sexta-feira, 20 de agosto de 2010

URANTIA JESUS DE NAZARÉ III

DOCUMENTO 143

ATRAVESSANDO A SAMARIA
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No final de junho, do ano 27 d. C. , por causa da oposição crescente dos dirigentes religiosos judeus, Jesus e os doze partiram de Jerusalém, depois de enviar as suas tendas e os parcos bens pessoais para serem guardados na casa de Lázaro, na Betânia. Indo para o norte da Samaria, eles detiveram-se para o sábado em Betel. E lá eles pregaram, por vários dias, ao povo que veio de Gofna e de Efraim. Um grupo de cidadãos de Arimatéia e de Tamná chegou com a finalidade de convidar Jesus a visitar as suas aldeias. O Mestre e os seus apóstolos passaram mais de duas semanas ensinando aos judeus e aos samaritanos dessa região, muitos dos quais vieram de tão longe quanto Antipatris, para ouvir as boas-novas do Reino.

143:0:2 16072 O povo do sul da Samaria ouviu Jesus entusiasmado e, com exceção de Judas Iscariotes, os apóstolos conseguiram vencer grande parte do seu preconceito contra os samaritanos. Foi muito difícil para Judas amar a esses samaritanos. Na última semana de julho, Jesus e os seus colaboradores estavam prontos para partir rumo às novas cidades gregas de Fasaeles e de Arquelais, perto do Jordão.

1. PREGANDO EM ARQUELAIS


143:1:1 16073 Na primeira metade do mês de agosto, o grupo apostólico fez o seu centro de apoio nas cidades gregas de Arquelais e de Fasaeles, onde eles tiveram a sua primeira experiência pregando a grupos quase exclusivos de gentios – gregos, romanos e sírios – já que poucos judeus residiam nessas duas cidades gregas. Ao entrarem em contato com esses cidadãos romanos, os apóstolos encontraram novas dificuldades para a proclamação da mensagem do Reino vindouro, e depararam-se com novas objeções aos ensinamentos de Jesus. Numa das muitas conversas noturnas com os seus apóstolos, Jesus ouviu atentamente essas objeções, feitas ao evangelho do Reino, que os doze repetiam enquanto reproduziam as experiências com as pessoas envolvidas nos seus trabalhos pessoais.

143:1:2 16074 Uma pergunta, feita por Filipe, era típica das dificuldades deles. Disse Filipe: “Mestre, esses gregos e romanos fazem pouco da nossa mensagem, dizendo que tais ensinamentos servem apenas aos fracos e aos escravos. Eles afirmam que a religião dos pagãos é superior aos nossos ensinamentos, porque inspira a aquisição de um caráter forte, robusto e agressivo. E dizem que nós transformaríamos todos em espécimes debilitados de homens não resistentes e passivos, que seriam logo eliminados da face da Terra. Eles gostam de ti, Mestre, e admitem voluntariamente que o teu ensinamento é celeste e ideal, mas eles não nos levarão a sério. Afirmam que a tua religião não é para este mundo; que os homens não podem viver como tu ensinas. E agora, Mestre, o que diremos a esses gentios”?

143:1:3 16075 Depois de ter ouvido outras objeções semelhantes, ao evangelho do Reino, apresentadas por Tomé, Natanael, Simão zelote e Mateus, ele disse aos doze:

143:1:4 16081 “Eu vim a este mundo para fazer a vontade do meu Pai e para revelar o Seu caráter amoroso a toda a humanidade. Essa, meus irmãos, é a minha missão. E vou realiza-la, independentemente da má compreensão dos meus ensinamentos, pelos judeus ou gentios, nos dias presentes ou em outra geração. Mas vós não deveis esquecer-vos do fato de que mesmo o amor divino tem suas disciplinas severas. O amor de um pai pelo seu filho muitas vezes leva o pai a restringir os atos pouco sábios da sua prole imprudente. O filho nem sempre compreende a sabedoria e o amor dos motivos da disciplina restritiva do pai. Todavia, eu declaro a vós que o meu Pai, no Paraíso, rege o universo dos universos por meio do poder do pulso do seu amor. O amor é a maior de todas as realidades do espírito. A verdade é uma revelação libertadora, mas o amor é a relação suprema. E quaisquer que sejam os erros cometidos pelos vossos semelhantes, na direção do mundo de hoje, o evangelho que eu proclamo, em uma idade que virá, irá reger este mesmo mundo. A meta última do progresso humano é o reconhecimento reverente da paternidade de Deus, e a materialização, pelo amor, da irmandade dos homens.

143:1:5 16082 “E quem vos disse que o meu evangelho é destinado apenas aos escravos e aos debilitados? E vós, meus apóstolos escolhidos, acaso pareceis débeis? Será que João tem a aparência de um fraco? Vós já presenciastes a mim sendo escravizado pelo medo? É bem verdade, os pobres e os oprimidos desta geração têm o evangelho pregado para eles. As religiões deste mundo têm negligenciado os pobres, mas o meu Pai não tem preferência por ninguém. Além disso, os pobres desta época são os primeiros a dar atenção ao chamado de arrependimento e de aceitação da filiação. O evangelho do Reino deve ser pregado a todos os homens – judeus e gentios, gregos e romanos, ricos e pobres, livres e escravos – e igualmente aos jovens e velhos, aos homens e às mulheres.

143:1:6 16083 “Porque o meu Pai é um Deus de amor e de júbilo, na prática da misericórdia, não vos impregneis da idéia de que o serviço do Reino deva ser de facilidade monótona. A ascensão ao Paraíso é a aventura suprema de todos os tempos, é a árdua realização da eternidade. O serviço do Reino, na Terra, apelará para toda a virilidade corajosa que vós e os vossos colaboradores puderem reunir. Muitos de vós sereis levados à morte, por causa da vossa lealdade ao evangelho deste Reino. Fácil é morrer na linha física da batalha, quando a vossa coragem é fortalecida pela presença dos vossos camaradas na luta, mas uma forma mais elevada e mais profunda de coragem humana e de devoção é necessária para sacrificar a vossa vida, calmamente e a sós, pelo amor de uma verdade guardada no relicário do vosso coração mortal.

143:1:7 16084 “Hoje, os descrentes podem escarnecer de vós, por causa da pregação de um evangelho de não-resistência e de vidas sem violência, mas vós sois os primeiros voluntários de uma longa linha de crentes sinceros no evangelho deste Reino e irão maravilhar a toda a humanidade pela sua devoção heróica a esses ensinamentos. Nenhum exército do mundo jamais demonstrou mais coragem e bravura do que as que serão mostradas por vós e pelos vossos sucessores leais, que se espalharão por todo o mundo proclamando as boas-novas – a paternidade de Deus e a irmandade entre os homens. A coragem da carne é a forma mais baixa de bravura. A bravura da mente é um tipo mais elevado de coragem humana, e o tipo mais elevado e supremo de bravura é a de lealdade sem concessões às convicções esclarecidas das realidades espirituais profundas. E essa coragem constitui-se no heroísmo do homem sabedor de Deus. E vós sois, todos, homens conhecedores de Deus, na verdade sois os companheiros pessoais do Filho do Homem”.

143:1:8 16085 Essa não é a totalidade do que Jesus disse, naquela ocasião, mas é a introdução do seu discurso; e ele delongou-se na amplificação e na ilustração de tudo o que falou. Essa foi uma das elocuções mais apaixonadas que Jesus fez aos doze. Raramente o Mestre falara aos seus apóstolos com uma veemência tão evidente, contudo essa foi uma daquelas ocasiões em que ele falou com uma gravidade manifesta, acompanhada de emoção especial.

143:1:9 16091 O resultado sobre a pregação pública e a ministração pessoal dos apóstolos foi imediato; desde esse mesmo dia, a mensagem deles teve um novo tom de predomínio da coragem. Os doze continuaram a adquirir um espírito positivamente dinâmico de agregação em torno do novo evangelho do Reino. Desse dia em diante eles não mais se ocuparam tanto com a pregação contra as virtudes negativas, nem com as injunções passivas dos ensinamentos multifacetados do Mestre.

2. A LIÇÃO DA MESTRIA SOBRE SI PRÓPRIO


143:2:1 16092 O Mestre foi um exemplo perfeito de autocontrole humano. Quando insultado, não insultava; quando sofria, não proferia nenhuma ameaça contra aqueles que o atormentavam; quando foi denunciado pelos seus inimigos, ele simplesmente entregou-se ao julgamento justo do Pai no céu.

143:2:2 16093 Numa das conversas noturnas, André perguntou a Jesus: “Mestre, devemos praticar a renúncia como João nos ensinou, ou devemos buscar o autocontrole que está nos teus ensinamentos? Em que os teus ensinamentos diferem dos de João?” Jesus respondeu: “João de fato vos ensinou o caminho da retidão de acordo com a luz e as leis dos pais dele e estas formavam uma religião de auto-exame e de auto-renúncia. Mas eu venho com uma nova mensagem de auto-esquecimento e de autocontrole. Eu mostro a vós o caminho da vida, como foi revelado a mim pelo meu Pai no céu.

143:2:3 16094 “Em verdade, em verdade, digo a vós, que aquele que conquista o controle sobre o próprio ego é maior do que aquele que conquista uma cidade. A automestria é a medida da natureza moral do homem; e é indicadora do seu desenvolvimento espiritual. Na velha ordem vós jejuastes e orastes; e como novas criaturas que sois, do renascimento pelo espírito, vos é ensinado a acreditar e a rejubilar. No Reino do Pai, vós deveis tornar-vos novas criaturas; as velhas coisas devem passar; observai, pois eu vos mostro como todas as coisas devem tornar-se novas. E, pelo amor que tendes uns pelos outros, vós deveis convencer o mundo de que passastes da escravidão à liberdade, da morte para a vida eterna.

143:2:4 16095 “Pelo velho caminho vós buscais suprimir, obedecer e vos colocar em conformidade com as regras do viver; pelo novo caminho vós sois primeiro transformados, na vossa alma interior, pelo Espírito da Verdade e sois fortalecidos por ele, com a renovação espiritual constante da vossa mente e, assim, vós sois dotados com o poder de atuar de modo certo, rejubilante e cumprindo, com graça e aceitação, a vontade perfeita de Deus. Não vos esqueçais – de que é a vossa fé, pessoal, nas promessas imensamente grandes e preciosas de Deus, o que assegura que vos tornareis participantes da natureza divina. Assim, pela vossa fé e pela transformação do espírito, vós vos tornais na realidade os templos de Deus; e o espírito Dele, de fato, reside dentro de vós. Se, então, o espírito reside em vós, não mais sois escravos da carne, mas sois sim filhos livres e libertos do espírito. A nova lei do espírito dota-vos com a liberdade do autocontrole e da automestria, em substituição à velha lei do medo, da escravidão e prisão ao ego, na auto-renúncia.

143:2:5 16096 “Muitas vezes, após haverdes feito o mal, vós pensastes em atribuir os vossos atos à influência do maligno, quando, em realidade, fostes levados pelas vossas próprias tendências naturais. E o profeta Jeremias não vos disse, há muito tempo, que o coração humano engana, acima de todas as coisas, e que é, algumas vezes, até mesmo desesperadamente perverso? Quão fácil para vós é que sejais enganados e que por isso caiais em medos tolos, em concupiscências diversas, em prazeres escravizantes, em malícia, em inveja e mesmo no ódio vingativo!

143:2:6 16101 “A salvação acontece pela regeneração do espírito, e não pelos atos de auto-retidão da carne. Vós vos justificais pela fé, e pela graça sois admitidos à comunhão entre irmãos, e não pelo medo e pela renúncia da carne; embora os filhos do Pai, nascidos do espírito, sejam sempre e cada vez mais os mestres sobre o próprio ego e tudo o que é pertinente aos desejos da carne. Quando souberdes que sois salvos pela fé, vós estareis na paz real de Deus. E tudo o que vier no caminho dessa paz celeste está destinado a ser santificado no serviço eterno dos filhos, sempre em avanço, do Deus eterno. Doravante, não é um dever, mas é como um alto privilégio que, ao buscardes a perfeição no amor do Pai, vos limpeis de todos os males da mente e do corpo.

143:2:7 16102 “A vossa filiação tem o seu fundamento na fé, e vós deveis permanecer insensíveis ao medo. O vosso júbilo nasce da confiança na palavra divina e, conseqüentemente, vós não sereis levados a duvidar da realidade do amor e da misericórdia do Pai. É a bondade mesma de Deus que conduz os homens ao arrependimento verdadeiro e genuíno. O vosso segredo da mestria e do controle sobre o ego está ligado à vossa fé no espírito residente, que sempre trabalha por amor. Mesmo essa fé salvadora que tendes, não a tendes por vós próprios; é também uma dádiva de Deus. E, se sois filhos dessa fé viva, não sois mais escravos do vosso ego, pois sois antes os mestres triunfantes de vós próprios, sois os filhos libertados de Deus.

143:2:8 16103 “Se, pois, sois nascidos do espírito, então, meus filhos, estais para sempre libertados das correntes autoconscientes de uma vida de auto-renúncia e de vigilância sobre os desejos da carne, e vós sois transladados para o Reino rejubilante do espírito, do qual espontaneamente vós mostrareis os frutos, vindos do espírito, na vossa vida diária; e os frutos do espírito são, em essência, o tipo mais elevado de autocontrole agradável e enobrecedor; são mesmo o auge da realização terrestre para os mortais – a verdadeira mestria sobre vós próprios”.

3. DIVERSÃO E DESCANSO


143:3:1 16104 Nesse momento, um estado de grande tensão nervosa e emocional desenvolveu-se entre os apóstolos e os seus condiscípulos imediatos. Eles ainda não se haviam acostumado a viver e a trabalhar juntos. Estavam experimentando dificuldades cada vez maiores para manter relações harmoniosas com os discípulos de João. O contato com os gentios e os samaritanos foi uma grande provação para esses judeus. E, além de tudo isso, as afirmações recentes de Jesus tinham aumentado o sua tumulto mental. André estava quase fora de si; não sabia mais o que fazer, e assim ele foi até o Mestre, levando os seus problemas e perplexidades. Depois de ter escutado o dirigente apostólico relatar os seus problemas, Jesus disse: “André, tu não podes retirar dos homens as suas perplexidades quando eles estão nesse nível de envolvimento, e quando tantas pessoas e sentimentos violentos estão implicados. Eu não posso fazer o que pedes a mim – eu não participarei dessas dificuldades sociais pessoais –, mas estarei convosco, no gozo de um período de três dias de descanso e de repouso. Vá aos teus irmãos e anuncie que todos irão comigo ao monte Sartaba, onde eu desejo descansar um dia ou dois.

143:3:2 16105 “Agora deves ir aos teus onze irmãos e falar a cada um deles em particular, dizendo: ‘O Mestre deseja que tenhamos um período de descanso e de relaxamento, a sós com ele. Já que todos nós recentemente experimentamos muitos aborrecimentos de espírito e de tensão mental, eu sugiro que não se faça menção às nossas preocupações e provações, enquanto estivermos nesse descanso. Posso confiar em ti para cooperar comigo nessa questão?’ E, desse modo, fala privada e pessoalmente a cada um dos teus irmãos”. E André fez como o Mestre havia instruído que fizesse.

143:3:3 16111 Essa foi uma ocasião maravilhosa, nas experiências de cada um deles; e nunca se esqueceram do dia em que subiram a montanha. Durante toda a viagem, dificilmente foi dita uma palavra sobre os próprios problemas. Ao chegarem ao topo da montanha, Jesus assentou-os em volta de si e disse: “Meus irmãos, deveis aprender o valor do descanso e a eficácia do relaxamento. Deveis compreender que o melhor método de resolver certos problemas emaranhados é o de abandoná-los por algum tempo. Então, quando voltardes refrescados do descanso ou da adoração, estareis aptos a atacar os vossos problemas com uma cabeça mais clara e com a mão mais firme, para não mencionar o coração que estará mais resoluto. De novo, muitas vezes vereis que o problema terá o seu tamanho e as suas proporções encolhidas, durante o tempo em que estivestes descansando a vossa mente e o vosso corpo”.

143:3:4 16112 No dia seguinte Jesus designou a cada um dos doze um tópico para a discussão. O dia todo foi devotado a reminiscências e a conversas sobre questões não ligadas ao trabalho religioso. Eles ficaram momentaneamente chocados quando Jesus até deixou de fazer os agradecimentos – verbais – no momento de partir o pão para a refeição do meio-dia. Essa foi a primeira vez que perceberam haver ele negligenciado tais formalidades.

143:3:5 16113 Quando subiram a montanha, a cabeça de André estava cheia de problemas. João tinha o coração excessivamente perplexo. Tiago, a alma gravemente perturbada. Mateus estava muito pressionado, por causa da falta de fundos no caixa, desde que eles permaneciam entre os gentios. Pedro encontrava-se extenuado e, ultimamente, andava mais temperamental do que de costume. Judas sofria de um ataque periódico de sensibilidade e de egoísmo. Simão parecia anormalmente desnorteado nos seus esforços para reconciliar o seu patriotismo com o amor pela irmandade dos homens. Filipe estava mais e mais confuso com o modo pelo qual as coisas caminhavam. Natanael tinha estado com menos bom humor desde que eles haviam entrado em contato com as populações gentias, e Tomé achava-se em meio a uma crise severa de depressão. Apenas os gêmeos aparentavam estar normais e sem perturbações. Todos eles andavam excessivamente atordoados com a questão de como se darem pacificamente com os discípulos de João.

