acreditar na ressurreição dos mortos, uma doutrina apenas mencionada por Daniel, um dos últimos profetas.

137:7:7 15346 Os saduceus eram compostos pelo sacerdócio e por certos judeus ricos. Eles não eram tão cheios de rigor pelos detalhes da aplicação da lei. Os fariseus e os saduceus, na realidade, eram mais partidos religiosos, do que seitas.

137:7:8 15347 Os essênios eram uma seita verdadeiramente religiosa, originada durante a revolta dos macabeus, cujos princípios eram, sob alguns aspectos, mais exigentes do que aqueles dos fariseus. Eles haviam adotado muitas crenças e práticas persas; viviam como uma irmandade, em monastérios, abstinham-se do casamento e possuíam todas as coisas comunitariamente. E especializaram-se em ensinamentos sobre os anjos.

137:7:9 15351 Os zelotes eram um grupo de ardentes patriotas judeus. Eles advogavam que todo e qualquer dos métodos se justificaria na luta para escapar da escravidão do jugo romano.

137:7:10 15352 Os herodianos eram um partido puramente político, que advogava a emancipação do governo romano direto, pela restauração da dinastia de Herodes.

137:7:11 15353 Bem no meio da Palestina viviam os samaritanos, com quem “os judeus não faziam nenhum negócio”, não obstante tivessem eles muitos pontos de vista semelhantes aos ensinamentos dos judeus.

137:7:12 15354 Todos esses partidos e seitas, incluindo a pequena irmandade nazarita, acreditavam na vinda, em algum tempo, do Messias. Eles todos procuravam um libertador nacional. Entretanto, Jesus foi muito positivo, ao deixar claro que ele e os seus discípulos não se tornariam aliados de nenhuma dessas escolas de pensamento ou de práticas. O Filho do Homem não seria nem um nazarita nem um essênio.

137:7:13 15355 Se bem que mais tarde Jesus houvesse ordenado que os apóstolos devessem partir, como o fez João, e pregar os ensinamentos de Deus e instruir os crentes, ele colocou ênfase na proclamação das “boas-novas do Reino do céu”. Ele repetia infalivelmente, para os seus colaboradores, que eles deveriam “demonstrar amor, compaixão e compreensão”. Muito cedo ele ensinou aos seus seguidores que o Reino do céu era uma experiência espiritual, que tinha a ver com a entronização de Deus nos corações dos homens.

137:7:14 15356 Enquanto aguardavam, assim, antes de embarcarem para as suas pregações públicas ativas, Jesus e os sete apóstolos passavam duas noites, todas as semanas, na sinagoga, a estudar as escrituras dos hebreus. Nos anos posteriores, após muito tempo de pregação pública, os apóstolos relembrar-se-iam desses quatro meses como os mais preciosos e proveitosos de toda a sua ligação com o Mestre. Jesus ensinou a esses homens tudo o que poderiam assimilar. Ele não cometeu o erro de instruí-los em excesso. Ele não precipitou a confusão, apresentando uma verdade muito adiante da sua capacidade de compreensão.

8. O SERMÃO SOBRE O REINO


137:8:1 15357 No sábado, 22 de junho, pouco antes de partirem para a sua primeira excursão de pregações, e dez dias depois do aprisionamento de João, Jesus ocupou o púlpito da sinagoga, pela segunda vez desde que trouxera os seus apóstolos para Cafarnaum.

137:8:2 15358 Poucos dias antes da pregação desse sermão sobre “O Reino”, como Jesus estivesse trabalhando na oficina de barcos, Pedro trouxe a ele as novas sobre a prisão de João. Jesus depôs as suas ferramentas; uma vez mais, tirou o seu avental e disse a Pedro: “É chegada a hora do Pai. Aprontemo-nos para proclamar os ensinamentos de Deus, sobre o Reino”.

137:8:3 15359 Jesus fez o seu último trabalho na bancada de carpinteiro nessa terça-feira, 18 de junho, do ano 26 d. C. Pedro apressou-se a sair da sua oficina e, no meio da tarde, tinha reunido todos os seus companheiros e, deixando-os em um bosque perto da praia, foi buscar Jesus. Contudo, não pôde encontrá-lo, pois o Mestre tinha ido a um outro bosque para orar. E eles não o viram, até tarde naquela noite, quando ele voltou para a casa de Zebedeu e pediu alimento. No dia seguinte ele enviou o seu irmão Tiago para pedir o privilégio de falar na sinagoga, no próximo dia de sábado. E o dirigente da sinagoga ficou muito contente, de que Jesus estivesse de novo disposto a conduzir os serviços.

137:8:4 15361 Antes que Jesus fizesse esse sermão memorável, sobre o Reino de Deus, o primeiro esforço ambicioso da sua carreira pública, ele leu das escrituras estas passagens: “Vós sereis para mim um reino de sacerdotes, um povo santo. Yavé é o nosso juiz, Yavé é o nosso legislador, Yavé é o nosso rei; ele nos salvará. Yavé é o meu rei e o meu Deus. Ele é um grande rei sobre toda a Terra. O amor-benevolência recai sobre Israel nesse reino. Abençoada seja a glória do Senhor, pois ele é o nosso Rei”.

137:8:5 15362 Quando acabou de ler, Jesus disse:

137:8:6 15363 “Eu vim para proclamar o estabelecimento do Reino do Pai. E este Reino deverá incluir as almas adoradoras dos judeus e dos gentios, do rico e do pobre, dos livres e dos escravos; pois o meu Pai não tem preferência por ninguém, o Seu amor e a Sua misericórdia estendem-se a todos.

137:8:7 15364 “O Pai dos céus envia o Seu espírito para residir nas mentes dos homens e, quando eu tiver acabado o meu trabalho na Terra, do mesmo modo, o Espírito da Verdade será efundido sobre toda a carne. E o espírito do meu Pai e o Espírito da Verdade estabelecer-vos-ão no Reino vindouro da compreensão espiritual e da retidão divina. O meu Reino não é deste mundo. O Filho do Homem não conduzirá exércitos à batalha para estabelecer um trono de poder, nem um reino de glória temporal. Quando o meu Reino tiver vindo, vós conhecereis o Filho do Homem como o Príncipe da Paz, a revelação do Pai eterno. Os filhos deste mundo lutam pelo estabelecimento e a ampliação dos reinos deste mundo, mas os meus discípulos entrarão no Reino do céu por meio das suas decisões morais e pelas suas vitórias espirituais; e, uma vez que tenham eles entrado, encontrarão a alegria, a retidão e a vida eterna.

137:8:8 15365 “Aqueles que primeiro buscarem entrar no Reino, começando assim a lutar por uma nobreza de caráter, como a do meu Pai, possuirão logo tudo o mais que for necessário. E eu vos digo, com toda a sinceridade: a menos que procureis a entrada para o Reino com a fé e a dependência confiada de uma criança pequena, não sereis admitidos de modo nenhum.

137:8:9 15366 “Não sejais enganados por aqueles que vêm dizendo que aqui é o reino ou que ali está o reino, pois o Reino do meu Pai não concerne às coisas visíveis e materiais. E este Reino está convosco, mesmo agora, pois, onde o espírito de Deus ensina e guia a alma do homem, na realidade, aí está o Reino do céu. E este Reino de Deus é a retidão, a paz e a alegria no Espírito Santo.

137:8:10 15367 “João de fato vos batizou, como um símbolo do arrependimento e para a remissão dos vossos pecados, mas, quando entrardes no Reino do céu, vós sereis batizados pelo Espírito Santo.

137:8:11 15368 “No Reino do meu Pai não haverá nem judeus nem gentios, apenas aqueles que buscam a perfeição pelo serviço, pois eu declaro que aquele que quer ser grande no Reino do meu Pai deve primeiro transformar-se em um servidor de todos. Se vós quereis servir aos vossos semelhantes, vós deveis assentar-vos comigo, no meu Reino, do mesmo modo que eu, servindo à semelhança da criatura, irei assentar-me dentro em pouco com o meu Pai no seu Reino.

137:8:12 15369 “Este novo Reino é como uma semente crescendo em bom solo em um campo. Não dá imediatamente os seus frutos. Há um intervalo de tempo entre o estabelecimento do Reino, na alma do homem, e a hora em que o Reino amadurece, dando os plenos frutos da retidão duradoura e da salvação eterna.

137:8:13 153610 “E este Reino que eu vos proclamo não é um reino de poder e de abundância. O Reino do céu não é uma questão de comida e de bebida mas, antes, uma vida de retidão progressiva e de júbilo crescente pelo serviço que se perfecciona do Pai que está nos céus. Pois o Pai disse dos seus filhos do mundo: ‘É a minha vontade que eles sejam finalmente perfeitos, como eu mesmo sou perfeito’.

137:8:14 15371 “Eu vim para pregar as alegres novas do Reino. Eu não vim para acrescentar nada às cargas pesadas daqueles que gostariam de entrar neste Reino. Eu proclamo um caminho novo e melhor e aqueles que estiverem capacitados para entrar no Reino vindouro desfrutarão do descanso divino. E não importa o que vos custará, em termos das coisas deste mundo, não importa o preço que ireis pagar para entrar no Reino celeste, neste mundo vós recebereis muitas vezes mais, em júbilo e progresso espiritual, e na vida eterna nas idades que virão.

137:8:15 15372 “A entrada no Reino do Pai não depende de exércitos que marchem, nem de que os reinos deste mundo mudem, nem de que se quebre o jugo sobre os aprisionados. O Reino celeste está ao alcance da mão, e todos os que lá entrarem encontrarão abundante liberdade e a salvação cheia de júbilo.

137:8:16 15373 “Este Reino é domínio do eterno. Aqueles que entrarem no Reino ascenderão até o meu Pai; e irão certamente alcançar a mão direita da Sua glória no Paraíso. E todos que entrarem no Reino do céu tornar-se-ão os filhos de Deus e, nas idades que virão, irão ascender ao Pai. E eu não vim para chamar aqueles que seriam os justos, mas os pecadores e todos aqueles que têm fome e sede de retidão da perfeição divina.

137:8:17 15374 “João veio pregando o arrependimento para preparar-vos para o Reino; agora venho eu para proclamar a fé, a dádiva de Deus, como o preço da entrada no Reino do céu. Se apenas acreditardes que o meu Pai vos ama com um amor infinito, então vós estais no Reino de Deus”.

137:8:18 15375 Depois de assim falar, ele assentou-se. Todos aqueles que o haviam escutado estavam atônitos com as suas palavras. Os seus discípulos, maravilhados. Todavia, o povo não estava preparado para receber as boas-novas, vindas dos lábios desse Deus-homem. Cerca de um terço, dos que o escutaram, acreditou na mensagem, ainda que não pudesse entendê-la completamente; cerca de um terço preparou-se, nos seus corações, para rejeitar um conceito tão puramente espiritual do Reino aguardado; enquanto o terço restante não conseguiu nem compreender os seus ensinamentos, e muitos deles na verdade acreditaram que ele “estava fora de si”.

DOCUMENTO 138

A FORMAÇÃO DOS MENSAGEIROS DO REINO
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Depois de pregar o sermão sobre “O Reino”, Jesus reuniu os seis apóstolos naquela tarde e começou a expor os seus planos para visitar as cidades em volta do mar da Galiléia. Os seus irmãos, Tiago e Judá, ficaram bastante sentidos por não terem sido chamados para essa reunião. Até esse momento eles consideravam-se como fazendo parte do círculo interno de apóstolos de Jesus. Contudo, Jesus planejava não ter parentes próximos como membros desse corpo de diretores apostólicos do Reino. A não inclusão de Tiago e Judá entre os poucos escolhidos, junto com a sua indiferença aparente para com a sua mãe desde a experiência de Caná, foi o ponto de partida de um abismo sempre crescente entre Jesus e a sua família. Essa situação continuou durante toda a sua ministração pública – eles quase que o rejeitaram – e essas diferenças não foram completamente aparadas até após a sua morte e ressurreição. A sua mãe constantemente oscilava entre as atitudes de uma fé e de uma esperança flutuantes, e as de emoções crescentes de desapontamento, humilhação e desespero. Apenas Rute, a mais jovem, permaneceu indefectivelmente leal ao seu pai-irmão.

138:0:2 15382 Até depois da ressurreição, toda a família de Jesus pouquíssimo tinha a ver com a sua ministração. Se um profeta pode ter honrarias, mas não na sua própria terra, a ele são dados valor e apreciação, mas não na sua própria família.

1. INSTRUÇÕES FINAIS


138:1:1 15383 No domingo seguinte, 23 de junho do ano 26 d. C. , Jesus deu as suas instruções finais aos seis. Ele ordenou-lhes que partissem, dois a dois, para anunciar as boas-novas do Reino. Proibiu-os de batizar e desaconselhou-os quanto a fazer pregações públicas. Explicou a eles que mais tarde ele iria permitir-lhes que fizessem pregações públicas, mas que, por um certo tempo, por muitas e boas razões, desejava que eles adquirissem experiência prática de lidar pessoalmente com os seus semelhantes. Jesus propunha fazer dessa primeira viagem um trabalho inteiramente pessoal. E, embora esse anúncio tenha sido algo como um desapontamento para os apóstolos, eles ainda viram, pelo menos parcialmente, as razões de Jesus para começar daquele modo a proclamação do Reino e então assim eles começaram com bom ânimo e com um entusiasmo confiante. Ele os enviou dois a dois, Tiago e João foram para Queresa, André e Pedro para Cafarnaum enquanto Filipe e Natanael partiram para Tariquéia.

138:1:2 15384 Antes que começassem essas duas primeiras semanas de serviço, Jesus anunciou-lhes que desejava ordenar doze apóstolos para continuar o trabalho do Reino, depois da sua partida, e autorizou a cada um deles escolher um homem, dentre as suas primeiras conversões, para que fossem membros desse corpo projetado de apóstolos. João perguntou: “Mas, Mestre, esses seis homens virão para o nosso meio e compartilharão todas as coisas igualmente conosco, que estamos contigo desde o Jordão ouvindo todos os teus ensinamentos em preparação para este que é o nosso primeiro trabalho para o Reino?” E Jesus respondeu: “Sim, João, os homens que ireis escolher tornar-se-ão um conosco e vós ensinareis a eles tudo aquilo que seja pertinente ao Reino, do mesmo modo que eu vos ensinei”. Depois de ter dito isso, Jesus deixou-os.

138:1:3 15391 Os seis não se separaram, para ir e fazer os seus trabalhos, até que tivessem trocado muitas palavras e discutissem as instruções de Jesus, com o intuito de que cada um deles escolhesse um novo apóstolo. O conselho de André prevaleceu afinal e eles partiram para os seus trabalhos. Em essência, eis o que André disse: “O Mestre está certo, somos em número muito pequeno para assumirmos esse trabalho. Há necessidade de mais instrutores e o Mestre manifestou grande confiança em nós por nos ter confiado a escolha desses seis novos apóstolos”. Naquela manhã, quando se separaram a fim de seguir para o trabalho, havia um pouco de depressão escondida em cada coração. Eles sabiam que iriam sentir falta de Jesus e, além do medo e da timidez, não era daquele modo que tinham imaginado a inauguração do Reino do céu.

138:1:4 15392 Tinha sido arranjado para que os seis trabalhassem por duas semanas, depois das quais retornariam à casa de Zebedeu para uma reunião. Nesse ínterim, Jesus foi até Nazaré para estar com José e Simão e os outros membros da sua família, que viviam naquela vizinhança. Jesus fez tudo o que lhe foi humanamente possível, em conformidade com a sua consagração a fazer a vontade do seu Pai, para manter a confiança e o afeto da sua família. E cumpriu bem o seu dever nessa questão, e fez mesmo até mais.

138:1:5 15393 Enquanto os apóstolos estavam fora, para essa missão, Jesus pensou muito sobre João, agora na prisão. Era uma grande tentação usar o seu poder potencial para libertá-lo, mas uma vez mais ele resignou-se a “aguardar a vontade do Pai”.

2. ESCOLHENDO OS SEIS


138:2:1 15394 Essa primeira viagem missionária dos seis foi, sobretudo, cheia de êxito. Todos eles descobriram o grande valor do contato direto e pessoal com os homens. E voltaram para Jesus com um conhecimento mais pleno de que, afinal, a religião é pura e inteiramente uma questão de experiência pessoal. Eles começaram a sentir quão sedenta estava a gente comum de ouvir palavras de conforto religioso e de encorajamento espiritual. Quando se reuniram com Jesus, eles queriam falar todos ao mesmo tempo; mas André tomou a frente e os chamou um a um, e eles fizeram os seus relatos formais ao Mestre e apresentaram as suas indicações dos seis novos apóstolos.

138:2:2 15395 Jesus, depois que cada homem tinha apresentado a sua escolha dos novos apóstolos, pediu a todos os outros que votassem na indicação; assim todos os seis novos apóstolos foram formalmente aceitos por todos os seis mais antigos. E então Jesus anunciou que eles todos deveriam estar com os candidatos e convidá-los para o serviço.

138:2:3 15396 Os apóstolos recém-selecionados foram:

138:2:4 15397 1. Mateus Levi, coletor alfandegário de Cafarnaum, que tinha o seu escritório no lado leste da cidade, perto das fronteiras de Batanea. Foi escolhido por André.

138:2:5 15398 2. Tomé, o Dídimo, um pescador de Tariquéia e ex-carpinteiro e pedreiro de Gadara. Foi selecionado por Filipe.

138:2:6 15399 3. Tiago Alfeu, pescador e agricultor de Queresa foi escolhido por Tiago Zebedeu.

138:2:7 153910 4. Judas Alfeu, irmão gêmeo de Tiago Alfeu, também pescador, foi escohido por João Zebedeu.

138:2:8 15401 5. Simão, o zelote, era um alto funcionário da patriótica organização dos zelotes, posição que ele abandonou para juntar-se aos apóstolos de Jesus. Antes de ligar-se aos zelotes, Simão tinha sido um mercador. Foi escolhido por Pedro.

138:2:9 15402 6. Judas Iscariotes era o filho único de pais judeus ricos que viviam em Jericó. Tornou-se um seguidor de João Batista e os seus pais saduceus o tinham deserdado. Estava procurando emprego naquelas regiões, quando os apóstolos de Jesus encontraram-no e, principalmente por causa da sua experiência com as finanças, Natanael o convidou para juntar-se às suas fileiras. Judas Iscariotes era o único judeu entre os doze apóstolos.

138:2:10 15403 Jesus passou um dia inteiro com os seis, respondendo às suas perguntas e escutando os detalhes do que tinham para contar, pois muitas experiências interessantes e úteis tinham para relatar. Agora eles viam a sabedoria do plano do Mestre, de enviá-los para trabalhar de um modo calmo e pessoal, antes de mandá-los para esforços públicos mais ambiciosos.

3. O CHAMADO DE MATEUS E SIMÃO


138:3:1 15404 No dia seguinte, Jesus e os seis foram chamar Mateus, o coletor aduaneiro. Mateus estava esperando por eles; tendo já feito o balancete nos seus livros, estava pronto para entregar os assuntos do seu escritório ao seu irmão. Quando aproximaram da casa aduaneira, André adiantou-se com Jesus, que, olhando no rosto de Mateus, disse: “Siga-me”. Então ele levantou-se e foi para a sua casa com Jesus e os apóstolos.

138:3:2 15405 Mateus contou a Jesus sobre o banquete que tinha arranjado para aquela noite e que desejava pelo menos dar aquele jantar à sua família e amigos, caso Jesus aprovasse e consentisse em ser o hóspede de honra. E Jesus consentiu movimentando a cabeça. Pedro então, com Mateus, se separou deles, e explicou que tinha convidado um tal Simão para juntar-se aos apóstolos e assegurou o consentimento de que Simão fosse também incluído nesta festa.

138:3:3 15406 Depois de um almoço ao meio-dia, na casa de Mateus, foram todos com Pedro chamar Simão zelote, a quem encontraram no seu antigo local de trabalho, o qual agora estava sendo conduzido pelo seu sobrinho. Quando Pedro conduziu Jesus até Simão, o Mestre saudou o ardente patriota e apenas disse: “Siga-me”.

138:3:4 15407 E todos voltaram à casa de Mateus, onde conversaram muito sobre política e religião até a hora do jantar. A família Levi dedicava-se, há muito, aos negócios e à coleta de taxas; e por isso muitos dos convidados de Mateus para esse banquete poderiam ser chamados de “publicanos e pecadores” pelos fariseus.

138:3:5 15408 Naqueles dias, quando uma recepção com banquete era dada a um indivíduo proeminente, o costume era que todas as pessoas envolvidas ficassem no salão e observassem os convivas durante a refeição e escutassem as conversas e os discursos dos homens aos quais se prestava honra. Desse modo, a maior parte dos fariseus de Cafarnaum estava presente a essa ocasião para observar a conduta de Jesus nesta inusitada reunião social.

138:3:6 15409 À medida que o jantar progredia, a alegria dos convivas ia transbordando; e todos estavam gostando tão esplendidamente de tudo, que os fariseus ali observando começaram, nos seus corações, a criticar Jesus pela sua participação em um acontecimento tão frívolo e comezinho. Mais tarde, naquela noite, quando estavam fazendo os discursos, um dos fariseus mais maledicentes foi tão longe a ponto de criticar, junto a Pedro, a conduta de Jesus, dizendo: “Como ousas dizer que este homem é reto, quando ele come com publicanos e pecadores emprestando, desse modo, a sua presença a tais cenas descuidadas de entrega ao prazer”. Pedro sussurrou esse comentário crítico para Jesus antes que ele desse a bênção aos que estavam reunidos. Quando Jesus começou a falar, disse: “Ao vir aqui nesta noite para dar as boas vindas a Mateus e a Simão à nossa fraternidade, fico contente de testemunhar a vossa alegria em um ânimo social tão bom, mas vós devíeis rejubilar-vos mais ainda porque muitos de vós entrareis no Reino vindouro do espírito, no qual ireis desfrutar mais abundantemente das boas coisas do Reino do céu. E para vós, que estais criticando a mim, dentro dos vossos corações, por eu ter vindo aqui compartilhar da alegria destes amigos, devo dizer-lhes que eu vim para proclamar a alegria àqueles que são socialmente oprimidos e a liberdade espiritual aos que estão moralmente prisioneiros. É necessário que eu vos lembre de que, mais do que os sãos, os doentes é que precisam de um médico? Eu vim, não para chamar os retos, mas os pecadores”.

138:3:7 15411 E essa era verdadeiramente uma coisa estranha ao ambiente judeu: ver um homem de caráter reto e de sentimentos nobres misturando-se livre e alegremente com a gente comum, e ainda mais com tantos publicanos e pecadores reconhecidamente pouco religiosos e em busca de prazeres. Simão zelote quis fazer um discurso nessa reunião, na casa de Mateus, mas André, sabendo que Jesus não queria o Reino vindouro confundido com o movimento dos zelotes, convenceu-o a refrear-se de fazer quaisquer comentários públicos.

138:3:8 15412 Jesus e os apóstolos, naquela noite, permaneceram na casa de Mateus e, quando todos se foram para as suas casas, eles não falaram senão de uma coisa: da bondade e da cordialidade de Jesus.

4. O CHAMADO DOS GÊMEOS


138:4:1 15413 Na manhã seguinte os nove dirigiram-se, todos, de barco a Queresa para executar o chamado formal dos dois próximos apóstolos, Tiago e Judas, os dois filhos gêmeos de Alfeu, indicados por Tiago e João Zebedeu. Os dois pescadores gêmeos contavam com a vinda de Jesus e dos seus apóstolos e já estavam esperando por eles na praia. Tiago Zebedeu apresentou o Mestre aos pescadores de Queresa, e Jesus, olhando para eles, acenou dizendo: “Sigam-me”.

138:4:2 15414 Naquela tarde que passaram juntos, Jesus os instruiu plenamente sobre como deviam proceder em reuniões festivas, e concluiu as suas observações dizendo: “Todos os homens são meus irmãos. O meu Pai nos céus não despreza nenhum ser criado por nós. O Reino do céu está aberto para todos os homens e mulheres. Nenhum homem pode fechar a porta da misericórdia na cara de nenhuma alma faminta que procure entrada. Nós nos assentaremos e comeremos com todos aqueles que desejem escutar sobre o Reino. Aos olhos do nosso Pai que nos contempla de cima, todos são iguais. Não recuseis repartir o vosso pão com o fariseu ou com o pecador, com o saduceu ou o publicano, romano ou judeu, rico ou pobre, livre ou escravo. A porta do Reino está bem aberta para todos que desejarem saber a verdade e encontrar Deus”.

138:4:3 15415 Naquela noite em uma simples ceia na casa de Alfeu, os dois gêmeos eram recebidos na família apostólica. Mais tarde naquela noite, Jesus deu aos seus apóstolos a sua primeira lição que tratava da origem, natureza e destino dos espíritos impuros, mas eles não compreenderam a importância daquilo que ele lhes tinha dito. Achavam muito fácil compreender, amar e admirar Jesus, mas difícil, por demais, era compreender muitos dos seus ensinamentos.

138:4:4 15421 Depois de uma noite de descanso todo o grupo, agora em número de onze, foi de barco até Tariquéia.

5. O CHAMADO DE TOMÉ E JUDAS


138:5:1 15422 Tomé, o pescador, e Judas, o errante, encontraram-se com Jesus e os apóstolos no barco de pesca que atracou em Tariquéia, e Tomé os conduziu para a sua casa perto dali. Filipe agora apresentava Tomé como o seu indicado para o apostolado e Natanael apresentava Judas Iscariotes, o judeu, com as mesmas honras. Jesus olhou para Tomé e disse: “Tomé, tu tens pouca fé; entretanto, eu te recebo. Siga-me”. Para Judas Iscariotes o Mestre disse: “Judas, somos todos da mesma carne e, como eu o recebo em nosso meio, eu oro para que sejas sempre leal aos teus irmãos galileus. Siga-me”.

138:5:2 15423 Depois de terem descansado, Jesus saiu com os doze para orar com eles e para instruí-los sobre a natureza e o trabalho do Espírito Santo, mas de novo de nenhum modo eles compreenderam o significado daquelas verdades maravilhosas que ele tentava ensinar-lhes. Um compreenderia um ponto e o outro comprenderia outro ponto, mas nenhum deles pôde captar o seu ensinamento como um todo. Eles sempre cometeriam o erro de tentar enquadrar o novo evangelho de Jesus dentro das suas velhas formas de crenças religiosas. Não conseguiam captar a idéia de que Jesus tinha vindo para proclamar um novo evangelho de salvação e para estabelecer um novo caminho de encontrar a Deus; eles não percebiam que ele era uma nova revelação do Pai dos céus.

138:5:3 15424 No dia seguinte Jesus deixou os seus doze apóstolos a sós; queria que eles se conhecessem uns aos outros e desejava que ficassem a sós para conversarem sobre o que ele lhes havia ensinado. O Mestre voltou para a refeição da tarde e, durante as horas depois do jantar, ele falou-lhes sobre as ministrações dos serafins, e alguns dos apóstolos compreenderam o seu ensinamento. Descansaram por uma noite e partiram de barco para Cafarnaum no dia seguinte.

138:5:4 15425 Zebedeu e Salomé tinham ido morar com o filho Davi e, desse modo, toda a sua grande casa podia ficar à disposição de Jesus e dos seus doze apóstolos. E ali, Jesus passou um sábado tranqüilo com os seus mensageiros escolhidos; cuidadosamente traçou os planos para proclamar o Reino e explicou integralmente a importância de evitar quaisquer conflitos com as autoridades civis, dizendo: “Se os governantes civis tiverem de ser censurados, deixai comigo essa tarefa. Cuidai de não fazer nenhuma denúncia contra César ou os seus servidores”. Foi nessa mesma noite que Judas Iscariotes chamou Jesus à parte para perguntar por que nada estava sendo feito para tirar João da prisão. E Judas não ficara totalmente satisfeito com a atitude de Jesus.

6. A SEMANA DE LIÇÕES INTENSIVAS


138:6:1 15426 A semana seguinte foi dedicada a um programa de aperfeiçoamento intenso. Cada dia os seis novos apóstolos eram colocados nas mãos dos seus respectivos recrutadores para uma cuidadosa recapitulação de tudo o que tinham aprendido e experimentado como preparação para o trabalho do Reino. Os apóstolos mais antigos recapitularam cuidadosamente, para benefício dos seis mais recentes, os ensinamentos de Jesus, dados até aquele momento. Às tardes eles sempre se reuniam no jardim de Zebedeu para receber as instruções de Jesus.

138:6:2 15427 Foi nessa mesma época que Jesus estabeleceu um dia, no meio da semana, para descanso e diversão. E eles seguiram esse plano de descanso de um dia por semana durante o resto da vida material do seu Mestre. Como regra geral, às quartas-feiras eles nunca faziam as suas atividades regulares. Nesse feriado da semana, Jesus normalmente separava-se deles dizendo: “Meus filhos, ide divertir-vos por um dia. Descansai os corpos dos trabalhos árduos do Reino e gozai do arrefecimento que advem da volta às vossas antigas vocações ou da descoberta de novas espécies de atividades recreativas”. Ainda que Jesus, nesse período da sua vida terrena, na verdade não necessitasse desse dia de descanso, ele adaptou-se a esse plano porque sabia que era o melhor para os seus seguidores humanos. Jesus era quem ensinava – o Mestre; os seus companheiros eram os seus alunos – os discípulos.

138:6:3 15431 Jesus esforçou-se para tornar clara, para os seus apóstolos, a diferença entre os seus ensinamentos e a sua vida junto com eles e os ensinamentos que pudessem advir posteriormente sobre ele. Disse Jesus: “O meu Reino e o evangelho que está relacionado a ele deverão ser o conteúdo da vossa mensagem. Não vos deixeis desviar por pregações sobre mim e sobre os meus ensinamentos. Proclamai o evangelho do Reino e retratai a minha revelação do Pai dos céus, mas não vos deixeis ser extraviados pelas vielas da criação de lendas e de construção de cultos de crenças e de ensinamentos sobre as minhas crenças e ensinamentos”. No entanto, novamente eles não compreenderam por que ele dissera isso, e nenhum homem ousou perguntar porque ele ensinava isso a eles.

138:6:4 15432 Nesses ensinamentos iniciais Jesus tentou evitar controvérsias com os seus apóstolos, tanto quanto possível, exceto naqueles casos que envolviam conceitos errôneos do seu Pai nos céus. Para todas essas questões, ele nunca hesitou em corrigir as crenças errôneas. Havia apenas um motivo, na vida pós-batismal de Jesus em Urântia, e esse era a revelação do seu Pai do Paraíso, uma revelação mais verdadeira e melhor; ele era o pioneiro do caminho novo e melhor até Deus, o caminho da fé e do amor. A sua exortação aos apóstolos era sempre: “Ide procurar os pecadores; encontrem os afligidos e confortai os ansiosos”.

138:6:5 15433 Jesus tinha uma perfeita compreensão da situação; ele possuía um poder ilimitado, que poderia ter sido utilizado para ajudar e adiantar a sua missão, mas estava totalmente satisfeito com os meios e as personalidades, que a maior parte das pessoas teria considerado inadequadas e que teriam encarado como sendo insignificantes. Ele estava empenhado em uma missão de possibilidades dramáticas enormes, mas insistiu em dedicar-se aos assuntos do seu Pai do modo mais tranqüilo e pouco dramático; evitou cuidadosamente qualquer exibição de poder. E agora ele planejava trabalhar de modo pouco ruidoso, ao menos por vários meses, com os seus doze apóstolos, nas cercanias do mar da Galiléia.

7. UMA NOVA DESILUSÃO


138:7:1 15434 Jesus tinha planejado uma campanha missionária tranqüila de cinco meses de trabalho pessoal. Contudo, não disse aos apóstolos o quanto aquilo ia durar; eles trabalharam de semana a semana. E muito cedo neste primeiro dia da semana, exatamente quando ia anunciar isso aos seus doze apóstolos, Simão Pedro, Tiago Zebedeu e Judas Iscariotes vieram para ter uma conversa particular com ele. Levando Jesus para um lado, Pedro ousou dizer-lhe: “Mestre, viemos a pedido dos nossos companheiros para perguntar se o momento agora não está maduro para entrar no Reino. E se tu irás proclamar o Reino em Cafarnaum, ou se vamos prosseguir até Jerusalém? E quando saberemos, cada um de nós, as posições que iremos ocupar junto contigo no estabelecimento do Reino?” – e Pedro teria continuado a fazer mais perguntas, mas Jesus levantou a mão em um gesto de admoestação e o refreou. E fazendo um aceno aos outros apóstolos que se acercavam deles, Jesus disse: “Meus filhinhos, até quando deverei ser indulgente convosco! Já não esclareci que o meu Reino não é deste mundo? Quantas vezes já lhes disse que não vim para assentar-me no trono de Davi, e então por que é que me estais inquirindo sobre qual o lugar que cada um de vós irá ocupar no Reino do Pai? Não podeis perceber que eu vos chamei como embaixadores de um Reino espiritual? Não compreendeis que logo, muito em breve mesmo, vós ireis representar-me no mundo e na proclamação do Reino, do mesmo modo como eu represento o meu Pai que está nos céus? Será possível que eu vos tenha escolhido e que vos tenha instruído como mensageiros do Reino, e que vós ainda não compreendeis a natureza e o significado deste Reino vindouro, de predominância divina nos corações dos homens? Meus amigos, escutai-me uma vez mais. Eliminai das vossas mentes essa idéia de que o meu Reino é um governo de poder ou um reino de glória. De fato, todo poder nos céus e na Terra será dentro em pouco entregue às minhas mãos, mas não é da vontade do Pai que usemos esse dom divino para glorificar a nós próprios durante esta idade. Numa outra idade vós ireis de fato assentar-vos comigo no poder e na glória, mas cabe-nos agora submetermo-nos à vontade do Pai e continuarmos, em humilde obediência, executando o Seu mandato na Terra”.