143:3:6 16114 Ao terceiro dia, quando iniciaram a descida da montanha, para voltar ao acampamento, uma grande mudança havia acontecido neles. Tinham feito a descoberta importante de que muitas das perplexidades humanas na realidade inexistem, de que muitos problemas que nos pressionam são criações de um medo e de uma apreensão exagerados. Haviam aprendido que todas essas perplexidades são mais bem manipuladas quando abandonadas; ao distanciarem-se, eles deixaram que os problemas se resolvessem por si próprios.

143:3:7 16115 O regresso dessa folga marcou a abertura de um período de relações bastante melhores com os seguidores de João. Alguns dos doze realmente se viram possuídos de alegria quando perceberam como tudo mudara nas mentes de todos e quando observaram que estavam livres das irritações, tendo tudo surgido como resultado dos três dias de férias dos deveres rotineiros da vida. Há sempre o perigo de que a monotonia no contato humano multiplique em muito as perplexidades e aumente as dificuldades.

143:3:8 16116 Não eram muitos os gentios, nas duas cidades gregas de Arquelais e Fasaeles, que acreditavam no evangelho, mas os doze apóstolos ganharam uma boa experiência nesse seu primeiro trabalho extenso, exclusivamente com populações gentias. Numa segunda-feira pela manhã, por volta do meio da metade do mês, Jesus disse a André: “Vamos para a Samaria”. E eles partiram imediatamente para a cidade de Sichar, perto do poço de Jacó.

4. OS JUDEUS E OS SAMARITANOS


143:4:1 16121 Por mais de seiscentos anos os judeus da Judéia, e mais tarde também os da Galiléia, mantinham uma inimizade em relação aos samaritanos. Esse sentimento prejudicial, entre os judeus e os samaritanos, surgira da seguinte maneira: Cerca de setecentos anos a. C. , Sargon, rei da Assíria, ao subjugar uma revolta na Palestina Central, levou consigo em cativeiro mais de vinte e cinco mil judeus do reino do norte de Israel e instalou no lugar deles um número quase igual de descendentes de cutitas, de sefarvitas e de hamatitas. Mais tarde, Assurbanipal enviou ainda outras colônias para residirem em Samaria.

143:4:2 16122 A inimizade religiosa entre os judeus e os samaritanos data do retorno dos judeus do cativeiro na Babilônia, quando os samaritanos trabalharam para impedir a reconstrução de Jerusalém. Mais tarde eles ofenderam os judeus quando estenderam uma ajuda amigável aos exércitos de Alexandre. Em retribuição à amizade deles, Alexandre deu aos samaritanos a permissão para construírem um templo no monte Gerizim, onde eles adoravam Yavé e os seus deuses tribais e ofereciam sacrifícios muito semelhantes aos da ordem dos serviços dos templos de Jerusalém. E eles continuaram com esse culto, ao menos até a época dos macabeus, quando João Hircano destruiu o templo deles no monte Gerizim. Depois da morte de Jesus, o apóstolo Filipe, nos seus trabalhos com os samaritanos, realizou muitos encontros no local desse velho templo samaritano.

143:4:3 16123 Os antagonismos entre os judeus e os samaritanos tornaram-se históricos e tradicionais; desde os dias de Alexandre eles davam-se cada vez menos bem uns com os outros. Os doze apóstolos não eram avessos a pregar nas cidades gregas e em outras cidades gentias da Decápolis e da Síria, mas surgia um teste severo para a sua lealdade ao Mestre, quando este dizia: “Vamos a Samaria”. Contudo, no período de pouco mais de um ano, em que estiveram com Jesus, eles desenvolveram uma forma de lealdade pessoal que transcendia até mesmo a sua fé nos ensinamentos do Mestre e os próprios preconceitos contra os samaritanos.

5. A MULHER DE SICHAR


143:5:1 16124 Quando o Mestre e os doze chegaram ao poço de Jacó, Jesus, estando cansado da viagem, parou ao lado do poço, enquanto Filipe levou os apóstolos consigo para ajudar a levar comida para as tendas de Sichar, pois estavam eles dispostos a permanecer um pouco mais nessa vizinhança. Pedro e os filhos de Zebedeu teriam permanecido com Jesus, mas este solicitou que fossem com os seus irmãos, dizendo: “Não temais por mim; esses samaritanos serão amigáveis; apenas os nossos irmãos, os judeus, tentam causar danos a nós”. E eram quase seis horas, nessa tarde de verão, quando Jesus assentou-se junto ao poço para aguardar pelo retorno dos apóstolos.

143:5:2 16125 A água do poço de Jacó era menos mineral do que a dos poços de Sichar e, portanto, era de muito mais valor para ser bebida. Jesus estava com sede, mas não havia nenhum meio de retirar a água do poço. Foi quando uma mulher de Sichar surgiu, com o seu cântaro de água, e preparou-se para tirar água do poço, e Jesus disse-lhe: “Dê-me um pouco para beber”. Essa mulher da Samaria sabia que Jesus era judeu, pela sua aparência e roupas, e supôs que ele fosse galileu por causa do seu sotaque. Chamava-se Nalda e era uma pessoa atraente. Ficou muito surpreendida de ouvir um homem judeu falando assim a ela, junto ao poço, pedindo água, pois não era considerado próprio, naqueles dias, a um homem que se respeitasse falar a uma mulher em público, e muito menos que um judeu conversasse com uma samaritana. E, sendo assim, Nalda perguntou a Jesus: “Como é que tu, sendo um judeu, pedes a mim, uma mulher samaritana, água para beber?” Jesus respondeu: “De fato eu lhe pedi um pouco de água, mas se tu pudesses compreender, tu me pedirias um pouco da água da vida”. Então Nalda disse: “Mas, Senhor, tu não tens com que retirar água, e o poço é profundo; de onde, então, podes tirar essa água da vida? Será que és maior do que o nosso pai Jacó que nos deu este poço, e do qual ele próprio bebeu tanto quanto os seus filhos e o seu gado também”?

143:5:3 16131 Jesus respondeu: “Todos os que beberem dessa água terão sede novamente, mas quem beber da água do espírito vivo nunca mais terá sede. Essa água da vida tornar-se-á dentro dele como um poço de água fresca, jorrando até a vida eterna”. Nalda então disse: “Dê-me dessa água para que eu não sinta mais sede, nem tenha que vir até aqui para retirar mais água. Além do mais, qualquer coisa que uma mulher samaritana possa receber de um judeu, tão louvável, seria um prazer”.

143:5:4 16132 Nalda não sabia como encarar a boa disposição com a qual Jesus conversava com ela. E via, no rosto do Mestre, a expressão de um homem íntegro e santo, mas confundia a boa vontade dele com alguma familiaridade comum; assim ela tomou a sua fala simbólica como um modo dele se insinuar para ela. E, sendo uma mulher de moralidade pouco rígida, estava disposta a iniciar abertamente um namorico, quando Jesus, olhando bem fundo nos seus olhos, disse, em uma voz que demonstrava autoridade: “Mulher, vá buscar o seu marido e traga-o aqui”. Essa ordem trouxe Nalda de volta a si. Ela notou que tinha entendido mal a bondade do Mestre; e percebeu que havia interpretado mal o sentido das suas palavras. E chegou a ficar amedrontada; e começou a compreender que estava diante de uma pessoa excepcional e, buscando na sua mente uma resposta adequada, em uma grande confusão, ela disse: “Senhor, eu não posso chamar o meu marido, pois não tenho nenhum marido”. Então Jesus disse: “Tu disseste a verdade, pois, ainda que tenhas tido um marido, aquele com quem tu estás vivendo agora, não é o teu marido. Melhor seria se pudesses deixar de tomar as minhas palavras levianamente, e se procurasses achar a água da vida que eu hoje te ofereci”.

143:5:5 16133 Nesse momento Nalda estava mais calma, e o seu eu mais elevado tinha sido despertado. Ela não era uma mulher imoral por escolha, totalmente. Havia sido rude e injustamente posta de lado pelo marido e, nessa situação desesperada, tinha consentido em viver com um certo grego, como mulher dele, mas sem casamento. Nalda agora se envergonhava muito de ter falado impensadamente a Jesus, e penitentemente ela dirigiu-se ao Mestre, dizendo: “Meu Senhor, arrependo-me pelos meus modos de falar convosco, pois percebo que és um homem santo ou talvez um profeta”. E ela estava a ponto de buscar a ajuda direta e pessoal do Mestre quando então fez o que muitos têm feito antes e subitamente evadiu-se da questão da salvação pessoal, voltando-se para a discussão sobre a teologia e a filosofia. Rapidamente ela conduziu a conversa passando das suas próprias necessidades para uma controvérsia teológica. Apontando para o monte Gerizim, ela continuou: “Os nossos pais fizeram a sua adoração nessa montanha, e tu dizes que Jerusalém é o local onde os homens devem adorar; qual, então, é o local certo para adorar a Deus?”

143:5:6 16134 Jesus percebeu a tentativa da alma da mulher de evitar o contato direto e de busca com o seu Criador, mas percebeu também presente na sua alma um desejo de saber qual o melhor caminho na vida. Afinal, no coração de Nalda havia uma sede verdadeira da água da vida; e, assim, ele tratou-a com paciência, dizendo: “Mulher, deixe-me dizer-te que virá logo o dia em que nem nessa montanha, nem em Jerusalém, tu adorarás o Pai. E agora tu adoras aquilo que não conheces, uma mistura da religião de muitos deuses pagãos e de filosofias gentias. Os judeus ao menos sabem a quem adoram; eles acabaram com toda a confusão, concentrando a sua adoração em um único Deus, Yavé. E tu deverias acreditar em mim quando digo que a hora logo virá – e já veio, agora mesmo – em que todos os adoradores sinceros adorarão o Pai em espírito e em verdade, pois são exatamente a esses adoradores que o Pai procura. Deus é espírito, e aqueles que O adoram devem adorar a Ele em espírito e em verdade. A tua salvação não vem de saberes como os outros deveriam adorar, nem onde, mas vem de receberes no teu próprio coração essa água da vida que eu estou oferecendo a ti, neste momento”.

143:5:7 16141 Nalda faria, contudo, ainda um outro esforço para evitar falar da questão embaraçosa da sua vida pessoal na Terra e do status da sua alma diante de Deus. Uma vez mais, ela recorreu a perguntas sobre a religião em geral, dizendo: “Sim, eu sei, senhor, que João pregou sobre a vinda do Convertedor, daquele que será chamado de Libertador, e que, quando vier, ele declarará para nós todas as coisas” – e Jesus, interrompendo Nalda, disse com uma segurança surpreendente: “Eu, que falo a ti, sou ele”.

143:5:8 16142 Esse foi o primeiro pronunciamento direto, positivo e indisfarçado da sua natureza e filiação divina que Jesus fez na Terra; e foi feito a uma mulher, a uma samaritana, uma mulher de caráter questionável aos olhos dos homens, até esse momento, mas uma mulher a quem o olho divino contemplou, como sendo alguém contra quem se tinha pecado mais do que pecara ela própria por seu próprio desejo; sendo agora uma alma humana que desejava a salvação, que a desejava sinceramente e de todo o seu coração, e isso era suficiente.

143:5:9 16143 Quando Nalda estava para falar sobre a sua aspiração pessoal real por coisas melhores e por um caminho mais nobre de viver, quando ela estava pronta para falar sobre o desejo real do seu coração, os doze apóstolos voltaram de Sichar, e, deparando com a cena de Jesus falando tão intimamente com essa mulher – essa mulher samaritana, e a sós –, eles ficaram mais do que atônitos. Rapidamente colocaram no chão os suprimentos e permaneceram ao lado, nenhum deles ousando reprová-lo, enquanto Jesus dizia a Nalda: “Mulher, tome o teu caminho; Deus te perdoou. De agora em diante viverás uma nova vida. Já recebeste a água da vida, e uma nova alegria brotará dentro da tua alma e tornar-te-ás filha do Altíssimo”. E a mulher, percebendo a desaprovação dos apóstolos, abandonou o seu pote de água e fugiu para a aldeia.

143:5:10 16144 Ao entrar na aldeia, ela proclamou a todos o que havia encontrado: “Ide ao poço de Jacó e ide depressa, pois lá vereis um homem que falou de tudo o que eu fiz. Será que ele pode ser o Convertedor?” E, antes que o sol se pusesse, uma grande multidão reuniu-se no poço de Jacó para ouvir Jesus. E o Mestre falou-lhes ainda mais sobre a água da vida, a dádiva do espírito residente.

143:5:11 16145 Os apóstolos nunca deixaram de chocar-se com a disposição que Jesus tinha de falar com mulheres, mulheres de caráter discutível, e imorais mesmo. Era muito difícil para Jesus ensinar aos seus apóstolos que as mulheres, mesmo as mulheres chamadas imorais, têm almas que podem escolher Deus como Pai delas, tornando-se assim filhas de Deus e candidatas à vida eterna. E, mesmo dezenove séculos depois, muitos ainda demonstram a mesma relutância em compreender os ensinamentos do Mestre. Mesmo a religião cristã tem sido construída persistentemente sobre o fato da morte de Cristo e não sobre a verdade da sua vida. O mundo deveria estar mais ocupado com a vida feliz, e reveladora de Deus, que Jesus levou, do que com a sua morte trágica e pesarosa.

143:5:12 16146 Nalda contou toda essa história ao apóstolo João, no dia seguinte, mas ele nunca a revelou plenamente aos outros apóstolos, e Jesus não falou detalhadamente desse acontecimento aos doze.

143:5:13 16151 Nalda contou a João que Jesus tinha contado a ela “tudo o que eu fiz na minha vida”. João quis perguntar a Jesus, muitas vezes, sobre essa conversa com Nalda, mas nunca o fez. Jesus apenas havia contado a ela uma coisa sobre ela própria, mas o olhar fundo nos olhos dela e o modo como ele a tratara trouxeram-lhe, em uma revisão panorâmica, tudo, bem diante da sua mente, em um lapso de tempo tal que ela associou toda essa auto-revelação, da própria vida que levara, ao olhar e à palavra do Mestre. Jesus nunca lhe havia dito que ela tivera cinco maridos. Ela vivera com quatro homens diferentes, desde que o seu marido a deixara, e isso, junto com todo o seu passado, veio vividamente à sua mente no momento em que compreendeu que Jesus era um homem de Deus, tanto que ela acabou repetindo depois, para João, que Jesus tinha realmente dito a ela tudo sobre a sua vida pessoal.

6. O RENASCIMENTO SAMARITANO


143:6:1 16152 Na noite em que Nalda levou a multidão até o lado de fora de Sichar, para ver Jesus, os doze tinham acabado de voltar com comida; e eles suplicaram a Jesus que comesse com eles em vez de falar com o povo, pois eles tinham estado sem comer todo o dia e estavam famintos. Jesus, entretanto, sabia que a escuridão logo os envolveria; e, desse modo, persistiu na sua determinação de conversar com o povo, antes de mandar todos embora. Quando André tentou persuadi-lo a comer um pouco, antes de falar à multidão, Jesus replicou: “Eu tenho, para comer, um alimento do qual vós nada sabeis”. Quando os apóstolos ouviram isso, eles disseram entre si: “Será que algum homem lhe trouxe algo para comer? Pode ser que a mulher tenha dado comida a ele junto com o que lhe deu para beber?” Quando Jesus os ouviu falando entre si, antes de falar ao povo, ele voltou-se de lado para dizer aos doze: “O meu alimento é fazer a vontade Dele, que me enviou, e realizar o Seu trabalho. Vós não devíeis mais dizer que há tanto e mais tanto tempo ainda antes da colheita. Vejais esse povo vindo de uma cidade samaritana para ouvir-nos; eu vos digo que os campos já estão brancos para a colheita. Aquele que colhe recebe o salário, e junta o fruto para a vida eterna; conseqüentemente os semeadores e os colhedores rejubilam-se juntos. Pois aqui reside a verdade do ditado: ‘Um semeia e o outro colhe’. Eu agora vos estou enviando para colher onde não trabalhastes; outros trabalharam, e vós estais para entrar no trabalho deles”. Isso ele disse referindo-se à pregação de João Batista.

143:6:2 16153 Jesus e os apóstolos foram a Sichar e pregaram durante dois dias, antes de montarem o acampamento deles no monte Gerizim. E muitos dos habitantes de Sichar acreditaram no evangelho e pediram o batismo, mas os apóstolos de Jesus não batizavam ainda.

143:6:3 16154 Na primeira noite do acampamento, no monte Gerizim, os apóstolos esperaram que Jesus os reprovasse pela atitude deles para com a mulher, no poço de Jacó, mas ele não fez referência à questão. Em vez disso fez-lhes aquela maravilhosa palestra sobre “As realidades que são as mais importantes no Reino de Deus”. Em qualquer religião é muito fácil permitir que valores assumam uma grandeza desproporcional, como também é fácil permitir que acontecimentos ocupem o lugar da verdade, na teologia. O fato da cruz tornou-se o centro mesmo do cristianismo, que veio em seguida; mas não é essa a verdade central da religião que se pode derivar da vida e dos ensinamentos de Jesus de Nazaré.

143:6:4 16155 O tema dos ensinamentos de Jesus no monte Gerizim foi: Ele queria que todos os homens vissem a Deus como um Pai-amigo, exatamente como ele (Jesus) é um amigo-irmão. De novo e de novo, ele inculcou neles o fato de que o amor é a relação mais elevada no mundo – no universo –, do mesmo modo que a verdade é o maior pronunciamento sobre a observação dessas relações divinas.

143:6:5 16161 Jesus revelou-se assim tão completamente aos samaritanos porque ele podia fazê-lo com segurança, e porque sabia que não visitaria de novo o centro da Samaria para pregar o evangelho do Reino.

143:6:6 16162 Jesus e os doze permaneceram acampados no monte Gerizim até o fim de agosto. Eles pregavam as boas-novas do Reino – a paternidade de Deus – aos samaritanos, nas aldeias, dia após dia, e passavam as noites no acampamento. O trabalho que Jesus e os doze fizeram nessas cidades samaritanas conduziu muitas almas ao Reino e fez muito para preparar o caminho ao trabalho maravilhoso de Filipe nessas regiões, depois da morte e da ressurreição de Jesus, em seguida à dispersão dos apóstolos até os confins da Terra, na perseguição amarga dos crentes em Jerusalém.

7. ENSINAMENTOS SOBRE A PRECE E A ADORAÇÃO


143:7:1 16163 Nas conversas noturnas no monte Gerizim, Jesus ensinou muitas grandes verdades e, em particular, colocou ênfase no seguinte:

143:7:2 16164 A verdadeira religião é o ato de uma alma individual, nas suas relações autoconscientes com o Criador; a religião organizada é a tentativa de socializar o ato da adoração do homem religioso individual.

143:7:3 16165 A adoração – a contemplação do espiritual – deve alternar-se com o serviço, o contato com a realidade material. O trabalho deveria alternar-se com a diversão; a religião deveria ser equilibrada pelo humor. A filosofia profunda deveria receber o alívio da poesia rítmica. A tensão de viver – a tensão da personalidade no tempo – deveria ser afrouxada, no descanso da adoração. Os sentimentos de insegurança que advêm do medo do isolamento da personalidade no universo deveriam receber o antídoto que é a contemplação, na fé, do Pai, e que é a tentativa de realização e compreensão do Supremo.

143:7:4 16166 A prece é destinada a tornar o homem menos pensativo e mais realizador; ela não se destina a fazer o conhecimento crescer, mas antes a expandir o discernimento.

143:7:5 16167 A adoração intenta antecipar a vida melhor, que está adiante, e em seguida destina-se a refletir de volta, para a vida atual, essas novas significações espirituais. A prece sustenta espiritualmente, mas a adoração é divinamente criativa.

143:7:6 16168 A adoração é a técnica de voltar-se para o Um, para receber a inspiração do serviço de muitos. A adoração é a medida pela qual se avalia o distanciamento da alma, até o universo material, e a sua conexão simultânea e segura com as realidades espirituais de toda a criação.

143:7:7 16169 A prece é como a autolembrança – um pensamento sublime; a adoração é o auto-esquecimento – o suprapensamento. A adoração é a atenção sem esforço, o repouso verdadeiro e ideal para a alma, uma forma de exercício espiritual repousante.

143:7:8 161610 A adoração é o ato de uma parte identificando-se com o Todo; o finito com o Infinito; o filho com o Pai; o tempo no ato de um passo que toca a eternidade. A adoração é o ato da comunhão pessoal do filho com o Pai divino, é deixar que a alma-espírito assuma atitudes reanimadoras, criativas, fraternais e românticas.

143:7:9 161611 Embora os apóstolos tenham captado apenas pouco dos seus ensinamentos no acampamento, outros mundos captaram; e novas gerações na Terra irão alcançar esses ensinamentos.

DOCUMENTO 144

EM GILBOA E NA DECÁPOLIS
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Setembro e outubro foram passados em retiro num acampamento isolado, nos declives do monte Gilboa. O mês de setembro Jesus passou-o lá, a sós com os seus apóstolos, ensinando a eles e instruindo-os sobre as verdades do Reino.

144:0:2 16172 Havia uma série de razões para que Jesus e os seus apóstolos se mantivessem retirados nas fronteiras da Samaria e da Decápolis, durante esse período. Os dirigentes religiosos de Jerusalém estavam bastante hostis para com eles; Herodes Antipas ainda mantinha João na prisão, temendo libertá-lo, tanto quanto executá-lo; e havia suspeitas de que João e Jesus mantivessem ainda alguma forma de ligação. Essas condições tornaram contra-indicado planejar qualquer trabalho mais intenso, tanto na Judéia quanto na Galiléia. Havia uma terceira razão: a tensão, que aumentava pouco a pouco, entre os líderes dos discípulos de João e os apóstolos de Jesus, e que se agravou com o número cada vez maior de crentes.

144:0:3 16173 Jesus sabia que os dias de trabalhos preliminares, de ensinamento e de pregação, estavam quase terminados, que o próximo passo envolvia o começo do esforço maior e final da sua vida na Terra, e não queria que o deslanchar desse empreendimento fosse, de nenhum modo, penoso nem embaraçoso para João Batista. Jesus, portanto, havia decidido passar algum tempo em retiro, repassando tudo com os seus apóstolos, para depois, então, fazer, reservadamente, algum trabalho, nas cidades da Decápolis, até que João fosse executado ou libertado para juntar-se a eles com vistas a um esfoço unificado.

1. O ACAMPAMENTO DE GILBOA


144:1:1 16174 Com o passar do tempo, os doze tornaram-se mais devotados a Jesus e mais profundamente compromissados com o trabalho do Reino. A devoção deles era, em grande parte, uma questão de lealdade pessoal. Eles não captavam o ensinamento multifacetado de Jesus; eles não compreendiam plenamente a natureza nem o significado da sua auto-outorga na Terra.

144:1:2 16175 Jesus deixou claro, para os seus apóstolos, que estavam todos em retiro por três razões:

16176 1. Para confirmar o entendimento e a fé, que deviam ter no evangelho do Reino.

16177 2. Para dar tempo a que a oposição ao trabalho deles, na Judéia e na Galiléia, se acalmasse.

16178 3. E para aguardar o destino de João Batista.

144:1:3 16179 Enquanto permaneceram em Gilboa, Jesus contou aos doze muita coisa sobre a primeira parte da sua vida e das suas experiências no monte Hermom; revelou também algo do que acontecera nas colinas, durante os quarenta dias imediatamente após o seu batismo.

144:1:4 16181 E ordenou diretamente a eles que não contassem a nenhum homem sobre essas experiências, antes que ele voltasse para o Pai. Durante essas semanas do mês de setembro, eles descansaram, conversaram, rememoraram as próprias experiências desde que Jesus os chamara para o serviço e empenharam-se em um esforço sério para coordenar tudo o que o Mestre lhes tinha ensinado até então. Até um certo ponto, todos sentiam que essa seria a última oportunidade para um descanso prolongado. Compreenderam que o seu próximo esforço público, tanto na Judéia quanto na Galiléia, marcaria o começo da proclamação final do Reino vindouro, mas não tinham uma idéia formada sobre o que o Reino seria, quando viesse. João e André julgavam que o Reino já tinha vindo; Pedro e Tiago acreditavam que estava ainda para vir; Natanael e Tomé confessavam francamente estar perplexos; Mateus, Filipe e Simão zelote viam-se incertos e confusos; os gêmeos mantinham-se em uma ignorância abençoada sobre a controvérsia; e Judas Iscariotes permanecia silencioso, desligado de comprometimentos.

144:1:5 16182 Durante grande parte desse período Jesus permaneceu a sós na montanha perto do acampamento. Ocasionalmente levava Pedro, Tiago ou João junto consigo, mas, mais freqüentemente, distanciava-se para orar ou comungar a sós. Depois do batismo de Jesus, e dos quarenta dias nas colinas pereianas, não é próprio falar desses períodos de comunhão com o seu Pai como sendo uma prece, nem é compatível falar de Jesus adorando, mas é inteiramente correto fazer alusão a esses períodos como sendo os de uma comunhão pessoal com o seu Pai.

144:1:6 16183 O tema central das conversas durante todo o mês de setembro foi a prece e a adoração. Depois de terem discutido sobre a adoração, por alguns dias, Jesus finalmente pronunciou o seu memorável discurso sobre a oração, em resposta ao pedido de Tomé: “Mestre, ensine-nos como orar”.

144:1:7 16184 João tinha ensinado aos seus discípulos uma prece, uma prece para a salvação no Reino vindouro. Embora Jesus nunca tenha proibido os seus seguidores de usar a forma de oração ensinada por João, os apóstolos perceberam logo que o Mestre não aprovava totalmente a prática de utilizar orações formalmente estabelecidas. Entretanto, os crentes solicitavam constantemente que se lhes fosse ensinado como fazer as preces. Os doze almejavam saber a forma de súplica que Jesus aprovaria. E foi principalmente por causa dessa necessidade de uma prece simples, para a gente comum, que Jesus consentiu, nessa época, em responder ao pedido de Tomé, de ensinar-lhes uma forma sugestiva de prece. Jesus deu essa lição em uma tarde, na terceira semana da permanência deles no monte Gilboa.

2. O DISCURSO SOBRE A PRECE


144:2:1 16185 “João, de fato, ensinou-vos uma forma simples de prece: ‘Ó Pai, purifica-nos do pecado, mostra-nos a Tua glória, revela-nos o Teu amor e deixa que o Teu espírito santifique os nossos corações, para todo o sempre, Amém!’ Ele ensinou essa prece para que tivésseis alguma coisa para ensinar à multidão. Ele não teve a intenção de que usásseis essa súplica fixa e formal como expressão da oração das vossas próprias almas.

144:2:2 16186 “A prece é uma expressão inteiramente pessoal e espontânea da atitude da alma para com o espírito; a prece deveria ser a comunhão da filiação e a expressão da fraternidade. A prece, quando ditada pelo espírito, conduz ao progresso espiritual cooperativo. A prece ideal é uma forma de comunhão espiritual, que conduz à adoração inteligente. A verdadeira oração é uma forma sincera de estender a mão na direção do céu para alcançar os vossos ideais.

144:2:3 16191 “A prece é o respirar da alma e deveria levar-vos a serdes persistentes na vossa tentativa de melhor assegurar-se da vontade do Pai. Se um dentre vós tiver um vizinho, e se fordes a ele à meia-noite e disserdes: ‘Amigo, empresta-me três pães, pois um amigo meu chegou de viagem para ver-me e eu nada tenho para oferecer-lhe’; e se o vosso vizinho responder: ‘Não me incomode, pois a porta agora está fechada, as crianças e eu estamos na cama, e eu não posso levantar-me e dar-lhe pão’; vós havereis de persistir, explicando-lhe que o vosso amigo tem fome e que não tendes nenhuma comida para oferecer a ele. Eu vos digo, embora o vosso vizinho não vá se levantar para dar-vos o pão, só porque ele é amigo vosso, pelo vosso inoportunismo, ele acabará levantando-se e dando-vos tantos pães quantos necessitardes. E então, se a persistência consegue favores até do homem mortal, quão mais a vossa persistência conseguirá, no espírito, do pão da vida, para vós, das mãos dispostas do Pai nos céus. E, de novo, vos digo: Pedi e vos será dado; buscai e encontrareis; batei e a porta abrir-se-á para vós. Pois todos aqueles que pedem, recebem; e aquele que busca, encontra; e, para quem bate, a porta da salvação será aberta.

144:2:4 16192 “Qual de vós, sendo um pai, se o vosso filho fizer um pedido tolo, hesitaria em dar a ele, preferivelmente, mais de acordo com a vossa sabedoria de pai, do que nos termos do pedido errado do filho? Se a criança necessita de um pão, vós dar-lhe-eis uma pedra, apenas porque tolamente ela pediu a pedra? Se o vosso filho necessita de um peixe, dareis a ele uma cobra d’água, apenas porque ela veio na rede com os peixes e porque a criança imprudentemente pede a serpente? Se, pois, sendo vós mortais e finitos, sabeis como corresponder a um pedido e como fazer a dádiva boa e apropriada às vossas crianças, quão mais, o vosso Pai celeste, não dará de espírito, e de tantas bênçãos adicionais, àqueles que lhe pedem? Os homens deveriam sempre orar e não se deixar desencorajar.

144:2:5 16193 “Deixai que eu vos conte a história de um certo juiz que vivia em uma cidade perversa. Esse juiz não temia a Deus, nem tinha respeito pelos homens. Ora, nessa cidade havia uma viúva em necessidade e ela repetidamente vinha a esse juiz injusto dizendo: ‘proteja-me do meu adversário’. Por algum tempo ele não quis dar-lhe ouvidos, mas em breve ele disse a si próprio: ‘Embora eu não tema a Deus nem tenha consideração pelos homens e porque essa viúva não pára de me incomodar, eu farei jus à sua reivindicação, para que ela deixe de me cansar com as suas contínuas vindas’. Essas histórias eu as conto para encorajar-vos a persistir na prece e não para que pensem que os vossos pedidos modificarão o Pai justo e reto lá no alto. A vossa persistência, contudo, não é para ganhar favores junto a Deus, mas para modificar a vossa atitude terrena e para ampliar a capacidade de receptividade da vossa alma para com o espírito.

144:2:6 16194 “No entanto, quando orais, colocais tão pouca fé. A fé verdadeira removerá montanhas de dificuldades materiais que possam estar colocadas no meio do caminho da expansão da alma e do progresso espiritual”.

3. A PRECE DAQUELE QUE CRÊ


144:3:1 16195 Todavia, os apóstolos não estavam ainda satisfeitos, desejavam que Jesus lhes desse um modelo de prece que pudessem ensinar aos novos discípulos. Depois de ouvir esse discurso sobre a prece, Tiago Zebedeu disse: “Muito bom, Mestre, mas nós não desejamos uma forma de prece para nós próprios, tanto quanto para os crentes mais recentes, que tão freqüentemente nos pedem: ‘Ensinai-nos como orar de um modo aceitável, para o Pai no céu’ ”.

144:3:2 16196 Quando Tiago terminou de falar, Jesus disse: “Se, então, vós ainda desejais uma prece, eu gostaria de apresentar-vos aquela que ensinei aos meus irmãos e irmãs, em Nazaré:

144:3:3 16201 “Pai nosso, que estais no céu,

Santificado seja o vosso nome.

Venha a nós o vosso Reino; a vossa vontade seja feita

Assim na Terra como no céu.

O pão nosso de amanhã, dai-nos neste dia;

Refrescai as nossas almas com a água da vida.

E perdoai-nos de todas as nossas dívidas

Como nós perdoamos também aos nossos devedores.

Salvai-nos da tentação, e livrai-nos do mal,

E fazei-nos sempre mais perfeitos, como Vós o sois.

144:3:4 162011 Não é de se estranhar que os apóstolos desejassem que Jesus lhes ensinasse uma prece como modelo para os crentes. João Batista tinha ensinado várias preces aos seus seguidores; todos os grandes instrutores formularam preces para os seus alunos. Os instrutores religiosos dos judeus tinham umas vinte e cinco ou trinta preces prontas, que recitavam nas sinagogas e mesmo nas esquinas. Jesus era particularmente avesso a orar em público. Até esse momento, os doze tinham-no ouvido orar apenas umas poucas vezes. Eles viam-no passando noites inteiras em prece ou em adoração, e estavam muito curiosos para conhecer o modo ou a forma dos seus pedidos. Sentiam-se realmente muito pressionados para saber qual resposta dar às multidões quando pedissem que lhes fosse ensinado como orar, como João tinha ensinado aos seus discípulos.

144:3:5 162012 Jesus ensinou aos doze que orassem sempre reservadamente; para que ficassem a sós, em meio a redondezas silenciosas, junto à natureza, ou que fossem aos seus quartos e fechassem as portas, quando estivessem fazendo a sua prece.

144:3:6 162013 Depois da morte e da ascensão de Jesus ao Pai, entre muitos crentes, tornou-se prática terminar esta que é chamada a oração do Senhor, acrescentando: “Em nome do Senhor Jesus Cristo”. E, ainda mais tarde, duas linhas foram perdidas na transcrição, e foi acrescentada a essa prece uma afirmação suplementar que dizia: “Pois a vós pertence o Reino, e o poder e a glória, para todo o sempre”.

144:3:7 162014 Jesus deu aos apóstolos a prece em forma coletiva, como eles tinham orado no lar em Nazaré. Ele nunca ensinou uma prece formal pessoal, apenas preces grupais, familiares ou sociais. E ele nunca se dispôs a fazer isso.

144:3:8 162015 Jesus ensinou que a prece eficiente deve ser:

162016 1. Não egoísta – não apenas para si próprio.

162017 2. Crente – de acordo com a fé.

162018 3. Sincera – honesta de coração.

162019 4. Inteligente – de acordo com a luz.

162020 5. Confiante – em submissão à vontade totalmente sábia do Pai.

144:3:9 162021 Quando Jesus passou noites inteiras na montanha, em prece, foi principalmente pelos seus discípulos, e particularmente pelos doze. O Mestre fazia pouquíssimas preces para si próprio, embora praticasse bastante a adoração, aquela adoração cuja natureza é a comunhão de compreensão com seu Pai do Paraíso.

4. MAIS SOBRE A PRECE


144:4:1 162022 Dias depois do discurso sobre a prece, os apóstolos continuavam a fazer perguntas ao Mestre a respeito desta prática de suma importância: a da adoração. A instrução de Jesus aos apóstolos, durante esses dias, a respeito da prece e da adoração, pode ser restabelecida na forma moderna, do modo como a seguir está resumido:

144:4:2 16211 A repetição sincera e veemente de qualquer prece, quando esta é a expressão sincera de um filho de Deus e é feita com fé, não importando o quanto seja improvável ou impossível de se obter uma resposta direta a ela, servirá sempre para expandir a capacidade de receptividade espiritual da alma.