138:7:2 15441 Uma vez mais os seus discípulos ficaram chocados, estupefatos. Jesus mandou-lhes que fossem orar, dois a dois, pedindo a eles que voltassem a ele ao meio-dia. Nessa manhã crucial, cada um deles procurou encontrar Deus e, cada um, esforçou-se para animar e fortalecer o outro; e retornaram para Jesus como ele lhes havia pedido.

138:7:3 15442 Jesus rememorou com eles, nesse momento, a vinda de João, o batismo no Jordão, a festa de casamento em Caná, a escolha recente dos seis e a separação, pela qual passaram, dos próprios irmãos na carne; e então os preveniu de que o inimigo do Reino iria também tentar separá-los. Depois dessa conversa curta mas sincera, os apóstolos levantaram-se, sob a liderança de Pedro, para declarar a sua devoção imperecível ao seu Mestre e para prometer a sua lealdade inarredável ao Reino e, como Tomé a expressou: “A este Reino vindouro, não importa o que seja e ainda que eu não o compreenda inteiramente”. Eles todos realmente acreditavam em Jesus, embora não entendessem completamente os seus ensinamentos.

138:7:4 15443 Jesus agora perguntava a eles quanto dinheiro eles tinham consigo; e também perguntou quanto às provisões que tinham dado às suas famílias. Quando ficou claro que eles não tinham fundos suficientes para mantê-los por duas semanas, ele disse: “Não é da vontade do meu Pai que comecemos o nosso trabalho desse modo. Permaneceremos aqui perto do mar e pescaremos por duas semanas ou faremos o que as nossas mãos encontrarem para fazer; e nesse ínterim, sob a liderança de André, o primeiro apóstolo escolhido, vós ireis organizar-vos de modo a prover de tudo o que seja necessário ao vosso futuro trabalho, não apenas para o ministério pessoal presente mas também para quando posteriormente eu vos mandar na pregação do evangelho e na instrução dos crentes”. Eles ficaram cheios de ânimo com essas palavras; essa era a primeira sugestão clara e positiva que tiveram, de que Jesus projetava mais tarde efetuar esforços públicos mais ambiciosos e ativos.

138:7:5 15444 Os apóstolos passaram o restante do dia aperfeiçoando a sua organização e completando os arranjos dos barcos e redes para embarcar, na manhã seguinte, com o intuito de pescar, pois todos tinham decidido devotar-se à pescaria; a maioria deles fora de pescadores, e até mesmo Jesus era um barqueiro e pescador experiente. Muitos dos barcos que eles usariam nos próximos anos tinham sido feitos com as próprias mãos de Jesus. E eram barcos bons e confiáveis.

138:7:6 15445 Jesus mandou que eles se devotassem a pescar por duas semanas, acrescentando: “E depois avançareis, tornando-vos pescadores de homens”. Eles pescaram em três grupos, a cada noite Jesus saíra com um grupo diferente. Como eles desfrutavam da companhia de Jesus! Ele era um bom pescador, um companheiro alegre e um amigo inspirador; quanto mais trabalhavam com ele, tanto mais o amavam. Certo dia Mateus disse: “Quanto mais tu compreendes algumas pessoas, menos as admiras, mas com este homem quanto menos eu o compreendo, tanto mais eu o amo”.

138:7:7 15451 Esse plano de pescar por duas semanas e sair para o trabalho pessoal em nome do Reino, por duas semanas, continuou por mais de cinco meses, até o fim desse ano 26 d. C. , até que cessassem aquelas perseguições especiais que tinham sido dirigidas contra os discípulos de João depois do seu encarceramento.

8. O PRIMEIRO TRABALHO DOS DOZE


138:8:1 15452 Depois de vender o fruto da pesca de duas semanas, Judas Iscariotes, que foi o escolhido para atuar como tesoureiro dos doze, dividiu os fundos apostólicos em seis partes iguais, depois de tirados os fundos para as famílias dependentes. E então, perto do meio de agosto, no ano 26 d. C. , eles saíram dois a dois para os campos de trabalho designados por André. Nas duas primeiras semanas Jesus esteve com André e Pedro, nas segundas duas semanas com Tiago e João, e assim por diante com as outras duplas na ordem da escolha deles. Desse modo ele era capaz de sair ao menos uma vez com cada dupla antes de reuni-los para o começo dos trabalhos públicos deles.

138:8:2 15453 Jesus ensinou-lhes a pregar o perdão dos pecados pela fé em Deus sem penitência nem sacrifício, e que o Pai dos céus ama todos os seus filhos com o mesmo amor eterno. E mandou que os apóstolos se abstivessem de discutir:

138:8:3 15454 1. A obra e o aprisionamento de João Batista.

138:8:4 15455 2. A voz durante o batismo. Disse Jesus: “Apenas aqueles que ouviram a voz podem referir-se a ela. Falai apenas daquilo que ouvistes de mim; não façais discurso sobre rumores”.

138:8:5 15456 3. A conversão da água em vinho em Caná. Jesus os admoestou seriamente, dizendo: “Não reveleis a nenhum homem a respeito da água e do vinho”.

138:8:6 15457 Eles passaram momentos maravilhosos durante esses cinco ou seis meses, nos quais trabalharam como pescadores alternadamente a cada duas semanas, fazendo assim economias para sustentarem-se no campo durante as duas semanas seguintes de trabalho missionário para o Reino.

138:8:7 15458 A gente comum maravilhava-se com os ensinamentos e as ministrações de Jesus e dos seus apóstolos. Os rabinos há muito tinham ensinado aos judeus que o ignorante não poderia ser pio nem virtuoso. Contudo, os apóstolos de Jesus eram tanto devotos quanto retos; e eram ainda alegremente ignorantes de muitos dos ensinamentos dos rabinos e da sabedoria do mundo.

138:8:8 15459 Jesus deixou evidente, para os seus apóstolos, a diferença entre o arrependimento por meio das chamadas obras boas, como ensinado pelos judeus, e a mudança que a fé causava na mente – o novo nascimento – que ele exigia, como preço para a admissão no Reino. Ele ensinou aos seus apóstolos que a fé é a única coisa necessária para se entrar no Reino do Pai. João tinha ensinado a eles “o arrependimento – para escapar da ira que viria”. Jesus ensinava “A fé como sendo a porta aberta para a entrada no amor presente, perfeito e eterno de Deus”. Jesus não falava como um profeta, como um que vem para declarar a palavra de Deus. Ele parecia falar de si próprio como alguém que tem autoridade. Jesus buscava que eles desviassem os seus pensamentos da necessidade de milagres, fazendo com que a mente deles se voltasse para a busca de uma experiência real e pessoal de satisfação e segurança, vinda do espírito de Deus que reside neles, no seu amor e na sua graça salvadora.

138:8:9 154510 Os discípulos cedo aprenderam que o Mestre tinha um profundo respeito e uma consideração compassiva para com todo ser humano que ele conhecia, e eles ficavam imensamente comovidos por essa consideração uniforme e invariável que ele tinha, de modo tão consistente, para com todas as espécies de homens, mulheres e crianças. Ele parava no meio de um discurso profundo para ir até a estrada e dar alento a uma mulher que passava carregando a sua pesada carga de corpo e de alma. Ele interrompia uma conferência séria com os seus apóstolos para se confraternizar com uma criança intrometida. Nada nunca parecia tão importante para Jesus quanto o indivíduo humano que chegava à sua presença imediata. Ele era o Mestre e o instrutor, mas era mais – ele era também um amigo e um vizinho, um camarada compreensivo.

138:8:10 15461 Se bem que os ensinamentos públicos de Jesus consistissem principalmente de parábolas e discursos curtos, invariavelmente ele ensinava aos seus apóstolos por meio de perguntas e respostas. Ele se interromperia sempre para responder a perguntas sinceras, durante os seus discursos públicos mais recentes.

138:8:11 15462 Os apóstolos chocavam-se, no início, mas claramente se acostumaram ao tratamento que Jesus dava às mulheres; sempre deixava bastante claro para todos que as mulheres deviam merecer direitos iguais aos dos homens, no Reino.

9. CINCO MESES DE PROVAS


138:9:1 15463 Esse período, um tanto monótono, de pescarias alternadas com o trabalho pessoal, provou ser uma experiência estafante para os doze apóstolos, mas eles resistiram ao teste. Apesar de todos os seus queixumes, dúvidas e insatisfações passageiras, eles permaneceram fiéis aos seus votos de devoção e lealdade ao Mestre. Foi a sua união pessoal com Jesus, durante esses meses de testes, que fez com que eles o amassem tanto e que eles todos (salvo Judas Iscariotes) permanecessem leais e fiéis a ele, mesmo nas horas tenebrosas do seu julgamento e da crucificação. Homens verdadeiros não podiam simplesmente desertar de fato um mestre venerado que tinha vivido tão perto deles e que tinha sido tão devotado a eles quanto Jesus. Durante as horas negras da morte do Mestre, nos corações desses apóstolos, toda razão e todo juízo e toda lógica foram postos de lado, em deferência a apenas uma emoção humana extraordinária – o sentimento supremo de amizade e lealdade. Esses cinco meses de trabalho com Jesus levaram esses apóstolos, cada um deles, a considerá-lo como o melhor amigo que tiveram em todo o mundo. E foi esse sentimento humano, não os seus magníficos ensinamentos nem os seus feitos maravilhosos, que os manteve juntos até depois da ressurreição e da renovação da proclamação do evangelho do Reino.

138:9:2 15464 Esses meses de trabalho tranqüilo não apenas representaram um grande teste para os apóstolos, um teste ao qual eles sobreviveram; mas o período sem atividade pública foi uma grande provação para a família de Jesus. Na época em que Jesus estava preparando-se para deslanchar o seu trabalho público, a sua família inteira (exceto Rute) tinha praticamente se desertado dele. Apenas em algumas ocasiões posteriores intentaram fazer contato com Jesus, mas ainda assim foi para persuadi-lo a voltar para casa com eles, pois chegaram quase a acreditar que ele estava fora de si. Simplesmente não conseguiam penetrar a sua filosofia nem entender os seus ensinamentos; tudo aquilo era demais para os da sua própria carne e sangue.

138:9:3 15465 Os apóstolos prosseguiram no seu trabalho pessoal em Cafarnaum, Betsaida-Júlias, Corazim, Gerasa, Hipos, Magdala, Caná, Belém da Galiléia, Jotapata, Ramá, Safé, Giscala, Gadara e Abila. Além dessas cidades, eles trabalharam em muitas aldeias, bem como pelo interior, no campo. Ao fim desse período os doze tinham elaborado planos bastante satisfatórios para cuidar das suas respectivas famílias. A maioria dos apóstolos era de casados, alguns possuíam vários filhos, mas eles tinham feito arranjos tais para o sustento daqueles que estavam nos seus lares que, com um pouco de assistência dos fundos apostólicos, eles podiam devotar todas as suas energias ao trabalho do Mestre, sem ter de preocupar-se com o bem-estar financeiro das suas famílias.

10. A ORGANIZAÇÃO DOS DOZE


138:10:1 15471 Os apóstolos de início organizaram-se da seguinte maneira:

138:10:2 15472 1. André, o primeiro apóstolo a ser escolhido, tinha sido designado como o dirigente e líder geral dos doze.

138:10:3 15473 2. Pedro, Tiago e João foram apontados como acompanhantes pessoais de Jesus. Eles deviam assisti-lo dia e noite, ministrando quanto às suas necessidades gerais e físicas, bem como o acompanhando naquelas vigílias noturnas de oração e comunhão misteriosa com o Pai nos céus.

138:10:4 15474 3. Filipe foi nomeado o intendente do grupo. Era do seu dever prover comida e cuidar para que os visitantes, e às vezes até mesmo a multidão de ouvintes, tivessem algo para comer.

138:10:5 15475 4. Natanael cuidava das necessidades das famílias dos doze. Ele recebia informações regulares quanto às necessidades da família de cada apóstolo e, fazendo requisições a Judas, o tesoureiro, enviaria fundos toda semana para aqueles que necessitavam.

138:10:6 15476 5. Mateus era o gestor de recursos do corpo apostólico. O seu dever era de cuidar para que o orçamento permanecesse equilibrado, e a tesouraria abastecida. Se não entrassem os fundos para a sustentação de todos eles, se não fossem recebidas doações suficientes para manter o grupo, Mateus tinha o poder de ordenar aos doze que retornassem para prover as necessidades por um período. Isso, entretanto, nunca se fez necessário depois que começaram o seu trabalho público; sempre tinham fundos suficientes nas mãos do tesoureiro para financiar as suas atividades.

138:10:7 15477 6. Tomé era administrador do itinerário. A sua incumbência era a de arranjar alojamento e selecionar, de um modo geral, os locais das pregações e ensinamentos, assegurando com isso um programa de viagem tranqüilo e sem perdas de tempo.

138:10:8 15478 7. Tiago e Judas, os filhos gêmeos de Alfeu, estavam designados para administrar as multidões. A tarefa deles era designar um número suficiente de monitores assistentes, de modo que fosse possível manter a ordem nas multidões durante a pregação.

138:10:9 15479 8. A Simão zelote era dado o encargo da recreação e das diversões. Ele preparava o programa das quartas-feiras e também procurava prover umas poucas horas de descanso e de diversão a cada dia.

138:10:10 154710 9. Judas Iscariotes foi apontado tesoureiro. Ele carregava a bolsa. Pagava as despesas e mantinha os livros. Fazia estimativas de orçamentos para Mateus, semanalmente, e também elaborava os relatórios semanais para André. Judas pagava as despesas segundo a autorização de André.

138:10:11 154711 Desse modo os doze funcionaram desde o início da sua organização até a época em que a reorganização se fez necessária com a deserção de Judas, o traidor. O Mestre e os seus discípulos-apóstolos seguiram nesse modo simples até domingo, 12 de janeiro do ano 27 d. C. , quando ele os reuniu e formalmente os ordenou como embaixadores do Reino e pregadores das suas boas-novas. E logo depois eles estavam prontos e partiram para Jerusalém e para a Judéia, na primeira viagem de pregação pública.

DOCUMENTO 139

OS DOZE APÓSTOLOS
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Um testemunho eloqüente do encanto e da retidão da vida de Jesus na Terra é que apenas um dos seus apóstolos o tenha deserdado, embora repetidamente ele tivesse reduzido a pedaços e rasgado em trapos as esperanças e a ambição que os seus apóstolos alimentavam de exaltação pessoal.

139:0:2 15482 Os apóstolos aprenderam de Jesus sobre o Reino do céu, e Jesus aprendeu muito com eles sobre o reino dos homens, e sobre a natureza humana, tal como esta existe em Urântia e nos outros mundos evolucionários do tempo e do espaço. Esses doze homens representavam muitos tipos diferentes de temperamentos humanos, e a instrução não os tinha feito semelhantes. Muitos desses pescadores galileus traziam uma forte ascendência de sangue gentio, em resultado da conversão forçada, há cem anos atrás, da população gentia da Galiléia.

139:0:3 15483 Não cometais o erro de tomar os apóstolos como sendo de todo ignorantes e pouco instruídos. Todos eles, exceto os gêmeos Alfeus, tinham-se graduado nas escolas das sinagogas, tendo sido educados profundamente sobre as escrituras dos hebreus e sobre muitos dos conhecimentos correntes daqueles dias. Sete deles eram graduados da escola da sinagoga de Cafarnaum, e não havia escolas judaicas melhores em toda a Galiléia.

139:0:4 15484 Quando os vossos registros se referem a esses mensageiros do Reino como sendo “ignorantes e iletrados”, a intenção é a de transmitir a idéia de que eles eram leigos, ou seja, não instruídos segundo o saber dos rabinos, nem educados segundo os métodos da interpretação rabínica das escrituras. Eles tinham lacunas, no que se concebe como sendo uma educação superior. Nos tempos modernos, eles certamente seriam considerados sem instrução e, nalguns círculos da sociedade, até sem cultura. Uma coisa é certa: eles não tinham passado, todos, por um programa rígido convencional e estereotipado de instrução. Desde a adolescência, cada um deles tinha tido experiências isoladas diferentes de aprendizado de vida.

1. ANDRÉ, O PRIMEIRO ESCOLHIDO


139:1:1 15485 André, líder do corpo apostólico do Reino, nascera em Cafarnaum. Era o mais velho, em uma família de cinco filhos – ele próprio, o seu irmão Simão, e três irmãs. O seu pai, agora falecido, tinha sido sócio de Zebedeu no negócio de secagem de peixes em Betsaida, o porto de pesca de Cafarnaum. Quando se tornou um apóstolo, André estava solteiro, mas vivia com o seu irmão casado, Simão Pedro. Ambos eram pescadores e sócios de Tiago e de João, os filhos de Zebedeu.

139:1:2 15486 No ano 26 d. C. , quando foi escolhido como apóstolo, André tinha 33 anos, um ano completo a mais do que Jesus, e era o mais velho dos apóstolos. Ele vinha de uma linhagem excelente de ancestrais e era o mais capaz dos doze homens. Excetuando a oratória, ele era um igual aos seus companheiros em quase todas as aptidões imagináveis. Jesus nunca deu a André um apelido, uma designação fraternal. Contudo, tão logo os apóstolos começaram a chamar a Jesus de Mestre, eles também designaram André com um termo equivalente a chefe.

139:1:3 15491 André era um bom organizador e um administrador ainda melhor. Era um dos quatro apóstolos que formavam o círculo interno, mas ao ser designado por Jesus como dirigente do grupo apostólico, André teria de se manter junto aos seus irmãos, ao passo que os outros três usufruíam de uma comunhão mais estreita com o Mestre. Até o fim, André permaneceu como o deão do corpo de apóstolos.

139:1:4 15492 Mesmo nunca tendo sido um pregador eficiente, André fazia um trabalho pessoal eficaz, sendo o missionário pioneiro do Reino, visto que, enquanto primeiro apóstolo escolhido, imediatamente trouxe até Jesus o seu irmão, Simão, que depois se tornou um dos maiores pregadores do Reino. André era o principal apoio da política adotada por Jesus, de utilizar o programa de trabalho pessoal como um meio de treinar os doze como mensageiros do Reino.

139:1:5 15493 Estivesse Jesus ensinando os apóstolos em particular ou pregando à multidão, André, em geral, sabia o que estava acontecendo; ele era um executivo compreensivo e um administrador eficiente. Ele tomava uma decisão imediata sobre todas as questões trazidas ao seu conhecimento, a menos que considerasse o problema como estando além do domínio da sua autoridade e, quando isso acontecia, ele o levaria diretamente a Jesus.

139:1:6 15494 André e Pedro tinham o caráter e o temperamento bem diferentes, mas lhes deve ser dado, para sempre, o crédito de se darem esplendidamente bem um com o outro. André nunca tinha inveja da capacidade oratória de Pedro. E raro é ver-se um homem mais velho do tipo de André exercendo uma influência tão profunda sobre um irmão mais jovem e talentoso. André e Pedro pareciam nunca ter a menor inveja das habilidades, nem das realizações um do outro. Tarde da noite, no Dia de Pentecostes, quando duas mil almas foram acrescentadas ao Reino, graças principalmente à pregação energética e inspirada de Pedro, André disse ao seu irmão: “Eu não poderia ter feito isso, mas estou contente de ter um irmão que o fez”. Ao que Pedro respondeu: “E se não fosse tu, que me trouxeste ao Mestre e, não fosse a tua perseverança em me manter junto a ele, eu não estaria aqui para fazer isso”. André e Pedro eram exceções à regra, provando que mesmo irmãos podem conviver em paz e trabalhar juntos de um modo eficiente.

139:1:7 15495 Depois de Pentecostes, Pedro estava famoso; mas nunca se tornou irritante para o irmão mais velho passar o resto da sua vida sendo apresentado como o “irmão de Simão Pedro”.

139:1:8 15496 De todos os apóstolos, André era o melhor conhecedor dos homens. Ele sabia que conflitos estavam germinando no coração de Judas Iscariotes, mesmo quando nenhum dos outros sequer suspeitava de que algo estava errado com o tesoureiro deles; mas ele nada disse a ninguém sobre os seus temores. O grande serviço de André para o Reino foi o de aconselhar a Pedro, a Tiago e a João a respeito da escolha dos primeiros missionários que foram expedidos para proclamar o evangelho do Reino, e também o de aconselhar a esses primeiros líderes sobre a organização dos assuntos administrativos do Reino. André tinha o grande dom de descobrir os recursos ocultos e os talentos latentes dos mais jovens.

139:1:9 15497 Logo depois da ascensão celeste de Jesus, André começou a escrever um registro pessoal de muitos dos feitos e dos ditos do seu Mestre que partira. Depois da morte de André foram feitas cópias desse registro particular, e elas circularam livremente entre os primeiros instrutores da igreja cristã. Essas notas informais de André, subseqüentemente, foram editadas, corrigidas, alteradas e tiveram acréscimos até que formassem uma narrativa suficientemente contínua da vida do Mestre na Terra. A última dessas poucas cópias alteradas e corrigidas foi destruída pelo fogo em Alexandria, cerca de cem anos depois que o original fora escrito pelo apóstolo, o primeiro a ser escolhido entre os doze.

139:1:10 15501 André era um homem de um discernimento interno claro, de pensamento lógico e de decisão firme, cuja grande força de caráter consistia na sua estupenda estabilidade. A sua desvantagem de temperamento era a sua falta de entusiasmo; muitas vezes ele preferiu fazer elogios ponderados aos seus companheiros a encorajá-los. E essa reticência em louvar as realizações de mérito dos seus amigos nasceu da sua aversão pela adulação e pela insinceridade. André era um desses homens categóricos, de temperamento regulado, feito por si próprio, e de sucesso nos seus modestos negócios.

139:1:11 15502 Todos os apóstolos amavam Jesus, mas ainda assim é verdade que cada um dos doze sentia-se atraído por algum aspecto da sua personalidade e que tivesse exercido um encanto especial sobre aquele apóstolo individualmente. André admirava Jesus por causa da consistência da sua sinceridade e da sua dignidade sem afetação. Quando os homens conheciam Jesus, eles ficavam possuídos por um impulso de compartilhá-lo com os amigos; eles realmente queriam que todo mundo viesse a conhecê-lo.

139:1:12 15503 Quando as perseguições posteriores finalmente dispersaram os apóstolos de Jerusalém, André viajou pela Armênia, Ásia Menor e Macedônia, tendo sido ao final preso e crucificado em Patras, na Acáia, após trazer vários milhares de pessoas para o Reino. Dois dias inteiros foi o tempo que levou para que esse homem robusto expirasse na cruz e, durante essas horas trágicas ele continuou efetivamente a proclamar as boas-novas da salvação do Reino do céu.

2. SIMÃO PEDRO


139:2:1 15504 Quando Simão juntou-se aos apóstolos, ele tinha trinta anos. Era casado, possuía três filhos, e vivia em Betsaida, perto de Cafarnaum. O seu irmão, André, e a mãe da sua mulher viviam com ele. Ambos, Pedro e André, eram sócios de pescaria dos filhos de Zebedeu.

139:2:2 15505 O Mestre tinha conhecido Simão havia já algum tempo, quando André o apresentou como o segundo dos apóstolos. Naquele momento Jesus deu a Simão o nome de Pedro, e o fez com um sorriso, para ser uma espécie de apelido. Simão era muito conhecido por todos os seus amigos como sendo um companheiro impulsivo e errante. É bem verdade que, mais tarde, Jesus deu importância nova e de maior significado a esse apelido conferido de uma maneira tão imediata.

139:2:3 15506 Simão Pedro era um homem impulsivo, um otimista. Ele havia crescido permitindo a si próprio a indulgência de ter sentimentos fortes; estava constantemente em dificuldades, porque persistia em falar sem pensar. Essa espécie de descuido também trazia complicações umas após outras a todos os seus amigos e condiscípulos tendo sido o motivo para o Mestre ter chamado suavemente a sua atenção muitas vezes. A única razão pela qual Pedro não entrava em maiores complicações, por causa de falar sem pensar, era que, desde muito cedo, ele aprendera a conversar sobre muitos dos seus planos e esquemas com o seu irmão, André, antes de aventurar-se a fazer propostas em público.

139:2:4 15507 Pedro era um orador fluente, eloqüente e dramático. Era também um líder de homens, por natureza e por inspiração, um pensador rápido, mas não tinha um raciocínio profundo. Fazia muitas perguntas, mais do que todos os apóstolos juntos, e, se bem que a maioria fosse de boa qualidade e pertinente, muitas delas eram impensadas e tolas. Pedro não tinha uma mente profunda, mas conhecia muito bem a própria mente. Era, por conseguinte, um homem de decisão súbita e de ação rápida. Enquanto os outros, atônitos, faziam comentários de espanto ao verem Jesus na praia, Pedro pulava na água e nadava até a praia para encontrar o Mestre.

139:2:5 15511 O traço que Pedro mais admirava em Jesus era a sua elevada ternura. Pedro nunca se cansava de contemplar a paciência de Jesus. E nunca se esqueceu da lição sobre perdoar a quem erra, não apenas sete vezes mas setenta vezes e mais sete. Ele pensou muito sobre essas impressões, sobre o caráter do Mestre, de sempre perdoar, durante aqueles dias escuros e tristes que se seguiram imediatamente depois que ele, irrefletida e involuntariamente, negou a Jesus no pátio do sumo sacerdote.

139:2:6 15512 Simão Pedro era aflitivamente vacilante; ele ia subitamente de um extremo a outro. Primeiro ele recusou-se a deixar Jesus lavar os seus pés e então, ao ouvir a resposta do Mestre, ele implorou para que ele o lavasse por inteiro. Mas, afinal, Jesus sabia que as falhas de Pedro vinham da sua cabeça e não do coração. Ele era uma das combinações mais inexplicáveis de coragem e de covardia, como jamais houve na Terra. A sua grande força de caráter era a lealdade, a amizade. Pedro amava Jesus, real e verdadeiramente. E, ainda a despeito de ter uma força altaneira de devoção, ele era instável e inconstante a ponto de permitir que uma garota serviçal o provocasse e o levasse a negar o seu Senhor e Mestre. Pedro podia resistir à perseguição e a qualquer outra forma de ataque direto, mas ele se desamparava e afundava diante do ridículo. Era um soldado valente, quando enfrentava um ataque frontal, mas era um covarde curvado de medo, quando surpreendido por trás.

139:2:7 15513 Pedro foi o primeiro dos apóstolos de Jesus a adiantar-se para defender o trabalho de Filipe com os samaritanos e o de Paulo com os gentios. Entretanto, na Antióquia, mais tarde, ele inverteu a sua posição quando afrontado pelos judaizadores que o ridicularizavam, retirando-se temporariamente de entre os gentios, sem outro resultado a não ser trazer sobre a sua cabeça a denúncia destemida de Paulo.

139:2:8 15514 Ele foi o primeiro entre os apóstolos a confessar, de todo coração, reconhecer a combinação da humanidade e da divindade em Jesus, e o primeiro – depois de Judas – a negá-lo. Pedro não era tanto um sonhador, mas ele não gostava de descer das nuvens do êxtase e do entusiasmo dos seus deleites teatrais, para o mundo da realidade simples do dia a dia.

139:2:9 15515 Ao seguir Jesus, literal e figurativamente, ele estava à frente da procissão ou então rastejando na última fileira – “seguindo de longe e detrás”. Entretanto, ele era o pregador mais notável dos doze; ele fez mais do que qualquer homem, a não ser Paulo, para estabelecer o Reino e enviar os seus mensageiros aos quatro cantos da Terra, em uma só geração.

139:2:10 15516 Depois de negar intempestivamente ao Mestre, ele caiu em si e, com o apoio compassivo e sensível de André, ele tomou de volta o caminho das redes de pescaria, enquanto os apóstolos permaneciam estáticos à espera de saber o que viria depois da crucificação. Quando ficou totalmente seguro de que Jesus o tinha perdoado e de que tinha sido recebido de volta ao aprisco do Mestre, o fogo do Reino queimou de um modo tão brilhante dentro da sua alma, que ele se tornou uma luz grande e salvadora para milhares de almas na escuridão.

139:2:11 15517 Depois de deixar Jerusalém, e antes de Paulo tornar-se um espírito de liderança para as igrejas cristãs dos gentios, Pedro viajou extensivamente, visitando todas as igrejas da Babilônia até Corinto. Ele visitou e ministrou até mesmo nas muitas igrejas que tinham sido erigidas por Paulo. Embora Pedro e Paulo tivessem temperamento e educação muito diferentes, até mesmo em teologia, eles trabalharam juntos e harmoniosamente, nos seus últimos anos, para a edificação das igrejas.

139:2:12 15521 Um pouco do estilo e dos ensinamentos de Pedro é mostrado nos sermões parcialmente transcritos por Lucas e no evangelho de Marcos. O seu estilo vigoroso foi mais bem representado na sua carta conhecida como a Primeira Epístola de Pedro; ao menos isso é verdadeiro antes de ter sido ela alterada, posteriormente, por um discípulo de Paulo.

139:2:13 15522 Todavia, Pedro persistiu no erro de tentar convencer os judeus de que Jesus era, afinal, real e verdadeiramente o Messias deles. Até o dia da sua morte, Simão Pedro continuou a padecer mentalmente da confusão entre os conceitos de Jesus enquanto Messias judeu, de Cristo como o redentor do mundo e do Filho do Homem enquanto uma revelação de Deus, o Pai cheio de amor por toda a humanidade.

139:2:14 15523 A esposa de Pedro era uma mulher muito capacitada. Durante anos ela trabalhou satisfatoriamente como membro do corpo feminino e, quando Pedro foi expulso de Jerusalém, ela o acompanhou em todas as suas jornadas às igrejas, bem como em todas as suas excursões missionárias. E, no dia que o seu ilustre marido teve a vida ceifada, ela foi atirada às bestas selvagens na arena de Roma.

139:2:15 15524 E assim este homem, Pedro, um íntimo de Jesus, um dos que fizeram parte do seu círculo interno, partiu de Jerusalém proclamando, com poder e glória, as boas-novas do Reino, até que a plenitude da sua ministração tivesse sido alcançada; e ele se considerou como um recebedor de altas honrarias quando os seus captores informaram-lhe que ele deveria morrer como o seu Mestre tinha morrido – na cruz. Dessa forma Simão Pedro foi crucificado em Roma.

3. TIAGO ZEBEDEU


139:3:1 15525 Tiago, o mais velho dos dois apóstolos filhos de Zebedeu, aos quais Jesus deu o nome de “filhos do trovão”, estava com trinta anos quando se tornou apóstolo. Era casado, tinha quatro filhos, e vivia próximo dos seus pais, nos arredores de Cafarnaum, em Betsaida. Era um pescador, e exercia a sua profissão na companhia de João, o seu irmão mais jovem, e associado a André e Simão. Tiago e o seu irmão João desfrutavam da vantagem de ter conhecido Jesus antes de qualquer dos outros apóstolos.

139:3:2 15526 Esse competente apóstolo possuía um temperamento contraditório; ele parecia realmente possuir duas naturezas, ambas de fato movidas por fortes sentimentos. Ele era veemente em especial, quando a sua indignação chegava plenamente ao auge. Tinha uma disposição feroz, quando provocado adequadamente e, quando a tempestade chegava ao fim, ele estava sempre habituado a justificar-se e a desculpar a sua raiva sob o pretexto de que era uma manifestação de justa indignação. Excetuando-se essas perturbações periódicas de ira, a personalidade de Tiago era muito semelhante à de André. Ele não tinha a circunspecção de André, nem o discernimento dele sobre a natureza humana, mas era um orador público muito melhor. Depois de Pedro, e talvez de Mateus, Tiago era o melhor orador público entre os doze.

139:3:3 15527 Embora Tiago não fosse melancólico, ele podia estar quieto e taciturno em um dia e muito falante e contador de histórias no outro. Em geral ele falava livremente com Jesus, mas, entre os doze, durante muitos dias seguidos, ele permanecia silencioso. A sua grande fraqueza estava nesses intervalos de um silêncio inexplicável.

139:3:4 15528 O traço notável da personalidade de Tiago era a sua capacidade de ver todos os lados de uma questão. De todos os doze, era ele que chegava o mais próximo de captar a importância e o significado real do ensinamento de Jesus. Ele também tinha sido lento a princípio para compreender o que o Mestre queria dizer, mas, logo que eles terminaram os aperfeiçoamentos, Tiago estava de posse de um conceito superior da mensagem de Jesus. Era capaz de entender uma gama bastante ampla de naturezas humanas; ele se dava bem com o versátil André, com o impetuoso Pedro e com o seu contido irmão João.

139:3:5 15531 Embora Tiago e João tivessem os seus problemas tentando trabalhar juntos, era inspirador observar como os dois se davam bem. Não tinham tanto êxito quanto André e Pedro, mas se saíam muito melhor do que era de se esperar, em geral, de dois irmãos, especialmente de dois irmãos tão teimosos e determinados. E, por estranho que possa parecer, esses dois filhos de Zebedeu eram muito mais tolerantes, um com o outro, do que com estranhos. Eles nutriam uma grande afeição entre si; e sempre haviam sido bons companheiros de recreação. Foram esses “filhos do trovão” os que quiseram pedir para descer o fogo do céu com o intuito de destruir os samaritanos que ousaram demonstrar falta de respeito pelo seu Mestre. Contudo, a morte prematura de Tiago modificou muito o temperamento veemente de João, o seu irmão mais novo.