144:4:3 16212 Em todas as preces, lembrai que a filiação é uma dádiva. Nenhum filho nada tem a ver ou a fazer quando ganha o status de filho ou de filha. O filho da Terra nasce pela vontade dos seus pais. E também assim, o filho de Deus recebe a graça, e a nova vida do espírito, pela vontade do Pai no céu. E, por isso, o Reino do céu – a filiação divina – deve ser recebido como se fôssemos criancinhas. A retidão vós a conquistais – o desenvolvimento progressivo do caráter –, mas a filiação vós a recebeis como uma graça e por meio da fé.

144:4:4 16213 A prece conduziu Jesus à supercomunhão de alma com os Dirigentes Supremos do universo dos universos. A prece conduzirá os mortais da Terra à comunhão da verdadeira adoração. A capacidade espiritual de receptividade da alma determina a quantidade das bênçãos celestes que podem ser pessoalmente apropriadas e conscientemente realizadas, em resposta à prece.

144:4:5 16214 A prece, e a adoração associada a ela, é uma técnica de distanciamento da rotina diária da vida, do desgaste monótono da existência material. É um amplo caminho de aproximação da auto-realização espiritualizada e de aquisição da individualidade intelectual e religiosa.

144:4:6 16215 A prece é um antídoto para a introspecção perniciosa. A prece, ao menos como ensinada pelo Mestre, é uma ministração bastante benéfica à alma. Jesus empregou com consistência a influência benéfica da prece para os seus semelhantes. O Mestre, em geral, orava no plural, não no singular. Apenas durante a grande crise da sua vida terrena Jesus orou para si próprio.

144:4:7 16216 A prece é o fôlego da vida espiritual, em meio à civilização material das raças da humanidade. A adoração é a salvação para as gerações de mortais que estão na busca do prazer.

144:4:8 16217 Do mesmo modo que a prece assemelha-se a um recarregar das baterias espirituais da alma, a adoração pode ser comparada ao ato de sintonizar a alma para captar as emissões universais vindas do espírito infinito do Pai Universal.

144:4:9 16218 A prece é o olhar sincero e ardente do filho para o seu Pai espiritual; é um processo psicológico de trocar a vontade humana pela vontade divina. A prece é uma parte do plano divino, para transformar o que é naquilo que deveria ser.

144:4:10 16219 Uma das razões pelas quais Pedro, Tiago e João, que freqüentemente acompanhavam Jesus nas suas longas vigílias noturnas, nunca ouviram Jesus orando, era pelo fato de que o seu Mestre, só muito raramente, fazia as suas preces em palavras pronunciadas. Praticamente todas as preces de Jesus eram feitas no espírito e no coração – silenciosamente.

144:4:11 162110 De todos os apóstolos, Pedro e Tiago estiveram mais próximos de compreender os ensinamentos do Mestre sobre a prece e a adoração.

5. OUTRAS FORMAS DE PRECE


144:5:1 162111 De quando em quando, durante o restante da sua permanência na Terra, Jesus trazia ao conhecimento dos apóstolos várias outras formas de prece, mas o fez apenas como uma ilustração para outras questões, e determinou que essas “preces em forma de parábola” não deveriam ser ensinadas às multidões. Muitas delas eram de outros planetas habitados, mas Jesus não revelou esse fato aos doze. Entre essas preces estavam as seguintes:

144:5:2 16221 Pai nosso, em Quem consistem todos os reinos do universo,

Que o Teu nome seja exaltado e Todo-glorioso seja o Teu caráter.

A Tua presença nos engloba, e a Tua glória manifesta-se

De modo imperfeito, por nosso intermédio, e, no alto, é mostrada em perfeição.

Dá-nos, neste dia, as forças vivificadoras da luz,

E não nos deixes errar pelos desvios malignos da nossa imaginação,

Pois Teu é o residente glorioso, o poder eterno,

E, nossa, é a dádiva eterna do amor infinito do Teu Filho.

Assim seja, na verdade eterna.


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144:5:3 162210 Pai nosso criador, que estás no centro do universo,

Outorga a nós a Tua natureza e dá-nos o Teu caráter.

Faça de nós Teus filhos e filhas por meio da graça,

Que o Teu nome seja glorificado por meio da nossa eterna realização.

Dá o Teu espírito ajustador e controlador, para viver e residir dentro de nós.

E que possamos fazer a Tua vontade nesta esfera, como os anjos cumprem os Teus comandos na luz.

Sustenta-nos neste dia, no nosso progresso dentro do caminho da verdade.

Livra-nos da inércia, do mal e de todas as transgressões pecaminosas.

Sê paciente conosco, assim como nós mostramos bondade e amor aos nossos semelhantes.

Derrama o espírito da Tua misericórdia nos nossos corações de criaturas.

Conduze-nos pela Tua própria mão, passo a passo, nos labirintos incertos da vida,

E, quando vier o nosso fim, recebe os nossos espíritos fiéis no Teu próprio seio.

E assim seja feito o Teu desejo, não o nosso.


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144:5:4 162225 Pai nosso celeste, perfeito e reto,

Guia e dirige a nossa jornada deste dia.

Santifica os nossos passos e coordena os nossos pensamentos.

Conduze-nos sempre nos caminhos do progresso eterno.

Sacia-nos de sabedoria, até a plenitude do poder

E vitaliza-nos com a Tua energia infinita.

Inspira-nos com a consciência divina

Da presença e da orientação das hostes seráficas.

Guia-nos sempre para cima, na senda da luz;

Inocenta-nos plenamente no dia do grande julgamento.

Faze-nos à Tua semelhança, na glória eterna

E recebe-nos, no alto, para o Teu serviço perpétuo.


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144:5:5 162237 Pai nosso, que Te mantém em mistério,

Revela-nos o Teu caráter santo.

Faze, neste dia, que os Teus filhos na Terra

vejam o caminho, a luz e a verdade.

Mostra-nos a direção do progresso eterno

E dá-nos a vontade de caminhar para ele.

Estabelece, dentro de nós, a Tua soberania divina

E concede-nos o domínio pleno do ego.

Não nos deixe enveredar pelos caminhos das trevas e da morte;

Conduze-nos eternamente nas águas da vida.

Ouve esta nossa prece, por amor da Tua própria causa;

Contenta-te em fazer-nos cada vez mais semelhantes a Ti.

E afinal, pelo Filho divino,

Recebe-nos nos Teus braços eternos.

E assim, seja feita a Tua vontade, não a nossa.


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144:5:6 16235 Glorioso Pai e gloriosa Mãe, unificados em um progenitor único,

Gostaríamos de ser leais à vossa natureza divina.

Que viva de novo em nós a vossa pessoa

Por meio da dádiva e do outorgamento do vosso espírito divino,

Que só imperfeitamente imita a vós, nesta esfera,

Tal como vós vos mostrais em perfeição e em majestade, no alto.

A cada dia, dai-nos a vossa doce ministração de fraternidade

E conduzi-nos, a todo momento, na direção do serviço ao amor. Sede sempre e firmemente pacientes conosco

Assim como nós somos pacientes com os nossos filhos.

Dai-nos a sabedoria divina de fazer todas as coisas bem,

Dai-nos o amor infinito, que é a graça de toda a criatura.

E concedei-nos a vossa paciência e a vossa bondade amorosa

Que a nossa caridade possa envolver os fracos deste reino.

E, quando a nossa carreira acabar, fazei dela uma honra ao vosso nome,

Um prazer para o vosso espírito de bondade, e uma satisfação para aqueles que ajudam a nossa alma

Não como desejamos nós, nosso Pai de amor, mas assim como vós desejardes, para o eterno bem dos vossos filhos mortais,

Que assim possa ser.


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144:5:7 162325 Ó Fonte nossa Toda-fiel e Centro nosso Todo-Poderoso,

Reverenciado e santo seja o nome do vosso Filho tão cheio de graça.

As vossas bondades e as vossas bênçãos têm descido sobre nós,

Dando-nos poder para fazer a vossa vontade e para executar a vossa ordem.

Dai-nos, a cada momento, a sustentação da árvore da vida;

A cada dia, refrescai-nos, com as águas da vida do vosso rio.

A cada passo, conduzi-nos para fora das trevas e para a luz divina.

Renovai as nossas mentes, por meio das transformações do espírito residente,

E, quando o fim mortal finalmente vier sobre nós,

Recebei-nos junto a vós e enviai-nos à eternidade.

Coroai-nos com os atributos celestes do serviço fecundo,

E nós glorificaremos o Pai, o Filho e a Santa Influência.

E que assim seja, em um universo sem fim.


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144:5:8 162338 Pai nosso que habitas em locais secretos do universo,

Honrado seja o Teu nome, reverenciada seja a Tua misericórdia e respeitado seja o Teu julgamento.

Que o sol da retidão brilhe sobre nós ao meio-dia,

Enquanto nós Te suplicamos que guies os nossos passos incertos sob o crepúsculo.

Conduze-nos com a Tua mão, nos caminhos da Tua escolha

E, quando o caminho for duro e as horas forem de trevas, não nos abandones.

Não nos esqueças, assim como nós muitas vezes Te esquecemos e Te negligenciamos.

Mas sê misericordioso e ame-nos como nós Te desejamos amar.

Do alto, olha-nos com bondade e perdoa-nos com misericórdia Como nós perdoamos, com justiça, àqueles que nos magoam e que nos ofendem.

E possam o amor, a devoção e o dom do Filho excelso

Tornar disponível a vida eterna, com a Tua misericórdia sem fim e com o Teu amor.

Que o Deus dos universos possa conceder-nos a medida plena do Seu espírito;

Dá-nos a graça de submeter-nos à condução desse espírito.

Pela ministração de amor das Tuas devotadas hostes seráficas

Que possa o Filho guiar-nos até o fim da idade.

Faze-nos sempre, e cada vez mais, semelhantes a Ti

E, quando do nosso fim, recebe-nos no abraço eterno do Paraíso.

Assim seja, em nome do Filho a nós enviado

E para a honra e glória de Ti, Pai Supremo.

144:5:9 162413 Embora os apóstolos não fossem livres para apresentar essas lições sobre a prece nos seus ensinamentos públicos, eles aproveitaram muito de todas essas revelações para as suas experiências religiosas pessoais. Jesus utilizou esses e outros modelos de preces, como ilustrações, nas instruções íntimas dadas aos doze. E uma permissão específica nos foi concedida, para que transcrevêssemos essas sete amostras de orações neste registro.

6. A CONFERÊNCIA COM OS APÓSTOLOS DE JOÃO


144:6:1 162414 Por volta de primeiro de outubro, Filipe e alguns dos seus amigos apóstolos, estavam em uma aldeia próxima comprando alimentos, quando encontraram alguns dos apóstolos de João Batista. Nesse encontro casual, na praça do mercado, programou-se uma conferência de três semanas, no acampamento de Gilboa, entre os apóstolos de Jesus e os apóstolos de João; pois João, recentemente, tinha apontado doze dos seus líderes como apóstolos, seguindo o precedente de Jesus. João tinha feito isso em resposta à solicitação de Abner, o líder dos seus leais apoiadores. Jesus esteve presente, no acampamento de Gilboa, durante a primeira semana dessa conferência conjunta, mas ausentou-se nas duas últimas semanas.

144:6:2 162415 No começo da segunda semana desse mês, Abner tinha reunido todos os seus condiscípulos no acampamento em Gilboa, e estavam todos preparados para o conselho com os apóstolos de Jesus. Durante três semanas, esses vinte e quatro homens entraram em sessões, três vezes ao dia e seis dias a cada semana. Na primeira semana, Jesus esteve com eles entre as sessões da manhã, da tarde e da noite. Todos queriam que o Mestre se reunisse com eles e que presidisse as suas deliberações conjuntas, mas ele recusou-se firmemente a participar de suas discussões; embora consentisse em falar-lhes em três ocasiões; e essas palestras, de Jesus, para os vinte e quatro, foram sobre compaixão, cooperação e tolerância.

144:6:3 162416 André e Abner alternavam-se na presidência desses encontros conjuntos entre os dois grupos apostólicos. Esses homens tinham muitas dificuldades a serem discutidas e muitos problemas para resolver. Muitas vezes eles levavam os seus problemas a Jesus, para apenas ouvi-lo dizer: “Eu me ocupo apenas dos vossos problemas pessoais e puramente religiosos. Sou o representante do Pai para o indivíduo, não para o grupo. Se vós tiverdes dificuldades pessoais, nas vossas relações com Deus, vinde a mim e eu vos ouvirei e vos aconselharei, na solução do vosso problema. Mas, quando estiverdes tratando da coordenação de interpretações humanas divergentes, para as questões religiosas, e da socialização da religião, cabe a vós resolver todos esses problemas, por meio das vossas próprias decisões. Não obstante, eu vos acompanharei sempre compassiva e interessadamente; e, quando chegardes às vossas conclusões, no que toca a essas questões de importância não espiritual, já que todos vós estais de acordo, então, eu prometo, adiantadamente, a minha aprovação total e a minha cooperação sincera. E, agora, com a finalidade de deixar-vos desimpedidos para as vossas deliberações, estarei distante por duas semanas. Não vos preocupeis comigo, pois voltarei para vós. Eu estarei cuidando dos assuntos do meu Pai, pois temos outros Reinos além deste aqui. ”

144:6:4 16251 Depois de falar assim, Jesus desceu a encosta da montanha e eles não mais o viram por duas semanas inteiras. E nunca souberam para onde foi, nem o que fez durante esses dias. Demorou algum tempo para que os vinte e quatro pudessem ater-se às considerações sérias dos seus problemas, tão desconsertados ficaram com a ausência do Mestre. Dentro de uma semana, contudo, estavam de novo no cerne das suas discussões, sem poder apelar para a ajuda de Jesus.

144:6:5 16252 O primeiro item sobre o qual o grupo concordou foi o da adoção da prece que, tão recentemente, Jesus havia ensinado a eles. Essa prece, aceita por votação unânime, era aquela que seria ensinada aos crentes pelos dois grupos de apóstolos.

144:6:6 16253 Em seguida decidiram que, enquanto João vivesse, fosse na prisão ou fora dela, ambos os grupos de doze apóstolos continuariam com os seus trabalhos, e que encontros conjuntos de uma semana aconteceriam, a cada três meses, em locais a serem determinados.

144:6:7 16254 O mais sério de todos os problemas, contudo, era a questão do batismo. As dificuldades todas foram agravadas ainda mais, porque Jesus tinha-se recusado a fazer qualquer pronunciamento sobre esse tema. Finalmente, eles concordaram: enquanto João vivesse, ou até o momento em que eles pudessem modificar em conjunto essa decisão, apenas os apóstolos de João batizariam os crentes, e apenas os apóstolos de Jesus instruiriam finalmente os novos discípulos. Sendo assim, desde aquele momento, até depois da morte de João, dois dos apóstolos de João acompanhavam Jesus e os seus apóstolos para batizar os crentes, pois o conselho conjunto tinha por unanimidade aprovado, pelo voto, que o batismo devia tornar-se o passo inicial, o sinal exterior de aliança com os assuntos do Reino.

144:6:8 16255 Em seguida, ficou decidido que, no caso da morte de João, os apóstolos dele apresentar-se-iam a Jesus e submeter-se-iam à direção dele, e que não mais batizariam, a menos que fossem autorizados por Jesus ou pelos seus apóstolos.

144:6:9 16256 E então foi votado que, no caso da morte de João, os apóstolos de Jesus começariam a batizar com água como símbolo do batismo do Espírito divino. Quanto à questão de o arrependimento estar ligado ou não à pregação do batismo, isso ficou entregue à opção de cada um; nenhuma decisão foi tomada, como obrigatória, pelo grupo. Os apóstolos de João pregavam: “Arrependei-vos e sereis batizados”. Os apóstolos de Jesus proclamavam: “Acreditai e sede batizados”.

144:6:10 16257 E essa é a história da primeira tentativa, dos seguidores de Jesus, de coordenar os esforços divergentes, de compor as diferenças de opinião, de organizar empreendimentos grupais, de legislar sobre os ritos exteriores e de socializar as práticas religiosas pessoais.

144:6:11 16258 Muitas outras questões menores foram consideradas, e a solução delas foi tomada com unanimidade. Esses vinte e quatro homens tiveram uma experiência verdadeiramente notável durante essas duas semanas em que foram levados a enfrentar os problemas e a decidir conjuntamente nos impasses, sem Jesus. Eles aprenderam a divergir, a debater, a lutar, a orar e a transigir e, durante todo esse tempo, a conservar-se em toda a simpatia para com os pontos de vista das outras pessoas e também a manter ao menos um certo nível de tolerância para com as opiniões alheias sinceras.

144:6:12 16259 Na tarde da sua discussão final sobre as questões financeiras, Jesus retornou; e ouviu sobre as deliberações deles, escutou as decisões e disse: “Essas, então, são as vossas conclusões; e eu vos ajudarei, a cada um, a pôr em prática o espírito das vossas decisões unidas”.

144:6:13 16261 Dois meses e meio depois dessa época João foi executado e, durante esse período, os apóstolos de João permaneceram com Jesus e os doze. Todos trabalharam juntos e batizaram os crentes, durante esse período de trabalho, nas cidades da Decápolis. O acampamento de Gilboa foi levantado aos 2 de novembro de 27 d. C.

7. NAS CIDADES DA DECÁPOLIS


144:7:1 16262 Durante os meses de novembro e de dezembro, Jesus e os vinte e quatro trabalharam silenciosamente nas cidades gregas da Decápolis, principalmente em Citópolis, Gerasa, Abila e Gadara. Esse foi realmente o fim daquele período preliminar, de absorver o trabalho e a organização de João. Sempre a religião socializada de uma nova revelação paga o preço do comprometimento de concessões com as formas e os usos estabelecidos, da religião precedente, que ela procura salvaguardar. O batismo foi o preço que os seguidores de Jesus pagaram, para levar com eles, como um grupo religioso socializado, os seguidores de João Batista. Os seguidores de João, ao juntarem-se aos seguidores de Jesus, cederam em quase tudo, exceto no batismo pela água.

144:7:2 16263 Jesus promoveu poucos ensinamentos públicos, nessa missão nas cidades da Decápolis. Passou um tempo considerável ensinando aos vinte e quatro e teve muitas sessões especiais com os doze apóstolos de João. Com o tempo, eles tornaram-se mais compreensivos, quanto ao porquê de Jesus não ter ido visitar João na prisão, e por que nenhum esforço ele tinha feito para assegurar a libertação de João. Mas nunca puderam compreender por que Jesus não fazia nenhuma obra miraculosa, por que ele recusava-se a dar sinais externos da sua autoridade divina. Antes de vir para o acampamento de Gilboa, eles já criam em Jesus, sobretudo por causa do testemunho de João, mas logo eles estavam começando a crer no resultado do seu próprio contato com o Mestre e os seus ensinamentos.

144:7:3 16264 A maior parte do tempo, nesses dois meses, o grupo trabalhou aos pares; um dos apóstolos de Jesus saindo com um dos de João. O apóstolo de João batizava, o apóstolo de Jesus instruía; enquanto ambos pregavam o evangelho do Reino, como cada um o entendia. E eles ganharam muitas almas, entre os gentios e os judeus apóstatas.

144:7:4 16265 Abner, o dirigente dos apóstolos de João, tornou-se um firme devoto de Jesus e, mais tarde, foi feito o superior de um grupo de setenta instrutores a quem o Mestre encarregou com a missão de pregar o evangelho.

8. NO ACAMPAMENTO PERTO DE PELA


144:8:1 16266 No final de dezembro todos foram para perto do Jordão, junto a Pela, onde, de novo, começaram a ensinar e a pregar. Vinham a esse acampamento tanto judeus quanto gentios para ouvir as boas-novas. Foi enquanto Jesus ensinava à multidão, uma tarde, que alguns amigos especiais de João trouxeram ao Mestre a última mensagem que ele recebera do Batista.

144:8:2 16267 João, a essa altura, tinha estado já durante um ano e meio na prisão e, pela maior parte desse tempo, Jesus havia trabalhado muito silenciosamente; e assim não era estranho que João fosse levado a se perguntar sobre o Reino. Os amigos de João interromperam os ensinamentos de Jesus para dizer-lhe: “João Batista nos enviou para perguntar – tu és realmente o Libertador, ou devemos procurar por algum outro?”

144:8:3 16268 Jesus parou para dizer aos amigos de João: “Voltai e dizei a João que ele não foi esquecido. Dizei a ele sobre o que vistes e ouvistes, que as boas-novas foram pregadas aos pobres”. E, depois de Jesus ter falado aos mensageiros de João, ele voltou à multidão e disse: “Não penseis que João duvida do evangelho do Reino. Ele faz perguntas apenas para certificar aos seus discípulos que são também meus discípulos. João não é um fraco. Deixai-me perguntar a vós, que ouvistes João pregando, antes de Herodes colocá-lo na prisão: O que vistes em João – uma palha balançando ao vento? Um homem de humor variável e vestido em roupas macias? Em geral aqueles que se vestem suntuosamente e que vivem delicadamente estão nas cortes dos reis e nas mansões dos ricos. Mas o que vistes, quando contemplastes João? Um profeta? Eu vos digo que sim; e muito mais do que um profeta. Foi escrito sobre João: ‘Vejais, Eu coloco o meu mensageiro para que vós o vejais diante de vós; ele irá preparar o caminho’.

144:8:4 16271 “Em verdade, em verdade, eu vos digo, entre aqueles nascidos de mulheres não nasceu ninguém maior do que João Batista; no entanto, aquele que não é senão pequeno no Reino do céu, é ainda maior, porque nasceu do espírito e sabe que se tornou um filho de Deus”.

144:8:5 16272 Muitos dos que ouviram Jesus, naquele dia, submeteram-se ao batismo de João e, pois, proclamaram publicamente a entrada no Reino. E os apóstolos de João ficaram firmemente ligados a Jesus, daquele dia em diante. Esse acontecimento marcou a união real dos seguidores de João e de Jesus.

144:8:6 16273 Depois que os mensageiros conversaram com Abner, partiram para Macaeros, com o objetivo de dizer tudo isso a João. Ele ficou muito confortado, e a sua fé fortaleceu-se com as palavras de Jesus e a mensagem de Abner.

144:8:7 16274 Nessa tarde, Jesus continuou a ensinar, dizendo: “A que compararei esta geração? Muitos de vós não aceitareis nem a mensagem de João, nem o meu ensinamento. Vós sois como crianças, brincando na praça do mercado, e que chamam os seus amigos para dizer: ‘Nós tocamos flauta para vós e não dançastes; nós gememos e vós não vos afligistes’. E assim acontece com alguns de vós. João chegou jejuando de alimentos e de bebidas, e eles disseram que ele estava possuído por um demônio. O Filho do Homem vem, comendo e bebendo, e essa mesma gente diz: ‘Vede, é um homem glutão e um bebedor de vinho, amigo de publicanos e de pecadores!’ Na verdade, a sabedoria justifica-se pelos frutos dela.

144:8:8 16275 “Pareceria que o Pai no céu escondeu, dos sábios e dos arrogantes, algumas dessas verdades, ao passo que as revelou aos bebês pequeninos. Mas, o Pai, a todas as coisas faz bem; o Pai revela-Se ao universo pelos métodos da sua própria escolha. Vinde, pois, todos de vós que penais e que tendes fardos pesados, e encontrareis o descanso para as vossas almas. Tomai sobre vós o jugo divino, e experimentareis a paz de Deus, que transcende a todo o entendimento. ”

9. A MORTE DE JOÃO BATISTA


144:9:1 16276 João Batista foi executado, por ordem de Herodes Antipas, na tarde de 10 de janeiro, do ano 28 d. C. No dia seguinte, uns poucos entre os discípulos de João, que tinham ido a Macaeros, souberam da sua execução e foram até Herodes e requisitaram o corpo dele, e puseram-no em uma tumba; mais tarde deram-lhe uma sepultura em Sebaste, a cidade de Abner. Aos 12 de janeiro, dois dias depois, partiram para o acampamento dos apóstolos de João e de Jesus, perto de Pela, e contaram a Jesus sobre a morte de João. Ao ouvir o relato deles, Jesus dispersou a multidão e, reunindo os vinte e quatro, disse-lhes: “João está morto. Herodes mandou decapitá-lo. Hoje à noite, fazei uma reunião de conselho e colocai os vossos assuntos em ordem, como deve ser feito. Não haverá muita demora mais. É chegada a hora de proclamarmos o Reino abertamente e com toda a força. Amanhã iremos para a Galiléia”.

144:9:2 16277 Conseqüentemente, na manhã de 13 de janeiro, do ano 28 d. C. , bem cedo, Jesus e os apóstolos, acompanhados de uns vinte e cinco discípulos, rumaram para Cafarnaum e alojaram-se, nessa noite, na casa de Zebedeu.

DOCUMENTO 145

QUATRO DIAS MEMORÁVEIS EM CAFARNAUM
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Jesus e os apóstolos chegaram em Cafarnaum na noite de terça-feira, 13 de janeiro. Como de costume, fizeram da casa de Zebedeu, em Betsaida, a sua sede. Agora que a morte de João Batista havia acontecido, Jesus se preparava para lançar-se à primeira campanha de pregação aberta e pública, na Galiléia. As novas de que Jesus tinha voltado espalharam-se rapidamente por toda a cidade e, no dia seguinte, bem cedo, Maria, a mãe de Jesus, apressou-se a partir para Nazaré, no intuito de visitar o seu filho José.

145:0:2 16282 Jesus passou a quarta-feira, a quinta-feira e a sexta-feira, na casa de Zebedeu, instruindo os seus apóstolos, na preparação para a primeira grande viagem pública que eles fariam. Também recebeu e ensinou a muitos buscadores sinceros da verdade, tanto em grupos, quanto isoladamente. Por intermédio de André, ele compromissou-se a falar na sinagoga no próximo dia de sábado.

145:0:3 16283 Bem tarde, na noite de sexta-feira, Rute, a irmã mais nova de Jesus, fez-lhe, secretamente, uma visita. Eles passaram quase uma hora juntos, em um barco ancorado a uma pequena distância da praia. Nenhum ser humano, exceto João Zebedeu, jamais soube dessa visita, e a ele foi recomendado que não falasse a ninguém sobre ela. Rute era o único membro da família de Jesus que acreditava, de um modo consistente e resoluto, na divindade da missão terrena dele, desde a época inicial da sua consciência espiritual e ao longo de toda a sua memorável ministração, até a sua morte, ressurreição e ascensão; e ela, finalmente, passou à vida futura não tendo nunca duvidado do caráter sobrenatural da missão do seu pai-irmão na carne. A pequena Rute foi o maior conforto de Jesus, no que dizia respeito à sua família terrena, durante as provas cruéis do seu julgamento, da sua rejeição e da sua crucificação.

1. O LANÇO COM A REDE REPLETA DE PEIXES


145:1:1 16284 Na sexta-feira, pela manhã, dessa mesma semana, quando Jesus estava ensinando à beira da praia, o povo em volta dele empurrou-o até tão perto da água que ele fez um sinal para alguns pescadores, trabalhando num barco próximo para que viessem resgatá-lo. Ele entrou no barco e continuou a ensinar à multidão reunida, por mais de duas horas. Esse barco chamava-se “Simão”; era o antigo barco de pesca de Simão Pedro e tinha sido construído pelas próprias mãos de Jesus. Nessa manhã, em particular, o barco estava sendo usado por Davi Zebedeu e dois companheiros seus, que tinham acabado de vir de uma praia próxima, depois de uma noite infrutífera de pescaria no lago. Eles estavam limpando e reparando as suas redes, quando Jesus pediu-lhes que viessem ajudá-lo.

145:1:2 16285 Depois de Jesus ter acabado de ensinar ao povo, ele disse a Davi: “Tu te atrasastes para vir ajudar-me, agora deixe que eu trabalhe contigo. Vamos pescar; vá para o fundo e jogue as tuas redes para um arrastão”. Mas Simão, um dos ajudantes de Davi, respondeu: “Mestre, é inútil. Nós lutamos toda a noite e não pegamos nada; contudo, a seu pedido iremos até lá e lançaremos as redes”. E Simão consentiu em seguir a indicação de Jesus, por causa de um gesto feito pelo seu patrão, Davi. Quando chegaram no local indicado por Jesus, eles jogaram as redes e pegaram uma quantidade tão grande de peixes, que temeram pelo rompimento das redes, e tanto assim que sinalizaram aos seus companheiros, nas margens, para que viessem ajudá-los. Quando tinham enchido todos os três barcos de peixes, até quase afundarem, esse Simão caiu aos joelhos de Jesus dizendo: “Saia de perto de mim, Mestre, pois eu sou um pecador”. Simão e todos aqueles que estavam envolvidos nesse episódio ficaram assombrados com a quantidade de peixes na rede. Desde aquele dia, Davi Zebedeu, o seu ajudante Simão e os seus companheiros abandonaram as suas redes e seguiram Jesus.

145:1:3 16291 Este, entretanto, não foi um lanço milagroso da rede, em nenhum sentido. Jesus era um estudante cuidadoso da natureza; era um pescador experiente e conhecia os hábitos dos peixes no mar da Galiléia. Nessa ocasião, ele apenas levou esses homens ao local onde os peixes geralmente deveriam ser encontrados naquela hora do dia. Mas os seguidores de Jesus sempre consideraram esse fato como um milagre.

2. À TARDE NA SINAGOGA


145:2:1 16292 No sábado sequinte, no serviço da tarde, na sinagoga, Jesus pregou o seu sermão sobre “A Vontade do Pai do Céu”. Pela manhã, Simão Pedro tinha pregado sobre “O Reino”. No encontro de quinta-feira, à noite, na sinagoga, André havia prestado um ensinamento cujo tema foi “O Novo Caminho”. Nesse momento em particular, havia mais pessoas acreditando em Jesus na cidade de Cafarnaum do que em qualquer outra cidade na Terra.

145:2:2 16293 Jesus ensinou na sinagoga, nessa tarde de sábado; e, conforme o costume, o primeiro texto ele o tomou da lei, lendo do Livro do Êxodo: “E servirás ao Senhor, teu Deus, e Ele abençoará o teu pão e a tua água, e toda a doença será afastada de ti”. Ele escolhera o segundo texto dos profetas, lendo de Isaías: “Levanta-te e resplandece, pois a tua luz já veio, e a glória do Senhor levantou-se sobre ti. As trevas podem cobrir a Terra e uma profunda obscuridade pode recobrir o povo, mas o espírito do Senhor levantar-se-á sobre ti, e a glória divina será vista contigo. Até mesmo os gentios virão para essa luz, e muitas grandes mentes render-se-ão ao esplendor dessa luz”.

145:2:3 16294 Esse sermão foi um esforço da parte de Jesus, para deixar claro o fato de que a religião é uma experiência pessoal. Entre outras coisas, o Mestre disse:

145:2:4 16295 “Bem sabeis que um pai de coração terno, amando a sua família como um todo, considera-a como um grupo, por causa do forte afeto que dedica a cada membro individual dessa família. Não mais deveis pensar no Pai do céu como filhos de Israel, e sim como filhos de Deus. Como grupo, sois de fato filhos de Israel, contudo, como indivíduos cada um de vós é um filho de Deus. Eu vim, não para revelar o Pai aos filhos de Israel, mas, para trazer esse conhecimento de Deus e a revelação do Seu amor e misericórdia ao indivíduo que crê, como uma experiência pessoal genuína. Os profetas todos têm ensinado a vós que Yavé importa-se com o seu povo, que Deus ama Israel. Contudo, eu vim até vós para proclamar uma verdade maior, uma verdade que muitos dos profetas recentes também compreenderam, a verdade de que Deus vos ama – a cada um de vós – como indivíduos. Em todas essas gerações, vós tendes conhecido uma religião racial ou nacional, agora eu vim para dar-vos uma religião pessoal.

145:2:5 16301 Contudo, mesmo essa não é uma idéia nova. Muitos, dentre vós, que tendes a mente espiritualizada, têm sabido dessa verdade, porquanto alguns dos profetas vos instruíram desse modo. Acaso não lestes as escrituras onde o profeta Jeremias diz: ‘Naqueles dias não se dirá mais que os pais comeram uvas ácidas e que as crianças ficaram com os dentes doendo. Cada homem morrerá pela sua própria iniqüidade; todo homem que comer uvas verdes ficará com a boca travada. Vede, dias virão em que farei uma nova aliança com o Meu povo, não de acordo com a aliança que Eu fiz com os pais deles, quando os tirei das terras do Egito, mas de acordo com o novo caminho. Eu irei até mesmo escrever a Minha lei nos seus corações. Eu serei o seu Deus, e eles serão o Meu povo. Naquele dia, cada homem ao seu vizinho, não dirá: Tu conheces o Senhor? Não! Pois todos eles Me conhecerão pessoalmente, desde o menor até o maior de todos’.

145:2:6 16302 “Vós não lestes estas promessas? Não acreditais nas escrituras? Não compreendeis que as palavras dos profetas estão realizadas naquilo que podeis ver já neste dia de hoje? E Jeremias não vos exortou a fazer da religião um assunto do coração, para que vos relacionásseis com Deus como indivíduos? E acaso o profeta não vos falou que o Deus do céu buscaria os vossos corações individualmente? E não fostes avisados de que o coração humano natural é enganoso acima de todas as coisas, e que, muitas vezes, é desesperadamente malvado?

145:2:7 16303 “Não lestes, também em Ezequiel, ele ensinou até mesmo aos vossos pais que a religião deve tornar-se uma realidade nas vossas experiências individuais? Não mais usareis o provérbio que diz: ‘Os pais comeram uvas ácidas e os seus filhos ficaram com os dentes doídos’. ‘Enquanto eu viver’, diz o Senhor Deus, ‘observai que todas as almas sejam Minhas; como a alma do pai, e também a alma do filho. Apenas a alma que peca morrerá’. E então Ezequiel previu mesmo esse dia em que, em nome de Deus, falou: ‘Um novo coração também eu darei a ti, e um novo espírito eu colocarei dentro de ti’.

145:2:8 16304 “Não mais deveis temer que Deus puna uma nação, pelo pecado de um indivíduo; nem o Pai do céu punirá um dos seus filhos crentes, pelos pecados de uma nação, ainda que o membro individual de qualquer família, freqüentemente, tenha de sofrer as conseqüências materiais dos erros da família e das transgressões do grupo. Não compreendeis que a esperança de uma nação melhor – ou de um mundo melhor – está ligada ao progresso e ao esclarecimento do indivíduo?”

145:2:9 16305 Então o Mestre descreveu que a vontade do Pai do céu, depois que o homem discerne essa liberdade espiritual, é de que os Seus filhos, na Terra, deveriam começar aquela eterna ascensão da carreira ao Paraíso, que consiste na resposta consciente da criatura ao estímulo divino do espírito residente, de encontrar o Criador, de conhecer a Deus e de buscar ser como Ele.

145:2:10 16306 Os apóstolos foram grandemente ajudados por esse sermão. Todos eles compreenderam mais completamente que o evangelho do Reino é uma mensagem dirigida ao indivíduo, não à nação.

145:2:11 16307 O povo de Cafarnaum, mesmo estando familiarizado com os ensinamentos de Jesus, ficou surpreendido com esse sermão, nesse dia de sábado. E Jesus ensinou de fato, como alguém que tem autoridade e não como os escribas.