139:3:6 15532 A característica de Jesus que Tiago mais admirava era a afeição compassiva do Mestre. O interesse compreensivo de Jesus pelo pequeno e pelo grande, pelo rico e pelo pobre, exercia uma grande atração sobre ele.

139:3:7 15533 Tiago Zebedeu era um pensador e um planejador bem equilibrado. Junto com André, ele era um dos mais ponderados do grupo dos apóstolos. Era um indivíduo vigoroso, mas nunca tinha pressa para nada. Tiago foi um excelente contrapeso para Pedro.

139:3:8 15534 Ele era modesto e pouco dramático, um servidor do cotidiano, um trabalhador despretensioso; quando compreendeu algo do real significado do Reino, ele não buscou nenhuma recompensa especial. E, deve mesmo ficar claro que foi a mãe de Tiago e de João, por si própria, quem fez o pedido para serem concedidos, aos seus filhos, os lugares à mão direita e à mão esquerda de Jesus. E, quando eles declararam que estavam prontos para assumir tais responsabilidades, deve ser reconhecido que estavam conscientes dos perigos inerentes à suposta revolta do Mestre contra o poder romano e, também, que estavam dispostos a pagar o preço. Quando Jesus perguntou se eles estavam prontos para beber do cálice, eles responderam afirmativamente. E, quanto a Tiago, isso acabou sendo verdade ao pé da letra – ele bebeu do cálice com o Mestre, visto ter sido ele o primeiro dos apóstolos a sofrer o martírio, sendo muito cedo colocado à morte pela espada de Herodes Agripa. Tiago, assim, foi o primeiro dos doze a sacrificar a própria vida, na nova frente de batalha do Reino. Herodes Agripa temia a Tiago acima de todos os outros apóstolos. De fato ele muitas vezes permanecia quieto e silencioso, mas, quando as suas convicções eram estimuladas e desafiadas, ele tornava-se corajoso e determinado.

139:3:9 15535 Tiago viveu a vida na sua plenitude e, quando o fim chegou, comportou-se com tanta dignidade e fortaleza que até mesmo o seu acusador e denunciador, que testemunhou o seu julgamento e execução, ficou tão tocado que se afastou às pressas da cena da morte de Tiago para juntar-se aos discípulos de Jesus.

4. JOÃO ZEBEDEU


139:4:1 15536 Quando se tornou apóstolo, João estava com vinte e quatro anos e era o mais jovem dos doze. Sendo solteiro vivia com os seus pais em Betsaida; era pescador e trabalhava com o seu irmão Tiago, em sociedade com André e Pedro. Tanto antes, quanto depois de tornar-se apóstolo, João funcionou como o agente pessoal de Jesus para cuidar da família do Mestre, e continuou com essa responsabilidade enquanto Maria, a mãe de Jesus, viveu.

139:4:2 15537 Já que era o mais jovem dos doze e mantinha um contato tão estreito com Jesus e com os assuntos da família dele, João era muito querido pelo Mestre, mas não pode ser verdadeiramente dito que fosse “o discípulo a quem Jesus amava”. Dificilmente vós suspeitaríeis de que a uma personalidade tão magnânima como a de Jesus pudesse ser atribuído o desacerto de demonstrar favoritismo, de amar a um dos seus apóstolos mais do que aos outros. O fato de que João fosse um dos três auxiliares pessoais de Jesus emprestou mais ênfase a tal idéia errônea, para não mencionar que João, junto com o seu irmão Tiago, conhecia Jesus há mais tempo do que os outros.

139:4:3 15541 Pedro, Tiago, e João foram apontados como auxiliares pessoais de Jesus, logo depois de se tornarem apóstolos. Pouco depois da seleção dos doze, e na época em que indicou André para atuar como dirigente do grupo, Jesus disse a André: “E agora eu desejo que tu designes dois ou três dos seus companheiros para estarem comigo e para permanecer ao meu lado, para me confortar e para ministrar às minhas necessidades diárias”. E André achou melhor selecionar, para esse dever especial, os outros três primeiros apóstolos escolhidos depois dele. Ele gostaria de se fazer voluntário, ele próprio, para esse serviço abençoado, mas o Mestre já lhe tinha dado a sua missão; e assim, imediatamente, ele apontou Pedro, Tiago e João para permanecerem mais próximos de Jesus.

139:4:4 15542 João Zebedeu possuía muitos traços encantadores no seu caráter, mas um destes, não tão adorável, era a sua presunção imoderada, mas em geral bem dissimulada. O seu longo convívio com Jesus trouxe muitas grandes mudanças para o seu caráter. Essa vaidade ficou bastante diminuída, mas, depois de envelhecer e de tornar-se algo como que infantil, aquela auto-estima reapareceu com uma certa intensidade, de modo que, quando se empenhou em conduzir Natam na redação do evangelho que agora leva o seu nome, o apóstolo idoso não hesitou em referir-se repetidamente a si próprio como o “discípulo a quem Jesus amava”. Em vista do fato de que João chegou a ser o mais próximo de Jesus, mais do que qualquer outro mortal da Terra, de que ele havia sido o representante pessoal escolhido para tantas questões, não é estranho que ele deva ter chegado a considerar a si próprio como o “discípulo a quem Jesus amava”, pois, muito certamente, ele sabia que era o discípulo em quem Jesus confiava com mais freqüência.

139:4:5 15543 O traço mais forte do caráter dele era a sua confiabilidade; João estava sempre disposto e era corajoso, fiel e devotado. Sua maior fraqueza era a vaidade característica. Ele era o mais jovem membro da família do seu pai e o mais jovem do grupo dos apóstolos. Talvez ele tenha sido apenas um pouco mimado; talvez a ele tivesse sido condescendido um pouco demais. Todavia, o João de alguns anos depois era um tipo de pessoa muito diferente daquele jovem arbitrário, que se auto-admirava e que se juntou às fileiras dos apóstolos de Jesus quando tinha vinte e quatro anos.

139:4:6 15544 As características que João mais apreciava em Jesus eram o amor e a falta de egoísmo do Mestre; esses traços causavam tamanho impacto sobre João que, posteriormente, toda a sua vida tornou-se dominada pelo sentimento de amor e de devoção fraterna. Ele falou e escreveu sobre o amor. Esse “filho do trovão” tornou-se o “apóstolo do amor”; e, em Éfeso, quando bispo e já idoso, João não sendo mais capaz de permanecer de pé no púlpito e pregar, tendo de ser carregado até a igreja numa cadeira e, ao final do serviço, diante do pedido de que dissesse algumas palavras aos crentes, durante anos, a sua única expressão era “Meus filhinhos, amai-vos uns aos outros”.

139:4:7 15545 João era um homem de poucas palavras, exceto quando estava com os seus ânimos exaltados. Ele pensava muito, mas falava pouco. Ao envelhecer, o seu temperamento ficou mais controlado, e João dominava-se melhor, mas nunca venceu a sua pouca inclinação para falar; e nunca, de fato, conseguiu superar tal reticência. Mas ele era dotado de uma imaginação notavelmente criativa.

139:4:8 15551 Havia um outro lado em João que não era de se esperar fosse encontrável no seu tipo quieto e introspectivo. De algum modo, ele era um tanto sectário e extremamente intolerante. Sob esse ponto de vista, ele e Tiago eram muito semelhantes – ambos queriam trazer o fogo dos céus sobre as cabeças dos samaritanos desrespeitosos. Quando João deparou-se com alguns estranhos ensinando em nome de Jesus, ele os proibiu imediatamente de continuar. Contudo, ele não era o único, entre os doze, que estava maculado por essa espécie de consciência exagerada de auto-estima e de superioridade.

139:4:9 15552 A vida de João foi tremendamente influenciada quando ele viu que Jesus ia enfrentar o seu caminho sem um lar e, igualmente, sabia quão fielmente ele tinha provido para que a sua mãe e a sua família tivessem de tudo. João também era profundamente movido pela compaixão por Jesus, pelo fato de a família dele não o compreender, pois João sabia que eles estavam gradativamente distanciando-se de Jesus. Toda essa situação, mais o fato de Jesus submeter sempre o seu menor desejo à vontade do Pai dos céus e, ainda, o fato de Jesus manter o cotidiano da sua vida dentro dessa confiança implícita na vontade do Pai; tudo isso causava uma impressão tão profunda em João, de tal forma a gerar mudanças permanentes e marcantes no seu caráter; mudanças estas que se manifestaram durante toda a sua vida posterior.

139:4:10 15553 João tinha uma coragem fria e ousada, coisa que poucos dos outros apóstolos possuíam. Ele foi o apóstolo que seguiu junto com Jesus, na noite em que o aprisionaram e ousou acompanhar o seu Mestre até às próprias mandíbulas da morte. João esteve presente, e ao alcance da mão, até a última hora terrena dele, e desempenhara fielmente a sua missão em relação à mãe de Jesus e manteve-se pronto para receber outras instruções mais, que pudessem ser dadas naqueles últimos momentos da existência mortal do Mestre. Uma coisa é certa: João era profundamente confiável. Em geral, João assentava-se à direita de Jesus, quando os doze estavam tomando refeições. Ele foi o primeiro dos doze a acreditar, real e plenamente, na ressurreição, e foi o primeiro a reconhecer o Mestre quando ele veio, até junto deles, na praia, depois da sua ressurreição.

139:4:11 15554 Esse filho de Zebedeu esteve, muito de perto, ligado a Pedro nas atividades iniciais do movimento cristão, tornando-se um dos principais sustentáculos da igreja de Jerusalém. Foi o principal apoio de Pedro, no Dia de Pentecostes.

139:4:12 15555 Vários anos depois do martírio de Tiago, João casou-se com a viúva do seu irmão. Uma das suas netas, que muito o amava, tomou conta dele nos últimos vinte anos da sua vida.

139:4:13 15556 João esteve na prisão por várias vezes e foi banido para a Ilha de Patmos, por um período de quatro anos, até que um outro imperador chegasse ao poder em Roma. Se não tivesse sido sagaz e de muito tato, sem dúvida, João teria sido morto como o seu irmão Tiago, que se exprimia mais abertamente. Com o passar dos anos, João, junto com Tiago, o irmão do Senhor, aprendeu a praticar uma sábia conciliação, quando eles se viam diante de magistrados civis. Eles concluíram que uma “resposta suave aplaca a ira”. Eles aprenderam também a representar a igreja como “uma fraternidade espiritual devotada ao serviço social da humanidade” mais do que como o “Reino do céu”. Eles ensinaram o serviço do amor mais do que o do poder que governa – de reinado e rei.

139:4:14 15557 Quando, no exílio temporário em Patmos, João escreveu o Livro da Revelação, que vós tendes agora em uma forma abreviada e distorcida. Esse Livro da Revelação contém os fragmentos que sobreviveram de uma grande revelação, da qual se perderam grandes partes e outras partes foram retiradas, depois que João o escrevera. Apenas uma parte fragmentada e adulterada foi preservada.

139:4:15 15558 João viajou muito, trabalhou incessantemente e, depois de tornar-se bispo das igrejas da Ásia, estabeleceu-se em Éfeso. Ele orientou o seu colaborador, Natam, na redação do chamado “evangelho segundo João”, em Éfeso, quando tinha noventa e nove anos de idade. De todos os doze apóstolos, João Zebedeu finalmente tornou-se o mais destacado teólogo. Ele morreu de morte natural, em Éfeso, no ano 103 d. C. , quando tinha cento e um anos.

5. FILIPE, O CURIOSO


139:5:1 15561 Filipe foi o quinto apóstolo escolhido, tendo sido chamado quando Jesus e os seus quatro primeiros apóstolos estavam no caminho de volta, vindos do local em que João batizava no Jordão, para Caná da Galiléia. Já que vivia em Betsaida, Filipe conhecia Jesus há algum tempo, mas não lhe tinha ocorrido que Jesus era realmente um grande homem, até aquele dia no Vale do Jordão em que ele disse: “Siga-me”. Filipe foi também, de um certo modo, influenciado pelo fato de André, Pedro, Tiago e João haverem aceitado Jesus como o Libertador.

139:5:2 15562 Filipe estava com vinte e sete anos quando se juntou aos apóstolos; ele havia se casado recentemente, mas não tinha filhos até então. O apelido que os apóstolos deram a ele significava “curiosidade”. Filipe estava sempre querendo que tudo se lhe fosse mostrado. Ele nunca parecia ver longe, diante de qualquer questão. Ele não era necessariamente obtuso, mas faltava-lhe imaginação. Essa falta de imaginação era a grande fraqueza do seu caráter. Ele era um indivíduo comum e terra a terra.

139:5:3 15563 Quando os apóstolos estavam organizados para o serviço, Filipe foi feito intendente; o seu dever era zelar para que nunca lhes faltassem suprimentos. E ele cuidou bem do almoxarifado. A sua característica mais forte era a minuciosidade metódica; era tanto matemático quanto sistemático.

139:5:4 15564 Filipe vinha de uma família de sete filhos, três meninos e quatro meninas. Ele era o segundo, e depois da ressurreição ele batizou a sua família inteira no Reino. Toda a família de Filipe era de pescadores. O seu pai era um homem muito capaz, um pensador profundo, mas a sua mãe era de uma família bastante medíocre. Filipe não era um homem de quem se podia esperar que fizesse grandes coisas, mas ele era um homem que podia fazer coisas pequenas de um modo grande, fazia-as bem e aceitavelmente. Apenas umas poucas vezes, em quatro anos, ele deixou de ter comida à mão para satisfazer as necessidades de todos. Mesmo as muitas demandas de emergência que resultavam da vida que viviam, raramente o pegaram desprevenido. O serviço de intendência da família dos apóstolos foi administrado inteligente e eficientemente.

139:5:5 15565 O ponto forte de Filipe era a confiabilidade metódica; o seu ponto fraco era a total falta de imaginação, a ausência de capacidade de colocar dois ao lado de dois para obter quatro. Ele era matemático, abstratamente, mas não tinha a imaginação construtiva. Era quase que inteiramente carente de alguns tipos de imaginação. Ele era o homem comum típico, de todos os dias. Havia muitos desses homens e mulheres em meio às multidões que vinham ouvir Jesus ensinar e pregar, e para eles era um grande conforto observar alguém, como eles próprios, elevado a uma posição de honra, nos conselhos do Mestre; eles ficavam encorajados com o fato de que alguém, como eles próprios, tinha já encontrado um lugar de importância nos assuntos do Reino. E Jesus aprendeu muito sobre o modo como algumas mentes humanas funcionam, quando ele escutava tão pacientemente às perguntas tolas de Filipe e quando aquiescia aos inúmeros pedidos do seu intendente para que se “lhe fosse mostrado”.

139:5:6 15566 A qualidade de Jesus que Filipe tão continuamente admirava era a generosidade infalível do Mestre. Filipe nunca encontrava nada em Jesus que fosse pequeno, avaro, miserável, e ele adorava essa liberalidade sempre presente e infalível.

139:5:7 15571 Pouco havia da personalidade de Filipe que impressionasse. A ele sempre se referiam como o “Filipe da Betsaida, a cidade em que vivem André e Pedro”. Ele quase não tinha nenhuma visão de discernimento; era incapaz de captar as possibilidades dramáticas de uma determinada situação. Não era pessimista; era simplesmente prosaico. Faltava-lhe também muito do discernimento espiritual interno. Ele não hesitaria em interromper Jesus, no meio de um dos ensinamentos mais profundos do Mestre, para fazer alguma pergunta aparentemente tola. Jesus, entretanto, nunca lhe fazia nenhuma reprimenda por tais descuidos; era paciente com ele e levava em consideração a sua incapacidade de compreender os significados mais profundos dos ensinamentos. Jesus bem sabia que, caso ele reprovasse Filipe, de fazer tais perguntas aborrecidas, não apenas iria ferir à alma honesta dele, mas uma tal reprimenda iria magoá-lo de um tal modo que ele não iria nunca mais se sentir livre para fazer perguntas. Jesus sabia que, nos seus mundos do espaço, havia bilhões incontáveis de mortais semelhantes, de pensamento lerdo, e queria encorajar esses mortais a olhá-lo, sentindo-se sempre livres para trazer-lhe as suas perguntas e problemas. Afinal, Jesus estava muito mais interessado nas perguntas tolas de Filipe do que no sermão que ele pudesse estar fazendo. Jesus estava supremamente interessado nos homens, em todas as espécies de homens.

139:5:8 15572 O intendente apostólico não era um bom orador público, mas ele era um trabalhador pessoal bastante persuasivo e de muito êxito. Ele não ficava desencorajado facilmente; era um labutador muito tenaz em qualquer coisa da qual se incumbisse. Tinha aquele dom grande e raro de dizer: “Vem”. Quando Natanael, o seu primeiro convertido, quis discutir sobre os méritos e deméritos de Jesus de Nazaré, a resposta efetiva de Filipe foi: “Vem e vê”. Ele não era um pregador dogmático que exortava os seus ouvintes a “irem” – façam isso e façam aquilo. Ele encarava todas as situações como elas surgiam, no seu trabalho, com um: “Vem” – “vem comigo; eu te mostrarei o caminho”. E essa é sempre a técnica eficaz, em todas as formas e fases de ensinamento. Até mesmo os pais podem aprender de Filipe o melhor modo de dizer aos seus filhos para não “irem fazer isso, nem irem fazer aquilo”, mas antes: “Vinde conosco para que vos mostremos e compartilhemos convosco do melhor caminho”.

139:5:9 15573 A incapacidade de Filipe de adaptar-se a uma situação nova ficou bem ilustrada quando os gregos vieram até ele em Jerusalém, dizendo: “Senhor, nós desejamos ver Jesus”. Ora, Filipe teria dito: “vem”, a qualquer judeu que fizesse tal pedido. Aqueles homens, no entanto, eram estrangeiros e Filipe não conseguiu se lembrar de nenhuma instrução dos seus superiores a respeito de uma tal situação; e, pois, a única coisa que ele conseguiu pensar em fazer foi consultar o dirigente, André, e então os dois acompanharam os gregos interessados até Jesus. Do mesmo modo, quando Filipe foi a Samaria, pregando e batizando os crentes, como lhe tinha sido ensinado pelo seu Mestre, ele absteve-se de impor as mãos aos seus convertidos, em sinal de terem recebido o Espírito da Verdade. Isso foi feito por Pedro e João, que vieram logo de Jerusalém para observar o seu trabalho em nome da mãe Igreja.

139:5:10 15574 Filipe continuou o seu trabalho durante as horas de provações, da morte do Mestre, participou da reorganização dos doze, e foi o primeiro a ir em frente no intuito de conquistar almas para o Reino, fora das fileiras imediatas dos judeus, tendo tido muito êxito no seu trabalho com os samaritanos e em todos os seus trabalhos posteriores em nome do evangelho.

139:5:11 15575 A esposa de Filipe, que era um membro eficiente do corpo feminino, tornou-se ativamente ligada ao marido no seu trabalho de evangelização, depois da sua partida para fugir das perseguições de Jerusalém. Sua esposa era uma mulher destemida. Ela ficou ao pé da cruz de Filipe, encorajando-o a proclamar as boas-novas, até mesmo para os seus assassinos e, quando lhe faltaram forças, ela começou a contar a história da salvação pela fé em Jesus e foi silenciada apenas quando os judeus irados correram até ela apedrejando-a até a morte. Sua filha mais velha, Lea, continuou o trabalho deles e tornou-se, mais tarde, uma renomada profetiza de Hierápolis.

139:5:12 15581 Filipe, o antigo intendente dos doze, fora um homem de poder no Reino, conquistando almas onde quer que fosse; e foi finalmente crucificado, pela sua fé, e enterrado em Hierápolis.

6. O HONESTO NATANAEL


139:6:1 15582 Natanael, o sexto e último dos apóstolos escolhido pelo próprio Mestre, foi trazido a Jesus pelo seu amigo Filipe. Ele tinha sido associado de Filipe, em vários empreendimentos de negócios, e estava indo ver João Batista com Filipe, quando se encontraram com Jesus.

139:6:2 15583 Quando Natanael juntou-se aos apóstolos, ele tinha vinte e cinco anos e era o segundo mais jovem do grupo. Era o mais jovem de uma família de sete irmãos, sendo solteiro e o único esteio de pais idosos e enfermos, vivia com eles em Caná; os seus irmãos e a irmã eram pessoas casadas ou falecidas, e nenhum deles vivia lá. Natanael e Judas Iscariotes eram os dois homens mais bem instruídos entre os doze. Natanael tinha chegado a pensar em estabelecer-se como mercador.

139:6:3 15584 Jesus não deu, ele próprio, nenhum apelido a Natanael, mas os doze logo começaram a referir-se a ele em termos que significavam honestidade e sinceridade. Ele era “sem artifícios”. E essa era a sua grande virtude; ele era tanto honesto, quanto sincero. A fraqueza do seu caráter era o seu orgulho; ele era muito orgulhoso da família, da cidade, da própria reputação e da nação; e tudo isso seria louvável, não fosse levado tão longe. Natanael, contudo, era inclinado a ir aos extremos nos seus preconceitos pessoais. Ele estava disposto a prejulgar os indivíduos de acordo com as suas opiniões pessoais. Ele não demorou a fazer a pergunta, mesmo pouco antes de conhecer Jesus: “Pode alguma coisa boa vir de Nazaré?” Entretanto, Natanael não era obstinado, mesmo no seu orgulho. Ele era rápido em reverter os próprios pensamentos, uma vez que olhasse no rosto de Jesus.

139:6:4 15585 Sob muitos pontos de vista, Natanael era o gênio ímpar dos doze. Ele era o filósofo apostólico e o sonhador, mas era o tipo do sonhador prático. Alternava estações de profunda filosofia com períodos de um raro humor bufão; quando estava com o humor certo, Natanael era provavelmente o melhor contador de histórias entre os doze. Jesus gostava muito de escutar Natanael discorrer sobre as coisas, tanto as sérias quanto as frívolas. Natanael, aos poucos, foi levando Jesus e o Reino mais a sério, mas nunca encarou a si próprio com seriedade excessiva.

139:6:5 15586 Os apóstolos todos amavam e respeitavam Natanael, e este se dava esplendidamente com eles, exceto com Judas Iscariotes. Judas não achava que Natanael levasse o seu apostolado suficientemente a sério, e certa vez cometeu a temeridade de ir secretamente a Jesus para lançar uma queixa contra ele. Jesus disse: “Judas, toma cuidado com o que fazes; não superestimes o teu encargo. Quem entre nós é competente para julgar o nosso irmão? A vontade do Pai não é que os seus filhos devam compartilhar apenas as coisas sérias da vida. Deixa-me repetir: Eu vim para que os meus irmãos na carne possam ter júbilo, alegria e uma vida de maior abundância. Vai então, Judas, e faze bem aquilo que te tenha sido confiado e deixa Natanael, o teu irmão, dar conta de si próprio a Deus”. E a memória disso, junto com a de muitas experiências semelhantes, viveu por muito tempo no coração iludido por si mesmo de Judas Iscariotes.

139:6:6 15591 Muitas vezes, quando Jesus encontrava-se nas montanhas com Pedro, Tiago e João, e as coisas estavam ficando tensas e confusas entre os apóstolos, quando até mesmo André estava em dúvida sobre o que dizer aos seus irmãos inconsoláveis, Natanael aliviaria a tensão com um pouco de filosofia ou com um lance de humor; e um humor certamente de boa qualidade.

139:6:7 15592 O dever de Natanael era o de cuidar das famílias dos doze. Ele estava freqüentemente ausente do conselho apostólico, pois, quando sabia que alguma doença ou outra coisa fora do ordinário tinha acontecido a alguém sob o seu encargo, ele não perdia tempo e logo ia até a casa dele. Os doze ficavam sossegados ao saber que o bem-estar das suas famílias estava assegurado nas mãos de Natanael.

139:6:8 15593 O que Natanael mais reverenciava em Jesus era a sua tolerância. Ele nunca se cansou de contemplar a abertura da mente de Jesus e a generosa compaixão de Filho do Homem.

139:6:9 15594 O pai de Natanael (Bartolomeu) morreu pouco depois de Pentecostes; e depois disso, esse apóstolo foi para a Mesopotâmia e para a Índia proclamar as boas-novas do Reino e batizar os crentes. Os seus irmãos nunca souberam o que aconteceu com o seu ex-filósofo, poeta, e humorista. E ele foi também um grande homem para o Reino e muito realizou para a disseminação dos ensinamentos do seu Mestre, embora não tenha participado da organização da igreja cristã posterior. Natanael morreu na Índia.

7. MATEUS LEVI


139:7:1 15595 Mateus, o sétimo apóstolo, foi escolhido por André. Mateus pertencia a uma família de coletores de impostos, ou publicanos, mas era, ele próprio, coletor alfandegário em Cafarnaum, onde vivia. Estava com trinta e um anos e era casado, possuía quatro filhos. Era um homem de alguma posse, o único que tinha um certo recurso entre os do corpo apostólico. Era um bom homem de negócios, adaptando-se bem a qualquer meio social, e havia sido dotado com a capacidade de fazer amigos e de se dar muito bem com uma grande variedade de pessoas.

139:7:2 15596 André apontou-o como o representante financeiro dos apóstolos. De um certo modo Mateus era o agente fiscal e o porta-voz de publicidade da organização apostólica. Era um bom julgador da natureza humana e um eficaz homem de propaganda. É difícil de visualizar a sua personalidade, mas foi um discípulo sincero e cada vez mais um crente na missão de Jesus e na certeza do Reino. Jesus nunca deu a Levi um apelido, mas os seus companheiros apóstolos comumente referiam-se a ele como o “angariador de dinheiro”.

139:7:3 15597 O ponto forte de Levi era a sua devoção, de pleno coração, à causa. Que ele, um publicano, tivesse sido adotado por Jesus e pelos seus apóstolos era a causa de uma gratidão imensa da parte do antigo coletor de impostos. Contudo, levou algum tempo para que os apóstolos, especialmente Simão zelote e Judas Iscariotes, se reconciliassem de um modo despreocupado com a presença do publicano no meio deles. A fraqueza de Mateus era o seu ponto de vista estreito e materialista da vida. Em todos esses pontos, contudo, ele fez muitos progressos, com o passar dos meses. Está claro que ele tinha de estar ausente em muitas das mais preciosas sessões de instrução, pois o seu dever era manter o tesouro suprido.

139:7:4 15598 O que Mateus mais apreciava era a disposição que o Mestre tinha de perdoar. Ele nunca cessaria de repetir que o necessário era apenas a fé, na questão de encontrar a Deus. Ele sempre gostava de falar do Reino como “esse negócio de encontrar a Deus”.

139:7:5 15601 Embora Mateus fosse um homem com um passado de publicano, ele saiu-se admiravelmente bem na sua tarefa e, com o passar do tempo, os seus companheiros tornaram-se orgulhosos com a atuação do publicano. Ele era um dos apóstolos que tomaram longas notas das falas de Jesus, e essas notas foram usadas como base da narrativa posterior de Isador sobre os feitos e os ditos de Jesus, que se tornou conhecida como o evangelho segundo Mateus.

139:7:6 15602 A longa e útil vida de Mateus, o homem de negócios e coletor alfandegário de Cafarnaum, foi o meio de conduzir milhares e milhares de outros homens de negócios, de funcionários e de políticos, nas idades subseqüentes, a também escutarem aquela voz empenhada do Mestre dizendo: “Siga-me”. Mateus realmente foi um político astuto, mas, de um modo intenso, leal a Jesus, tendo sido supremamente devotado à tarefa de cuidar para que os mensageiros do Reino vindouro fossem adequadamente financiados.

139:7:7 15603 A presença de Mateus entre os doze foi o meio de manter as portas do Reino bem abertas para as hostes de almas desencorajadas e desterradas, que tinham já, havia muito tempo, considerado a si próprias como estando fora dos limites do consolo religioso. Homens e mulheres, deserdados e em desespero, e amontoados, para ouvirem a Jesus, e ele nunca rejeitou a nenhum deles.

139:7:8 15604 Mateus recebeu oferendas voluntariamente feitas pelos discípulos crentes e ouvintes imediatos dos ensinamentos do Mestre, mas ele nunca solicitou fundos abertamente às multidões. Ele fazia todo o seu trabalho financeiro de um modo silencioso e pessoal e levantava a maior parte do dinheiro entre os da classe mais provida de crentes interessados. Ele praticamente deu a sua modesta fortuna ao trabalho do Mestre e aos seus apóstolos, mas eles nunca souberam dessa generosidade, salvo Jesus, que sabia tudo sobre isso. Mateus hesitava em contribuir abertamente para os fundos apostólicos por medo de que Jesus e os seus companheiros pudessem considerar o seu dinheiro como sendo sujo; e assim ele doou muito, mas em nome de outros crentes. Durante os meses iniciais, quando Mateus percebia que a presença dele era como que uma provação para os apóstolos, ele ficou fortemente tentado a fazer com que eles soubessem que os seus fundos muitas vezes supriam-nos do pão diário, mas ele não cedeu a essa tentação. Quando a evidência do desdém pelo publicano tornou-se evidente, Levi fervia de vontade de revelar a eles a sua generosidade, mas sempre conseguia manter-se em silêncio.

139:7:9 15605 Quando os fundos para a semana eram menores do que o estimado, Levi sempre lançava mão pesadamente dos próprios recursos pessoais. E também, algumas vezes quando estava muito interessado nos ensinamentos de Jesus, ele preferia permanecer para ouvir essas instruções, mesmo sabendo que teria de cobrir ele mesmo, por ter deixado de ir angariar os fundos necessários. E Levi gostaria que Jesus pudesse saber que grande parte do dinheiro vinha do seu bolso! E ele mal imaginava que Jesus sabia de tudo. Os apóstolos todos morreram sem saber que Mateus era o seu benfeitor e em um tal grau que, quando ele viajou para proclamar o evangelho do Reino, depois do começo das perseguições, estava praticamente sem nenhum dinheiro.

139:7:10 15606 Quando essas perseguições levaram os crentes a abandonar Jerusalém, Mateus viajou para o norte, pregando o evangelho do Reino e batizando os crentes. Ele estava perdido, ao que sabiam os seus antigos companheiros do apostolado; mas ele continuava, pregando e batizando, na Síria, na Capadócia, na Galátia, na Bitínia e na Trácia. E foi na Trácia, na Lisimáquia, que alguns judeus, não crentes, conspiraram com os soldados romanos para consumar a sua morte. E esse publicano regenerado morreu, triunfante, na fé de uma salvação que com tanta certeza ele tinha aprendido dos ensinamentos do Mestre, durante a sua recente permanência na Terra.

8. TOMÉ, O DÍDIMO


139:8:1 15611 Tomé era o oitavo apóstolo, e foi escolhido por Filipe. Mais tarde ele tornou-se conhecido como “o incrédulo Tomé”, mas os seus companheiros apóstolos não o consideravam um incrédulo crônico. É bem verdade que a sua mente era do tipo lógico, cético, mas ele tinha uma forma de lealdade corajosa que proibia aos seus conhecidos mais próximos considerá-lo como um cético por leviandade.

139:8:2 15612 Quando se juntou aos apóstolos Tomé estava com vinte e nove anos, era casado, e possuía quatro filhos. Anteriormente ele havia sido carpinteiro e pedreiro, mas ultimamente sendo pescador residia na Tariquéia, situada na margem oeste do Jordão, onde o rio flui do mar da Galiléia; e era considerado como o cidadão líder dessa pequena aldeia. Apesar da pouca instrução, possuía uma mente perspicaz e de bom raciocínio; era filho de pais excelentes, que viviam em Tiberíades. Possuidor da única mente de fato analítica dos doze, Tomé era realmente o cientista do grupo apostólico.

139:8:3 15613 A vivência inicial de Tomé no lar havia sido pouco ditosa; os seus pais não eram de todo felizes na vida de casados, e isso teve reflexo na experiência adulta de Tomé. Ele cresceu com uma disposição, bastante desagradável, para a discussão. Até mesmo a sua esposa ficou contente quando o viu juntar-se aos apóstolos; ela sentiu-se aliviada com o pensamento de que o seu marido pessimista estaria longe de casa a maior parte do tempo. Tomé também nutria um vestígio de suspeita, que tornava muito difícil relacionar-se pacificamente com ele. Pedro havia ficado bastante perturbado por causa de Tomé, a princípio, queixando-se a André, seu irmão, do fato de que Tomé era “mesquinho, desagradável e sempre suspeitando de tudo”. Entretanto, quanto mais os seus companheiros conheciam Tomé, mais gostavam dele. Descobriram que ele era estupendamente honesto e inflexivelmente leal. Era perfeitamente sincero e inquestionavelmente verdadeiro, mas tinha um pendor natural para encontrar erros em tudo e havia crescido como um pessimista de verdade. A sua mente analítica padecia de uma suspeita aflitiva. Ele estava rapidamente perdendo a fé no seu semelhante quando ele ligou-se aos doze e, assim, entrou em contato com o caráter nobre de Jesus. Essa associação com o Mestre começou imediatamente a transformar toda a disposição de Tomé, causando grandes mudanças nas suas reações mentais para com os seus semelhantes.

139:8:4 15614 A grande força de Tomé era a sua excelente mente analítica, acompanhada por uma coragem inflexível – depois de ter tomado a sua decisão. A sua grande fraqueza era o seu duvidar suspeitoso, coisa que ele nunca venceu totalmente em toda a sua vida na carne.

139:8:5 15615 Na organização dos doze, Tomé ficou encarregado de estabelecer e ordenar o itinerário; e ele foi um dirigente à altura do trabalho e dos movimentos do corpo apostólico. Era um bom executivo, um excelente homem de negócios, mas limitado pelos seus múltiplos humores; era um homem em um dia e no próximo já se tornava outro. Quando se uniu ao grupo. tinha inclinação para a melancolia meditativa, mas o contato com Jesus e os apóstolos curaram-no amplamente dessa introspecção mórbida.