145:2:12 16308 Quando Jesus acabou de falar, um jovem homem da congregação, que tinha estado muito agitado por causa daquelas palavras, foi tomado por um ataque epilético violento e gritava alto. Ao fim da crise, ao recuperar a consciência, ainda em um estado meio de sonho, ele disse: “O que temos nós a ver contigo, Jesus de Nazaré? Tu és o santo de Deus; acaso vieste para destruir-nos?” Jesus pediu silêncio à assistência e, tomando o jovem homem pela mão, disse: “Sai deste estado” – e ele acordou imediatamente.

145:2:13 16311 Esse jovem homem não estava possuído por nenhum espírito impuro, nem demônio; ele era vítima da epilepsia comum. Mas haviam ensinado a ele que a sua aflição era devido à posse de um espírito malévolo. Ele acreditou nisso e procedia de acordo, em tudo o que pensava ou dizia que se referia à sua doença. O povo acreditava que tais fenômenos eram causados diretamente pela presença de espíritos impuros. E, assim, concluía que Jesus tinha expulsado um demônio para fora desse homem. No entanto, Jesus, naquele momento, não curou a epilepsia dele. Só mais tarde, naquele dia, depois do entardecer, é que esse homem ficou realmente curado. Muito tempo depois do Dia de Pentecostes, o apóstolo João, que foi o último a escrever sobre os atos de Jesus, evitou qualquer referência a esses atos assim chamados de “expulsão de demônios”, e ele fez isso tendo em vista o fato de que tais casos de possessão demoníaca nunca ocorreram depois de Pentecostes.

145:2:14 16312 O resultado é que esse incidente corriqueiro espalhou-se rapidamente, por toda Cafarnaum, como se Jesus tivesse expulsado um demônio de um homem e o tivesse curado, miraculosamente, na sinagoga, na conclusão do seu sermão vespertino. O sábado era exatamente o dia para um rumor tão surpreendente espalhar-se, rápida e efetivamente. E a história foi também levada até todos os povoados menores, nos arredores de Cafarnaum, e muita gente acreditou nela.

145:2:15 16313 Os trabalhos de cozinha e de arrumação, na grande casa de Zebedeu, onde Jesus e os doze estavam hospedados, eram feitos, na sua maior parte, pela esposa e pela mãe de Simão Pedro. A casa de Pedro era próxima de Zebedeu; e Jesus e os seus amigos pararam lá, quando vinham da sinagoga, porque a sogra de Pedro tinha estado doente por vários dias, com calafrios e febre. E aconteceu que, durante o tempo em que Jesus ficou ao lado dessa mulher adoentada, segurando a sua mão, acariciando a sua fronte e dizendo-lhe palavras de conforto e de encorajamento, a febre foi embora. Jesus ainda não havia tido tempo para explicar, aos seus apóstolos, que nenhum milagre fora realizado na sinagoga; e, com esse incidente tão recente e vívido nas suas mentes, e com a lembrança da água e do vinho em Caná, eles tomaram essa coincidência como um outro milagre, e alguns deles correram para espalhar as novas por toda a cidade.

145:2:16 16314 Amata, a sogra de Pedro, estivera sofrendo com a febre da malária. Ela não havia sido miraculosamente curada por Jesus naquele momento. E, só várias horas mais tarde, depois do pôr-do-sol, é que a sua cura foi efetivada quando do acontecimento extraordinário que ocorreu no jardim da frente da casa de Zebedeu.

145:2:17 16315 E esses casos são típicos da maneira pela qual uma geração em busca de milagres, e um povo com a mente voltada para os milagres, infalivelmente, agarra-se a tais coincidências como um pretexto para proclamar que mais um milagre havia sido realizado por Jesus.

3. A CURA AO ENTARDECER


145:3:1 16316 No momento em que Jesus e os seus apóstolos estavam prontos para tomar a sua refeição da noite, perto do final desse dia de sábado cheio de acontecimentos, toda Cafarnaum e os seus arredores estavam inquietos por causa desses supostos milagres de cura; e, todos que estavam doentes, ou afligidos, começaram os seus preparativos para irem até Jesus ou para serem carregados até ele, pelos seus amigos, tão logo o sol se pôs. De acordo com o ensinamento judeu, não era permitido sequer ir em busca da saúde durante as horas sagradas do sábado.

145:3:2 16321 E, portanto, tão logo o sol escondeu-se no horizonte, dezenas de crianças, de mulheres e de homens afligidos, começaram a tomar o caminho da casa de Zebedeu, em Betsaida. Um homem partiu com a sua filha paralisada, tão logo o sol se escondeu por trás das casas da vizinhança.

145:3:3 16322 Os acontecimentos de todo o dia haviam preparado o quadro para essa cena extraordinária ao entardecer. Até mesmo o texto que Jesus tinha usado para o seu sermão dessa tarde deixava a entender que a doença devia ser banida; e ele tinha falado com uma força e com uma autoridade tão sem precedentes! A sua mensagem era irresistível! Sem fazer nenhum apelo ao poder humano, ele falou diretamente às consciências e às almas dos homens. Embora ele não tenha recorrido à lógica, nem às minúcias legais, nem a explicações engenhosas, ele fez um apelo poderoso, direto, claro e pessoal aos corações dos seus ouvintes.

145:3:4 16323 Aquele sábado foi um grande dia na vida terrena de Jesus, sim, e na vida de um universo. Para todos os fins e propósitos, no universo local, a pequena cidade judia de Cafarnaum foi a capital de Nebadon. O punhado de judeus, na sinagoga de Cafarnaum, não foi o único grupo a ouvir aquela declaração memorável de fechamento do sermão de Jesus: “O ódio é a sombra do medo; a vingança é a máscara da covardia”. E também os seus ouvintes não poderiam esquecer as suas palavras abençoadas, declarando: “O homem é filho de Deus, não um filho do diabo”.

145:3:5 16324 Logo após o pôr-do-sol, enquanto Jesus e os apóstolos ainda estavam na mesa de jantar, a esposa de Pedro ouviu vozes no jardim da frente e, indo até a porta, viu um grande número de doentes reunindo-se, e viu que a estrada de Cafarnaum estava lotada por aqueles que vinham em busca da cura das mãos de Jesus. Ao deparar com essa visão, ela foi imediatamente informar o seu marido, e ele contou a Jesus.

145:3:6 16325 Quando o Mestre saiu da porta de entrada da casa de Zebedeu, os seus olhos depararam-se com um grande número de seres humanos enfermos e afligidos. E o seu olhar pasmo pôde ver quase mil seres humanos doentes e sofredores; esse era por baixo o número de pessoas reunidas diante dele. Nem todos os presentes eram afligidos; alguns tinham vindo para ajudar os seus seres amados, nesse esforço de assegurar a cura.

145:3:7 16326 Ver todos aqueles mortais afligidos, homens, mulheres e crianças, sofrendo, em grande parte, em conseqüência dos erros e transgressões dos seus Filhos, nos quais confiara a administração do universo; tocou especialmente o coração humano de Jesus e desafiou a sua misericórdia divina de Filho Criador benevolente. Jesus, no entanto, bem sabia que ele nunca poderia criar um movimento espiritual duradouro apoiando-se na fundação de prodígios puramente materiais. A sua política consistente tinha sido a de abster-se de exibir as suas prerrogativas de criador. Desde Caná, nada de sobrenatural ou de miraculoso acompanhara os seus ensinamentos; mas essa multidão aflita tocou o seu coração compassivo e apelou poderosamente para o seu afeto cheio de compreensão.

145:3:8 16327 Uma voz no jardim da frente disse: “Mestre, exclama a palavra, restaura a nossa saúde, cura as nossas doenças e salva as nossas almas”. Mal tinham essas palavras sido ditas e uma vasta comitiva de serafins, de controladores físicos, de Portadores da Vida e de intermediários, que sempre acompanhou este Criador, encarnado, de um universo, se fez pronta para atuar com o poder criativo, apenas o seu Soberano desse o sinal. Esse foi um dos momentos, na carreira terrena de Jesus, no qual a sabedoria divina e a compaixão humana estiveram tão entrelaçadas, no pensamento do Filho do Homem, que ele buscou refúgio apelando para a vontade do seu Pai.

145:3:9 16328 Quando Pedro implorou ao Mestre que desse ouvidos aos pedidos de ajuda, Jesus, vendo de cima a multidão afligida, respondeu: “Eu vim ao mundo para revelar o Pai e estabelecer o Seu Reino. Com esse propósito eu vivi a minha vida até este momento. Portanto, se for da vontade Dele, que me enviou, e se não for incompatível com a minha dedicação à proclamação da boa-nova do Reino do céu, eu desejaria ver os meus filhos curados. . . e”, – mas as outras palavras de Jesus perderam-se no tumulto.

145:3:10 16331 Jesus tinha passado a responsabilidade da decisão dessa cura para o comando do seu Pai. Evidentemente que a vontade do Pai não colocou nenhuma objeção, pois as palavras do Mestre mal tinham sido pronunciadas e o conjunto das personalidades celestes, que servia sob o comando do Ajustador Personalizado de Jesus, estava já poderosamente mobilizado. A vasta comitiva desceu, em meio à multidão variada de mortais aflitos e, em poucos instantes, 683 homens, mulheres e crianças foram curados, ficaram perfeitamente sadios de todas as suas doenças físicas e de outras desordens materiais. Essa cena nunca foi testemunhada na Terra, antes desse dia; e, depois, tampouco. E para aqueles de nós, que estavam presentes, contemplando essa onda criativa de cura, foi de fato um espetáculo emocionante.

145:3:11 16332 No entanto, entre todos os seres que ficaram surpreendidos com essa súbita e inesperada explosão de cura sobrenatural, Jesus era o mais surpreso. Num momento em que os seus interesses humanos e as suas simpatias estavam focalizadas na cena de sofrimento e de aflição instalada ali, diante dele, ele esquecera-se de manter a sua mente humana atenta aos avisos de prevenção dados pelo seu Ajustador Personalizado, a respeito da impossibilidade de limitar as suas prerrogativas criativas de Filho Criador, dentro do elemento tempo, sob certas condições e em certas circunstâncias. Jesus desejou ver todos esses mortais sofredores curados, se a vontade do Pai não fosse violada com isso. O Ajustador Personalizado de Jesus, instantaneamente, comandou que esse ato de energia criativa, naquele momento, não iria transgredir a vontade do Pai do Paraíso e, com essa decisão – em vista da expressão precedente, de desejo de cura, de Jesus –, o ato criativo aconteceu. Aquilo que um Filho Criador deseja, e que é a vontade do seu Pai, É. Em toda a vida subseqüente de Jesus na Terra, nenhum outro ato de cura física em massa aconteceu.

145:3:12 16333 Como era de se esperar, a fama dessa cura ao entardecer, em Betsaida, Cafarnaum, espalhou-se em toda a Galiléia e na Judéia e em todas as regiões mais distantes. Uma vez mais os temores de Herodes foram despertados, e ele enviou observadores para relatar sobre o trabalho e os ensinamentos de Jesus, e para que ficasse apurado se ele era o antigo carpinteiro de Nazaré ou se era João Batista ressuscitado de entre os mortos.

145:3:13 16334 Sobretudo mediante essa demonstração, não intencional, de cura física, daí por diante, durante todo o restante da sua carreira terrena, Jesus tornou-se tanto um médico quanto um pregador. Bem verdade é que ele continuou o seu ensinamento, mas, sobretudo, o seu trabalho pessoal consistiu principalmente mais em ministrar aos doentes e aos desamparados, enquanto os seus apóstolos faziam o trabalho de pregação pública e de batizar os crentes.

145:3:14 16335 Contudo, a maioria daqueles que receberam a cura física sobrenatural ou criativa, nessa demonstração ao entardecer de energia divina, não obteve um benefício espiritual de modo permanente dessa manifestação extraordinária de misericórdia. Um pequeno número, de fato, se viu edificado por essa ministração física, mas o Reino espiritual em nada ficou mais avançado nos corações dos homens, diante dessa efusão espantosa de cura criativa fora do tempo.

145:3:15 16336 As curas miraculosas que, de quando em quando, acompanhavam a missão de Jesus na Terra, não eram parte do seu plano de proclamação do Reino. Elas foram inerentes, incidentalmente, à presença na Terra, de um ser divino de prerrogativas quase ilimitadas de criador, junto com uma combinação sem precedentes de misericórdia divina e de compaixão humana. Mas esses chamados milagres trouxeram a Jesus muitos problemas, pois eles produziram uma publicidade geradora de preconceitos e propiciaram bastante notoriedade não almejada.

4. A NOITE SEGUINTE


145:4:1 16341 Durante a noite seguinte a esse grande desencadeamento de cura, a multidão rejubilante e feliz invadiu a casa de Zebedeu, e os apóstolos de Jesus foram levados ao clímax mais alto de entusiasmo emocional. De um ponto de vista humano, esse foi provavelmente o dia mais grandioso de todos os grandes dias da ligação deles com Jesus. Em nenhum momento, anterior ou posterior, as suas esperanças subiram a alturas tais de expectativa confiante. Jesus tinha dito a eles, poucos dias antes, quando eles estavam ainda dentro das fronteiras da Samaria, que era chegada a hora em que o Reino seria proclamado em poder, e agora os olhos deles viam o que eles supunham ser o cumprimento daquela promessa. Eles estavam emocionados com a visão do que devia vir, se essa assombrosa manifestação de poder de cura fosse apenas o começo. As suas dúvidas pendentes sobre a divindade de Jesus foram banidas. Eles estavam literalmente intoxicados pelo êxtase de um encantamento estupefato.

145:4:2 16342 Entretanto, quando procuraram por Jesus, eles não o conseguiram encontrar. O Mestre estava muito perturbado pelo que tinha acontecido. Os homens, mulheres e crianças que haviam sido curados de diversas doenças ficaram lá, até tarde da noite, esperando pelo retorno de Jesus, para que pudessem agradecer-lhe. Os apóstolos não conseguiam entender a conduta do Mestre, pois as horas passavam e ele permanecia em reclusão; o contentamento deles poderia ter sido pleno e perfeito, não fosse a ausência continuada do Mestre. Quando Jesus retornou para junto deles, já era tarde da noite, e praticamente todos os beneficiários do episódio da cura tinham ido para as próprias casas. Jesus não aceitou as congratulações e a adoração dos doze e dos outros que tinham ficado para cumprimentá-lo, dizendo apenas: “Rejubilai, não porque o meu Pai seja poderoso para curar o corpo, e sim porque Ele é poderoso para salvar a alma. Vamos descansar, pois amanhã deveremos cuidar dos assuntos do Pai”.

145:4:3 16343 E, de novo, doze homens desapontados, perplexos e de corações entristecidos, foram descansar; poucos deles, afora os gêmeos, dormiram bem, naquela noite. Mal o Mestre fazia alguma coisa para encorajar as almas e alegrar os corações dos seus apóstolos, e já parecia imediatamente despedaçar as esperanças e até demolir as fundações da coragem e do entusiasmo deles. Quando esses pescadores, perplexos, se olharam nos olhos uns dos outros, só tinham um pensamento: “Nós não podemos compreendê-lo. O que pode significar tudo isso?”

5. NO DOMINGO BEM CEDO


145:5:1 16344 Jesus também não dormiu muito, naquela noite de sábado. Ele compreendeu que o mundo estava cheio de infortúnios físicos e sobrecarregado de dificuldades materiais, e previu o grande perigo que seria forçar-se a devotar tanto do seu tempo a cuidar de doentes e aflitos, e que a ministração das coisas físicas podia acabar interferindo na sua missão de estabelecer o Reino espiritual nos corações dos homens, ou que essa missão ficasse subordinada à ministração das coisas físicas. Por causa desse pensamento e de outros semelhantes, que ocuparam a mente mortal de Jesus, durante a noite, ele levantou-se naquele domingo de manhã, muito antes do dia nascer, e foi, sozinho, até um dos seus locais favoritos para a comunhão com o Pai. O tema da oração de Jesus, nessa manhã bem cedo, foi o da sabedoria e do julgamento, para que ele pudesse evitar que a sua compaixão humana junto com a sua misericórdia divina tivessem um tal apelo para ele, diante da presença do sofrimento mortal, até o ponto em que todo o seu tempo não acabasse sendo ocupado com a ministração física, em detrimento da ministração espiritual. Embora ele não desejasse evitar, de todo, a ministração aos doentes, ele sabia que devia também fazer o trabalho mais importante de ensinamento espiritual e de aperfeiçoamento religioso.

145:5:2 16351 Jesus sempre ia às colinas para orar, porque não havia ali quartos onde pudesse ficar isolado para as suas devoções pessoais.

145:5:3 16352 Pedro não conseguiu dormir naquela noite; e, assim, muito cedo, pouco depois de Jesus ter saído para uma prece, ele acordou Tiago e João, e os três foram ao encontro do Mestre. Depois de mais de uma hora de busca, encontraram Jesus e imploraram a ele que lhes dissesse qual o motivo da sua estranha conduta. Eles desejavam saber por que ele parecera perturbado com a poderosa efusão do espírito de cura, já que todo o povo estava transbordando de júbilo e já que os seus apóstolos estavam tão contentes.

145:5:4 16353 Durante mais de quatro horas Jesus empenhou-se em explicar a esses três apóstolos o que tinha acontecido. Ele mostrou-lhes o que se passara e explicou sobre os perigos de tais manifestações. Jesus confidenciou-lhes sobre o motivo de ter vindo orar. Ele buscava deixar claras, para os seus seguidores pessoais, as razões verdadeiras pelas quais o Reino do Pai não podia ser construído sobre a realização de prodígios e de curas físicas. Mas eles não podiam entender o seu ensinamento.

145:5:5 16354 Nesse meio tempo, cedo na manhã de domingo, outras multidões de almas aflitas e de muitos curiosos, começaram a ajuntar-se perto da casa de Zebedeu. Eles clamavam para ver Jesus. André e os apóstolos estavam tão perplexos que, enquanto Simão zelote falava para a multidão, André, junto com vários dos seus condiscípulos, foi procurar Jesus. Quando André localizou Jesus, em companhia dos três, ele disse: “Mestre, por que nos deixa sozinhos com a multidão? Vê, todos os homens te procuram; nunca antes tantos estiveram buscando os teus ensinamentos. E, mesmo agora, a casa está cercada daqueles que vieram de perto e de longe por causa das tuas obras poderosas. Tu não irás conosco para ministrar a eles?”

145:5:6 16355 Quando Jesus ouviu isso, respondeu: “André, eu não ensinei a ti e a esses outros que a minha missão na Terra é a revelação do Pai, e que a minha mensagem é a proclamação do Reino do céu? Como é, pois, que queres desviar-me da minha obra, para a gratificação dos curiosos e para a satisfação daqueles que andam atrás de sinais e prodígios? Não estivemos junto a esse povo todos esses meses? E eles não se atropelaram nas multidões, para ouvir sobre as boas-novas do Reino? Por que vêm eles agora assediar-nos? Não é por causa da cura dos seus corpos físicos, mais do que para receberem a verdade espiritual da salvação das suas almas? Quando os homens sentem-se atraídos para nós por causa de manifestações extraordinárias, muitos deles vêm em busca, não da verdade e da salvação, mas da cura dos seus males físicos, e para assegurar a libertação das suas dificuldades materiais.

145:5:7 16356 “Durante todo esse tempo eu estive em Cafarnaum, e tanto na sinagoga quanto junto ao mar eu proclamei as boas-novas do Reino a todos que tiveram ouvidos para ouvir e corações para receber a verdade. Não é da vontade do meu Pai que eu deva voltar convosco, para satisfazer a esses curiosos e para ocupar-me com a ministração das coisas físicas, abandonando as coisas espirituais. Eu vos ordenei que pregassem o evangelho e que ministrassem aos doentes, mas eu não posso me deixar absorver pelas curas, e deixar de lado os meus ensinamentos. Não, André, eu não voltarei contigo. Vai e diz ao povo para acreditar em tudo aquilo que nós lhe ensinamos, e para rejubilar-se com a liberdade de filhos de Deus, e te prepare para a nossa partida rumo as outras cidades da Galiléia, onde o caminho já foi preparado para a pregação das boas-novas do Reino. Com esse propósito é que eu vim do Pai. Vai, então, e cuida da nossa partida imediata, enquanto eu espero pela tua volta”.

145:5:8 16361 Quando Jesus acabou de falar, André e os seus companheiros apóstolos tristemente partiram de volta para a casa de Zebedeu, dispersaram a multidão reunida, e rapidamente aprontaram-se para a viagem, como Jesus tinha mandado. E, assim, na tarde de domingo, 18 de janeiro, do ano 28 d. C. , Jesus e os apóstolos partiram para a sua primeira campanha de pregações realmente públicas e abertas, nas cidades da Galiléia. Nessa primeira viagem, eles pregaram o evangelho do Reino em muitas cidades, mas não visitaram Nazaré.

145:5:9 16362 Naquele domingo à tarde, pouco depois de Jesus e os seus apóstolos terem partido para Rimon, os seus irmãos Tiago e Judá vieram vê-lo, batendo na casa de Zebedeu. Por volta do meio-dia, Judá procurou o seu irmão Tiago e insistiu para que fossem até Jesus. No momento em que Tiago consentiu em ir com Judá, Jesus já havia partido.

145:5:10 16363 Os apóstolos detestaram ter de abandonar Cafarnaum, onde um interesse tão grande havia sido despertado. Pedro calculava que nada menos de mil crentes poderiam ter sido batizados para o Reino. Jesus ouviu-os pacientemente, mas não consentiu em voltar. O silêncio prevaleceu durante um certo tempo e, então, Tomé dirigiu-se aos seus companheiros apóstolos, dizendo: “Vamos! O Mestre já disse. Não importa que não possamos entender plenamente os mistérios do Reino do céu; de uma coisa estamos certos: Seguimos um instrutor que não busca nenhuma glória para si próprio”. E relutantemente seguiram todos para pregar as boas-novas nas cidades da Galiléia.

DOCUMENTO 146

A PRIMEIRA CAMPANHA DE PREGAÇÃO NA GALILÉIA
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A primeira viagem de pregação pública pela Galiléia começou no domingo, 18 de janeiro, do ano 28 d. C. , e continuou durante cerca de dois meses, terminando com o retorno a Cafarnaum, no dia 17 de março. Nessa campanha, Jesus e os doze apóstolos, ajudados pelos antigos apóstolos de João, pregaram o evangelho e batizaram os crentes em Rimon, Jotapata, Ramá, Zebulom, Iron, Giscala, Corazim, Madom, Caná, Naim, e En-dor. Nessas cidades, permaneceram e ensinaram; enquanto ao passar por muitas outras aldeias menores eles proclamaram o evangelho do Reino.

146:0:2 16372 Essa foi a primeira vez que Jesus permitiu aos seus seguidores pregar sem restrição. Nessa viagem ele os advertiu em apenas três ocasiões; aconselhou-os a permanecer afastados de Nazaré e a ser discretos quando passassem por Cafarnaum e por Tiberíades. Foi uma fonte de grande satisfação para os apóstolos sentirem, afinal, que tinham liberdade para pregar e ensinar sem restrição, e todos se lançaram à obra de pregar o evangelho, ministrando aos doentes e batizando os crentes com grande seriedade e muita alegria.

1. PREGANDO EM RIMON


146:1:1 16373 A pequena cidade de Rimon dedicou-se, certa vez, à adoração de um deus babilônico do ar, Raman. Muitos dos primeiros ensinamentos babilônicos e do zoroastrismo eram ainda abraçados pelas crenças dos rimonitanos; por isso Jesus e os vinte e quatro devotaram grande parte do seu tempo à tarefa de deixar evidente a diferença entre essas crenças mais antigas e o novo evangelho do Reino. Ali, Pedro fez um dos grandes sermões da sua carreira inicial, sobre “Aarão e o bezerro de ouro”.

146:1:2 16374 Embora muitos dos cidadãos de Rimon tenham-se tornado crentes dos ensinamentos de Jesus, eles causaram grandes problemas para os seus irmãos em anos posteriores. É difícil, no curto tempo de uma única vida, converter adoradores da natureza à plena comunhão da adoração de um ideal espiritual.

146:1:3 16375 Muitas das melhores idéias sobre a luz e as trevas, o bem e o mal, o tempo e a eternidade, dos babilônios e dos persas, foram incorporadas, mais tarde, às doutrinas do chamado cristianismo; e essa inclusão tornou os ensinamentos cristãos mais imediatamente aceitáveis aos povos do Oriente próximo. De um modo semelhante, a inclusão de muitas das teorias de Platão, sobre o espírito ideal ou sobre os arquétipos invisíveis de todas as coisas visíveis e materiais, mais tarde adaptadas por Filo para a teologia dos hebreus fez com que os ensinamentos cristãos de Paulo passassem a ser mais facilmente aceitos pelos gregos ocidentais.

146:1:4 16376 Foi em Rimon que Todan ouviu, pela primeira vez, o evangelho do Reino e, mais tarde, levou essa mensagem à Mesopotâmia e mesmo até mais adiante. Ele estava entre os primeiros a pregar as boas-novas àqueles que residiam além do Eufrates.

2. EM JOTAPATA


146:2:1 16381 Conquanto a gente comum de Jotapata tenha ouvido Jesus e os seus apóstolos com alegria e embora muitos tenham aceitado o evangelho do Reino, foi a palavra de Jesus aos vinte e quatro, na segunda noite da permanência deles nessa aldeia pequena, que deu personalidade à missão de Jotapata. Natanael estava com a mente confundida pelos ensinamentos do Mestre a respeito da prece, da ação de graças e da adoração; e, em resposta à sua pergunta, Jesus falou prolongadamente para melhor explicar o seu ensinamento. Resumido e colocado em uma linguagem moderna, esse discurso pode ser apresentado, enfatizando os seguintes pontos:

146:2:2 16382 1. A atenção, que se dá à iniqüidade, consciente e persistentemente, dentro do coração do homem, destrói gradualmente a conexão, tecida pela prece, da alma humana com os circuitos espirituais de comunicação entre o homem e o seu Criador. Naturalmente que Deus ouve os pedidos dos seus filhos, mas, quando o coração humano, deliberada e persistentemente, abriga conceitos iníquos, isso leva gradualmente à perda da comunhão pessoal entre o filho da Terra e o seu Pai celeste.

146:2:3 16383 2. A prece que é incompatível com as leis conhecidas e estabelecidas de Deus é uma abominação para as Deidades do Paraíso. Se o homem não ouve os Deuses quando eles falam da Sua criação dentro das leis do espírito, da mente e da matéria, o próprio ato de um desdém deliberado e consciente, da parte das criaturas, faz com que os ouvidos das personalidades espirituais deixem de escutar os pedidos pessoais desses mortais desobedientes e sem lei. Jesus citou, para os seus apóstolos, a passagem do profeta Zacarias: “Mas eles recusaram-se a ouvir e sacudiram os ombros e fecharam os ouvidos para não ouvir. Sim, eles endureceram como pedra os seus corações, para não ter que ouvir a Minha lei e as palavras que Eu enviei, pelo Meu espírito, por meio dos profetas; e portanto os resultados dos seus maus pensamentos caem como uma grande ira sobre as suas cabeças culpadas. E assim aconteceu que gritaram por misericórdia, mas não havia ouvido aberto para escutá-los”. E então Jesus citou o provérbio do homem sábio que disse: “Aquele que ensurdece seus ouvidos, para não ouvir a lei divina, até mesmo a sua prece será uma abominação”.

146:2:4 16384 3. Ao abrir o lado humano, do canal de comunicação entre Deus e o homem, os mortais imediatamente disponibilizam o fluxo sempre constante da ministração divina às criaturas dos mundos. Quando o homem ouve o espírito de Deus falar dentro do coração humano, inerente a essa experiência é o fato de que Deus simultaneamente ouve a prece desse homem. O próprio perdão do pecado opera desse mesmo modo inequívoco. O Pai no céu já vos perdoou antes mesmo de terdes pensado em pedir o perdão a Ele, mas esse perdão só se torna disponível, à vossa experiência religiosa pessoal, no momento em que vós perdoardes os vossos semelhantes. O perdão de Deus não está de fato condicionado ao perdão que dais aos vossos semelhantes, mas é condicionado precisamente assim na experiência. E tal fato, da sincronia entre o perdão divino e o humano, foi, desse modo, reconhecido e incluído na prece que Jesus ensinou aos apóstolos.

146:2:5 16385 4. Há uma lei básica de justiça, no universo, da qual a misericórdia é impotente para se desviar. Não é possível, a uma criatura completamente egoísta dos reinos do tempo e do espaço, receber as glórias não egoístas do Paraíso. Nem mesmo o amor infinito de Deus pode forçar a salvação, da sobrevivência eterna, de qualquer criatura mortal que escolhe não sobreviver. A misericórdia é concedida com uma grande amplidão, mas, afinal, há mandatos de justiça que, nem o amor, combinado com a misericórdia, pode efetivamente ab-rogar. E novamente Jesus citou as escrituras dos hebreus: “Eu chamei e vós vos recusastes a ouvir; eu estendi a minha mão, mas nenhum homem deu atenção. Vós reduzistes a nada todos os Meus conselhos e rejeitastes a Minha censura e, por causa dessa atitude rebelde, torna-se inevitável Me chamardes sem receber uma resposta. Tendo rejeitado o caminho da vida, vós podeis buscar por Mim com toda diligência nos vossos momentos de sofrimento, mas não ireis encontrar-Me”.

146:2:6 16391 5. Aqueles que querem receber misericórdia devem demonstrar ter misericórdia; não julgueis para não serdes julgados. Com o mesmo espírito que julgardes os outros, vós também sereis julgados. A misericórdia não abole totalmente a justiça do universo. Ao final, a verdade seguinte ficará demonstrada: “Aquele que fecha os ouvidos ao grito do pobre, também ele algum dia clamará por ajuda, e ninguém o ouvirá”. A sinceridade de qualquer prece é a certeza de que será ouvida; a sabedoria espiritual e a consistência universal de qualquer pedido determinam o tempo, a maneira e o grau da resposta. Um pai sábio não responde literalmente aos pedidos tolos dos seus filhos ignorantes e inexperientes, não obstante as crianças possam sentir um grande prazer e uma satisfação real na alma, ao fazerem pedidos absurdos.

146:2:7 16392 6. Quando vos tornardes inteiramente dedicados a fazer a vontade do Pai no céu, a resposta a todos os vossos pedidos será concedida porque as vossas preces estarão de pleno acordo com a vontade do Pai, e a vontade do Pai manifesta-se sempre em todo o seu vasto universo. Aquilo que o verdadeiro filho deseja e que é da vontade do Pai infinito, É. Uma prece feita desse modo não pode permanecer sem resposta, e possivelmente nenhuma outra espécie de pedido pode ser atendida integralmente.

146:2:8 16393 7. O apelo do justo é o ato de fé do filho de Deus, que abre a porta das reservas de bondade, de verdade e de misericórdia do Pai; e essas boas dádivas têm, há muito, estado à espera da aproximação do filho, para que ele aproprie-se pessoalmente delas. A prece não muda a atitude divina para com o homem, mas muda a atitude do homem para com o imutável Pai. O motivo da prece é o que dá a ela o direito de acesso ao ouvido divino, não é a posição social, econômica ou religiosa, exterior, daquele que faz a prece.

146:2:9 16394 8. A prece não deve ser empregada para evitar as demoras no tempo, nem para transcender as limitações do espaço. A prece não é algo como uma técnica destinada ao engrandecimento do eu, nem deve ser feita para conseguir vantagens injustas sobre o semelhante. Uma alma totalmente egoísta é incapaz de fazer uma prece, no sentido verdadeiro da palavra. Disse Jesus: “Que o vosso deleite supremo exista, segundo o caráter de Deus, e Ele certamente vos concederá os desejos sinceros do vosso coração”. “Comprometais o vosso caminho com o Senhor; confiai Nele, e Ele agirá”. “Pois o Senhor ouve o apelo do necessitado, e Ele considerará a prece dos desamparados”.

146:2:10 16395 9. “Eu vim do Pai; e, portanto, se vós alguma vez estiverdes sem saber o que pedir ao Pai, pedi em meu nome e eu apresentarei o vosso pedido, de acordo com as vossas reais necessidades e desejos e de acordo com a vontade do meu Pai”. Protegei-vos contra o grande perigo de tornar-vos autocentrados nas vossas preces. Evitai orar demasiadamente para vós próprios; orai mais para o progresso espiritual dos vossos semelhantes. Evitai a prece materialista; orai em espírito e para a abundância das dádivas do espírito.

146:2:11 16396 10. Quando orardes pelos doentes e afligidos, não espereis que os vossos pedidos ocupem o lugar das ministrações amorosas e inteligentes a serem dadas por vós às necessidades desses afligidos. Orai pelo bem-estar das vossas famílias, dos amigos e dos semelhantes, mas orai especialmente por aqueles que vos amaldiçoam, e fazei, com amor, pedidos por aqueles que vos perseguem. “Sobre quando orar, entretanto, disso eu nada digo. O espírito que reside em vós, só ele pode levar-vos a formular as preces que expressam as vossas relações internas com o Pai dos espíritos”.

146:2:12 16401 11. Muitos recorrem à prece apenas quando estão em dificuldades. Essa prática é imprudente e enganosa. É bem verdade que fazeis bem em orar quando estiverdes atormentados, mas deveis também vos lembrar de falar ao Pai, enquanto filhos, mesmo quando tudo vai bem com a vossa alma. Que as vossas preces verdadeiras sejam sempre feitas em segredo. Que os homens não ouçam as vossas preces pessoais. As preces de ação de graças são apropriadas para os grupos de adoradores, mas a prece da alma é um assunto pessoal. Existe apenas uma forma de prece que é apropriada para todos os filhos de Deus, e esta é: “Apesar de tudo, seja feita a vossa vontade”.

146:2:13 16402 12. Todos que acreditam nesse evangelho deveriam orar sinceramente para a expansão do Reino do céu. De todas as preces das escrituras dos hebreus, ele comentou com mais aprovação a prece do salmista: “Criai em mim um coração puro, ó Deus, e renovai em mim o meu espírito de retidão. Purgai-me de pecados secretos e mantende este vosso servo afastado de transgressões presunçosas”. Jesus comentou prolongadamente sobre a relação da prece com as palavras desleixadas e ofensivas, citando: “Colocai uma vigia, ó Senhor, na minha boca; tomai conta da porta dos meus lábios”. “A língua humana”, disse Jesus, “é um membro que poucos podem dominar, mas o espírito interior pode transformar esse membro desregrado em uma voz suave de tolerância e em um ministro inspirado de misericórdia”.