139:8:6 15616 Jesus experimentava bastante satisfação com a companhia de Tomé e mantinha muitas e longas conversas pessoais com ele. A presença de Tomé, entre os apóstolos, foi um grande conforto para todos os céticos honestos e encorajou muitas mentes perturbadas a virem para o Reino, mesmo que não pudessem compreender completamente tudo sobre os aspectos espirituais e filosóficos dos ensinamentos de Jesus. A admissão de Tomé no grupo dos doze era uma proclamação permanente de que Jesus ama até mesmo àqueles que duvidam sinceramente.

139:8:7 15621 Os outros apóstolos reverenciavam a Jesus por causa de algo da sua personalidade repleta de traços especiais e notáveis, mas Tomé reverenciava o seu Mestre por causa do seu caráter tão esplendidamente equilibrado. Tomé admirava e honrava de um modo crescente a alguém que, sendo misericordioso com tanto amor, era ainda tão inflexivelmente justo e equânime; tão firme, mas nunca obstinado; tão calmo, mas nunca indiferente; tão cooperativo e tão compassivo, mas nunca intrometido, nem ditatorial; tão forte, mas ao mesmo tempo tão doce; tão direto ao ponto, mas sem ser grosseiro jamais, nem rude; tão terno, sem vacilar nunca; tão puro e inocente e, ao mesmo tempo, tão viril, dinâmico e enérgico; tão verdadeiramente corajoso e nunca imprudente, nem temerário; tão amante da natureza mas tão liberto de qualquer tendência a reverenciá-la; tão bem-humorado e alegre, mas isento de leviandade e de frivolidade. Era essa incomparável simetria de personalidade o que tanto encantava a Tomé. Talvez, entre os doze apóstolos, Tomé fosse aquele que, intelectualmente, usufruía de uma compreensão mais elevada de Jesus e que melhor apreciava da personalidade dele.

139:8:8 15622 Nos conselhos dos doze, Tomé era sempre cauteloso, advogando em primeiro lugar uma política de segurança, mas, se o seu conservadorismo fosse derrotado ou rejeitado, era sempre ele o primeiro a destemidamente ter a iniciativa de executar o programa escolhido. Quantas vezes ele não ficava contra algum projeto, por ser temerário e presunçoso; e ele debateria até um amargo fim, mas, quando André colocava a proposta em votação e, depois, os doze decidiam fazer aquilo a que ele se tinha oposto tão ardorosamente, Tomé era o primeiro a dizer: “Vamos!” Ele era um bom perdedor. E não guardava rancores nem alimentava sentimentos de mágoa. E de novo iria se opor a deixar que Jesus se expusesse ao perigo, mas, quando o Mestre decidia enfrentar os riscos, sempre era Tomé que reanimava os apóstolos com as suas palavras corajosas: “Vamos, camaradas, vamos até lá morrer com ele”.

139:8:9 15623 Tomé era, em alguns aspectos, como Filipe; ele também esperava “que lhe fosse mostrado”, mas a sua expressão externa da dúvida era baseada em operações intelectuais inteiramente diferentes. Tomé era analítico, não meramente cético. E, quando a coragem pessoal física estava envolvida, ele era um dos mais valentes entre os doze.

139:8:10 15624 Tomé tinha os seus dias maus, às vezes ele ficava triste e abatido. A perda da sua irmã gêmea, quando ele estava com nove anos, havia causado muito pesar na sua juventude aumentando, ainda mais, os seus problemas de temperamento mais tarde na vida. Quando Tomé ficava desanimado, algumas vezes era Natanael que o ajudava a se restabelecer, algumas vezes era Pedro, e não raro um dos gêmeos Alfeus. Quando estava muito deprimido, infelizmente ele sempre tentava evitar o contato direto com Jesus. No entanto, o Mestre sabia de tudo a esse respeito e tinha uma atitude de solidariedade compreensiva para com esse apóstolo, quando ele estava assim afligido pela depressão e atormentado pelas dúvidas.

139:8:11 15625 Algumas vezes Tomé conseguia a permissão de André para ficar ausente, por um dia ou dois; mas logo ele aprendeu que esse comportamento não era sábio; logo percebeu que, quando estava abatido, era melhor ater-se ao seu trabalho, permanecendo perto dos seus companheiros. E, não importando o que acontecesse na sua vida emocional, ele continuava firme como apóstolo. Quando chegava a hora de ir adiante, era sempre Tomé que dizia: “Vamos em frente!”

139:8:12 15626 Tomé é o grande exemplo de um ser humano que tem dúvidas, que se confronta com elas, e que vence. Tinha uma grande mente; não era um crítico maligno. Era um pensador lógico; ele era uma prova de rigor para Jesus e para os seus irmãos apóstolos. Se Jesus e a sua obra não fossem verdadeiros, não poderiam ter segurado junto deles, desde o princípio até o fim, um homem como Tomé. Ele tinha um senso muito agudo e seguro do factual. Ao primeiro sintoma de fraude ou de ilusão, Tomé tê-los-ia abandonado a todos. Os cientistas podem não compreender plenamente tudo de Jesus e da sua obra na Terra, mas viveu e trabalhou lá, com o Mestre e com os seus colaboradores humanos, um homem cuja mente era a de um verdadeiro cientista – Tomé Dídimo –, e ele acreditou em Jesus de Nazaré.

139:8:13 15631 Tomé teve momentos difíceis durante os dias do interrogatório e da crucificação. Durante algum tempo, ele esteve nas profundezas do desespero, mas retomou a sua coragem, permaneceu solidário com os apóstolos, e esteve presente junto com eles para acolher Jesus no mar da Galiléia. Por um momento, ele sucumbiu à sua depressão e à dúvida, mas finalmente retomou a sua fé e a sua coragem. Ele deu conselhos sábios aos apóstolos, depois de Pentecostes e, quando a perseguição dispersou os crentes, ele foi para Chipre, Creta, costa norte da África e Sicília, pregando as boas-novas do Reino e batizando os crentes. E Tomé continuou a pregar e a batizar, até que foi preso pelos agentes do governo romano e acabou sendo executado em Malta. Poucas semanas antes da sua morte ele tinha começado a escrever sobre a vida e os ensinamentos de Jesus.

9. e 10. TIAGO E JUDAS ALFEU




139:9:1 15632 Tiago e Judas, os filhos de Alfeu, os pescadores gêmeos que viviam perto de Queresa, foram o nono e o décimo apóstolos, tendo sido escolhidos por Tiago e João Zebedeu. Eles estavam com vinte e seis anos e eram casados; Tiago possuía três filhos e Judas dois.

139:9:2 15633 Não há muito a ser dito sobre esses dois pescadores comuns. Eles amavam o seu Mestre e Jesus os amava, mas eles nunca interromperam os seus discursos com perguntas. Eles entendiam pouquíssimo sobre as discussões filosóficas e sobre os debates teológicos dos seus companheiros apóstolos, mas rejubilavam-se por se verem incluídos naquele grupo de homens poderosos. Esses dois homens eram quase idênticos na aparência pessoal, nas características mentais e no alcance da sua percepção espiritual. O que pode ser dito de um deve ser registrado sobre o outro.

139:9:3 15634 André os designou para o trabalho de manter a ordem nas multidões. Eles eram os principais porteiros nas horas de pregação e, de fato, eram os servidores gerais e os mensageiros dos doze. Eles ajudavam a Filipe com os suprimentos, levavam o dinheiro às famílias cuidadas por Natanael, e estavam sempre prontos para dar uma mão e ajudar a qualquer dos apóstolos.

139:9:4 15635 As multidões de gente comum ficavam muito encorajadas de ver dois homens exatamente como eles serem honrados com um lugar entre os apóstolos. Pela aceitação mesma deles como apóstolos, esses medíocres gêmeos representaram, eles próprios, o meio de trazer uma hoste de crentes medrosos para o Reino. E, também, o povo comum aceitava melhor a idéia de ser dirigido e conduzido por porteiros oficiais que eram bastante semelhantes a eles.

139:9:5 15636 Tiago e Judas, que eram também chamados de Tadeu e Lebeu, não tinham nem pontos fortes nem pontos fracos. Os apelidos dados a eles pelos discípulos eram designações benevolentes para a mediocridade. Eles eram “os menores entre os apóstolos”; eles sabiam disso e sentiam-se bem com isso.

139:9:6 15637 Tiago Alfeu amava especialmente a Jesus por causa da simplicidade do Mestre. Esses gêmeos não conseguiam compreender a mente de Jesus, mas eles captavam o laço de compaixão entre eles próprios e o coração do seu Mestre. As suas mentes não eram de uma qualidade elevada; eles poderiam até mesmo, com um certo respeito, ser chamados de estúpidos, mas tiveram, nas suas naturezas espirituais, uma experiência real. Eles acreditavam em Jesus; eram filhos de Deus e eram pessoas do Reino.

139:9:7 15641 Judas Alfeu sentia-se atraído pela humildade sem ostentação de Jesus. Tal humildade, aliada à dignidade pessoal do Mestre, exercia um grande encanto sobre Judas. O fato de Jesus sempre recomendar que não se falasse sobre os atos inusitados dele, causava uma grande impressão nesse filho simples da natureza.

139:9:8 15642 Os gêmeos eram ajudantes de boa índole, de mente simples, e todos amavam-nos. Jesus acolheu a esses dois jovens, de um único talento, dando-lhes posições de honra no seu grupo pessoal mais interno, do Reino, porque há milhões incontáveis de outras almas simples e temerosas, nos mundos do espaço, às quais ele quer receber, do mesmo modo, em fraternidade ativa e crente, junto a si e ao seu Espírito da Verdade, efusivo a todos. Jesus não menospreza a pequenez, apenas à maldade e ao pecado. Tiago e Judas eram pequenos, mas eram fiéis também. Eram simples e ignorantes, mas também tinham um coração grande, bom e generoso.

139:9:9 15643 E quão orgulhosamente gratos ficaram, esses homens humildes, naquele dia em que o Mestre recusou-se a aceitar um certo homem rico como evangelista, sem que ele vendesse os seus bens e ajudasse aos pobres. Quando o povo ouviu isso e viu os gêmeos entre os seus conselheiros, eles souberam, com certeza, que Jesus não tinha preferência por pessoas. E que, apenas uma instituição divina – o Reino do céu – poderia ser edificada sobre uma fundação humana de tal modo medíocre!

139:9:10 15644 Apenas uma ou duas vezes, em todo o seu convívio com Jesus, os gêmeos aventuraram-se a fazer perguntas em público. Judas uma vez ficou curioso a ponto de fazer uma pergunta a Jesus quando o Mestre tinha falado sobre revelar a si próprio abertamente ao mundo. Ele ficou um pouco decepcionado de que não houvesse mais segredos apenas para os doze, e ousou perguntar: “Mas, Mestre, quando tu te declarares assim para o mundo, como irás favorecer-nos com as manifestações especiais da tua bondade?”

139:9:11 15645 Os gêmeos serviram fielmente até o fim, até os dias escuros do julgamento, da crucificação e do desespero. Eles nunca perderam a sua fé em Jesus, e (exceto por João) foram os primeiros a acreditar na sua ressurreição. Mas não conseguiam compreender o estabelecimento do Reino. Pouco depois que o seu Mestre foi crucificado, eles voltaram para as suas famílias e para as redes de pesca; o seu trabalho estava feito. Eles não tinham a capacidade de continuar nas batalhas mais complexas do Reino. Contudo, eles viveram e morreram conscientes de terem sido honrados e abençoados pelos quatro anos de contato estreito e pessoal com um Filho de Deus, o soberano criador de um universo.

11. SIMÃO, O ZELOTE


139:11:1 15646 Simão zelote, o décimo primeiro apóstolo, foi escolhido por Simão Pedro. Era um homem capaz, de bons ancestrais, e vivia com a sua família em Cafarnaum. Contava vinte e oito anos quando se uniu aos apóstolos. Ele era um agitador feérico e também um homem que falava muito sem pensar. Tinha sido mercador em Cafarnaum antes de voltar toda a sua atenção para a organização patriótica dos zelotes.

139:11:2 15647 A Simão zelote, foi dado o encargo das diversões e do descanso do grupo apostólico, e ele era um organizador muito eficiente das diversões e das atividades de recreação dos doze.

139:11:3 15648 A força de Simão estava na sua inspirada lealdade. Quando os apóstolos encontravam um homem ou mulher debatendo-se de indecisão quanto à própria entrada no Reino, eles o mandavam para Simão. Em geral levava apenas quinze minutos para que esse advogado entusiasta da salvação pela fé em Deus dissipasse as dúvidas e removesse toda indecisão, e logo se via uma nova alma nascida na “liberdade da fé e no júbilo da salvação”.

139:11:4 15651 A grande fraqueza de Simão era a sua mente materialista. De judeu nacionalista que era, ele não poderia tão rapidamente transformar-se em um internacionalista de mente espiritualizada. Quatro anos foi um tempo curto demais para que se fizesse tal transformação intelectual e emocional, mas Jesus sempre se manteve paciente com ele.

139:11:5 15652 O que Simão tanto admirava em Jesus era a calma, a segurança, a estabilidade e a serenidade inexplicável do Mestre.

139:11:6 15653 Embora Simão fosse um revolucionário radical, um pavio destemido de agitação, ele gradualmente colocou sob controle a sua índole inflamada a ponto de tornar-se um pregador poderoso e eficiente da “Paz na Terra e boa vontade entre os homens”. Simão era um grande argumentador; e gostava de discutir. E, quando se tratava de lidar com as mentes legalistas dos judeus instruídos, ou das minúcias intelectuais dos gregos, a tarefa era sempre dada a Simão.

139:11:7 15654 Ele era um rebelde por natureza e um iconoclasta por formação, mas Jesus o conquistou para os conceitos mais elevados do Reino do céu. Ele sempre se identificou com o partido do protesto, mas agora estava unido ao partido do progresso, do progresso ilimitado e eterno do espírito e da verdade. Simão era um homem de lealdades intensas e de devoções pessoais calorosas, e ele amava profundamente a Jesus.

139:11:8 15655 Jesus não temia identificar-se com homens de negócios, com homens do trabalho, otimistas, pessimistas, filósofos, céticos, publicanos, políticos e patriotas.

139:11:9 15656 O Mestre tinha muitas conversas com Simão, mas ele nunca teve pleno êxito em fazer um internacionalista desse ardente judeu nacionalista. Jesus freqüentemente dizia a Simão que era oportuno querer ver melhoradas as ordens social, econômica e política, mas ele sempre acrescentava: “Esse assunto nada tem a ver com o Reino do céu. Devemos dedicar-nos a fazer a vontade do Pai. A nossa obra é sermos embaixadores de um governo espiritual do alto, e não devemos ocupar-nos de imediato com nada que não seja representarmos a vontade e o caráter do Pai divino, que está à frente do governo de cujas credenciais somos portadores”. Era difícil para Simão compreender, mas gradativamente ele começou a captar algo do sentido dos ensinamentos do Mestre.

139:11:10 15657 Depois da dispersão, por causa das perseguições de Jerusalém, Simão pôs-se temporariamente de retiro. Ele ficara de fato prostrado. Como um nacionalista patriota, ele se tinha capitulado em deferência aos ensinamentos de Jesus; e agora estava perdido. Estava em desespero, mas em poucos anos ele reanimou as próprias esperanças e saiu para proclamar o evangelho do Reino.

139:11:11 15658 Foi para a Alexandria e, após trabalhar Nilo acima, ele penetrou no coração da África, pregando em todos os lugares o evangelho de Jesus e batizando os crentes. Assim ele trabalhou até que a velhice e a fraqueza chegassem. E ele morreu e foi enterrado no coração da África.


12. JUDAS ISCARIOTES


139:12:1 15659 Judas Iscariotes, o décimo segundo apóstolo, foi escolhido por Natanael. Ele nasceu em Queriot, uma pequena aldeia no sul da Judéia. Quando era pequeno, os seus pais mudaram-se para Jericó, onde ele vivia e tinha sido empregado nos vários negócios das empresas do seu pai, até que se tornou interessado na pregação e na obra de João Batista. Os pais de Judas eram saduceus e, quando o filho deles juntou-se aos discípulos de João, eles o repudiaram.

139:12:2 15661 Quando Natanael conheceu Judas na Tariquéia, este se encontrava à procura de um trabalho junto a uma empresa de secagem de peixe, na extremidade baixa do mar da Galiléia. Ele tinha trinta anos e não era casado quando se juntou aos apóstolos. Ele era provavelmente o mais instruído entre os doze e o único judeu na família apostólica do Mestre. Judas não tinha nenhum traço notável de força pessoal, embora tivesse muitos traços externos aparentes de cultura e de hábitos de educação. Ele era um bom pensador, mas nem sempre um pensador verdadeiramente honesto. Judas realmente não entendia a si próprio; ele não era realmente sincero ao lidar consigo mesmo.

139:12:3 15662 André nomeou Judas como tesoureiro dos doze, uma posição para a qual ele estava eminentemente qualificado e, até a época da traição ao seu Mestre, ele desincumbiu-se das responsabilidades do seu posto, honesta, fiel e muito eficientemente.

139:12:4 15663 Não havia nenhum traço especial em Jesus que Judas admirasse mais do que a personalidade atraente em geral e extraordinariamente encantadora do Mestre. Judas nunca foi capaz de colocar-se acima dos seus preconceitos judaicos contra os seus colegas galileus; ele chegava a criticar até mesmo, na sua mente, muitas coisas de Jesus. A ele, a quem onze dos apóstolos admiravam como o homem perfeito, como o “único digno de ser amado e o mais importante entre dez mil”, é que esse presumido judeu muitas vezes ousava criticar no seu coração. E, realmente, ele acalentava a idéia de que Jesus era tímido e um pouco receoso de afirmar o seu próprio poder e autoridade.

139:12:5 15664 Judas era um bom homem de negócios. Era necessário tato, habilidade e paciência, bem como uma devoção meticulosa, para conduzir os assuntos financeiros de um idealista como Jesus, sem falar da luta com os métodos desordenados de alguns dos apóstolos na condução dos negócios. Judas realmente era um grande executivo, um financista capaz e previdente. E era de uma organização persistente. Nenhum dos doze jamais criticou Judas. Até onde podiam ver, Judas Iscariotes era um tesoureiro sem par, um homem instruído, um apóstolo leal (se bem que algumas vezes crítico) e, em todos os sentidos da palavra, um grande sucesso. Os apóstolos amavam Judas; ele era realmente um deles. Ele deve ter acreditado em Jesus, mas duvidamos que ele tenha realmente amado o Mestre, de todo o coração. O caso de Judas ilustra a verdade daquele ditado: “Há um caminho que parece o justo para um homem, mas o fim dele é a morte”. É de todo possível ser vítima da ilusão pacífica, da adaptação agradável aos caminhos do pecado e da morte. Podeis estar certos de que Judas sempre foi financeiramente leal ao seu Mestre e seus irmãos apóstolos. O dinheiro não poderia nunca ter sido o motivo da sua traição ao Mestre.

139:12:6 15665 Judas era o único filho de pais pouco sábios. Quando era muito jovem, ele foi mimado e afagado; e tornou-se uma criança mimada. Quando cresceu, tinha idéias exageradas sobre a sua própria importância. Era um mal perdedor. Nutria idéias distorcidas sobre a justiça; permitia-se a indulgência de sentir ódio e suspeita. E era especialista em interpretar erroneamente as palavras e os atos dos seus amigos. Durante toda a sua vida Judas tinha cultivado o hábito de ter de ficar quites com aqueles que, na sua fantasia, o tinham maltratado. O seu sentido de valores e lealdades era imperfeito.

139:12:7 15666 Para Jesus, Judas foi uma aventura da fé. Desde o começo, o Mestre compreendeu totalmente a fraqueza desse apóstolo e conhecia bem os perigos de admiti-lo na comunidade. No entanto, é da natureza dos Filhos de Deus dar a todos os seres criados chances plenas e iguais de salvação e de sobrevivência. Jesus queria, não apenas que os mortais desse mundo, mas também que os espectadores de inumeráveis outros mundos, soubessem que, quando existem dúvidas quanto à sinceridade, no coração, e a franqueza da devoção de uma criatura ao Reino, a prática invariável dos Juízes dos homens é receber totalmente o candidato em dúvida. A porta da vida eterna está bem aberta a todos; “quem quer que queira entrar, pode vir”; não há restrições ou qualificações, a não ser a fé daquele que vem.

139:12:8 15671 Foi só por esse motivo que Jesus permitiu a Judas ir até o fim, sempre fazendo todo o possível para transformar e salvar esse apóstolo fraco e confuso. Contudo, quando a luz não é recebida com honestidade e vivida de acordo, ela tende a transformar-se em trevas dentro da alma. Judas cresceu intelectualmente com os ensinamentos de Jesus sobre o Reino, mas não conseguiu progressos na aquisição do caráter espiritual, como lograram os outros apóstolos. Ele não conseguiu fazer um progresso pessoal satisfatório na experiência espiritual.

139:12:9 15672 Judas, cada vez mais, deixou que os desapontamentos pessoais crescessem dentro dele, para finalmente tornar-se vítima do ressentimento. Os seus sentimentos tinham sido feridos muitas vezes, e ele deixou que crescesse a suspeita de um modo anormal, a suspeita em relação aos seus melhores amigos, e até mesmo em relação ao Mestre. Em breve ele tornou-se obcecado pela idéia de tirar a diferença e ficar quites, de fazer qualquer coisa para vingar-se, sim, até mesmo a traição aos seus companheiros e ao seu Mestre.

139:12:10 15673 E essas idéias perversas e perigosas não tomaram forma definitiva até o dia em que uma mulher agradecida quebrou uma caixa valiosa de incenso aos pés de Jesus. Isto pareceu um desperdício para Judas e, quando o seu protesto público foi tão vivamente desaprovado por Jesus, ali, diante de todos, foi demais. Aquele acontecimento determinou a mobilização de todo ódio, mágoa, maldade, preconceito, inveja e vingança, acumulados em uma vida, e ele decidiu tirar a diferença não importa com quem; e então cristalizou todo o mal da sua natureza sobre a única pessoa inocente em todo o drama sórdido da sua vida desafortunada, apenas porque casualmente Jesus fora o agente principal, no episódio que marcou a sua passagem do Reino progressivo da luz para o domínio das trevas, escolhido por ele próprio.

139:12:11 15674 O Mestre, muitas vezes, tanto em particular quanto publicamente, tinha prevenido a Judas de que ele estava adormecido, mas as advertências divinas em geral são inúteis quando se trata da natureza humana amargurada. Jesus fez tudo o que foi possível, e compatível com a liberdade moral humana, para impedir que Judas escolhesse o caminho errado. O grande teste finalmente veio. O filho do ressentimento fracassou; e, dando-se uma auto-importância exagerada, ele cedeu aos ditames amargos e sórdidos de uma mente orgulhosa e vingativa, mergulhando rapidamente na confusão, no desespero e na perversidade.

139:12:12 15675 Judas então entrou na intriga baixa e vergonhosa para trair o seu Senhor e Mestre e rapidamente levou adiante o esquema nefando. Durante a realização do seu plano, concebido pela raiva e pela deslealdade traiçoeira, ele experimentou momentos de arrependimento e de vergonha e, nesses intervalos de lucidez, ele concebeu medrosamente, tal uma defesa para a sua própria mente, a idéia de que Jesus pudesse, possivelmente, exercer o seu poder e libertar a si próprio, no último momento.

139:12:13 15676 Quando o negócio vil e pecaminoso estava terminado, esse mortal renegado, que tinha dado tão pouca importância a vender o seu amigo por trinta peças de prata, para satisfazer a sua há muito alimentada sede de vingança, saiu precipitadamente e cometeu o ato final, no drama de fuga às realidades da existência mortal – o suicídio.

139:12:14 15677 Os onze apóstolos ficaram horrorizados, atordoados. Jesus olhou para o traidor apenas com piedade. Os mundos têm achado difícil perdoar Judas, e o seu nome é evitado em todo um vasto universo.

DOCUMENTO 140

A ORDENAÇÃO DOS DOZE
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Pouco antes do meio-dia, no domingo, 12 de janeiro do ano 27 d. C. , Jesus reuniu os apóstolos para a ordenação deles, como pregadores públicos do evangelho do Reino. Os doze estavam esperando ser chamados a qualquer dia; e, assim, nessa manhã eles não foram muito longe da margem para pescar. Vários deles permaneciam perto da margem, fazendo reparos nas suas redes e consertando a sua parafernália de pesca.

140:0:2 15682 Quando Jesus desceu até a praia, chamou os apóstolos e saudou primeiro a André e Pedro, que estavam pescando perto da margem; em seguida ele sinalizou para Tiago e João, que estavam em um barco por perto, conversando com Zebedeu, o pai deles, e remendando as suas redes. Dois a dois, ele convocou os apóstolos e, quando tinha reunido todos doze, seguiu com eles para as terras altas ao norte de Cafarnaum, onde continuou a instruí-los em preparo para a ordenação formal deles.

140:0:3 15683 Por uma vez, todos os doze apóstolos encontravam-se em silêncio; até mesmo Pedro estava disposto a refletir. Afinal, a hora tão esperada tinha chegado! Eles seguiam a sós com o Mestre, para participar em alguma espécie de cerimônia solene de consagração pessoal, e de dedicação coletiva ao trabalho sagrado de representar o seu Mestre, na proclamação da vinda do Reino do seu Pai.

1. A INSTRUÇÃO PRELIMINAR


140:1:1 15684 Antes do serviço da ordenação formal, Jesus falou aos doze, assentados todos em volta dele: “Meus irmãos, chegou a hora do Reino. Estais aqui comigo, isolados, porque eu vos vou apresentar ao Pai como embaixadores do Reino. Alguns de vós me ouvistes falando deste Reino na sinagoga, logo quando vós fostes chamados. Cada um de vós aprendeu mais sobre o Reino do Pai depois que estivestes trabalhando comigo nas cidades, em volta do mar da Galiléia. E agora eu tenho algo mais a dizer-vos a respeito deste Reino.

140:1:2 15685 “O novo Reino que o meu Pai está para estabelecer nos corações dos seus filhos terrenos é um domínio perene. Esse governo do meu Pai, nos corações daqueles que desejam fazer a sua divina vontade, não terá fim. Eu vos declaro que meu Pai não é um Deus só de judeus, nem de gentios. Muitos virão, do leste e do oeste, para se assentar conosco no Reino do Pai, enquanto muitos dos filhos de Abraão recusar-se-ão a aderir a essa nova fraternidade do governo do espírito do Pai, nos corações dos filhos dos homens.

140:1:3 15686 “O poder desse Reino consistirá, não da força de exércitos, nem do poder das riquezas, mas sim da glória do espírito divino que virá para ensinar às mentes e governar os corações dos cidadãos renascidos deste Reino celeste, os filhos de Deus. Essa é a fraternidade do amor, na qual reina a retidão, e cujo grito de batalha será: Paz na Terra e boa vontade a todos os homens. Este Reino, que vós estais a ponto de proclamar, é o desejo dos homens bons de todas as idades, a esperança de toda a Terra, e o cumprimento de todas as promessas sábias de todos os profetas.

140:1:4 15691 “E para vós, meus filhos, e para todos os outros que vos seguirão neste Reino, há um teste severo. Apenas a fé vos fará passar pelos seus portais, mas deveis produzir os frutos do espírito do meu Pai, se quiserdes continuar a ascender na vida progressiva da irmandade divina. Em verdade, em verdade, eu vos digo, nem todos aqueles que dizem: ‘Senhor, Senhor’, entrarão no Reino do céu; mas antes aqueles que cumprem a vontade do meu Pai que está no céu.

140:1:5 15692 “A vossa mensagem para o mundo será: buscai primeiro o Reino de Deus e a Sua retidão e, ao encontrardes isso, todas as outras coisas essenciais para a sobrevivência eterna vos serão asseguradas, por acréscimo. E agora eu deixo claro para vós que este Reino do meu Pai não virá com uma aparência exterior de poder, nem com uma demonstração pouco conveniente. E, pois, não deveis sair para proclamar o Reino dizendo: ‘ele é aqui’ ou ‘é lá’. Pois este Reino que pregais é Deus dentro de vós.

140:1:6 15693 “Aquele que quiser ser grande, no Reino do meu Pai, deve tornar-se um ministro para todos; e aquele que quiser ser o primeiro dentre vós, que se torne o servidor dos seus irmãos. E quando fordes recebidos realmente como cidadãos, no Reino celeste, não mais sereis servos, mas sereis filhos, filhos do Deus vivo. E assim progredirá este Reino, no mundo, até quebrar todas as barreiras e levar todos os homens a conhecerem o meu Pai e a acreditarem na verdade salvadora que eu vim declarar. E, agora mesmo, o Reino está ao alcance das mãos, e alguns de vós não morrereis sem terdes visto o Reino de Deus surgir em grande poder.

140:1:7 15694 “E o que os vossos olhos agora contemplam, esse pequeno começo de doze homens comuns, multiplicar-se-á e crescerá, até que finalmente toda a Terra seja preenchida de louvor ao meu Pai. E não será assim tanto pelas palavras que disserdes quanto pelas vidas que viverdes, que os homens saberão que vós tereis estado comigo e que tereis aprendido sobre as realidades do Reino. E, se bem que eu não queira depositar cargas pesadas nas vossas mentes, eu deverei colocar sobre as vossas almas a responsabilidade solene de me representarem para o mundo, quando, em breve, eu vos deixar, do mesmo modo como eu agora represento o meu Pai, nesta vida que estou vivendo na carne”. E quando terminou de falar, ele levantou-se.

2. A ORDENAÇÃO


140:2:1 15695 Jesus agora instruía, aos doze mortais que o tinham ouvido na sua declaração a respeito do Reino, para que se ajoelhassem em um círculo em volta dele. E então o Mestre colocou as suas mãos na cabeça de cada um dos apóstolos, começando por Judas Iscariotes e terminando por André. Depois de abençoa-los Jesus estendeu as suas mãos e orou:

140:2:2 15696 “Meu Pai, agora eu Te trago esses homens, meus mensageiros. Eu escolhi esses doze, dentre os nossos filhos da Terra, para que eles saiam e me representem como eu vim representar-Te. Ame a eles e esteja com eles, como Tu me amaste e estiveste comigo. E, agora, meu Pai, dá sabedoria a esses homens, pois eu coloco todos os assuntos do Reino que virá nas mãos deles. E eu gostaria, se for da Tua vontade, de permanecer na Terra por um tempo para ajudá-los, nos seus trabalhos para o Reino. E novamente, meu Pai, agradeço a Ti por esses homens, e os confio à Tua guarda enquanto eu vou terminar o trabalho que me encarregaste de fazer”.

140:2:3 15701 Quando Jesus terminou de orar, os apóstolos permaneceram quietos, inclinados em reverência, cada um deles no seu lugar. Muitos minutos se passaram antes que até mesmo Pedro ousasse levantar os olhos no intuito de olhar para o Mestre. Um a um eles abraçaram Jesus, mas nenhum daqueles homens disse palavra. Um grande silêncio penetrou o local, enquanto uma hoste de seres celestes contemplava a esta cena solene e sagrada – o Criador de um universo, colocando os assuntos da irmandade divina dos homens sob a condução de mentes humanas.

3. O SERMÃO DA ORDENAÇÃO


140:3:1 15702 E então Jesus tomou a palavra, dizendo: “Agora que sois embaixadores do Reino do meu Pai, vos tornastes, portanto, uma classe de homens distinta e separada de todos os outros homens na Terra. Agora não sois como homens entre homens, mas sois como os cidadãos esclarecidos de uma outra Terra celeste, entre as criaturas ignorantes deste mundo escuro. Não basta viverdes como se estivésseis diante desse momento, mas doravante deveis viver como aqueles que provaram das glórias de uma vida melhor e que foram enviados de volta para a Terra, como embaixadores do Soberano daquele mundo novo e melhor. Do instrutor é esperado mais do que do aluno; do mestre mais é exigido do que do servo. Dos cidadãos do Reino celeste é exigido mais do que dos cidadãos do governo terrestre. Algumas das coisas que eu vos direi podem parecer difíceis, mas vós escolhestes representar-me no mundo, como eu agora represento o Pai; e como agentes meus na Terra, vós sereis obrigados a comportar-vos segundo os ensinamentos e práticas que refletem os meus ideais da vida mortal, para os mundos do espaço, e aos quais eu dou o exemplo da minha vida terrestre, revelando o Pai que está nos céus.

140:3:2 15703 “Eu vos envio ao mundo, para proclamardes a liberdade a todos que estiverem no cativeiro espiritual, para júbilo dos prisioneiros do medo, e para curardes os doentes de acordo com a vontade do meu Pai nos céus. Quando virdes os meus filhos em angústia, falai encorajadoramente a eles, dizendo:

140:3:3 15704 “Felizes sejam os pobres em espírito, os humildes, pois deles são os tesouros do Reino do céu.

140:3:4 15705 “Felizes são aqueles que têm fome e sede de retidão, pois eles serão saciados.

140:3:5 15706 “Felizes sejam os mansos, pois eles herdarão a Terra.

140:3:6 15707 “Felizes sejam os puros de coração, pois eles verão a Deus.

140:3:7 15708 “E, deste mesmo modo, ireis falar aos meus filhos, com estas mesmas palavras de conforto espiritual e de promessa:

140:3:8 15709 “Felizes sejam aqueles que pranteiam, pois serão confortados. Felizes sejam os que choram, pois receberão o espírito do júbilo.

140:3:9 157010 “Felizes sejam os misericordiosos, pois eles receberão a misericórdia.

140:3:10 157011 “Felizes sejam os pacificadores, pois serão chamados de filhos de Deus.

140:3:11 157012 “Felizes os que forem perseguidos em nome da retidão, pois deles é o Reino do céu. Sede felizes quando os homens vos insultarem e vos perseguirem e contra vós lançarem falsamente todas as formas de mal. Jubilai em plena alegria, pois grande é a vossa recompensa nos céus.

140:3:12 157013 “Meus irmãos, eu vos envio, pois, ao mundo, e vós sois o sal da Terra, sal que tem sabor de salvação. Contudo, se esse sal perder o sabor, com o que é que se salgará? E de nada servirá mais, a menos que seja para ser jogado fora e pisoteado pelos homens. ”

140:3:13 157014 “Vós sois a luz do mundo. Uma cidade plantada em uma colina não pode ser escondida. E os homens não acendem uma vela e a colocam às escondidas, mas em um candeeiro; e ela dá a luz a todos que estão na casa. Que a vossa luz brilhe, assim, diante dos homens, para que eles possam ver as vossas boas obras e para que sejam levados a glorificar o vosso Pai que está nos céus.

140:3:14 15711 “Eu vos envio ao mundo para que representeis a mim e para que sejais os embaixadores do Reino do meu Pai e, quando sairdes para proclamar as boas-novas, confiai no Pai de quem sois mensageiros. Não resistais à injustiça com a força; não coloqueis a vossa confiança no braço da carne. Se o vosso semelhante bater na vossa face direita, dê-lhe também a outra. Estai dispostos mais a sofrer de injustiças do que a fazer cumprir a lei entre vós. Na bondade e na misericórdia, ministrai a todos os que estão na infelicidade e na necessidade.

140:3:15 15712 “E eu vos digo: Amai os vossos inimigos, fazei o bem àqueles que vos odeiam, abençoai àqueles que vos amaldiçoam, e orai por aqueles que se servem de vós, com desprezo. E tratai aos homens, do mesmo modo que acreditais que eu os trataria.

140:3:16 15713 “O vosso Pai nos céus faz o sol brilhar sobre os maus, tanto quanto sobre os bons; do mesmo modo ele envia a chuva ao justo e ao injusto. Vós sois os filhos de Deus, e mesmo mais, sois agora os embaixadores do Reino do meu Pai. Sede misericordiosos, como Deus é misericordioso e, no futuro eterno do Reino, vós sereis perfeitos, como o vosso Pai celeste é perfeito.

140:3:17 15714 “Vós tendes a missão de salvar os homens, não de julgá-los. Ao final da vossa vida terrena, todos vós deveis esperar misericórdia; e, pois, peço-vos, durante a vossa vida mortal, que demonstreis misericórdia para com todos os vossos irmãos na carne. Não cometais o erro de tentar tirar um cisco do olho do vosso irmão, quando há uma trave dentro dos vossos próprios olhos. Tendo primeiro retirado a trave do vosso próprio olho, vós podeis ver melhor para tirar o cisco do olho do vosso irmão.

140:3:18 15715 “Discerni a verdade com clareza; vivei a vida da retidão com destemor; e assim sereis meus apóstolos e embaixadores do meu Pai. Vós ouvistes o que foi dito: ‘Se um cego guia outro cego, ambos cairão no buraco’. Se quiserdes guiar outros ao Reino, deveis vós próprios caminhar na luz clara da verdade viva. Para com todos os assuntos do Reino eu vos exorto a demonstrar um julgamento justo e uma sabedoria aguçada. Não apresenteis aquilo que é sagrado aos cães, nem jogueis as vossas pérolas aos porcos, pois eles pisarão nas vossas gemas e voltar-se-ão contra vós.

140:3:19 15716 “Eu vos previno contra os falsos profetas, que virão a vós com peles de ovelhas, enquanto por dentro eles são como lobos devoradores. Pelos frutos vós os reconhecereis. Os homens colhem uvas dos espinheiros ou figos dos cardos? E ainda assim, toda boa árvore dá bons frutos, mas a árvore corrupta dá um fruto malévolo. Uma boa árvore não pode produzir frutos maus, nem uma árvore corrupta pode produzir bons frutos. Toda árvore que não dá bons frutos em breve é derrubada e jogada ao fogo. Para ganhar a entrada no Reino do céu, é o motivo que conta. Meu Pai olha dentro dos corações dos homens e os julga pelas suas aspirações interiores e pelas suas intenções sinceras.

140:3:20 15717 “No grande dia do julgamento do Reino, muitos dirão a mim: ‘Nós não professamos em vosso nome, e pelo vosso nome não fizemos obras maravilhosas?’ Contudo, serei obrigado a dizer-lhes: ‘Nunca vos conheci; afastai-vos de mim, vós que sois falsos instrutores’. E todo aquele que ouve essa instrução e sinceramente executa a sua missão de me representar diante dos homens, do mesmo modo como eu representei o meu Pai para vós, terá uma entrada ampla no meu serviço e no Reino do Pai celeste”.

140:3:21 15718 Nunca antes os apóstolos tinham ouvido Jesus falar desse modo, pois ele falou-lhes como quem tem a autoridade suprema. Eles voltaram da montanha por volta do pôr-do-sol, mas nenhum daqueles homens fez pergunta alguma a Jesus.

4. VÓS SOIS O SAL DA TERRA


140:4:1 15721 O chamado “Sermão da Montanha” não é o evangelho de Jesus. Ele traz muitos ensinamentos úteis, mas foi a instrução da ordenação de Jesus para os doze apóstolos. Foi a missão pessoal do Mestre, para aqueles que iriam pregar o evangelho e que aspiravam representá-lo no mundo dos homens, do mesmo modo que ele, tão eloqüente e perfeitamente, representava o seu Pai.

140:4:2 15722 “Vós sois o sal da Terra, sal que tem sabor de salvação. E se esse sal perder o seu sabor, com o que se salgará? Não será mais bom para nada a não ser para se jogar fora e ser pisoteado pelos homens. ”

140:4:3 15723 Na época de Jesus o sal era precioso. Era usado até mesmo como dinheiro. A moderna palavra “salário” deriva-se de sal. O sal não apenas dá sabor aos alimentos, mas é também um conservante. Faz com que outros alimentos fiquem mais saborosos, e para isso ele serve.

140:4:4 15724 “Vós sois a luz do mundo. Uma cidade plantada na montanha não pode ficar escondida. Nem os homens acendem uma vela e a colocam às escondidas, mas em um candeeiro; e ele dá a luz a todos os que estão na casa. Que a vossa luz brilhe assim diante dos homens, para que eles possam ver as vossas boas obras e para que sejam levados a glorificar o vosso Pai, que está no céu. ”

140:4:5 15725 Ainda que a luz dissipe as trevas, ela também pode “cegar” a ponto de confundir e de frustrar. Somos exortados a fazer a nossa luz brilhar de um modo tal que os nossos semelhantes sejam guiados a novos e bons caminhos de vida elevada. A nossa luz deveria brilhar assim, não para atrair a atenção para nós próprios. Até mesmo a vossa atividade de vocação pode ser utilizada como um “refletor” eficaz para a disseminação dessa luz de vida.

140:4:6 15726 Os caráteres fortes não se formam por não fazerem absolutamente o mal, mas muito mais por fazerem de fato o bem. A ausência de egoísmo é a insígnia da grandeza humana. Os níveis mais elevados de auto-realização são alcançados pela adoração e serviço. A pessoa feliz e eficiente é motivada, não pelo medo de fazer errado, mas pelo amor de fazer o certo.

140:4:7 15727 “Pelos seus frutos vós os conhecereis. ” A personalidade é basicamente imutável; o que muda – cresce – é o caráter moral. O erro maior das religiões modernas é o negativismo. A árvore que não dá frutos é “derrubada e jogada ao fogo”. O valor moral não pode originar-se de uma simples repressão obedecendo à injunção que prega o “não farás”. O medo e a vergonha são motivações sem valor para a vida religiosa. A religião é válida apenas quando revela a paternidade de Deus e realça a irmandade dos homens.

140:4:8 15728 Uma filosofia eficaz de vida é formada por uma combinação de discernimento cósmico e do todo das reações emocionais ao ambiente social e econômico. Lembrai-vos: Conquanto os impulsos hereditários não possam ser modificados fundamentalmente, as respostas emocionais a tais impulsos podem ser mudadas; a natureza moral pode, portanto, ser modificada, o caráter pode ser melhorado. No caráter forte as respostas emocionais são integradas e coordenadas e, assim, é produzida uma personalidade unificada. Uma unificação deficiente enfraquece a natureza moral e engendra a infelicidade.

140:4:9 15729 Sem uma meta digna, a vida torna-se sem interesse, torna-se inútil, e resulta em muita infelicidade. O discurso de Jesus para a ordenação dos doze constitui uma filosofia da mestria da vida. Jesus recomendou, aos seus seguidores, exercerem a fé experiencial. Ele exortou-os a não dependerem de meros consentimentos intelectuais, de uma credulidade qualquer e da autoridade estabelecida.

140:4:10 15731 A educação deveria ser uma técnica de aprendizado (descoberta) de melhores métodos de gratificar as nossas tendências naturais e as herdadas, e a felicidade é o todo resultante dessas técnicas melhoradas de satisfações emocionais. A felicidade depende pouco do ambiente, embora os locais agradáveis possam contribuir grandemente para ela.

140:4:11 15732 Todo mortal anseia realmente por ser uma pessoa completa, por ser perfeito, como o Pai no céu é perfeito, e realizar isso é possível porque, em última análise, o “universo é verdadeiramente paterno”.

5. O AMOR PATERNO E O AMOR FRATERNO


140:5:1 15733 Do Sermão da Montanha ao discurso da Última Ceia, Jesus ensinou os seus seguidores a manifestarem o amor paterno mais do que o amor fraterno. O amor fraterno seria amar o teu semelhante como a ti próprio, e isso seria um preenchimento adequado da “regra de ouro”. O afeto paterno, todavia, exige que tu ames os teus semelhantes mortais como Jesus te ama.

140:5:2 15734 Jesus ama a humanidade com um afeto dual. Ele viveu na Terra como uma personalidade de duas naturezas – a humana e a divina. Como Filho de Deus, ele ama o homem com um amor paterno – ele é o Criador do homem, o seu pai neste universo. Enquanto Filho do Homem, Jesus ama os mortais como um irmão – ele foi verdadeiramente um homem entre os homens.

140:5:3 15735 Jesus não esperou que os seus seguidores realizassem uma manifestação impossível de amor fraterno, mas ele esperou que eles se esforçassem para ser como Deus – ser perfeitos como o Pai no céu é perfeito –, que eles pudessem começar a ver o homem como Deus vê as suas criaturas e que, portanto, pudessem começar a amar os homens como Deus os ama – demonstrando o começo de um afeto paterno. Durante essas exortações aos doze apóstolos, Jesus buscou revelar esse novo conceito do amor paterno, do modo como ele se relaciona a algumas atitudes emocionais preocupadas em fazer numerosos ajustamentos sociais para o meio ambiente.

140:5:4 15736 O Mestre apresentou esse discurso memorável chamando a atenção para quatro atitudes de fé, como um prelúdio para retratar subseqüentemente as suas quatro reações transcendentes e supremas de amor paterno, contrastando-as com as limitações do amor meramente fraterno.

140:5:5 15737 Primeiro ele falou sobre aqueles que eram pobres em espírito, que eram famintos de retidão, que persistiam na mansidão e que eram puros de coração. Podia-se esperar que esses mortais discernidores do espírito alcançassem níveis divinos tais de ausência de egoísmo que os tornassem capazes de atingir o exercício surpreendente do afeto paterno; que, mesmo como lamentadores, eles teriam forças para demonstrar misericórdia, para promover a paz e para resistir às perseguições e, durante todas essas situações de provação, para amarem até mesmo a uma humanidade não amável, com um amor paterno. Um afeto paterno pode alcançar níveis de devoção que transcendem incomensuravelmente um afeto fraterno.

140:5:6 15738 A fé e o amor dessas beatitudes fortalecem o caráter moral e criam a felicidade. O medo e a raiva enfraquecem o caráter e destroem a felicidade. Esse sermão memorável teve o seu começo com uma nota sobre a felicidade.

140:5:7 15739 1. “Felizes são os pobres em espírito – os humildes. ” Para uma criança, a felicidade é a satisfação de um desejo de prazer imediato. O adulto está disposto a semear os grãos da renúncia, com o fito de ter colheitas subseqüentes de maior felicidade. Na época de Jesus, e desde então, a felicidade tem sido muito freqüentemente associada à idéia da posse de riquezas. Na história do fariseu e do publicano orando no templo, um sentia-se rico em espírito – egotista; o outro se sentia “pobre em espírito” – humilde. Um era auto-suficiente; o outro era capaz de aprender e de buscar a verdade. O pobre em espírito busca as metas da riqueza espiritual – busca a Deus. E os que buscam a verdade não têm de esperar por recompensas em um futuro distante; eles são recompensados agora. Eles encontram o Reino do céu dentro dos seus próprios corações, e experimentam uma tal felicidade agora.

140:5:8 15741 2. “Felizes são aqueles que têm fome e sede de retidão, pois eles serão saciados. ” Apenas aqueles que se sentem pobres em espírito irão ter fome e sede de retidão. Apenas os humildes buscam a força divina e almejam o poder espiritual. No entanto é muito perigoso praticar conscientemente o jejum espiritual com o fito de melhorar o próprio apetite pelos dons espirituais. O jejum físico torna-se perigoso, depois de quatro ou cinco dias; faz com que nos tornemos aptos a perder todo desejo de alimento. O jejum prolongado, seja físico ou espiritual, tende a destruir a fome.

140:5:9 15742 A retidão experiencial é um prazer, não um dever. A retidão de Jesus é um amor dinâmico – o afeto paterno junto com o fraterno. Não é o tipo de retidão negativa, o tipo “não faça” de retidão. Como é que alguém poderia almejar uma coisa negativa – uma coisa a “não fazer”?

140:5:10 15743 Não é tão fácil ensinar, à mente de uma criança, essas duas primeiras beatitudes, mas a mente amadurecida deveria captar o significado delas.

140:5:11 15744 3. “Felizes são os mansos, pois eles herdarão a Terra. ” A mansidão genuína não tem nenhuma relação com o medo. É mais a atitude de um homem cooperando com Deus – “A vossa vontade será feita”. Abrange a paciência e a tolerância, e é motivada pela fé inabalável em um universo amistoso e cumpridor da lei. Ela mantém o controle de todas as tentações de rebeldia contra o guiamento divino. Jesus foi o homem manso ideal de Urântia, e ele herdou um vasto universo.

140:5:12 15745 4. “Felizes são os puros de coração, pois eles verão a Deus. ” A pureza espiritual não é uma qualidade negativa, a não ser ao negar a suspeita e a vingança. Ao discutir sobre a pureza, Jesus não teve a intenção de tratar exclusivamente das atitudes sexuais humanas. Ele referia-se mais àquela fé que o homem deveria ter no seu semelhante; aquela fé que um pai tem no seu filho, e que o capacita a amar os seus semelhantes como um pai os amaria. O amor do pai não necessita mimar, e não fecha os olhos para o mal, mas é sempre anticínico. O amor paterno tem sempre um único propósito, e sempre busca o melhor no homem, que é a atitude de um verdadeiro progenitor.

140:5:13 15746 Ver a Deus – pela fé – significa adquirir o verdadeiro discernimento espiritual. E o discernimento espiritual intensifica o guiamento do Ajustador, e tudo isso, no fim, aumenta a consciência de Deus. E quando vós conhecerdes o Pai, vós estareis confirmados na certeza da filiação divina, e podereis amar cada vez mais a cada um dos vossos irmãos na carne, não apenas como um irmão – com o amor fraterno – mas também como um pai – com o afeto paterno.

140:5:14 15747 Essa exortação é fácil de transmitir, até mesmo a uma criança. As crianças são naturalmente confiantes, e os pais deveriam procurar fazer com que elas não perdessem essa fé simples. Ao lidardes com as crianças, evitai qualquer modo de enganá-las e abstendes de sugerir suspeitas. Sabiamente ajudai-as a selecionar os seus heróis e a escolher o trabalho da vida delas.

140:5:15 15748 E então Jesus continuou a instruir os seus discípulos na realização do propósito principal de toda a luta humana – a perfeição – a própria realização divina. E ele sempre lhes lembrava: “Sede perfeitos, como o vosso Pai nos céus é perfeito”. Ele não exortava os doze a amar os seus semelhantes como eles amavam a si próprios. Isso teria sido uma realização condigna; teria indicado a realização do amor fraterno. Jesus aconselhava os seus apóstolos a amar os homens como ele os tinha amado – com o amor paterno, tanto quanto com um afeto fraterno. E ilustrava isso apontando as quatro reações supremas do amor paterno:

140:5:16 15751 1. “Felizes são os que pranteiam, pois serão confortados. ” Nem o chamado senso comum, nem a melhor das lógicas nunca sugeririam que a felicidade poderia derivar-se da aflição. Jesus, porém, não se referia ao lamento externo ou ostentatório. Ele aludia a uma atitude emocional de ternura de coração. É um grande erro ensinar aos meninos e aos rapazes que não é masculino demonstrar ternura ou, de qualquer outro modo, evidenciar sentimentos emocionais ou sofrimento físico. A compaixão é um atributo tão condigno para o homem quanto o é para a mulher. Não é necessário ser endurecido para ser-se masculino. Essa é a forma errada de criar homens corajosos. Os grandes homens do mundo não tiveram medo de lamentar. Moisés, o lamentador, foi um grande homem, mais do que Sansão e mais do que Golias. Moisés foi um líder magnífico, mas ele era um homem também de mansidão. Ser sensível e susceptível às necessidades humanas gera uma felicidade genuína e duradoura, ao mesmo tempo em que essas atitudes gentis protegem a alma das influências destrutivas da raiva, do ódio e da suspeita.

140:5:17 15752 2. “Felizes são os misericordiosos, pois eles alcançarão a misericórdia. ” Misericórdia aqui tem a conotação da altura, da profundidade e da largura da mais verdadeira amizade – o amor da bondade. A misericórdia, algumas vezes pode ser passiva, mas aqui ela é ativa e dinâmica – a paternalidade suprema. Um pai cheio de amor tem um pouco de dificuldade em perdoar o seu filho, muitas vezes até. E, em um filho não mimado, o impulso de aliviar o sofrimento é natural. Os filhos são normalmente bons e compassivos quando já têm idade suficiente para avaliar as condições reais.

140:5:18 15753 3. “Felizes são os pacificadores, pois serão chamados filhos de Deus. ” Os ouvintes de Jesus careciam de libertação militar, não almejavam pacificadores. A paz de Jesus, contudo, não é da espécie pacífica e negativa. Em face das provações e das perseguições, ele disse: “A minha paz eu a deixo convosco”. “Que o vosso coração não seja perturbado, e que não padeça de temores. ” Esta é a paz que evita conflitos danosos. A paz pessoal integra a personalidade. A paz social afasta o medo, a cobiça e a raiva. A paz política impede os antagonismos raciais, as suspeitas nacionais e a guerra. Buscar a paz é a cura para a desconfiança e a suspeita.

140:5:19 15754 As crianças podem aprender facilmente a funcionar como pacificadoras. Elas gostam de atividades grupais; elas gostam de brincar juntas. E o Mestre disse certa vez: “Quem quiser salvar a sua vida irá perdê-la, mas quem perder a sua vida irá encontrá-la”.

140:5:20 15755 4. “Felizes daqueles que forem perseguidos por causa da sua retidão, pois deles é o Reino do céu. Felizes sereis quando os homens vos insultarem e vos perseguirem e lançarem falsamente todo o tipo de mal contra vós. Rejubilai-vos na alegria mais extrema, pois grande é a vossa recompensa nos céus. ”

140:5:21 15756 E, assim, freqüentemente a perseguição vem depois da paz. E os jovens e os adultos corajosos nunca fogem da dificuldade ou do perigo. “Nenhum amor é maior do que aquele que dá a sua vida pelos seus amigos. ” E um amor paterno pode livremente fazer todas essas coisas – coisas que o amor fraterno dificilmente consegue abranger. E o progresso tem sido sempre a colheita final da perseguição.

140:5:22 15757 As crianças sempre respondem ao desafio da coragem. A juventude está sempre disposta a “ousar”. E toda criança deveria aprender cedo a sacrificar-se.

140:5:23 15758 E assim é revelado que as beatitudes do Sermão da Montanha são baseadas na fé e no amor, e não na lei – ética ou dever.

140:5:24 15759 O amor paterno tem prazer em dar o bem em troca do mal – em fazer o bem em represália à injustiça.

6. A NOITE DA ORDENAÇÃO


140:6:1 15761 Domingo ao anoitecer, quando chegaram à casa de Zebedeu, vindos das terras altas ao norte de Cafarnaum, Jesus e os doze compartilharam uma refeição simples. Depois Jesus saiu para uma caminhada pela praia, enquanto os doze estiveram conversando entre eles. Depois de uma breve discussão, enquanto os gêmeos faziam uma pequena fogueira para dar-lhes calor e mais luz, André foi encontrar Jesus e, quando o alcançou, disse: “Mestre, meus irmãos são incapazes de compreender o que disseste sobre o Reino. Não nos sentimos capazes de começar este trabalho, antes que nos dês outras instruções. Eu vim para pedir-te que te juntes a nós no jardim e que nos ajude a compreender o significado das tuas palavras”. E Jesus foi com André encontrar-se com os apóstolos.

140:6:2 15762 Depois de entrar no jardim, ele juntou os apóstolos em volta de si e ensinou-lhes outras coisas mais, e disse-lhes: “Achais difícil receber a minha mensagem porque vós quereis construir o novo ensinamento diretamente em cima do antigo, mas eu declaro que deveis renascer. Deveis começar de novo, como pequenas crianças, e deveis estar dispostos a confiar no meu ensinamento e a acreditar em Deus. O novo evangelho do Reino não pode ser tomado como se se quisesse conformá-lo ao que existe. Vós tendes idéias erradas sobre o Filho do Homem e a sua missão na Terra. E não cometais o erro de pensar que eu vim para pôr de lado a lei e os profetas; eu não vim para destruir, mas para cumprir, para ampliar e para iluminar. Eu não vim para transgredir a lei, mas antes para escrever esses novos mandamentos nas tábuas dos vossos corações.

140:6:3 15763 “Eu peço de vós uma retidão que excederá a retidão daqueles que buscam obter o favorecimento do Pai por meio de caridades, prece e jejum. Se vós quereis entrar no Reino, vós deveis ter uma retidão que consiste do amor, misericórdia e verdade – o desejo sincero de fazer a vontade do meu Pai nos céus. ”

140:6:4 15764 Então disse Simão Pedro: “Mestre, se tu tens um novo mandamento, nós o ouviremos. Revele a nós o novo caminho”. Jesus respondeu a Pedro: “Vós o ouvistes, dito por aqueles que ensinam a lei: ‘Não matarás, pois aquele que matar estará sujeito a julgamento’. Entretanto eu olho além do ato, para ver o motivo a descoberto. Eu declaro a vós, que todo aquele que tiver raiva do seu irmão está em perigo de condenação. Aquele que nutre o ódio no seu coração e planeja a vingança na sua mente, está em perigo de ser julgado. Vós só podeis julgar os vossos companheiros pelos atos deles; o Pai, que está nos céus, julga pela intenção.

140:6:5 15765 “Vos ouvistes os instrutores da lei dizendo: ‘Não cometereis adultério’. Mas eu vos digo que todo homem que olha para uma mulher, com a intenção de desejo por ela, já cometeu o adultério com ela, no seu coração. Vós podeis julgar os homens apenas pelos seus atos, mas o meu Pai vê dentro dos corações dos seus filhos e, com misericórdia, julga-os, de acordo com as suas intenções e com os desejos reais”.

140:6:6 15766 Jesus tinha a intenção de continuar examinando os outros mandamentos, quando Tiago Zebedeu interrompeu-o, perguntando: “Mestre, o que devemos ensinar ao povo a respeito do divórcio? Devemos permitir a um homem divorciar-se da sua mulher, como Moisés mandou?” E, quando ouviu essa pergunta, Jesus disse: “Eu não vim para legislar, mas para esclarecer. Eu vim, não para reformar os reinos deste mundo, mas antes para estabelecer o Reino do céu. Não é da vontade do Pai que eu devesse ceder à tentação de ensinar-vos as regras do governo, do comércio, nem do comportamento social, as quais, embora pudessem ser boas para hoje, poderiam estar longe de serem adequadas para a sociedade de outra idade. Estou na Terra somente para confortar as mentes, para liberar os espíritos e para salvar as almas dos homens. Mas eu vos direi, a respeito dessa questão do divórcio que, embora Moisés fosse favorável a esses procedimentos, não era assim nos dias de Adão no Jardim”.

140:6:7 15771 Depois que os apóstolos tinham conversado entre si, durante um certo tempo, Jesus continuou a falar: “Vós deveis sempre reconhecer dois pontos de vista em toda conduta mortal – o humano e o divino; os caminhos da carne e o caminho do espírito; a perspectiva do tempo e a visão da eternidade”. E, embora os doze não pudessem compreender tudo o que ele lhes ensinava, eles foram realmente ajudados por essa instrução.

140:6:8 15772 E então disse Jesus: “Mas vós tropeçareis nos meus ensinamentos porque vós estais acostumados a interpretar a minha mensagem literalmente; sois vagarosos ao discernir o espírito do meu ensinamento. De novo, deveis lembrar-vos de que sois meus mensageiros; vós sois obrigados a viver as vossas vidas como eu tenho vivido a minha em espírito. Vós sois os meus representantes pessoais; mas não cometais o engano esperar que todos os homens vivam como vós, sob todos os pontos de vista. Vós vos deveis lembrar também de que eu tenho ovelhas que não são desse rebanho, e de que também tenho obrigações para com elas, pois devo prover-lhes o modelo de fazer a vontade do Pai, enquanto eu viver a vida da natureza mortal”.

140:6:9 15773 E então Natanael perguntou: “Mestre, não devemos dar um lugar à justiça? A lei de Moisés diz: ‘Um olho por um olho, e um dente por um dente’. O que devemos dizer?” E Jesus respondeu: “Deveis retribuir ao mal com o bem. Os meus mensageiros não devem disputar com os homens, mas serem gentis com todos. Medida por medida, não será essa a vossa regra. Os chefes entre os homens podem ter tais leis, mas não é assim no Reino; a misericórdia determinará sempre os vossos julgamentos, e o amor determinará a vossa conduta. E se esses são princípios duros, ainda agora podeis desistir. Se achardes os quesitos do apostolado muito penosos, podeis voltar para o caminho menos rigoroso do discipulado”.

140:6:10 15774 Ao ouvir essas palavras assustadoras, os apóstolos reuniram-se todos, à parte, por um momento, mas logo voltaram, e Pedro disse: “Mestre, gostaríamos de continuar contigo; nenhum de nós retrocederia. Estamos totalmente preparados para arcar com o preço extra; beberemos da taça. Gostaríamos de ser apóstolos, não discípulos meramente”.

140:6:11 15775 Quando Jesus ouviu isso, disse: “Estai dispostos, então, a assumir as vossas responsabilidades e seguir-me. Fazei as vossas boas ações em segredo; quando derdes esmolas, que a vossa mão esquerda não saiba o que faz a mão direita. E então, quando orardes, permanecei separados e a sós e não useis de repetições vãs nem de frases sem sentido. Lembrai-vos sempre de que o Pai sabe o que vós necessitais, antes mesmo de pedirdes a Ele. E não vos entregueis a jejuns, mantendo uma figura triste, para serdes vistos pelos homens. Como apóstolos escolhidos meus, agora a serviço do Reino, não deveis armazenar para vós próprios tesouros na Terra, mas, pelos vossos serviços altruístas, armazenai para vós próprios tesouros no céu, pois onde estiverem os vossos tesouros, lá também estarão os vossos corações.

140:6:12 15776 “A lâmpada do corpo é o olho; portanto se o vosso olho é generoso, o vosso corpo inteiro estará cheio de luz. Mas se o vosso olho é egoísta, o corpo inteiro será preenchido por trevas. Se a própria luz que está em vós estiver voltada para as trevas, grandes serão essas trevas!”

140:6:13 15777 E então Tomé perguntou a Jesus se eles deveriam “continuar tendo tudo em comum”. Disse o Mestre: “Sim, meus irmãos, eu gostaria que vivêssemos juntos, como uma família que se compreende bem. Vós estais encarregados de um grande trabalho, e almejo que o vosso serviço não se divida. Vós sabeis que foi dito com justeza: ‘Nenhum homem pode servir a dois mestres’. Vós não podeis adorar sinceramente a Deus e, de todo coração, ao mesmo tempo servir à cobiça. Tendo agora vos alistado, sem reservas, no trabalho do Reino, não tenhais ansiedades pelas vossas vidas; e muito menos deveis preocupar-vos com o que ireis comer ou com o que ireis beber; nem mesmo com os vossos corpos, nem com a roupa que devereis usar. Vós já aprendestes que mãos dispostas e corações honestos nunca terão fome. E agora, quando vos preparardes para devotar todas as vossas energias ao trabalho do Reino, podeis estar seguros de que o Pai não irá esquecer-se das vossas necessidades. Primeiro buscai o Reino de Deus e, quando tiverdes encontrado a vossa entrada nele, todas as coisas que vos forem necessárias, virão por acréscimo. Não sejais, portanto, indevidamente ansiosos com o amanhã. Devemos preocupar-nos com o que é suficiente para o dia”.

140:6:14 15781 Quando Jesus viu que estavam dispostos a permanecer acordados toda a noite fazendo perguntas, ele lhes disse: “Meus irmãos, vós sois como vasos de barro; é melhor irdes descansar para que estejais prontos para o trabalho de amanhã”. Mas o sono tinha fugido dos olhos deles. Pedro aventurou-se a pedir ao Mestre: “Posso ter só uma pequena conversa em particular contigo? Não que eu tenha segredos para os meus irmãos, mas tenho o espírito atormentado e, por acaso, se eu tiver de merecer uma repreensão do meu Mestre, eu a suportaria melhor se estivesse a sós contigo”? E Jesus disse: “Venha comigo, Pedro” – conduzindo-o para dentro da casa. Quando Pedro retornou de junto da presença do seu Mestre muito animado e grandemente encorajado, Tiago decidiu ir falar com Jesus. E assim, até as primeiras horas da madrugada, os outros apóstolos foram, um a um, falar com o Mestre. Quando todos tinham tido uma conversa pessoal com ele, exceto os gêmeos, que haviam caído no sono, André foi a Jesus e disse: “Mestre, os gêmeos caíram no sono no jardim, ao lado da fogueira; devo despertá-los e perguntar se querem também falar contigo?” E Jesus sorrindo disse a André: “Eles estão bem – não os incomode”. E, agora, a noite chegava ao fim; a luz de um outro dia estava surgindo.

7. A SEMANA SEGUINTE À DA ORDENAÇÃO


140:7:1 15782 Depois de umas poucas horas de sono, quando os doze estavam reunidos para um desjejum tardio com Jesus, ele disse: “Agora, deveis começar o vosso trabalho de pregar as boas-novas e de instruir os crentes. Preparem-se para ir a Jerusalém”. Depois de Jesus ter falado, Tomé reuniu coragem para dizer: “Sei, Mestre, que deveríamos estar prontos agora para iniciar o trabalho, mas temo que não estejamos ainda aptos para realizar essa grande tarefa. Consentirias que ficássemos por aqui apenas mais uns poucos dias, antes de começarmos o trabalho do Reino?” E quando Jesus viu que todos os seus apóstolos estavam possuídos por esse mesmo temor, ele disse: “Será como vós pedistes; permaneceremos aqui até o sábado”.

140:7:2 15783 Durante semanas e mais semanas pequenos grupos de buscadores sinceros da verdade, junto com espectadores curiosos, tinham vindo a Betsaida para ver Jesus. Já se falava sobre ele, em todo o país; os grupos de indagadores vinham das cidades distantes como Tiro, Sidom, Damasco, Cesaréia e Jerusalém. Até então, Jesus havia saudado essa gente e lhes tinha ensinado sobre o “Reino, mas agora o Mestre repassava esse trabalho aos doze. André escolheria um dos apóstolos e o designaria para um grupo de visitantes e, algumas vezes, todos os doze ficavam ocupados com essa tarefa.

140:7:3 15784 Por dois dias eles trabalharam, ensinando dia a dia e mantendo conversas particulares até tarde da noite. Ao terceiro dia Jesus conversou com Zebedeu e Salomé, enquanto mandou os seus apóstolos “saírem para pescar, buscando mudanças e distrações ou mesmo visitar as famílias”. Na quinta-feira eles retornaram para mais três dias mais de ensinamentos.

140:7:4 15785 Durante essa semana de aperfeiçoamento, muitas vezes Jesus repetiu aos seus apóstolos os dois grandes motivos da sua missão pós-batismal na Terra:

15787 1. Revelar o Pai ao homem.

15788 2. Conduzir os homens para que eles se tornem conscientes da filiação – da compreensão, pela fé, de que são filhos do Altíssimo.

140:7:5 15791 Uma semana nessa experiência variada fez muito pelos doze apóstolos; alguns se tornaram até autoconfiantes demais. Na última conversa, na noite depois do sábado, Pedro e Tiago vieram a Jesus, dizendo: “Nós estamos prontos – agora podemos ir em frente, e ensinar sobre o Reino”. Ao que Jesus respondeu: “Que a vossa sabedoria se iguale ao vosso zelo e que a vossa coragem compense a vossa ignorância”.

140:7:6 15792 Embora os apóstolos não compreendessem muita coisa dos seus ensinamentos, eles não deixavam de entender o significado da beleza da vida encantadora que levaram junto ao Mestre.

8. QUINTA-FEIRA À TARDE NO LAGO


140:8:1 15793 Jesus sabia muito bem que os seus apóstolos não estavam assimilando plenamente os ensinamentos. E decidiu dar alguma instrução especial a Pedro, Tiago e João, esperando que eles fossem capazes de dar esclarecimentos aos seus companheiros. Ele sabia que, conquanto alguns aspectos da idéia de um Reino espiritual estivessem sendo captados pelos doze, eles continuavam rigidamente associando esses novos ensinamentos espirituais do Reino do céu direta e literalmente aos seus conceitos antigos, já entranhados e cristalizados, como se o Reino pudesse ser algo como uma restauração do trono de Davi e um restabelecimento de Israel no seu poder temporal na Terra. Desse modo, na quinta-feira à tarde, Jesus foi à praia e saiu em um barco com Pedro, Tiago e João, para conversarem sobre os assuntos do Reino. Essa foi uma conversa de quatro horas, e abrangeu muitas perguntas e respostas, e deve ser de proveito colocar tudo aqui, neste registro, que reorganiza o sumário dessa tarde memorável, como foi passado por Simão Pedro ao seu irmão, André, na manhã seguinte:

140:8:2 15794 1. Fazer a vontade do Pai. O ensinamento de Jesus, para que se confie nos cuidados superiores do Pai celeste, não é o de um fatalismo cego e passivo. Ele cita com aprovação, nessa tarde, uma antiga afirmação hebraica que declara: “Aquele que não trabalha não comerá”. E aponta a sua própria experiência como sendo um testemunho suficiente dos seus próprios ensinamentos. Os seus preceitos, sobre confiar no Pai, não devem ser analisados segundo as condições sociais e econômicas dos tempos modernos ou de qualquer outra idade. A instrução dele abrange os princípios ideais, da vida perto de Deus, em todas as idades e em todos os mundos.

140:8:3 15795 Jesus deixou claro, para os três, a diferença entre as exigências para as funções do apostolado e as do discipulado. E ainda assim ele não proibiu, aos doze, o exercício da prudência e da previsão. Ele era contrário à ansiedade e à preocupação, não à precaução. Ele ensinava a submissão alerta e ativa à vontade de Deus. Em resposta a muitas das perguntas deles a respeito de frugalidades e de trivialidades, ele simplesmente chamou a atenção para a sua vida de carpinteiro, de fazedor de barcos e de pescador, e para a sua cuidadosa organização dos doze. Ele procurou deixar claro que o mundo não é para ser encarado como um inimigo; que as circunstâncias da vida são formadas por uma dispensação divina que trabalha junto com os filhos de Deus.

140:8:4 15796 Jesus teve uma grande dificuldade em fazê-los compreender a sua prática pessoal da não resistência. Ele recusava-se absolutamente a defender-se, e parecia aos apóstolos que ele ficaria contente se eles seguissem a mesma política. Ele ensinou-lhes a não resistir ao mal, a não combaterem a injustiça nem a injúria, mas ele não lhes ensinou a tolerarem passivamente a conduta errada. E deixou claro, nessa tarde, que ele aprovava a punição social dos malfeitores e dos criminosos, e que o governo civil deveria, algumas vezes, empregar a força na manutenção da ordem social e na execução da justiça.

140:8:5 15797 Ele nunca cessou de prevenir aos seus discípulos contra as más práticas da represália; ele desaprovava totalmente a vingança, a idéia do acerto de contas. Ele deplorava o fato de se guardar rancores. Ele não aprovava a idéia de olho por olho e dente por dente. Ele rejeitava todo o conceito da revanche privada e pessoal, atribuindo essas questões ao governo civil, por um lado, e ao julgamento de Deus, por outro. Ele deixou claro, para os três, que os seus ensinamentos aplicavam-se ao indivíduo, não ao Estado. Ele resumiu as suas instruções, até aquele momento, a respeito dessas questões da seguinte forma:

140:8:6 15801 Amai os vossos inimigos – lembrai-vos das asserções morais da irmandade humana.

140:8:7 15802 A inutilidade do mal: um erro não se torna certo pela vingança. Não cometais o erro de responder ao mal com as próprias armas dele.

140:8:8 15803 Tende – a confiança no triunfo final da justiça divina e da bondade eterna.

140:8:9 15804 2. A atitude política. Ele advertiu aos seus apóstolos para que fossem discretos nas suas observações a respeito das relações, então estremecidas, existentes entre o povo judeu e o governo romano; ele proibiu-os de envolverem-se, de qualquer modo, nessas dificuldades. Ele foi cuidadoso, em qualquer ocasião, para evitar as ciladas políticas dos seus inimigos, sempre com a observação: “Dai a César as coisas que são de César e a Deus as coisas que são de Deus”. Ele negava-se a deixar a sua atenção dispersar-se da sua missão de estabelecer um novo caminho de salvação; ele não permitiria a si próprio envolver-se em qualquer outra coisa. Na sua vida pessoal, ele sempre observou devidamente todas as leis e as regras civis; em todos os seus ensinamentos públicos, ele ignorou os reinos civil, social e econômico. Ele disse aos três apóstolos que ele ocupava-se apenas com os princípios da vida interior pessoal e espiritual do homem.

140:8:10 15805 Jesus não foi, portanto, um reformador político. Ele não veio para reorganizar o mundo; e ainda que tivesse feito reformas, elas teriam sido aplicáveis apenas àqueles dias e àquela geração. Todavia, ele mostrou ao homem o melhor modo de viver, e nenhuma geração está isenta do trabalho de descobrir como melhor adequar a vida de Jesus aos seus próprios problemas. Nunca, todavia, deveis cometer o erro de identificar os ensinamentos de Jesus com qualquer teoria política ou econômica, com qualquer sistema social ou industrial.

140:8:11 15806 3 . A atitude social. Os rabinos judeus há muito debatiam sobre a questão: Quem é o meu próximo? Jesus vinha apresentando a idéia da bondade ativa e espontânea, um amor tão legítimo pelo outro, o semelhante e o vizinho, que fez expandir a noção do que é o próximo, a ponto de incluir o mundo inteiro, e então fazendo com que os nossos próximos fossem todos os homens. Mas, com tudo isso, Jesus estava interessado apenas no indivíduo, não na massa. Jesus não era um sociólogo, ele apenas trabalhou para romper todas as formas de isolamento egoísta. Ele ensinou a simpatia da pura compaixão. Michael de Nebadon é um Filho dominado pela misericórdia; a compaixão é a sua natureza mesma.

140:8:12 15807 O Mestre não disse que os homens não devessem entreter os seus amigos durante as refeições, mas ele disse que os seus seguidores deveriam fazer festas para os pobres e os desafortunados. Jesus tinha um senso firme de justiça, mas que foi sempre temperado pela misericórdia. Ele não ensinou aos seus apóstolos que deixassem os parasitas sociais e os pedintes profissionais tirar vantagem deles. O mais próximo que ele esteve de fazer pronunciamentos sociológicos foi quando mencionou: “Não julgueis, para que não sejais julgados”.

140:8:13 15808 Ele deixou claro que a bondade indiscriminada poderia ser considerada a culpada de muitos males sociais. No dia seguinte Jesus deu a Judas a instrução definitiva de que nenhum fundo apostólico fosse dado como esmola, a não ser a pedido dele ou sob o pedido conjunto de dois dos apóstolos. Para todas essas questões, a prática era que Jesus dissesse: “Sede sábios como as serpentes, mas tão inofensivos como os pombos”. Parecia ser o seu propósito, em todas as situações sociais, ensinar a paciência, a tolerância e o perdão.

140:8:14 15811 A família ocupava o centro mesmo da filosofia de vida de Jesus – aqui e na vida futura. Ele baseava os seus ensinamentos sobre Deus na família, ao mesmo tempo em que tentava corrigir a tendência judaica de honrar os antepassados em exagero. Ele exaltava a vida familiar como o dever humano mais elevado, mas deixava claro que as relações familiares não deveriam interferir nas obrigações religiosas. Ele chamava atenção para o fato de que a família é uma instituição temporal; de que ela não sobrevive à morte. Jesus não hesitou em abdicar-se da sua família, quando a família se postou contrariamente à vontade do Pai. Ele ensinou a nova e mais ampla irmandade entre os homens – os filhos de Deus. No tempo de Jesus os hábitos e a prática do divórcio eram relaxados na Palestina, e em todo o império romano. Ele recusou-se reiteradamente a estabelecer leis a respeito do casamento e do divórcio, mas muitos dos primeiros seguidores de Jesus tinham opiniões bem marcadas sobre o divórcio e não hesitaram em atribuí-las a ele. Todos os escritores do Novo Testamento, exceto João Marcos, ativeram-se às idéias mais rigorosas e avançadas sobre o divórcio.

140:8:15 15812 4. A atitude econômica. Jesus trabalhou, viveu e transacionou no mundo do modo como o encontrou. Ele não foi um reformador econômico, embora freqüentemente chamasse a atenção para a injustiça da distribuição desigual das riquezas. E não propôs quaisquer sugestões para remediar. Deixou claro, para os três, que, conquanto não fosse para os seus apóstolos manterem propriedades, ele não estava pregando contra a riqueza e a propriedade, mas meramente sobre a sua distribuição injusta e desigual. Reconhecia a necessidade de justiça social e de eqüidade industrial, mas não propôs regras para que isso fosse estabelecido.

140:8:16 15813 Ele nunca ensinou aos seus seguidores que evitassem posses terrenas; apenas aos seus doze apóstolos ele ensinou isso. Lucas, o médico, era um forte crente da igualdade social, e muito fez para interpretar as palavras de Jesus, em harmonia com as suas crenças pessoais. Jesus nunca ordenou pessoalmente, aos seus seguidores, que adotassem um modo comunitário de vida; ele não se pronunciou, de nenhum modo, sobre essas questões.

140:8:17 15814 Jesus freqüentemente preveniu aos seus ouvintes sobre a cobiça, declarando que “a felicidade de um homem não reside na abundância das suas posses materiais”. Ele reiterava constantemente: “De que serve a um homem ganhar todo o mundo e perder a sua própria alma?” Ele não fez nenhum ataque direto à posse de propriedades, mas insistiu em que é eternamente essencial que os valores espirituais venham em primeiro lugar. Nos seus ensinamentos posteriores ele procurava corrigir muitos erros, na visão da vida que era predominante em Urântia, narrando numerosas parábolas, as quais ele apresentava durante as suas ministrações públicas. Jesus nunca teve a intenção de formular teorias econômicas; ele bem sabia que cada idade deve desenvolver os próprios remédios para os males existentes. E, se Jesus estivesse na Terra, hoje, vivendo a sua vida na carne, ele traria um grande desapontamento à maioria dos bons homens e mulheres, pela simples razão de que não tomaria posições na política atual, nem nas disputas sociais e econômicas. Ele permaneceria bastante reservado ao ensinar-vos como perfeccionar a vossa vida espiritual interior, de modo a vos tornar muito mais competentes para enfrentar a solução dos vossos problemas puramente humanos.

140:8:18 15815 Jesus gostaria de tornar todos os homens semelhantes a Deus e, então, acompanharia à distância com compaixão até que esses filhos de Deus resolvessem os seus próprios problemas políticos, sociais e econômicos. Não foi à riqueza que ele denunciou, mas ao que essa riqueza faz à maioria dos devotos dela. Nessa quinta-feira, à tarde, Jesus primeiro disse aos seus discípulos que “mais abençoado é dar do que receber”.

140:8:19 15816 5. A religião pessoal. Vós, como o fizeram seus apóstolos, deveríeis entender melhor os ensinamentos de Jesus, por intermédio da sua vida. Ele viveu uma vida perfeita em Urântia, e os seus ensinamentos sem par só podem ser entendidos quando a sua vida é vista como o suporte direto desses ensinamentos. É a sua vida, e não as suas lições aos doze, ou os seus sermões para as multidões, que mais ajudarão a revelar o caráter divino e a personalidade amorosa do Pai.

140:8:20 15821 Jesus não atacou os ensinamentos dos profetas hebreus, nem os dos moralistas gregos. O Mestre reconheceu as muitas coisas boas que esses grandes instrutores representavam, mas ele tinha vindo à Terra para ensinar algo mais : “A conformidade voluntária da vontade do homem à vontade de Deus”. Jesus não queria simplesmente produzir um homem religioso, um mortal ocupado integralmente com os sentimentos religiosos e movido apenas por impulsos espirituais. Caso pudésseis apenas ter dado uma olhada nele, e vós teríeis sabido que Jesus era realmente um homem de grande experiência nas coisas deste mundo. Os ensinamentos de Jesus, a esse respeito, têm sido deturpados grosseiramente e bastante adulterados, durante todos esses séculos da era cristã; vós também tendes mantido idéias deturpadas sobre a mansidão e a humildade do Mestre. O que ele almejou, na sua vida, parece ter sido um auto-respeito magnífico. Ele só aconselhou o homem a humilhar-se, para que ele pudesse ser verdadeiramente exaltado; o que ele realmente almejava era a verdadeira humildade para com Deus. Ele dava grande valor à sinceridade – a um coração puro. A fidelidade era uma virtude cardinal segundo a sua avaliação do caráter, enquanto a coragem era a essência mesma dos seus ensinamentos. “Não temais” era o seu lema, e a persistência paciente o seu ideal de força de caráter. Os ensinamentos de Jesus constituem uma religião de valor, de coragem e de heroísmo. E é exatamente por isso que ele escolheu, para serem os seus representantes pessoais, doze homens comuns, a maioria dos quais era de pescadores rudes, viris e varonis.

140:8:21 15822 Jesus tinha pouco a dizer sobre os vícios sociais dos seus dias; ele raramente fazia referência à degenerescência moral. Ele era um instrutor positivo da virtude verdadeira. Ele evitava atentamente o método negativo de administrar a instrução; ele recusava-se a apregoar o mal. Ele nem mesmo foi um reformador moral. Ele bem sabia, e assim ele ensinou aos seus apóstolos, que as urgências sensuais da humanidade não são suprimidas nem pela repressão religiosa, nem pelas proibições legais. As suas poucas denúncias foram dirigidas mais contra o orgulho, a crueldade, a opressão e a hipocrisia.

140:8:22 15823 Jesus não denunciou com veemência nem mesmo os fariseus, como o fez João. Ele sabia que muitos dos escribas e dos fariseus eram honestos, nos seus corações; ele compreendeu a submissão escravizada deles às tradições religiosas. Jesus punha uma grande ênfase em “primeiro tornar boa a árvore”. Ele fez com que os três compreendessem bem que ele valorava a vida como um todo, não apenas algumas poucas virtudes em especial.

140:8:23 15824 A coisa que João aprendeu com os ensinamentos desse dia foi que a essência da religião de Jesus consistia na aquisição de um caráter compassivo, junto com uma personalidade motivada a fazer a vontade do Pai do céu.

140:8:24 15825 Pedro captou a idéia de que o evangelho, que eles estavam à beira de proclamar, era realmente um novo começo para toda a raça humana. E, posteriormente, passou essa impressão a Paulo, que a partir disso formulou a sua doutrina de Cristo como “o segundo Adão”.

140:8:25 15826 Tiago captou a verdade emocionante de que Jesus queria que os seus filhos na Terra vivessem como se eles fossem já cidadãos completos do Reino celeste.

140:8:26 15827 Jesus sabia que os homens eram diferentes uns dos outros, e ensinou isso aos seus apóstolos. Ele exortava-os constantemente a absterem-se de tentar moldar os discípulos e crentes de acordo com algum modelo preestabelecido. Ele procurava permitir a cada alma desenvolver-se do seu próprio modo, como uma alma individual e isolada a perfeccionar-se perante Deus. Em resposta a uma das muitas perguntas de Pedro, o Mestre disse: “Eu quero deixar os homens livres, de um modo tal que possam começar novamente como pequenas crianças, na vida nova e melhor”. Jesus sempre insistiu em que a verdadeira bondade deve ser inconsciente, que ao fazer a caridade não se devia deixar que a mão esquerda soubesse o que faz a mão direita.

140:8:27 15831 Os três apóstolos ficaram chocados, nessa tarde, quando eles compreenderam que a religião do seu Mestre não dava meios para que se fizesse um auto-exame espiritual. Todas as religiões, antes e depois da época de Jesus, até mesmo o cristianismo, cuidadosamente davam condições de um auto-exame consciente. Contudo, não era assim com a religião de Jesus de Nazaré. A filosofia de vida de Jesus é desprovida dessa introspecção religiosa. O filho do carpinteiro nunca ensinou a elaboração do caráter; ele ensinou o crescimento do caráter, esclarecendo que o Reino do céu é como uma semente de mostarda. Todavia, Jesus nada disse que condenasse a auto-análise como um meio de precaver-se para impedir o egoísmo pretensioso.

140:8:28 15832 O direito de entrar no Reino é condicionado pela fé, pela crença pessoal. O custo, a ser pago para permanecer na ascensão progressiva do Reino, é uma pérola de alto preço e, para possuí-la, um homem vende tudo o que tem.

140:8:29 15833 O ensinamento de Jesus é uma religião para todos, não apenas para os fracos e os escravos. A sua religião nunca se tornou cristalizada (durante a sua época) em credos e leis teológicas; ele não deixou uma linha escrita sequer atrás de si. A sua vida e os seus ensinamentos foram legados ao universo, como uma herança inspiradora e idealista adequada para guiar espiritualmente e para a instrução moral de todas as idades, e em todos os mundos. E, mesmo hoje, os ensinamentos de Jesus permanecem, como tais, fora de todas as religiões, mas constituindo-se nas esperanças vivas de todas elas.

140:8:30 15834 Jesus não ensinou aos seus apóstolos que a religião é a única busca terrena do homem; essa era a idéia judaica de servir a Deus. Contudo, ele insistiu que a religião fosse a ocupação exclusiva dos doze. Jesus nada ensinou que dissuadisse os seus crentes da busca da cultura genuína; ele apenas não dava mérito às escolas religiosas de Jerusalém, presas à tradição. Ele era liberal, generoso, instruído e tolerante. A piedade autoconsciente não tinha lugar na sua filosofia do viver na retidão.

140:8:31 15835 O Mestre não propôs soluções para os problemas não-religiosos da sua própria idade, nem de qualquer idade subseqüente. Jesus almejava desenvolver um discernimento espiritual das realidades eternas e estimular a iniciativa na originalidade de viver; ele preocupou-se exclusivamente com as necessidades espirituais fundamentais e permanentes da raça humana. Ele revelou uma bondade igual à de Deus. Ele exaltou o amor – a verdade, a beleza e a bondade – como o ideal divino e a realidade eterna.

140:8:32 15836 O Mestre veio para criar, no homem, um novo espírito, uma nova vontade – para imprimir uma nova capacidade de conhecer a verdade, experimentando a compaixão, e escolhendo a bondade –, a vontade para estar em harmonia com a vontade de Deus, conjugada com o impulso eterno de tornar-se perfeito, como o próprio Pai no céu é perfeito.

9. O DIA DA CONSAGRAÇÃO


140:9:1 15837 O sábado seguinte Jesus devotou-o aos seus apóstolos, fazendo, de volta, a jornada às terras altas onde ele os tinha ordenado; e lá, depois de uma longa e maravilhosamente tocante mensagem pessoal de encorajamento, ele iniciou o ato solene da consagração dos doze. Nesse sábado, à tarde, Jesus reuniu os apóstolos em torno de si, na montanha, e os colocou nas mãos do seu Pai do céu, em preparação para o dia em que fosse obrigado a abandoná-los no mundo. Nenhum novo ensinamento houve nessa ocasião, apenas o encontro e a comunhão.

140:9:2 15841 Jesus relembrou muitos aspectos do sermão da ordenação, dado naquele mesmo local, e então, chamando-os diante de si, um a um, ele encarregou-os com a missão de saírem para o mundo, como representantes dele. A responsabilidade da consagração dada pelo Mestre foi: “Ide, ao mundo inteiro, pregar as boas-novas do Reino. Liberai os prisioneiros espirituais, confortai os oprimidos e ministrai aos aflitos. De graça recebestes, e de graça deveis dar”.

140:9:3 15842 Jesus lhes aconselhou a não aceitarem dinheiro nem roupas suplementares, dizendo: “O trabalhador é digno do seu salário”. E finalmente acrescentou: “Observai que eu os envio, como ovelhas, em meio a lobos; sede, portanto, sábios como serpentes, e inofensivos como os pombos. Mas tende cuidado, pois os vossos inimigos vos levarão perante os conselhos deles, e, nas sinagogas, eles vos criticarão e castigarão. Sereis levados perante os chefes e governantes, porque vós acreditais nesse evangelho, e o vosso depoimento mesmo será uma testemunha de mim para eles. E quando eles vos conduzirem ao julgamento, não vos inquietais sobre o que vós ireis dizer, pois o espírito do meu Pai reside em vós e, em uma hora dessas, ele irá falar por vosso intermédio. Alguns de vós sereis levados à morte e, antes de estabelecerdes o Reino na Terra, vós sereis odiados por muita gente, por causa desse evangelho; mas não temais; eu estarei convosco e o meu espírito irá, antes de vós, a todo o mundo. E a presença do meu Pai residirá em vós, enquanto fordes primeiro aos judeus, e depois aos gentios”.

140:9:4 15843 E, quando desceram a montanha, eles foram de volta para o seu lar na casa de Zebedeu.


10. A NOITE APÓS A CONSAGRAÇÃO


140:10:1 15844 Naquela noite, enquanto ensinava na casa, pois tinha começado a chover, Jesus falou demoradamente a eles, tentando mostrar aos doze o que eles deviam ser, não o que deviam fazer. Eles conheciam uma religião que lhes impunha que só fizessem determinadas coisas como meio de alcançar a retidão – a salvação. E Jesus reiterava: “No Reino, vós deveis ser retos e justos para fazerdes o trabalho”. Muitas vezes ele repetiu: “ Sede, portanto, perfeitos, como o vosso próprio Pai no céu é perfeito”. A todo o tempo estava o Mestre explicando aos seus apóstolos desnorteados que a salvação que ele viera trazer ao mundo seria obtida apenas pela crença, pela fé simples e sincera. Disse Jesus: “João pregou um batismo de arrependimento, de pesar pelo modo antigo de viver. Vós ireis proclamar o batismo do companheirismo com Deus. Pregai o arrependimento àqueles que estão em necessidade desse ensinamento, mas àqueles que buscam já a admissão sincera ao Reino, abri as portas bem abertas e convidai-os a entrar na jubilosa comunhão dos filhos de Deus”. Mas era uma tarefa difícil, a de persuadir esses pescadores galileus de que, no Reino, ser reto, por meio da fé, deve vir antes do fazer com retidão, na vida diária dos mortais da Terra.

140:10:2 15845 Outro grande obstáculo para esse trabalho de ensinar aos doze foi a tendência deles de tomar os princípios altamente idealistas e espirituais, da verdade religiosa, e colocá-los na forma de regras concretas de conduta pessoal. Jesus queria apresentar a eles o espírito magnificamente belo da atitude da alma, mas eles insistiam em traduzir esses ensinamentos em regras para o comportamento pessoal. Muitas vezes, quando se asseguravam de lembrar-se daquilo que o Mestre dissera, era quase que certo que eles se esquecessem do que ele não tinha dito. Mas, vagarosamente, eles assimilavam os seus ensinamentos, mesmo porque Jesus era, de fato, tudo o que ele ensinava. O que eles não ganhavam da sua instrução verbal, eles adquiriam, gradualmente vivendo com ele.

140:10:3 15851 Não estava visivelmente claro para os apóstolos que o seu Mestre achava-se empenhado em viver uma vida de inspiração espiritual para todas as pessoas, de todas as idades, em todos os mundos de um vasto universo. Não obstante o que Jesus dizia a eles, de tempos em tempos, os apóstolos não captaram a idéia de que ele estava fazendo um trabalho, neste mundo, mas que era para todos os outros mundos da sua vasta criação. Jesus viveu a sua vida terrena em Urântia, não para estabelecer um exemplo pessoal de vida mortal, para os homens e mulheres deste mundo, mas antes, para criar um ideal espiritual elevado e inspirador, para todos os seres mortais em todos os mundos.

140:10:4 15852 Nessa mesma tarde, Tomé perguntou a Jesus: “Mestre, tu dizes que devemos transformar-nos como que em pequenas crianças, antes que possamos ganhar a entrada no Reino do Pai, e tu ainda nos preveniste para não sermos enganados por falsos profetas e para não sermos culpados de jogarmos as nossas pérolas diante dos porcos. Agora eu estou honestamente perplexo. Eu não consigo entender os teus ensinamentos”. Jesus respondeu a Tomé: “Por quanto tempo vou tolerar-vos! Vós sempre insistis em tomar literalmente tudo o que eu ensino. Quando eu vos pedi que vos tornásseis crianças pequenas, como preço para a entrada no Reino, eu me referia não à facilidade de serdes enganados, não à mera tendência para acreditar, nem à rapidez para confiar em estranhos agradáveis. O que desejei que vós captásseis, com a ilustração, foi a relação pai-filho. Vós sois as crianças, e é no Reino do vosso Pai que buscais entrar. E, se presente está aquele afeto natural entre toda a criança normal e o seu pai, que assegura um entendimento e uma relação de amor, ela para sempre exclui qualquer necessidade de barganhar pelo amor e pela misericórdia do Pai. E o evangelho que vós ireis pregar tem a ver com uma salvação que vem da realização pela fé dessa mesma relação eterna entre pai e filho”.

140:10:5 15853 A grande característica do ensinamento de Jesus era que a moralidade da sua filosofia originava-se na relação pessoal do indivíduo com Deus – esse mesmo relacionamento entre a criança e o pai. Jesus colocou ênfase no indivíduo, e não na raça nem na nação. Enquanto jantavam, Jesus teve a conversa com Mateus, na qual ele explicou que a moralidade de qualquer ato é determinada pelo motivo do indivíduo. A moralidade de Jesus era sempre positiva. A regra de ouro restabelecida por Jesus demanda contato social ativo; a regra negativa mais antiga poderia ser obedecida em isolamento. Jesus retirou a moralidade de todas as regras e cerimônias e elevou-a aos níveis grandiosos do pensamento espiritual e do viver realmente da retidão.

140:10:6 15854 Essa nova religião de Jesus não estava isenta de implicações práticas, mas tudo o que puder ser encontrado no seu ensinamento, que tiver algum valor prático, seja político, seja social, ou econômico, será uma decorrência natural dessa experiência interior da alma, que manifesta os frutos do espírito na ministração diária espontânea da experiência religiosa pessoal genuína.

140:10:7 15855 Depois que Jesus e Mateus tinham acabado de conversar, Simão zelote perguntou: “Mas, Mestre, todos os homens são filhos de Deus?” E Jesus respondeu: “Sim, Simão, todos os homens são filhos de Deus, e essa é a boa-nova que vós ireis proclamar”. Os apóstolos, todavia, não podiam captar tal doutrina; era uma anunciação nova, estranha e surpreendente. E era por causa desse desejo de imprimir neles essa verdade que Jesus ensinou seus seguidores a tratar a todos os homens como seus irmãos.

140:10:8 15856 Em resposta a uma pergunta feita por André, o Mestre deixou claro que a moralidade do seu ensinamento era inseparável da religião do seu viver. Ele ensinou a moralidade, não a moralidade saída da natureza do homem, mas da relação do homem com Deus.

140:10:9 15857 João perguntou a Jesus, “Mestre, o que é o Reino do céu?” E Jesus respondeu: “O Reino do céu consiste destes três elementos essenciais: primeiro, o reconhecimento do fato da soberania de Deus; segundo, a crença na verdade da filiação a Deus; e terceiro, a fé na eficácia do supremo desejo humano fazer a vontade de Deus – de ser como Deus. E esta é a boa-nova do evangelho: a de que, pela fé, todo mortal pode ter esses elementos essenciais à salvação”.

140:10:10 15861 E agora a semana de espera estava acabada, e eles prepararam-se para partir, no dia seguinte, rumo a Jerusalém.

DOCUMENTO 141

COMEÇANDO O TRABALHO PÚBLICO
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No primeiro dia da semana, 19 de janeiro, do ano 27 d. C, Jesus e os doze apóstolos estavam prontos para partir das suas instalações em Betsaida. Os doze de nada sabiam dos planos do seu Mestre, exceto que estavam indo até Jerusalém para assistir à festa da Páscoa, em abril, e que era intenção viajar pelo caminho do vale do Jordão. Não se afastaram da casa de Zebedeu antes de perto do meio-dia, porque as famílias dos apóstolos e outros discípulos vieram para despedir-se e desejar que eles se dessem bem no novo trabalho que iam começar.

141:0:2 15872 Pouco antes de partir, os apóstolos se perderam do Mestre, e André foi atrás dele. Depois de uma busca breve, encontrou-o assentado em um barco na praia, e Jesus estava chorando. Os doze tinham, por muitas vezes, visto o Mestre quando ele parecia estar amargurado, e haviam presenciado os momentos das suas breves preocupações mentais sérias, mas nenhum deles jamais o havia visto chorar. André ficou um tanto assustado de ver o Mestre atingido desse modo, na véspera da partida deles para Jerusalém, e atreveu-se a chegar até Jesus e perguntar: “Neste grande dia, Mestre, quando nós estamos para partir rumo a Jerusalém no intuito de proclamar o Reino do Pai, porque choras? Qual de nós ter-te-ia ofendido?” E Jesus, voltando com André para junto dos doze, respondeu-lhe: “Nenhum de vós causastes essa tristeza. Eu me entristeci apenas porque ninguém da família do meu pai José lembrou-se de vir para nos desejar boa viagem”. Naquele momento Rute estava visitando o seu irmão José em Nazaré. Outros membros da sua família mantiveram-se afastados por orgulho, desapontamento, mal-entendidos e pequenos ressentimentos, que eles se permitiram ter em resultado de mágoas.

1. DEIXANDO A GALILÉIA


141:1:1 15873 Cafarnaum não era distante de Tiberíades, e a fama de Jesus tinha começado a espalhar-se bastante por toda a Galiléia e mesmo até locais mais distantes. Jesus sabia que Herodes logo seria informado sobre o seu trabalho; desse modo julgou que fosse melhor viajar para o sul e pela Judéia, com os seus apóstolos. Um grupo de mais de cem crentes desejava ir junto com eles, mas Jesus falou-lhes e suplicou a eles que não acompanhassem o grupo apostólico, na sua jornada rio Jordão abaixo. Embora eles assentissem em permanecer lá, muitos deles seguiram o Mestre, depois de alguns dias.

141:1:2 15874 No primeiro dia, Jesus e os apóstolos seguiram somente até Tariquéia, onde pousaram naquela noite. No dia seguinte, viajaram até um ponto no Jordão, perto de Pela, onde João havia pregado, cerca de um ano atrás, e onde Jesus tinha recebido o batismo. Ali, pousaram por mais de duas semanas, ensinando e pregando. Ao fim da primeira semana, várias centenas de pessoas, procedentes da Galiléia, Fenícia, Síria, Decápolis, Peréia e Judéia, tinham-se agrupado em um acampamento perto de onde Jesus e os doze estavam.

141:1:3 15881 Jesus não fez nenhum sermão público. André dividiu a multidão e designou os pregadores para as reuniões da manhã e da tarde; depois da refeição da noite Jesus falou aos doze. Ele não lhes ensinou nada de novo, mas repassou o seu ensinamento anterior e respondeu às muitas perguntas deles. Numa dessas noites, ele disse aos doze algo sobre os quarenta dias que passara na montanha perto daquele lugar.

141:1:4 15882 Muitos daqueles que vieram da Peréia e Judéia tinham sido batizados por João e estavam interessados em saber mais a respeito dos ensinamentos de Jesus. Os apóstolos conseguiram grande progresso, ensinando aos discípulos de João, pois de nenhum modo eles depreciaram as pregações de João, e também desta vez eles nem mesmo batizaram os seus novos discípulos. Entretanto, era sempre uma pedra no caminho, para os seguidores de João, que Jesus, sendo tudo aquilo que João tinha anunciado, nada fizesse para tirá-lo da prisão. Os discípulos de João nunca puderam compreender por que Jesus não impediu a morte cruel do seu amado líder.

141:1:5 15883 Noite após noite, André cuidadosamente ensinava aos seus amigos apóstolos a delicada e difícil tarefa de darem-se bem com os seguidores de João Batista. Durante esse primeiro ano da ministração pública de Jesus, mais do que três quartos dos seus seguidores tinham anteriormente seguido João e dele haviam recebido o batismo. Passsaram todo esse ano, 27 d. C. , retomando calmamente o trabalho de João na Peréia e Judéia.

2. A LEI DE DEUS E A VONTADE DO PAI


141:2:1 15884 Na noite anterior àquela em que eles deixaram Pela, Jesus deu aos apóstolos mais instruçõess a respeito do novo Reino. Disse o Mestre: “Tem sido ensinado a vós esperar pela vinda do Reino de Deus, e agora eu estou anunciando que este Reino há muito esperado está próximo e à mão, e até mesmo que ele já está aqui e em meio a nós. Em todo reino deve haver um rei assentado no seu trono e decretando as leis desse reino. E assim vós desenvolvestes um conceito do Reino do céu como um governo glorificado do povo judeu sobre todos os povos da Terra, com um Messias assentado no trono de Davi e, desse local de poder miraculoso, promulgando as leis de todo o mundo. Mas, meus filhos, vós não vedes com os olhos da fé, e vós não ouvis com o ouvido do espírito. Eu declaro que o Reino do céu é a realização e o reconhecimento do governo de Deus, dentro dos corações dos homens. É bem verdade, há um Rei neste Reino, e esse Rei é o meu Pai e vosso Pai. De fato nós somos os seus súditos leais, mas, transcendendo de longe, a esse fato, está a verdade transformadora de que nós somos os seus filhos. Na minha vida tal verdade está tornando-se manifestada para todos. O nosso Pai também se assenta em um trono, mas não um trono feito pelas mãos. O trono do Infinito é a eterna morada do Pai no céu dos céus; Ele completa todas as coisas e proclama as Suas leis de universos a universos. E o Pai também governa dentro dos corações dos Seus filhos na Terra, pelo espírito que Ele enviou para viver dentro das almas dos homens mortais.

141:2:2 15885 “Quando fordes os súditos desse Reino, de fato ouvireis a lei do Soberano do Universo; mas quando, por causa do evangelho do Reino, que eu vim declarar, vós vos descobrirdes pela fé, como filhos, vós não mais vos vereis como criaturas súditas da lei de um rei Todo-Poderoso, mas vós vos vereis como filhos privilegiados de um Pai divino e amantíssimo. Em verdade, em verdade, eu vos digo, enquanto a vontade do Pai for a vossa lei, dificilmente estareis no Reino. Mas quando a vontade do Pai tornar-se verdadeiramente a vossa vontade, então estareis de fato no Reino, porque o Reino ter-se-á tornado assim uma experiência estabelecida dentro de vós. Enquanto a vontade de Deus for a vossa lei, vós permanecereis como nobres súditos escravos; mas quando vós acreditardes nesse novo evangelho da filiação divina, a vontade do meu Pai torna-se a vossa vontade, e vós então sereis elevados à alta posição de filhos livres de Deus, filhos liberados do Reino”.

141:2:3 15891 Alguns dos apóstolos conseguiram captar algo desse ensinamento, mas nenhum deles compreendeu, na sua plenitude, o significado dessa anunciação espantosa, exceto talvez Tiago Zebedeu. Essas palavras, contudo, calaram fundo nos seus corações e ressurgiram para alegrar os ministérios deles, durante os últimos anos de serviço.

3. A PERMANÊNCIA EM AMATOS


141:3:1 15892 O Mestre e os seus apóstolos permaneceram perto de Amatos, por quase três semanas. Os apóstolos continuaram a pregar, duas vezes por dia, à multidão, e Jesus pregava aos sábados à tarde. Tornou-se impossível continuar com as recreações às quartas-feiras; e assim André fez um arranjo para que dois apóstolos descansassem um dia, dos seis na semana, ao passo que aos serviços dos sábados todos estavam presentes.

141:3:2 15893 Pedro, Tiago e João realizavam a maior parte das pregações públicas. Filipe, Natanael, Tomé e Simão ocupavam-se com grande parte do trabalho pessoal e davam instruções para os grupos especiais de buscadores da verdade; os gêmeos continuavam no seu trabalho geral de supervisão da segurança, enquanto André, Mateus e Judas formavam um comitê geral de administração a três, embora cada um deles também fizesse um trabalho religioso considerável.

141:3:3 15894 André estava bastante ocupado com a tarefa de desfazer os mal-entendidos e desacordos constantes e repetidos entre os discípulos de João e os discípulos mais recentes de Jesus. Situações sérias surgiam de poucos em poucos dias, mas André com a assistência do corpo de apóstolos conseguia fazer com que as partes em contenda chegassem a alguma espécie de acordo, temporariamente ao menos. Jesus recusava-se a participar de qualquer dessas conversas; e também não daria nenhum conselho sobre como fazer os acordos adequados para essas dificuldades. Nem mesmo uma vez ele ofereceu sugestão de como os apóstolos deviam resolver tais questões desconcertantes. Quando André trazia essas questões a Jesus, este dizia sempre: “Não é sábio que o dono da festa participe das complicações com a família dos seus convidados; um pai sábio nunca toma partido nas pequenas rixas entre os seus próprios filhos”.

141:3:4 15895 O Mestre demonstrou uma grande sabedoria e manifestou perfeita eqüidade em todas as suas condutas para com os seus apóstolos e para com todos os seus discípulos. Jesus era verdadeiramente um mestre para os homens; ele exerceu grande influência sobre o seu semelhante humano, porque a sua personalidade combinava encanto e força. Havia uma influência sutil de comando na sua vida austera, nômade e sem lar. Havia uma atração intelectual e um poder de atração espiritual na sua maneira de ensinar com autoridade, na sua lógica lúcida, na sua força de raciocínio, na sagacidade do seu discernimento, na agilidade da sua mente, no seu equilíbrio sem par e na sua tolerância sublime. Ele era simples, varonil, honesto e destemido. Junto a toda essa influência física e intelectual, manifestada pela simples presença do Mestre, havia também todos os encantos espirituais do ser, que se tornaram inerentes à sua personalidade – paciência, ternura, mansidão, doçura e humildade.

141:3:5 15896 Jesus de Nazaré era de fato uma pessoa forte e poderosa; ele era um poder intelectual e uma fortaleza espiritual. A sua personalidade era de um grande apelo não só para as mulheres voltadas para a espiritualidade, entre os seus seguidores, mas também para o instruído e intelectual Nicodemos e para o duro soldado romano, o capitão da guarda parado junto à cruz, e que, quando terminara de ver o Mestre morrer, disse: “Verdadeiramente, este foi um Filho de Deus”. E os rudes e vigorosos pescadores galileus chamavam-no de Mestre.

141:3:6 15901 Os retratos de Jesus têm sido bastante infelizes. Essas pinturas do Cristo têm exercido uma influência deletéria sobre a juventude; os mercadores do templo dificilmente teriam fugido diante de Jesus, caso ele tivesse sido um homem tal como os vossos artistas têm-no retratado usualmente. A sua masculinidade era cheia de dignidade; ele era bom, e isso era natural. Jesus não posava como um místico suave, doce, gentil e bom. O seu ensinamento era de um dinamismo impressionante. Ele não apenas tinha boas intenções, mas realmente percorria os lugares fazendo o bem.

141:3:7 15902 O Mestre nunca disse: “Vinde a mim todos vós que sois indolentes e todos vós que sois sonhadores”. No entanto, muitas vezes disse: “Vinde a mim todos vós que trabalhais, e eu vos darei descanso – a força espiritual”. O jugo do Mestre realmente é leve, mas, ainda assim, ele nunca o impõe; cada indivíduo deve tomar esse jugo pela sua própria e livre vontade.

141:3:8 15903 Jesus retratava a conquista pelo sacrifício, o sacrifício do orgulho e do egoísmo. Ao mostrar misericórdia, ele queria retratar a libertação espiritual de todos os ressentimentos, mágoas, raiva e luxúria de poder pessoal e de vingança. E, quando ele dizia: “Não resistais ao mal”, – não tinha a intenção de buscar desculpas para o pecado, nem de aconselhar a confraternização com a iniqüidade, conforme explicou mais tarde. Ele tinha a intenção de ensinar mais ainda o perdão, de “não resistir ao mau tratamento infligido à vossa personalidade, aos ferimentos profundos causados aos vossos sentimentos de dignidade pessoal”.

4. ENSINANDO SOBRE O PAI


141:4:1 15904 Enquanto permanecia em Amatos, Jesus passou muito tempo com os apóstolos instruindo-os sobre o novo conceito de Deus; de novo e de novo ele tentava imprimir neles a idéia de que Deus é um Pai, não um guarda-livros grande e supremo que está preocupado mais em registrar os males causados pelos seus filhos errantes da Terra, em fazer os registros dos pecados e das perversidades a serem usados contra eles, quando Ele for julgá-los posteriormente como o Juiz justo de toda a criação. Os judeus tinham já, havia muito tempo, concebido Deus como um rei que se sobrepunha a tudo, até mesmo como um Pai da nação, mas nunca antes um grande número de mortais havia alimentado a idéia de Deus como um Pai cheio de amor pelo indivíduo.

141:4:2 15905 À pergunta de Tomé: “Quem é este Deus do Reino?” – Jesus respondeu: “Deus é o vosso Pai, e a religião – o meu evangelho – nada mais é, nem nada menos, do que o reconhecimento acreditado da verdade de que vós sois os filhos Dele. E eu estou aqui entre vós, na carne, para tornar claras ambas essas idéias, por meio da minha vida e dos meus ensinamentos”.

141:4:3 15906 Jesus também buscou libertar as mentes dos seus apóstolos da idéia de oferecer sacrifícios animais como um dever religioso. Aqueles homens, no entanto, instruídos na religião do sacrifico diário, eram lentos para compreender o que ele queria dizer. Contudo, o Mestre nunca ficou cansado no seu ensinamento. Quando ele não conseguia alcançar as mentes de todos os apóstolos por meio de uma ilustração, ele repetia a sua mensagem e empregaria um outro tipo de parábola com o propósito de esclarecê-los.

141:4:4 15907 Nessa época, Jesus começou a ensinar mais plenamente aos doze a respeito da missão que eles tinham “de confortar os aflitos e de ministrar aos doentes”. O Mestre ensinou-lhes muito sobre o homem, como um todo – a união do corpo, da mente e do espírito, formando o homem ou a mulher individualmente. Jesus falou aos seus colaboradores sobre as três formas de aflição que eles encontrariam e explicou como eles deveriam ministrar a todos aqueles que sofriam as tristezas das doenças humanas. Ele ensinou-lhes a reconhecer:

15911 1. As doenças da carne – aquelas aflições consideradas comumente como sendo as doenças físicas.

15912 2. As mentes perturbadas – aquelas aflições não físicas, que foram consideradas, posteriormente, como dificuldades e perturbações emocionais e mentais.

15913 3. A possessão de espíritos malignos.

141:4:5 15914 Jesus explicou aos seus apóstolos, em várias ocasiões, a natureza e algo a respeito da origem desses espíritos maus, também chamados, naquela época, de espíritos impuros. O Mestre bem sabia a diferença entre a posse dos espíritos malignos e a insanidade, mas os apóstolos não sabiam. Aquilo não era compreensível para eles e Jesus, tampouco, podia fazer-lhes entender essa questão, por causa dos conhecimentos limitados deles sobre a história anterior de Urântia. Por muitas vezes, todavia, Jesus disse-lhes, aludindo a tais espíritos malignos: “Eles não mais molestarão os homens quando eu tiver ascendido ao meu Pai no céu e, depois que eu houver vertido o meu espírito sobre toda a carne, na época em que o Reino virá em grande poder e glória espiritual”.

141:4:6 15915 De semana a semana e de mês a mês, durante todo esse ano, os apóstolos deram mais e mais atenção à ministração da cura aos doentes.

5. A UNIDADE ESPIRITUAL


141:5:1 15916 Uma das palestras noturnas mais movimentadas de Amatos foi a reunião em que se discutiu sobre a unidade espiritual. Tiago Zebedeu havia perguntado: “Mestre, como aprenderemos a ver de um modo igual, para assim desfrutarmos de maior harmonia entre nós próprios?” Quando Jesus ouviu essa pergunta, ficou tão tocado, dentro do seu espírito, que respondeu: “Tiago, Tiago, quando foi que eu ensinei a vós que devêsseis ver tudo do mesmo modo? Eu vim ao mundo para proclamar a liberdade espiritual, com o fito de que os mortais pudessem ter o poder de viver vidas individuais de originalidade e de liberdade, diante de Deus. Eu não desejo que a harmonia social e a paz fraterna sejam compradas com o sacrifício da livre personalidade e da originalidade espiritual. O que eu vos peço, meus apóstolos, é a unidade espiritual – e isso vós podeis experimentar na alegria da vossa dedicação unida a fazer de todo o coração a vontade do meu Pai no céu. Vós não tendes que ver de um modo igual, nem tendes de sentir do mesmo modo, nem mesmo pensar da mesmo maneira, para serdes espiritualmente iguais. A unidade espiritual deriva-se da consciência de que cada um de vós é residido, e crescentemente dominado, pela dádiva espiritual do Pai celeste. A vossa harmonia apostólica deve crescer do fato de que a esperança espiritual de todos vós é idêntica pela origem, natureza e destino.

141:5:2 15917 “Desse modo vós podeis experienciar uma unidade perfeccionada de propósito espiritual e de compreensão espiritual, que nasce da consciência comum da identidade de cada um dos vossos espíritos residentes vindos do Paraíso; e vós podeis desfrutar de toda essa profunda unidade espiritual, mesmo diante da maior diversidade entre as vossas atitudes individuais de pensamento intelectual, de sentimentos, de temperamento e de conduta social. As vossas personalidades podem ser diversas de um modo animador, e marcadamente diferentes, enquanto as vossas naturezas espirituais e os vossos frutos espirituais, de adoração divina e de amor fraterno, podem ser tão unificados que todos os que contemplarem as vossas vidas irão certamente tomar conhecimento dessa identidade de espírito e dessa unidade de alma; eles irão reconhecer que vós estivestes comigo e que, por meio desse fato, aprendestes, de um modo aceitável, como fazer a vontade do Pai no céu. Vós podeis alcançar a unidade no serviço de Deus, até mesmo quando vós prestardes esse serviço, segundo a técnica dos vossos próprios dons de mente, de corpo e de alma.

141:5:3 15921 “A vossa unidade espiritual implica duas coisas que sempre se harmonizarão nas vidas dos crentes individuais. A primeira: vós estais possuídos por um motivo comum para uma vida de serviço; todos vós desejais fazer, acima de qualquer coisa, a vontade do Pai no céu. E a segunda: todos vós tendes uma meta comum de existência; todos vós tendes o propósito de encontrar o Pai nos céus para, por meio disso, demonstrardes ao universo que vós vos tornastes como Ele”.

141:5:4 15922 Muitas vezes, durante o aperfeiçoamento dos doze, Jesus retomou esse tema. Repetidamente disse-lhes não ser do seu desejo que aqueles que acreditavam nele, devessem tornar-se dogmatizados e padronizados, de acordo com a interpretação religiosa, ainda que fosse como homens bons. De novo e de novo ele preveniu aos seus apóstolos contra a formulação de credos e contra o estabelecimento de tradições, como um meio de guiar e de controlar os crentes no evangelho do Reino.

6. A ÚLTIMA SEMANA EM AMATOS


141:6:1 15923 Perto do fim da última semana em Amatos, Simão zelote trouxe a Jesus um certo Teherma, um persa que fazia negócios em Damasco. Teherma havia ouvido falar de Jesus e tinha vindo a Cafarnaum para vê-lo; e, uma vez lá, sendo informado de que Jesus havia seguido com os seus apóstolos Jordão abaixo a caminho de Jerusalém, ele partiu para encontrá-lo. André havia apresentado Teherma a Simão, para a instrução. Simão via o persa como um “adorador do fogo”, embora Teherma só a duras penas conseguisse explicar que o fogo era apenas o símbolo visível do Único Puro e Sagrado. Depois de conversar com Jesus, o persa demonstrou a sua intenção de permanecer por vários dias para ouvir os ensinamentos e para escutar as pregações.

141:6:2 15924 Quando Simão zelote e Jesus estavam a sós, Simão perguntou ao Mestre: “Por que é que eu não consegui persuadi-lo? Por que é que ele resistia tanto a mim, e tão prontamente deu ouvidos a ti?” Jesus respondeu: “Simão, Simão, quantas vezes eu te ensinei sobre absteres-te de qualquer esforço para tirar algo de dentro dos corações daqueles que buscam a salvação? Quão freqüentemente eu não tenho dito a ti para trabalhar apenas para colocar algo dentro dessas almas famintas? Conduza os homens ao Reino, e as verdades grandes e vivas do Reino, em breve, expulsarão todos os erros sérios. Quando tiveres apresentado ao homem mortal as boas-novas de que Deus é o Pai dele, tu poderás, com mais facilidade, persuadi-lo de que ele é, em realidade, um filho de Deus. E tendo feito isso, tu terás trazido a luz da salvação para aquele que estava nas trevas. Simão, quando o Filho do Homem chegou a ti pela primeira vez, ele chegou denunciando Moisés e os profetas, na proclamação de um novo e melhor caminho de vida? Não. Eu não vim para tirar aquilo que todos vós recebestes dos vossos antepassados, mas para mostrar-vos a visão perfeccionada daquilo que os vossos pais viram apenas parcialmente. Vá então, Simão, ensinar sobre o Reino e pregá-lo; e, quando tu tiveres trazido um homem com certeza e segurança para dentro do Reino, então é o momento, quando ele vier a ti com perguntas, de dar-lhe a instrução que tem a ver com o avanço progressivo da alma para dentro do Reino divino”.

141:6:3 15925 Simão ficara pasmo com essas palavras, e fez como Jesus lhe tinha instruído, e Teherma, o persa, estava entre aqueles que entraram no Reino.

141:6:4 15926 Naquela noite, Jesus discursou aos apóstolos sobre a nova vida no Reino. O que ele disse, em parte, foi: “Quando entrardes no Reino, vós renascereis. Vós não podeis ensinar as coisas profundas do espírito àqueles que nasceram apenas na carne; vede primeiro se os homens nasceram para o espírito antes de tentardes instruí-los nos caminhos avançados do espírito. Não vos comprometais em mostrar aos homens as belezas do templo sem terdes, antes, levado-os até o templo. Apresentai a Deus os homens, como filhos de Deus, antes de discursar sobre as doutrinas da paternidade de Deus e a filiação dos homens. Não disputeis com os homens – sede pacientes, sempre. O Reino não é vosso; sois apenas os embaixadores. Simplesmente proclamai que esse é o Reino do céu – Deus é o vosso Pai e vós sois os Seus filhos e essa é a boa-nova; se acreditardes nela de todo o coração, ela será a vossa salvação eterna”.

141:6:5 15931 Os apóstolos fizeram um grande progresso durante a permanência em Amatos. No entanto, ficaram muito decepcionados porque Jesus não deu a eles nenhuma sugestão sobre como lidar com os discípulos de João. Mesmo sobre a importante questão do batismo, tudo o que Jesus disse foi: “João de fato batizou com a água, mas, quando entrardes no Reino do céu, vós sereis batizados com o Espírito”.

7. NA BETÂNIA, ALÉM DO JORDÃO


141:7:1 15932 Aos 26 de fevereiro, Jesus, os seus apóstolos e um grande grupo de seguidores viajaram Jordão abaixo até um vau perto da Betânia, na Peréia, local onde João fizera a primeira proclamação do Reino vindouro. Junto com os seus apóstolos, Jesus permaneceu lá, ensinando e pregando, durante quatro semanas, antes de irem todos para Jerusalém.

141:7:2 15933 Na segunda semana de permanência na Betânia, além do Jordão, Jesus levou Pedro, Tiago e João até as colinas, depois do rio, ao sul de Jericó, para um descanso de três dias. O Mestre ensinou aos três muitas verdades novas e avançadas sobre o Reino do céu. Com o propósito de fazer o registro desses ensinamentos, os reorganizamos e classificamos, como a seguir:

141:7:3 15934 Jesus empenhou-se em deixar clara a sua vontade de que os discípulos, tendo provado das boas realidades espirituais do Reino, vivessem no mundo de um tal modo que os homens, vendo a vida deles, se tornassem conscientes do Reino e conseqüentemente fossem levados a perguntar aos crentes sobre os caminhos para o Reino. E todos esses buscadores sinceros da verdade, de fato, ficaram alegres ao ouvir as boas-novas sobre a dádiva da fé que assegura a admissão ao Reino, com as suas realidades espirituais eternas e divinas.

141:7:4 15935 O Mestre buscava imprimir em todos os instrutores do evangelho do Reino que a sua única meta era revelar Deus, para o homem individual, como o seu Pai – para conduzir esse homem individual a tornar-se consciente da sua filiação; e então apresentar esse mesmo homem a Deus, como o seu filho pela fé. Ambas essas revelações essenciais são realizadas em Jesus. Ele tornou-se, de fato, “o caminho, a verdade e a vida”. A religião de Jesus era inteiramente baseada na sua vida de auto-outorga na Terra. Quando Jesus partiu deste mundo, ele não deixou para trás livros, ou leis, nem outras formas de organização humana, ligadas à vida religiosa do indivíduo.

141:7:5 15936 Jesus explicou claramente que tinha vindo para estabelecer relações pessoais e eternas com os homens, relações estas que teriam precedência sobre todas as outras relações humanas. E enfatizara que essa relação espiritual íntima, de comunhão, seria estendida a todos os homens, de todas as idades e de todas as condições sociais, dentre todos os povos. A recompensa única que ele tinha para os seus filhos era: neste mundo – uma alegria espiritual e a comunhão divina; no próximo mundo – uma vida eterna, de progresso nas realidades espirituais divinas do Pai do Paraíso.

141:7:6 15937 Jesus colocou grande ênfase naquilo que chamava as duas verdades de primeira importância nos ensinamentos do Reino, sendo elas: alcançar a salvação pela fé, e apenas pela fé, e associá-la ao ensinamento revolucionário da realização da liberdade humana, por intermédio do reconhecimento sincero da verdade de que “vós conhecereis a verdade, e a verdade libertar-vos-á”. Jesus era a verdade manifestada na carne, e ele prometeu enviar o seu Espírito da Verdade aos corações de todos os seus filhos, depois do seu retorno ao Pai no céu.

141:7:7 15941 O Mestre estava ensinando a esses apóstolos os elementos essenciais da verdade, para toda uma idade na Terra. Eles freqüentemente ouviam os seus ensinamentos, ainda que na realidade no que ele dizia houvesse a intenção de ser a inspiração e a edificação de outros mundos. O exemplo dele foi um plano novo e original de vida. Do ponto de vista humano ele foi realmente um judeu, mas viveu a sua vida para todos os mundos, como um mortal desta esfera.

141:7:8 15942 Para assegurar o reconhecimento do seu Pai, no desdobrar do plano do Reino, Jesus explicou que tinha propositalmente ignorado os “grandes homens da Terra”. Ele começou o seu trabalho com os pobres, a mesma classe que tinha sido tão negligenciada pela maioria das religiões evolucionárias dos tempos precedentes. Ele não desprezava nenhum homem; o seu plano abrangia o mundo inteiro, era de fato universal. Ele era tão audacioso e enfático nesses anúncios, que até mesmo Pedro, Tiago e João foram tentados a pensar que ele pudesse talvez estar fora de si.

141:7:9 15943 Docemente, ele buscava levar aos apóstolos a verdade de que tinha vindo, na sua missão de outorga, não para estabelecer um exemplo para umas poucas criaturas da Terra, mas para estabelecer e demonstrar um modo exemplar de vida humana para todos os povos de todos os mundos do seu universo inteiro. E esse modo de vida aproximou-se da mais alta perfeição, e mesmo da bondade final do Pai Universal. No entanto, os apóstolos não puderam compreender o significado das suas palavras.

141:7:10 15944 Ele anunciou que tinha vindo para funcionar como um instrutor, um instrutor enviado do céu para apresentar a verdade espiritual à mente material. E isso foi exatamente o que ele fez; sendo Jesus um instrutor, não um pregador. Do ponto de vista humano, Pedro foi muito mais efetivamente um pregador do que Jesus. A pregação de Jesus era bastante eficiente por causa da sua personalidade única, mais do que em decorrência de um atrativo irresistível, oratório ou emocional. Jesus falava diretamente às almas dos homens. Ele era um instrutor dos espíritos dos homens, mas instuía por meio da mente. Ele viveu com os homens.

141:7:11 15945 Foi nessa ocasião que Jesus confessou a Pedro, a Tiago e a João que o seu trabalho na Terra devia, sob alguns pontos de vista, ser limitado pelos mandatos dos seus “colaboradores no alto”, referindo-se às instruções de pré-outorga de Emanuel, o seu irmão do Paraíso. E disse a eles que tinha vindo para fazer a vontade do seu Pai e apenas a vontade do seu Pai. Como estivesse motivado por uma unicidade totalmente sincera de propósito, ele não se preocupava, de um modo ansioso, com o mal no mundo.

141:7:12 15946 Os apóstolos estavam começando a reconhecer a amizade espontânea de Jesus. Embora o Mestre fosse de aproximação fácil, ele vivia sempre independentemente de todos os seres humanos, e acima deles. Jamais, sequer por um momento ele foi dominado por qualquer influência mortal ou sujeitou-se ao débil julgamento humano. Ele não dava atenção à opinião pública, e não era influenciado pelo elogio. Raramente perdia tempo em corrigir mal-entendidos, ou se ressentia com as apresentações falsas dos fatos. Nunca pediu conselhos a nenhum homem, nem fez pedidos de preces.

141:7:13 15947 Tiago ficava maravilhado de ver como Jesus parecia antever o fim a partir de um simples começo. O Mestre raramente parecia surpreender-se. Nunca se mostrava agitado, vexado ou desconcertado. Ele nunca precisou pedir desculpas a nenhum homem. Algumas vezes ficava triste, mas nunca desalentado.

141:7:14 15948 João reconhecia claramente que, não obstante todos os seus dons divinos, ele era humano, afinal. Jesus viveu como um homem, entre os homens; e ele compreendeu os homens, amou-os e sabia como comandá-los. Na sua vida pessoal, ele era tão humano, quanto incapaz de errar. E era sempre altruísta.

141:7:15 15951 Embora Pedro, Tiago e João não pudessem compreender muito do que Jesus dizia, nessa ocasião, as suas palavras plenas de graça gravaram-se nos corações deles e, depois da crucificação e da ressurreição, elas ressurgiram para enriquecer grandemente e alegrar as suas ministrações posteriores. Não é de se admirar que esses apóstolos não tenham compreendido as palavras do Mestre, pois ele estava projetando sobre eles o plano de uma nova idade.

8. TRABALHANDO EM JERICÓ


141:8:1 15952 Durante a permanência de quatro semanas, na Betânia, além do Jordão, várias vezes por semana André designaria duplas apostólicas para irem a Jericó, por um dia ou dois. João tinha muitos crentes em Jericó, e a maioria deles recebia bem os ensinamentos mais avançados de Jesus e dos seus apóstolos. Nessas visitas a Jericó, os apóstolos começaram mais especificamente a cumprir as instruções de Jesus, de que ministrassem aos doentes; eles visitavam cada casa da cidade e procuravam confortar todas as pessoas afligidas.

141:8:2 15953 Os apóstolos realizaram algum trabalho público em Jericó, mas os seus esforços eram principalmente de natureza mais silenciosa e pessoal. Agora eles faziam a descoberta de que as boas-novas do Reino eram muito confortantes para os doentes; que a sua mensagem trazia a cura aos afligidos. E foi em Jericó que a missão dada por Jesus aos doze, de pregar as boas-novas do Reino e de ministrar aos aflitos, foi pela primeira vez levada a efeito.

141:8:3 15954 Eles pararam em Jericó, a caminho de Jerusalém, e foram surpreendidos por uma delegação, da Mesopotâmia, que tinha vindo para conversar com Jesus. Os apóstolos haviam planejado passar apenas um dia ali, mas, quando chegaram esses buscadores da verdade, vindos do leste, Jesus passou três dias com eles, e eles voltaram para as suas casas, ao longo do Eufrates, felizes com o conhecimento das novas verdades sobre o Reino do céu.

9. PARTINDO PARA JERUSALÉM


141:9:1 15955 Na segunda-feira, o último dia de março, Jesus e os apóstolos começaram a sua viagem de subida das colinas até Jerusalém. Lázaro, da Betânia, tinha descido até o Jordão, duas vezes, para ver Jesus, e todos os arranjos haviam sido feitos para que o Mestre e os seus apóstolos tivessem o seu centro de operações na casa de Lázaro e das suas duas irmãs, na Betânia, enquanto eles quisessem permanecer em Jerusalém.

141:9:2 15956 Os discípulos de João permaneceram na Betânia, depois do Jordão, ensinando e batizando as multidões, de modo que Jesus foi acompanhado apenas pelos doze até chegar na casa de Lázaro. E, lá, Jesus e os apóstolos permaneceram durante cinco dias, descansando e restaurando as forças, antes de irem até Jerusalém para a Páscoa. Foi um grande acontecimento, na vida de Marta e de Maria, terem o Mestre e os seus apóstolos no lar do irmão delas, onde elas podiam ministrar segundo as necessidades deles.

141:9:3 15957 No domingo, 6 de abril, pela manhã, Jesus e os apóstolos desceram em direção a Jerusalém; e essa foi a primeira vez que o Mestre e todos os doze estiveram juntos ali.

DOCUMENTO 142

A PÁSCOA EM JERUSALÉM
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Durante o mês de abril, Jesus e os apóstolos trabalharam em Jerusalém, indo, todas as noites, fora da cidade, e pernoitando na Betânia. Jesus passava, ele próprio, uma ou duas noites, por semana, na casa de Flávio, um judeu grego, em Jerusalém, e até ali vinham, secretamente, muitos judeus proeminentes para entrevistarem-se com Jesus.

142:0:2 15962 No primeiro dia em Jerusalém, Jesus esteve com Anás, amigo de anos anteriores, e que havia sido o sumo sacerdote e era parente de Salomé, a mulher de Zebedeu. Anás tinha ouvido falar de Jesus e dos seus ensinamentos, mas, quando ele surgiu na casa do sumo sacerdote, foi recebido com muita reserva. Quando Jesus percebeu a frieza de Anás, imediatamente foi embora, e, ao sair, disse: “O medo é o maior escravizador do homem, e o orgulho, a sua grande fraqueza; tu te trairias a ti próprio, dentro da prisão desses dois destruidores do júbilo e da liberdade?” Anás nada respondeu, todavia. E o Mestre não mais viu Anás, até o momento em que este se assentou junto do próprio genro para o julgamento do Filho do Homem.

1. ENSINANDO NO TEMPLO


142:1:1 15963 Durante esse mês, diariamente, Jesus ou um dos seus apóstolos ensinava no templo. Quando as multidões da Páscoa estavam grandes demais para terem acesso ao ensinamento dentro do templo, os apóstolos faziam os grupos de aprendizado do lado de fora dos recintos sagrados. A ênfase da mensagem deles era:

15964 1. O Reino do céu está à mão.

15965 2. Pela fé na paternidade de Deus, vós podeis entrar no Reino do céu, tornando-vos assim os filhos de Deus.

15966 3. O amor é a regra para viver dentro do Reino – a suprema devoção a Deus que, ao mesmo tempo, significa amar ao próximo como a ti mesmo.

15967 4. A obediência à vontade do Pai, produzindo os frutos do espírito, na vida pessoal de cada um; essa é a lei do Reino.

142:1:2 15968 As multidões, que vieram celebrar a Páscoa, ouviram esse ensinamento de Jesus e, às centenas, rejubilaram-se com as boas-novas. Os sacerdotes principais e os dirigentes judeus ficaram muito preocupados com Jesus e os seus apóstolos, e debateram entre eles sobre o que deveriam fazer com eles.

142:1:3 15969 Além de ensinarem no templo e nas suas cercanias, os apóstolos e outros crentes estavam empenhados em realizar muito trabalho pessoal junto às multidões da Páscoa. Esses homens e mulheres interessados levavam a boa-nova da mensagem de Jesus, nessa celebração da Páscoa, até as partes mais remotas do império romano e também para o Oriente. Esse foi o começo da propagação do evangelho do Reino, para o mundo exterior. O trabalho de Jesus não mais ficaria confinado à Palestina.

2. A IRA DE DEUS


142:2:1 15971 Havia em Jerusalém, assistindo às festividades da Páscoa, um certo Jacó, um rico comerciante judeu de Creta; e ele veio até André e pediu para ver Jesus a sós. André arranjou esse encontro secreto com Jesus, na casa de Flávio, para a noite do dia seguinte. Esse homem não pôde compreender os ensinamentos do Mestre, e tinha vindo porque desejava inquirir mais completamente sobre o Reino de Deus. E Jacó disse a Jesus: “Mas, Rabbi, Moisés e os velhos profetas nos dizem que Yavé é um Deus ciumento, um Deus de muita ira e de forte raiva. Os profetas dizem que ele odeia os malfeitores e se vinga daqueles que não obedecem à sua lei. Tu e os teus discípulos nos ensinais que Deus é um rei, um Pai cheio de compaixão, que ama tanto a todos os homens e que os acolheria no seu Reino do céu, o qual tu proclamas estar perto e à mão”.

142:2:2 15972 Quando Jacó acabou de falar, Jesus respondeu: “Jacó, tu acabaste de expor muito bem os ensinamentos dos velhos profetas, que instruíram aos filhos daquela geração de acordo com a luz da época deles. O nosso Pai no Paraíso é imutável. Mas o conceito da sua natureza ampliou-se e cresceu desde os dias de Moisés até os tempos de Amós e mesmo até a geração do profeta Isaías. E agora eu vim, na carne, revelar o Pai, na nova glória, e mostrar o Seu amor e a sua misericórdia a todos os homens, em todos os mundos. Quando o evangelho deste Reino disseminar-se pelo mundo, com a mensagem de coragem e boa vontade a todos homens, surgirão melhores relações entre as famílias de todas as nações. Com o passar do tempo, os pais e seus filhos amar-se-ão mais uns aos outros; e assim será gerada uma melhor compreensão do amor do Pai no céu pelos Seus filhos na Terra. Lembre-se, Jacó, que um pai bom e verdadeiro não apenas ama a sua família, como um todo – como uma família – mas ama também e verdadeiramente se importa com afeto com cada um dos seus membros individuais ”.

142:2:3 15973 Depois de uma discussão considerável sobre o caráter do Pai celeste, Jesus fez uma pausa e disse: “Tu, Jacó, sendo pai de muitos filhos, sabes bem a verdade das minhas palavras”. E Jacó disse: “Mas, Mestre, quem te disse que sou pai de seis filhos? Como soubeste disso a meu respeito?” E o Mestre respondeu: “Bastaria dizer que o Pai e o Filho sabem de todas as coisas, pois de fato eles a tudo vêem. Amando os teus filhos como um pai na Terra, tu deves aceitar como uma realidade o amor do Pai celeste por ti – não só por todos os filhos de Abraão, mas por ti, pela tua alma individual”.

142:2:4 15974 Então Jesus continuou dizendo: “Quando os teus filhos são muito jovens e imaturos e tu tens de castigá-los, eles podem achar que talvez o pai deles esteja com raiva e tomado por uma ira ressentida. A imaturidade deles não os deixa penetrar além da punição, para que possam discernir a afeição previdente e corretiva do pai. Contudo, quando esses mesmos filhos tornam-se mulheres e homens crescidos, não seria uma tolice que eles se ativessem à noção anterior, concebida erradamente, sobre o seu pai? Como homens e mulheres eles deviam agora discernir o amor do seu pai, em todas aquelas ações disciplinares. E não devia a humanidade, com o passar dos séculos, vir a compreender melhor a verdadeira natureza e o caráter amoroso do Pai no céu? Que proveito podes ter das gerações sucessivas de esclarecimento espiritual, se persistires em ver Deus como Moisés e os profetas O viam? Eu te digo, Jacó, sob a luz brilhante desta hora, tu deverias ver o Pai como nenhum daqueles, que vieram antes, jamais O contemplaram. E vendo-O assim, tu deverias rejubilar-te por entrares no Reino onde esse Pai, tão misericordioso, governa, e tu deverias buscar ter a vontade do amor Dele dominando a tua vida, daqui por diante”.

142:2:5 15981 E Jacó respondeu: “Rabbi, eu creio; eu desejo que tu me conduzas ao Reino do Pai”.

3. O CONCEITO DE DEUS


142:3:1 15982 Os doze apóstolos, a maioria dos quais tinha ouvido essa conversa sobre o caráter de Deus, naquela noite, fizeram a Jesus várias perguntas sobre o Pai no céu. As respostas do Mestre a essas perguntas podem ser mais bem apresentadas pelo seguinte resumo, apresentado numa linguagem moderna:

142:3:2 15983 Jesus repreendeu aos doze com brandura; em essência eis o que disse: Não sabeis das tradições de Israel em relação ao crescimento da idéia de Yavé, e acaso sois ignorantes sobre os ensinamentos das escrituras a respeito da doutrina de Deus? E então o Mestre continuou a instruir os apóstolos sobre a evolução do conceito da Deidade, no curso do desenvolvimento do povo judeu. Ele chamou a atenção para as seguintes fases do crescimento da idéia de Deus:

142:3:3 15984 1. Yavé – o Deus dos clãs do Sinai. Esse foi o conceito primitivo da Deidade, que Moisés exaltou ao nível mais alto como o Senhor Deus de Israel. O Pai no céu nunca deixa de aceitar a adoração sincera dos seus filhos na Terra, não importando quão imaturo seja o conceito da Deidade que tenham, nem por que nome eles simbolizam esta natureza divina.

142:3:4 15985 2. O Altíssimo. Esse conceito do Pai no céu foi proclamado por Melquisedeque a Abraão tendo sido levado até bem longe de Salém por aqueles que, posteriormente, acreditaram nessa idéia ampliada e expandida da Deidade. Abraão e o seu irmão deixaram Ur, por causa do estabelecimento da adoração do sol, e tornaram-se crentes nos ensinamentos de Melquisedeque sobre El Elyon – o Deus Altíssimo. O conceito deles, sobre Deus, era composto de uma fusão das antigas idéias da Mesopotâmia com a da doutrina do Altíssimo.

142:3:5 15986 3. El Shadai. Durante esses dias primitivos, muitos dos hebreus adoravam El Shadai, o conceito egípcio do Deus do céu, sobre o qual eles aprenderam durante o seu cativeiro na terra do Nilo. Muito depois dos tempos de Melquisedeque, todos esses três conceitos de Deus tornaram-se fundidos, formando a doutrina da Deidade criadora, o Senhor Deus de Israel.

142:3:6 15987 4. Eloim. Desde os tempos de Adão, o ensinamento sobre a Trindade do Paraíso tem perdurado. Não vos lembrais como as escrituras iniciam, afirmando que “No começo os Deuses criaram os céus e a Terra”? Isso indica que, quando esse registro foi feito, o conceito de três Deuses em Um, na Trindade, tinha encontrado um lugar na religião dos nossos antepassados.

142:3:7 15988 5. O Supremo Yavé. Na época de Isaías essas crenças sobre Deus tinham-se expandido até o conceito de um Criador Universal, que era simultaneamente Todo-Poderoso e todo-misericordioso. E esse conceito de Deus, em evolução e em ampliação, virtualmente suplantou todas as idéias anteriores da Deidade, na religião dos nossos pais.

142:3:8 15989 6. O Pai no céu. E agora, conhecemos Deus como o nosso Pai no céu. O nosso ensinamento oferece uma religião em que o crente é um filho de Deus. Essa é a boa-nova do evangelho do Reino do céu. Coexistentes com o Pai, há o Filho e há o Espírito, e a revelação da natureza e o ministério dessas Deidades do Paraíso continuarão a ampliar-se e a iluminar as idades sem fim, da progressão espiritual eterna dos filhos ascendentes de Deus. Em todas as épocas e durante todas as idades, a verdadeira adoração de qualquer ser humano – no que concerne ao seu progresso espiritual individual – é reconhecida, pelo espírito residente, como uma homenagem feita ao Pai no céu.

142:3:9 15991 Nunca antes os apóstolos estiveram tão chocados como estavam ao escutarem sobre essa narrativa do crescimento do conceito de Deus nas mentes judias de gerações anteriores; eles estavam espantados demais, também, para fazerem perguntas. Como permaneciam assentados, diante de Jesus, em silêncio, o Mestre continuou: “E vós teríeis conhecido essas verdades, caso tivésseis lido as escrituras. Acaso não lestes em Samuel, onde ele diz: ‘E a raiva do Senhor foi incitada contra Israel, tanto assim que ele colocou Davi contra eles, dizendo, ide e fazei o censo de Israel e de Judá?’ E isso não era estranho porque, nos dias de Samuel, os filhos de Abraão realmente acreditavam que Yavé criara tanto o bem, quanto o mal. No entanto, quando um escritor posterior narrou esses acontecimentos, depois da ampliação do conceito que os judeus faziam da natureza de Deus, ele não atribuiu o mal a Yavé; e, por conseguinte, ele disse: ‘E Satã levantou-se contra Israel e levou Davi a fazer o censo de Israel’. Acaso não podeis perceber que tais registros das escrituras mostram, claramente, como o conceito da natureza de Deus continuou a crescer de uma geração para a outra?

142:3:10 15992 “De novo deveríeis ter percebido o crescimento da compreensão da lei divina em perfeita harmonia com os conceitos, em ampliação, da divindade. Quando os filhos de Israel saíram do Egito, nos dias anteriores à ampliação da revelação de Yavé, eles possuíam os dez mandamentos que lhes serviram de lei, até os tempos em que acamparam diante do Sinai. E esses dez mandamentos eram:

142:3:11 15993 “1. Não adorarás nenhum outro deus, pois o Senhor é um Deus ciumento.

142:3:12 15994 “2. Não elaborarás deuses com imagens fundidas.

142:3:13 15995 “3. Não negligenciarás a observação da festa do pão sem levedura.

142:3:14 15996 “4. De todos os varões dos homens ou do gado, os primogênitos são meus, disse o Senhor.

142:3:15 15997 “5. Durante seis dias poderás trabalhar, mas no sétimo dia descansarás.

142:3:16 15998 “6. Não deixarás de observar a festa dos primeiros frutos e a festa da colheita no final do ano.

142:3:17 15999 “7. Não oferecerás o sangue de nenhum sacrifício com pão feito com levedura.

142:3:18 159910 “8. Do sacrifício da festa da Páscoa, não sairás antes que chegue a manhã seguinte.

142:3:19 159911 “9. O primeiro entre os primeiros frutos da terra, vós os trareis para a casa do Senhor, vosso Deus.

142:3:20 159912 “10. Não ferverás um cabrito no leite da mãe dele.

142:3:21 159913 “E então, entre os trovões e os relâmpagos do Sinai, Moisés deu a eles os dez mandamentos novos, os quais, todos vós estais de acordo, são afirmações mais dignas de acompanhar os conceitos ampliados da Deidade de Yavé. E nunca tereis notado que esses mandamentos estão registrados duas vezes nas escrituras; que, no primeiro caso, a razão para a observação do sábado é a libertação do Egito; enquanto em um registro posterior as crenças religiosas, dos nossos pais, que avançavam, exigiam que a razão para a observação do sábado fosse mudada, passando a ser em reconhecimento ao fato da criação?

142:3:22 159914 “E então vós vos lembrareis de que uma vez mais – no dia do maior esclarecimento espiritual de Isaías – esses dez mandamentos negativos foram transformados na grande e positiva lei do amor, o comando de amar a Deus acima de tudo, e ao vosso semelhante como a vós próprios. E é essa lei suprema de amor a Deus e ao homem que eu também declaro a vós como constituindo todo o dever do homem”.

142:3:23 16001 E quando ele acabou de falar, ninguém lhe fez nenhuma pergunta. E todos foram, um a um, dormir.

4. FLÁVIO E A CULTURA GREGA


142:4:1 16002 Flávio, o judeu grego, era um prosélito que não tinha acesso ao templo, não tendo sido circuncidado ou batizado; e já que era um grande amante do belo na arte e na escultura, a casa que ocupava, enquanto permanecia em Jerusalém, era um belo edifício. Essa casa era finamente adornada com tesouros sem preço que ele tinha reunido aqui e ali nas suas viagens pelo mundo. Quando ele primeiro pensou em convidar Jesus para ficar na sua casa, ele temeu que o Mestre pudesse ofender-se ao ver essas, assim consideradas, imagens. Flávio, contudo, ficou agradavelmente surpreso quando Jesus entrou e, em vez de reprová-lo por ter esses objetos supostamente idólatras espalhados pela casa, manifestou um grande interesse por toda a coleção e fez muitas perguntas de reconhecimento sobre cada objeto enquanto Flávio acompanhava-o de aposento em aposento, mostrando-lhe todas as suas esculturas favoritas.

142:4:2 16003 O Mestre percebeu que o seu anfitrião estava surpreso com a sua atitude amistosa para com a arte; e, conseqüentemente, quando eles tinham terminado de ver toda a coleção, Jesus disse: “Pelo fato de apreciares a beleza das coisas criadas pelo meu Pai e confeccionadas pelas mãos artísticas do homem, deverias esperar que fosses reprovado? Por Moisés certa vez haver procurado combater a idolatria e a adoração de deuses falsos, por isso deveriam todos os homens ver com desagrado a reprodução da graça e da beleza? Eu te digo, Flávio, os filhos de Moisés não o compreenderam; e ainda agora transformam em falsos deuses até mesmo as suas proibições de imagens e de coisas celestes e terrestres. Todavia, ainda que Moisés houvesse ensinado essas restrições às mentes sem iluminação daqueles dias, o que teria isso a ver com os dias de hoje, nos quais o Pai no céu é revelado como o um Soberano Espiritual universal acima de tudo? E, Flávio, eu declaro que, no Reino que se aproxima, não mais se ensinará que: ‘não deveis adorar isso, nem adoreis aquilo’; não mais haverá preocupação com mandamentos de proibições de coisas nem de cuidados, de que não se faça isso nem aquilo; mas antes todos estarão ocupados com um dever supremo. E esse dever do homem expressa-se em dois grandes privilégios: a adoração sincera ao Criador infinito, o Pai do Paraíso; e o serviço de amor aos nossos semelhantes. Se tu amas o teu semelhante como amas a ti próprio, realmente sabes que és filho de Deus.

142:4:3 16004 “Numa idade em que o meu Pai não era bem compreendido, justificavam-se as tentativas de Moisés, de conter a idolatria, mas na idade vindoura o Pai terá sido revelado na vida do Filho; e essa nova revelação de Deus fará, para sempre, com que não tenha mais sentido em confundir o Pai Criador com ídolos de pedra ou com imagens de ouro e de prata. Doravante, os homens inteligentes podem desfrutar dos tesouros da arte sem confundir essa apreciação material da beleza com a adoração e o serviço do Pai no Paraíso, o Deus de todas as coisas e de todos os seres”.

142:4:4 16005 Flávio acreditou em tudo o que Jesus lhe ensinou. No dia seguinte ele seguiu para a Betânia, além do Jordão, e foi batizado pelos discípulos de João. E assim sucedeu, porque os apóstolos de Jesus ainda não batizavam os crentes. Quando Flávio voltou a Jerusalém, fez uma grande festa para Jesus e convidou sessenta dos seus amigos. E muitos desses convidados também se tornaram crentes na mensagem do Reino vindouro.

5. O DISCURSO SOBRE A CONVICÇÃO


142:5:1 16011 Um dos grandes sermões que Jesus pregou no templo nessa semana de Páscoa foi em resposta a uma pergunta feita por um dos seus ouvintes, um homem de Damasco. Esse homem perguntou a Jesus: “Mas, Rabbi, como sabermos com certeza que tu és enviado por Deus, e que nós podemos verdadeiramente entrar neste Reino que tu e os teus discípulos declaram estar perto e à mão?” E Jesus respondeu:

142:5:2 16012 “Quanto à minha mensagem e ensinamentos dos meus discípulos, vós deveríeis julgá-los pelos seus frutos. Se proclamarmos a vós as verdades do espírito, o espírito testemunhará nos seus corações que a nossa mensagem é genuína. A respeito do Reino e sobre a vossa convicção e a aceitação que o Pai celeste tem de vós, eu pergunto-vos, dentre vós, qual o pai que, sendo um pai digno e de bom coração, manteria o seu filho ansioso ou na expectativa quanto ao status dele na família ou quanto à segurança do seu lugar no afeto do coração do seu pai? Vós que sois pais terrenos tendes prazer em torturar os vossos filhos com a incerteza sobre a constância do amor que os vossos corações humanos mantêm por eles? O vosso Pai no céu também não deixa os seus filhos do espírito, pela fé, na incerteza duvidosa quanto à posição deles no Reino. Se recebeis Deus como o vosso Pai, então, de fato e de verdade sois os filhos de Deus. E se sois filhos, então estareis seguros na vossa posição e na situação de tudo o que diz respeito à filiação eterna e divina. Se vós acreditardes nas minhas palavras, conseqüentemente vós acreditais Nele que me enviou e, acreditando assim no Pai, vós vos estais certificando do vosso status como cidadãos celestes. Se fizerdes a vontade do Pai no céu, nunca ireis fracassar na realização da vida eterna de progresso no Reino divino.

142:5:3 16013 “O Espírito Supremo irá testemunhar junto aos vossos espíritos que vós sois verdadeiramente filhos de Deus. E se sois filhos de Deus, então nascestes do espírito de Deus; e todo aquele que houver nascido do espírito tem em si próprio o poder de superar qualquer dúvida; e essa vitória, que supera toda a incerteza, é a vitória da vossa própria fé.

142:5:4 16014 “Disse o profeta Isaías, falando desses tempos: ‘Quando o espírito do alto é vertido sobre nós, então o trabalho da retidão transforma-se em paz, em silêncio e, para sempre, em convicção’. E, para todos aqueles que verdadeiramente crêem nesse evangelho, eu me transformarei na garantia de que serão recebidos nas misericórdias eternas e na vida, que perdurará para sempre, do Reino do meu Pai. E então, vós, que ouvis esta mensagem e que credes nesse evangelho do Reino, sois os filhos de Deus, e vós tendes a vida eterna; e a evidência, para todo o mundo, de que nascestes do espírito é que vós amais uns aos outros com sinceridade”.

142:5:5 16015 A multidão de ouvintes permaneceu por muitas horas com Jesus, fazendo-lhe perguntas e escutando com atenção as suas respostas confortadoras. Mesmo os apóstolos ficaram encorajados, pelo ensinamento de Jesus, a pregar o evangelho do Reino com mais poder e mais convicção. Essa experiência em Jerusalém foi uma grande inspiração para os doze. Foi o primeiro contato deles com multidões tão enormes, e eles aprenderam muitas lições úteis que demonstraram ser de grande ajuda para o seu trabalho posterior.

6. A CONVERSA COM NICODEMOS


142:6:1 16016 Uma noite, na casa de Flávio, um certo Nicodemos, rico e antigo membro do sinédrio judeu, apareceu para ver Jesus. Muito tinha ouvido falar a respeito dos ensinamentos deste galileu e, sendo assim Nicodemos veio para ouvi-lo, em uma tarde, enquanto Jesus ensinava nas praças do templo. Ele poderia ter vindo ali, com freqüência, para ouvir Jesus ensinando, mas temia ser visto pelo povo, assistindo àqueles ensinamentos, pois os chefes judeus já divergiam tanto de Jesus que nenhum membro do sinédrio iria querer ser identificado abertamente de algum modo com ele. E, dessa maneira, Nicodemos tinha arranjado, com André, para ver Jesus, em privacidade, ainda naquele dia depois do cair da noite. Pedro, Tiago e João estavam no jardim de Flávio quando a entrevista começou; e mais tarde todos eles foram para dentro da casa, onde a conversa continuou.

142:6:2 16021 Ao receber Nicodemos, Jesus não demonstrou nenhuma deferência especial; ao falar com ele, não fez nenhuma concessão, nenhuma persuasão indevida. O Mestre não fez nenhuma tentativa de repelir o seu interlocutor secreto, nem empregou sarcasmo. Em todas as suas relações com o visitante ilustre, Jesus esteve calmo, sincero e digno. Nicodemos não era um representante oficial do sinédrio; ele veio ver Jesus, essencialmente, por causa do seu interesse pessoal e sincero pelos ensinamentos do Mestre.

142:6:3 16022 Ao ser apresentado por Flávio, Nicodemos disse: “Rabbi, sabemos que vós sois um instrutor enviado por Deus, pois ninguém meramente humano poderia ensinar desse modo a menos que Deus estivesse com ele. E eu estou desejoso de saber mais a respeito dos vossos ensinamentos sobre o Reino vindouro”.

142:6:4 16023 Jesus respondeu a Nicodemos: “Em verdade, em verdade, eu te digo, Nicodemos, a menos que um homem tenha nascido do alto, ele não pode ver o Reino de Deus”. Então Nicodemos replicou: “Mas como pode um homem nascer de novo quando ele é velho? Ele não pode entrar por uma segunda vez no ventre da sua mãe para nascer”.

142:6:5 16024 Jesus disse: “Contudo, eu declaro-te que a menos que um homem nasça do espírito, ele não pode entrar no Reino de Deus. Aquele que nasce da carne é carne, e aquele que nasce do espírito é espírito. Mas tu não deves espantar-te porque eu disse que tu deves nascer do alto. Quando sopra o vento, tu escutas o farfalhar das folhas, mas não podes ver o vento – nem de onde vem, nem para onde vai – e assim é com todos os nascidos do espírito. Com os olhos da carne podes aperceber-te das manifestações do espírito, mas não podes discernir de fato o espírito”.

142:6:6 16025 Nicodemos retrucou: “Mas eu não entendo – como pode ser isso?” E Jesus disse: “Como pode ser que tu sejas um instrutor em Israel e sejas ainda ignorante sobre tudo isso? Por isso é que se torna um dever, para aqueles que sabem sobre as realidades do espírito, revelar essas coisas àqueles que discernem apenas as manifestações do mundo material. Mas tu acreditarás em nós se te contarmos sobre as verdades celestes? Tu tens a coragem, Nicodemos, de acreditar naquele que desceu do céu, o próprio Filho do Homem?”

142:6:7 16026 E Nicodemos disse: “Mas como posso começar a captar esse espírito que deverá recriar-me na preparação para a minha entrada no Reino?” Jesus respondeu: “O espírito do Pai no céu já reside em ti. Se quiseres ser conduzido por esse espírito vindo do alto, tu irás, muito em breve, começar a ver com os olhos do espírito e, então, por meio da escolha sincera, serás guiado pelo espírito, nascerás no espírito, desde que o teu propósito de viver seja o de fazer a vontade do teu Pai que está no céu. E, assim, tendo nascido no espírito e estando feliz no Reino de Deus, tu começarás a colher na tua vida diária os frutos abundantes do espírito”.

142:6:8 16027 Nicodemos era inteiramente sincero. E estava profundamente impressionado mas foi embora confuso. Nicodemos era um homem realizado, quanto ao autodesenvolvimento e o autocontrole, e até mesmo quanto às suas altas qualidades morais. Ele era refinado, um egocêntrico altruísta; entretanto, não sabia como submeter a sua vontade à vontade do Pai divino, como uma criança pequena querendo submeter-se ao guiamento e à condução de um pai terreno sábio e amoroso, tornando-se assim em realidade um filho de Deus, um herdeiro progressivo do Reino eterno.

142:6:9 16031 Nicodemos, contudo, reuniu fé suficiente para assegurar-se no Reino. Protestou, apenas timidamente, quando os seus colegas do sinédrio tentaram condenar Jesus sem uma audiência; no entanto, com José de Arimatéia, mais tarde, ele demonstrou ousadamente a sua fé e reivindicou o corpo de Jesus, mesmo quando a maior parte dos discípulos tinha fugido com medo das cenas dos sofrimentos finais e da morte do Mestre.

7. A LIÇÃO SOBRE A FAMÍLIA


142:7:1 16032 Depois do atarefado período de ensinamentos por meio do trabalho pessoal da semana de Páscoa em Jerusalém, Jesus passou a quarta-feira seguinte na Betânia, com os seus apóstolos, descansando. Naquela tarde, Tomé fez uma pergunta que proporcionou uma longa e instrutiva resposta. Disse Tomé: “Mestre, no dia em que nós nos separamos para sermos embaixadores do Reino, tu nos disseste muitas coisas, instruindo-nos a respeito do nosso modo pessoal de vida, mas o que devemos ensinar à multidão? Como deve esse povo viver depois que o Reino vier mais plenamente? Os teus discípulos deveriam possuir escravos? Os teus crentes deveriam buscar a pobreza e evitar a propriedade? A misericórdia deverá prevalecer sozinha de modo a não termos mais leis nem justiça?” Jesus e os doze passaram aquela tarde e toda aquela noite, depois do jantar, discutindo sobre as perguntas de Tomé. Com o propósito de fazer o registro de tudo isso, apresentamos o resumo seguinte das instruções do Mestre:

142:7:2 16033 Jesus primeiro procurou deixar claro para os seus apóstolos que ele estava na Terra, vivendo uma vida única na carne, e que eles, os doze, tinham sido convocados a participar dessa experiência de auto-outorga do Filho do Homem; e, como colaboradores, também eles deveriam compartilhar de muitas das restrições especiais e das obrigações de toda a experiência da outorga. Havia uma sugestão velada de que o Filho do Homem, entre as pessoas que jamais tinham vivido na Terra, era a única pessoa que podia simultaneamente enxergar dentro do coração de Deus e nas profundezas da alma humana.

142:7:3 16034 Jesus explicou, bem claramente, que o Reino do céu era uma experiência evolucionária, começando aqui na Terra e progredindo através de várias etapas sucessivas de vida até o Paraíso. No decorrer da noite ele declarou definitivamente que, em algum estágio futuro do desenvolvimento do Reino, ele iria revisitar este mundo, com o seu poder espiritual e glória divina.

142:7:4 16035 Em seguida ele explicou que a “idéia de um reino” não era o melhor modo de ilustrar a relação do homem com Deus; que ele empregava essas figuras de linguagem porque o povo judeu estava esperando um reino e porque João tinha pregado em termos do Reino vindouro. Jesus disse: “O povo de uma outra idade entenderá melhor o evangelho do Reino, quando este for apresentado em termos que expressem o relacionamento familiar – quando o homem entender a religião como o ensinamento da paternidade de Deus e da irmandade entre os homens, a filiação a Deus”. Então o Mestre discursou, durante algum tempo, sobre a família terrena como uma ilustração da família celeste, reafirmando as duas leis fundamentais da vida: o primeiro mandamento de amor pelo pai, o chefe da família, e o segundo mandamento, o de amor mútuo entre os filhos, de amar ao irmão como a si próprio. E então explicou que essa qualidade de afeição fraterna iria, invariavelmente, manifestar-se em um serviço social amoroso e sem egoísmo.

142:7:5 16036 E, em seguida, surgiu a discussão memorável sobre as características fundamentais da vida familiar e sobre as suas aplicações ao relacionamento existente entre Deus e o homem. Jesus afirmou que uma verdadeira família baseia-se nos sete fatos seguintes:

142:7:6 16041 1. O fato da existência. As relações da natureza e os fenômenos da semelhança mortal estão ligados na família: os filhos herdam alguns traços dos pais. Os filhos têm origem nos pais; a existência da personalidade depende de um ato dos pais. A relação entre o pai e o filho é inerente em toda a natureza e pertence a todas as existências vivas.

142:7:7 16042 2. A segurança e o prazer. Os verdadeiros pais têm um grande prazer em prover as necessidades dos filhos. Muitos pais, não contentes em suprir meramente as necessidades dos seus filhos, gostam também de prover os seus prazeres.

142:7:8 16043 3. A educação e a instrução. Os pais sábios planejam cuidadosamente a educação e a instrução adequada dos seus filhos e filhas. Quando jovens, eles são preparados para as responsabilidades maiores da vida.

142:7:9 16044 4. A disciplina e as restrições. Os pais previdentes também cuidam da disciplina necessária, da orientação, da correção e, algumas vezes, das restrições a serem feitas à sua progênie imatura.

142:7:10 16045 5. O companheirismo e a lealdade. O pai afetuoso mantém um relacionamento íntimo e amoroso com os filhos. O seu ouvido fica sempre aberto aos seus pedidos; ele está sempre pronto a compartilhar das provações deles e a ajudá-los nas dificuldades. O pai está supremamente interessado no bem-estar progressivo da sua progênie.

142:7:11 16046 6. O amor e a misericórdia. Um pai compassivo perdoa livremente; os pais não conservam memórias vingativas contra os seus filhos. Os pais não são como juízes, nem como inimigos, nem como credores. As verdadeiras famílias são construídas na tolerância, paciência e perdão.

142:7:12 16047 7. A provisão para o futuro. Os pais temporais gostam de deixar uma herança para os seus filhos. A família continua de uma geração para a outra. A morte apenas termina com uma geração para marcar o começo de outra. A morte termina com a vida de um indivíduo, mas não necessariamente com a vida da família.

142:7:13 16048 Durante horas o Mestre discutiu sobre a aplicação desses aspectos da vida familiar às relações do homem, o filho da Terra, com Deus, o Pai do Paraíso. E esta foi a sua conclusão: “Toda a relação de um filho com o Pai, eu a conheço até à perfeição, pois tudo o que tiverdes de alcançar quanto à filiação, no futuro eterno, eu já alcancei agora. O Filho do Homem está preparado para ascender à mão direita do Pai, e assim em mim está aberto agora um caminho ainda mais amplo para que todos vós possais ver Deus e, antes de acabardes a progressão gloriosa, para vos tornardes perfeitos como o vosso próprio Pai no céu é perfeito”.

142:7:14 16049 Quando ouviram essas palavras surpreendentes, os apóstolos lembraram-se dos pronunciamentos que João fizera na época do batismo de Jesus, e relembraram-se, vividamente, dessa experiência, quando da sua pregação e da ministração subseqüente de ensinamentos, depois da morte e da ressurreição do Mestre.

142:7:15 160410 Jesus é um Filho divino da confiança total do Pai Universal. Ele tem estado com o Pai e O compreende plenamente. Ele vivia agora a sua vida terrena para a plena satisfação do Pai, e essa encarnação na carne capacitou-o plenamente para compreender o homem. Jesus foi a perfeição do homem; ele alcançou exatamente essa perfeição tal como todos os verdadeiros crentes estão destinados a alcançá-la, nele e por meio dele. Jesus revelou um Deus de perfeição ao homem e apresentou, em si próprio, o filho perfeccionado dos mundos a Deus.

142:7:16 16051 Embora Jesus tivesse falado por várias horas, Tomé ainda não estava satisfeito, pois disse: “Mas, Mestre, nós não achamos que o Pai no céu sempre nos trate com bondade e com misericórdia. Muitas vezes nós sofremos dolorosamente na Terra, e nem sempre as nossas preces são ouvidas. Onde é que falhamos em compreender o significado do teu ensinamento?”

142:7:17 16052 Jesus respondeu: “Tomé, Tomé, quanto tempo demorará até adquires a capacidade de ouvir com o ouvido do espírito? Quanto tempo levará para que tu aprendas que este Reino é um reino espiritual, e que o meu Pai é também um ser espiritual? Tu não compreendes que eu estou ensinando a vós como filhos espirituais da família espiritual do céu, da qual o chefe paterno é um espírito eterno e infinito? Tu não me deixarás usar a família terrena como uma ilustração das relações divinas, sem aplicar o meu ensinamento tão literalmente aos assuntos materiais? Nas vossas mentes não podeis separar as realidades espirituais do Reino dos problemas materiais, sociais, econômicos e políticos da idade? Quando eu falo a linguagem do espírito, por que insistis em traduzir o significado do que eu digo, para a linguagem da carne? Só porque eu tomo a liberdade de empregar lugares comuns e comparações literais com o propósito de ilustração? Meus filhos, eu vos imploro que cesseis de aplicar os meus ensinamentos sobre o Reino do espírito aos assuntos sórdidos da escravidão, da pobreza, de casas e terras, e aos problemas materiais da eqüidade e da justiça humana. Essas questões temporais são motivo para a ocupação dos homens deste mundo, e, conquanto, de um certo modo, elas afetem a todos os homens, vós fostes chamados a representar-me no mundo, do mesmo modo como eu represento o meu Pai. Vós sois os embaixadores espirituais de um Reino espiritual, representantes especiais do Pai espiritual. A esta altura deveria ser possível eu instruir-vos como homens crescidos do Reino do espírito. Deveria eu estar sempre me dirigindo a vós como se fosseis crianças? Não crescereis nunca na vossa percepção do espírito? No entanto, eu vos amo e irei suportar-vos até o fim mesmo da nossa associação na carne. E, mesmo então, o meu espírito vos precederá em todo o mundo”.

8. NO SUL DA JUDÉIA


142:8:1 16053 Lá pelo fim de abril, a oposição a Jesus, entre os fariseus e os saduceus, tinha tornado-se tão pronunciada que o Mestre e os seus apóstolos decidiram deixar Jerusalém por algum tempo, indo para o sul até Belém e Hebrom. Todo o mês de maio foi passado realizando um trabalho pessoal nessas cidades e entre as pessoas das aldeias vizinhas. Nenhuma pregação pública foi feita nessa viagem, apenas a visitação de casa em casa. Uma parte desse tempo, enquanto os apóstolos ensinavam o evangelho e ministravam aos doentes, Jesus e Abner passaram em Engedi, visitando a colônia nazarita. João Batista viera desse lugar, e Abner tinha sido o dirigente daquele grupo. Muitos, na irmandade dos nazaritas, tornaram-se crentes de Jesus, mas a maioria desses homens ascetas e excêntricos recusou-se a aceitá-lo como um instrutor enviado do céu, porque ele não ensinava o jejum e outras formas de renúncia.

142:8:2 16054 O povo que vivia nessa região não sabia que Jesus tinha nascido em Belém. Eles sempre supuseram que o Mestre tivesse nascido em Nazaré, exatamente como pensava a maioria dos seus discípulos, mas os doze apóstolos conheciam os fatos.

142:8:3 16055 Essa permanência no sul da Judéia foi um período de descanso e de trabalho frutífero; muitas almas foram acrescidas ao Reino. Nos primeiros dias de junho a agitação contra Jesus tinha já se acalmado tanto, em Jerusalém, que o Mestre e os apóstolos voltaram a instruir e a confortar os crentes.

142:8:4 16061 Embora Jesus e os apóstolos tivessem passado todo o mês de junho em Jerusalém ou nas cercanias, eles não se dedicaram a nenhum ensinamento público durante esse período. Na maior parte do tempo ficavam nas tendas, que eram montadas em um parque sombreado, ou jardim, conhecido naquela época como o Getsêmane. Esse parque estava situado na encosta oeste do monte das Oliveiras, não muito longe do riacho Cédrão. Eles passavam as festas dos sábados e os fins de semana com Lázaro e as suas irmãs na Betânia. Por poucas vezes Jesus esteve dentro dos muros de Jerusalém, mas um grande número de buscadores interessados na verdade vieram ao Getsêmane para conversar com ele. Numa certa sexta-feira à noite, Nicodemos e José de Arimatéia aventuraram-se a ir ver Jesus, mas, quando já estavam em frente da entrada da tenda do Mestre, voltaram amedrontados. E claro está que eles não perceberam que Jesus sabia de tudo que haviam feito.

142:8:5 16062 Quando os chefes dos judeus souberam que Jesus tinha voltado a Jerusalém, eles prepararam-se para prendê-lo; mas quando observaram que ele não fazia nenhuma pregação pública, concluíram que estava amedrontado, por causa das agitações anteriores, e decidiram permitir que ele continuasse os seus ensinamentos, do modo privado como o fazia, sem que fosse molestado. E assim os assuntos continuaram, silenciosamente, até os últimos dias de junho, quando um certo Simão, membro do sinédrio, aderiu publicamente aos ensinamentos de Jesus, depois de declarar-se diante dos chefes dos judeus. Imediatamente, uma nova agitação, visando à prisão de Jesus, sobreveio e se fortaleceu tanto que o Mestre decidiu retirar-se para as cidades de Samaria e para a Decápolis.

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