146:2:14 16403 13. Jesus ensinou que a prece para chamar pelo guiamento divino, na trajetória da vida terrena, tem quase tanta importância quanto a prece que invoca o conhecimento da vontade do Pai. Na realidade isso significa uma prece para atingir-se a sabedoria divina. Jesus nunca ensinou que o conhecimento humano e as habilidades especiais poderiam ser conquistadas por meio da prece. Ele ensinou, contudo, que a prece é um fator na expansão da capacidade, que se tem de receber a presença do espírito divino. Quando Jesus ensinou aos seus agregados a orar em espírito e na verdade, ele explicou que se referia a orar com sinceridade e de acordo com o próprio esclarecimento, a orar de todo o coração de um modo inteligente, honesto e constante.

146:2:15 16404 14. Jesus preveniu aos seus seguidores contra o pensamento de que as suas preces ficariam mais eficazes se feitas com repetições rebuscadas, e por meio de uma construção mais eloqüente da frase, do jejum, da penitência ou de sacrifícios. Mas exortou os seus crentes a empregar a prece como um meio para serem conduzidos, pelo agradecimento, à verdadeira adoração. Jesus deplorava que tão pouco do espírito da ação de agradecimento estivesse presente nas preces e na adoração dos seus seguidores. Ele citou as escrituras, nessa ocasião, dizendo: “É uma coisa boa agradecer ao Senhor e cantar louvores em nome do Altíssimo, em reconhecimento do seu amor e bondade a cada manhã, e todas as noites, à sua fidelidade, pois Deus me fez alegre por intermédio do seu trabalho. Em tudo e por tudo eu agradecerei de acordo com a vontade de Deus”.

146:2:16 16405 15. E então Jesus disse: “Não sejais tão constantemente preocupados com as vossas necessidades comuns. Não fiqueis apreensivos a respeito dos problemas da vossa existência terrena, mas em todas essas coisas, pela oração e pela súplica, com o espírito de um agradecimento sincero, deixai as vossas necessidades expostas diante do vosso Pai que está no céu”. E então citou das escrituras: “Eu louvarei o nome de Deus com uma canção e O exaltarei com o meu agradecimento. E isso irá agradar ao Senhor, mais do que o sacrifício de um boi ou um touro com chifres e cascos”.

146:2:17 16411 16. Jesus ensinou aos seus seguidores que, após fazerem as suas preces ao Pai, eles deveriam permanecer durante um momento em atitude de receptividade silenciosa para dar, ao espírito residente, uma oportunidade melhor de falar à alma atenta. O espírito do Pai fala melhor ao homem, quando a mente humana está em uma atitude de verdadeira adoração. Nós adoramos a Deus, graças à ajuda do espírito residente do Pai e à iluminação da mente humana, por meio da ministração da verdade. A adoração, como ensinada por Jesus, faz o adorador cada vez mais semelhante ao ser adorado. A adoração é uma experiência de transformação, por meio da qual o finito aproxima-se gradualmente para alcançar, em ultimidade, a presença do Infinito.

146:2:18 16412 E Jesus falou aos seus apóstolos de muitas outras verdades sobre a comunhão do homem com Deus, mas não foram muitos os que puderam compreender plenamente o seu ensinamento.

3. A PARADA EM RAMÁ


146:3:1 16413 Em Ramá, Jesus teve o debate memorável com um filosofo grego idoso, cujos ensinamentos mostravam que a ciência e a filosofia eram suficientes para satisfazer as necessidades da experiência humana. Com paciência e compaixão, Jesus ouviu esse educador grego reconhecer a verdade de muitas coisas que ele dissera; mas Jesus apontou, quando o filósofo terminou, na sua argumentação sobre a existência humana, que ele havia deixado de explicar “de onde, o porquê e para onde”, e acrescentou: “Onde vós terminais é que nós começamos. A religião é uma revelação à alma do homem, que lida com as realidades espirituais, que a mente em si não poderia jamais descobrir, nem sondar integralmente. Os esforços intelectuais podem revelar os fatos da vida, mas o evangelho do Reino desvela as verdades do ser. Vós abordastes as sombras materiais da verdade; será que podereis agora escutar o que eu tenho para falar-vos, sobre as realidades eternas e espirituais que projetam, em sombras temporais transitórias, os fatos materiais da existência mortal?” E, por mais de uma hora, Jesus ensinou a esse grego sobre as verdades salvadoras do evangelho do Reino. O velho filósofo foi sensível ao modo de abordagem adotado pelo Mestre, e sendo honesto, sincero e de coração aberto, ele rapidamente acreditou nesse evangelho da salvação.

146:3:2 16414 Os apóstolos ficaram um pouco desconsertados com o modo franco com o qual Jesus aquiesceu quanto a muitas das proposições do grego, mas Jesus disse a eles, depois, em particular: “Meus filhos, não vos admireis de que eu tenha sido tolerante com a filosofia do grego. A certeza interior verdadeira e genuína não teme, nem um pouco, uma análise exterior; a verdade também não se ressente de nenhuma crítica honesta. Vós não deveríeis, nunca, esquecer-vos de que a intolerância é uma máscara a encobrir as dúvidas secretas, alimentadas quanto à verdade da própria crença. Nenhum homem é perturbado, em momento algum, pela atitude do seu semelhante quando tem uma confiança perfeita na verdade daquilo em que acredita, de todo o coração. A coragem é a confiança daqueles que têm uma honestidade a toda prova quanto às coisas que professam acreditar. Os homens sinceros são destemidos quanto a um exame crítico das suas verdadeiras convicções e dos seus ideais nobres”.

146:3:3 16415 Na segunda noite em Ramá, Tomé fez a Jesus esta pergunta: “Mestre, como um novo crente dos seus ensinamentos pode saber realmente, e sentir-se seguro, sobre a verdade dessas boas-novas do Reino?”

146:3:4 16416 E Jesus disse a Tomé: “A tua certeza de teres entrado na família do Reino do Pai e de que tu sobreviverás eternamente, com os filhos do Reino, é totalmente uma questão de experiência pessoal – de fé na palavra da verdade. A segurança espiritual equivale à tua experiência religiosa pessoal com as realidades eternas da verdade divina e é, por outro lado, igual ao teu entendimento inteligente das realidades da verdade, somadas à tua fé espiritual e diminuídas das tuas dúvidas sinceras.

146:3:5 16421 “O Filho é naturalmente dotado com a vida do Pai. Tendo sido dotados com o espírito vivo do Pai, vós sois, portanto, filhos de Deus. Vós sobrevivereis depois da vossa vida no mundo material da carne, porque estais identificados com o espírito vivo do Pai, a dádiva da vida eterna. Muitos, de fato, tinham esta vida antes de eu ter vindo do Pai, e muitos mais têm recebido este espírito porque eles acreditaram na minha palavra; mas eu declaro que, quando eu voltar ao Pai, Ele enviará o Seu espírito aos corações de todos os homens.

146:3:6 16422 “Ainda que não possais observar o espírito divino trabalhando nas vossas mentes, há um método prático para descobrir o nível em que conseguistes ter o controle dos poderes da vossa alma, sob o ensinamento e o guiamento desse espírito interior residente do Pai celeste: é a medida do amor pelo vosso semelhante. Esse espírito do Pai compartilha do amor do Pai e, à proporção que domina o homem, leva infalivelmente na direção da adoração divina e da consideração amorosa pelo semelhante. A princípio, vós acreditais que sois filhos de Deus, porque o meu ensinamento tornou-vos mais conscientes da condução interna da presença residente do Pai; mas em breve o Espírito da Verdade será vertido sobre toda a carne, e ele viverá entre os homens e ensinará a todos os homens, do mesmo modo que eu vivo agora entre vós e vos digo palavras da verdade. E este Espírito da Verdade, falando a todos os dons espirituais das vossas almas, ajudar-vos-á a saber que sois filhos de Deus. E ele dará o testemunho infalível, junto com a presença residente do Pai, o vosso espírito, que então residirá em todos os homens, como agora reside em alguns, dizendo-vos que sois na realidade os filhos de Deus.

146:3:7 16423 “Todo filho terreno, que aceitar a condução desse espírito, conhecerá finalmente a vontade de Deus, e aquele que se entregar à vontade do meu Pai, viverá eternamente. O caminho da vida terrena até o estado eterno não vos foi claramente descrito. No entanto há um caminho, sempre houve, e eu vim para fazer dele um caminho novo e vivo. Aquele que entra no Reino tem já a vida eterna – não perecerá jamais. Mas vós compreendereis melhor uma grande parte de tudo isso quando eu tiver voltado para o Pai e quando vos tornardes capacitados para ver as vossas experiências em retrospecção. ”

146:3:8 16424 E todos aqueles que ouviram essas palavras abençoadas ficaram grandemente satisfeitos. Os ensinamentos judeus, a respeito da sobrevivência dos justos, tinham sido confusos e incertos; e foi reanimador e inspirador para os seguidores de Jesus ouvirem essas palavras, bastante precisas e positivas, de promessa sobre a sobrevivência eterna de todos os crentes verdadeiros.

146:3:9 16425 Os apóstolos continuaram a pregar e a batizar os crentes e, ao mesmo tempo, mantiveram a prática de visitar de casa em casa, confortando os abatidos e ministrando aos doentes e afligidos. A organização apostólica estava expandida, pois cada um dos apóstolos de Jesus agora tinha um dos apóstolos de João como colaborador; Abner era o colaborador de André; e esse plano prevaleceu até que descessem a Jerusalém para a próxima Páscoa.

146:3:10 16426 A instrução especial, dada por Jesus, durante a permanência deles em Zebulom, tinha a ver principalmente com as novas discussões sobre as obrigações recíprocas no Reino, e abrangia um ensinamento destinado a tornar claras as diferenças entre a experiência religiosa pessoal e as amizades e as obrigações religiosas sociais. Esta foi uma das poucas vezes em que o Mestre falou sobre os aspectos sociais da religião. Durante toda a sua vida terrena, Jesus deu pouquíssimas instruções aos seus seguidores a respeito da socialização da religião.

146:3:11 16431 Em Zebulom, a população era de uma raça mista, meio judia e meio gentia, e poucos deles realmente acreditavam em Jesus, não obstante terem ouvido sobre as curas dos doentes em Cafarnaum.

4. O EVANGELHO EM IROM


146:4:1 16432 Em Iron, como em muitas das aldeias menores da Galiléia e da Judéia, havia uma sinagoga e, durante os tempos iniciais das ministrações de Jesus, era costume dele falar nessas sinagogas, no dia de sábado. Algumas vezes, ele falava no serviço da manhã, e Pedro, ou um dos outros apóstolos, pregava na reunião da tarde. Jesus e os apóstolos freqüentemente também ensinavam e pregavam em assembléias noturnas, durante a semana, na sinagoga. Embora os líderes religiosos de Jerusalém, cada vez mais se opusessem a Jesus, eles não exerciam nenhum controle direto sobre as sinagogas de fora dessa cidade. Não foi senão mais tarde, durante a ministração pública de Jesus, que foram capazes de criar, de um modo tão abrangente, um sentimento contra ele a ponto de provocar o fechamento quase universal das sinagogas ao ensinamento dele. Nesta época, todas as sinagogas da Galiléia e da Judéia ainda estavam abertas para ele.

146:4:2 16433 Iron era o local de muitas minas importantes para a época e, já que Jesus nunca tinha participado da vida dos mineiros, ele passou a maior parte do seu tempo nas minas, durante sua permanência em Iron. Enquanto os apóstolos visitavam as casas e pregavam nas praças públicas, Jesus labutava nas minas com esses trabalhadores subterrâneos. A fama das curas de Jesus tinha espalhado-se até essa aldeia remota, e muitos doentes e aflitos buscaram ajuda pelas suas mãos, e vários deles foram grandemente beneficiados pela sua ministração de cura. Mas, em nenhum desses casos, o Mestre efetuou um chamado milagre de cura, exceto no caso da lepra.

146:4:3 16434 No final da tarde do terceiro dia em Iron, quando Jesus retornava das minas e dirigia-se ao seu alojamento, por acaso passou em uma estreita rua lateral. Quando se aproximou da cabana esquálida de um certo leproso, o homem afligido, tendo ouvido sobre a fama das suas curas, teve a coragem de abordá-lo, quando passou pela sua porta, e ajoelhado diante dele foi dizendo: “Senhor, se apenas quisesses, tu poderias limpar-me. Ouvi a mensagem dos teus instrutores, e gostaria de entrar no Reino, se eu pudesse ser purificado”. E o leproso falou desse modo porque, entre os judeus, os leprosos eram proibidos até mesmo de freqüentar a sinagoga ou aderir à adoração pública. Esse homem realmente acreditava que não poderia ser recebido no Reino vindouro, a menos que pudesse encontrar a cura para a sua lepra. E Jesus viu a aflição dele, ouviu aquelas palavras de fé aferrada e o seu coração humano foi tocado e a mente divina foi movida pela compaixão. E, quando Jesus pousou seus olhos sobre ele, o homem caiu com o rosto no chão em adoração. Então, o Mestre estendeu a sua mão e, tocando-o, disse: “Sim, eu quero – sê purificado”. E, imediatamente, ele foi curado; a lepra não mais o afligia.

146:4:4 16435 Jesus colocou o homem de pé, e ordenou-lhe: “Toma cuidado para não dizer a nenhum homem sobre a tua cura, vá cuidar em silêncio das tuas coisas, mostra-te ao sacerdote e ofereça os sacrifícios como foram mandados por Moisés, como testemunho da tua purificação”. Mas esse homem não fez como Jesus havia instruído que ele fizesse. Em vez disso, começou a tornar público, para todos na cidade, que Jesus tinha curado a sua lepra e, como ele era conhecido de todos na aldeia, o povo podia ver claramente que ele havia sido curado da sua doença. E ele não foi aos sacerdotes, como Jesus havia aconselhado que fizesse. Por conseqüência de ter tornado pública a nova de que Jesus o havia curado, o Mestre foi tão atropelado pelos doentes que se viu forçado a levantar-se cedo, no dia seguinte, e deixar a aldeia. Embora Jesus não tenha entrado de novo na aldeia, ele permaneceu dois dias nos seus arredores, perto das minas, continuando a instruir os mineiros crentes a respeito do evangelho do Reino.

146:4:5 16441 Essa cura do leproso foi o primeiro, assim chamado, milagre feito de modo intencional e deliberado por Jesus, até esse momento. E era esse um caso verdadeiro de lepra.

146:4:6 16442 De Iron, eles foram para Giscala, proclamando o evangelho durante dois dias e então partiram para Corazim, onde passaram quase uma semana pregando as boas-novas. Em Corazim, contudo, eles não puderam conquistar muitos crentes para o Reino. Em nenhum outro lugar onde ensinara Jesus tinha encontrado uma rejeição tão geral à sua mensagem. A permanência em Corazim foi muito deprimente para a maioria dos apóstolos; e André e Abner tiveram muita dificuldade em manter a coragem dos seus condiscípulos. E então, passando tranqüilamente por Cafarnaum, eles foram para a aldeia de Madom, onde tiveram um pouco mais de êxito. Nas mentes da maioria dos apóstolos, prevaleceu a idéia de que o pouco êxito obtido nas cidades visitadas mais recentemente era devido à insistência de Jesus para que eles se abstivessem, nos seus ensinamentos e pregações, de referir-se a ele como um curador. Como eles almejavam que Jesus purificasse um outro leproso ou que, de algum outro modo, manifestasse ele o seu poder para atrair a atenção do povo! Mas o Mestre permaneceu impassível ante seus pedidos fervorosos.

5. DE VOLTA A CANÁ


146:5:1 16443 O grupo apostólico ficou bastante contente quando Jesus anunciou: “Amanhã vamos a Caná”. Eles todos sabiam que teriam uma audiência simpática em Caná, pois Jesus era bem conhecido lá. Eles estavam indo bem, no seu trabalho de atrair o povo para o Reino quando, ao terceiro dia, Tito, um cidadão proeminente de Cafarnaum, chegou em Caná; ele era apenas meio crente, e o seu filho estava seriamente doente. Ao tomar conhecimento de que Jesus estava em Caná, ele apressou-se a ir até lá para vê-lo. Em Cafarnaum, todos os fiéis pensavam que Jesus podia curar qualquer doença.

146:5:2 16444 Quando esse nobre localizou Jesus em Caná, suplicou-lhe que se apressasse para ir até Cafarnaum a fim de curar o seu filho doente. Enquanto os apóstolos aguardavam com a respiração presa na expectativa, Jesus, olhando para o pai do menino doente, disse: “Por quanto tempo serei tolerante convosco? O poder de Deus está no meio de vós, mas, a menos que possais ver os sinais e presenciar prodígios, vos recusais a acreditar”. Todavia, o nobre implorou a Jesus, dizendo: “Meu Senhor, eu creio, mas venha antes que o meu filho faleça, pois quando eu o deixei ele já estava a ponto de morrer”. E depois de ter abaixado a cabeça, por um momento, em uma meditação silenciosa, Jesus subitamente falou: “Retorna à tua casa; o teu filho viverá”. Tito acreditou na palavra de Jesus e apressou-se a voltar para Cafarnaum. Ao retornar, os seus servos saíram para encontrá-lo, dizendo: “Rejubila-te, pois o teu filho melhorou – ele vive”. Então Tito perguntou a eles sobre a hora em que o menino começara a melhorar e, quando os servos responderam: “Ontem por volta das sete horas a febre o deixou”. E o pai lembrou-se de que tinha sido por volta dessa hora que Jesus dissera: “O teu filho viverá”. E a partir daí Tito acreditou, de coração, e toda a sua família também acreditou. Esse filho tornou-se um poderoso ministro do Reino e, mais tarde, sacrificou a sua vida junto com aqueles que padeceram em Roma. Embora toda a criadagem de Tito, os seus amigos, e até mesmo os apóstolos considerassem esse episódio como um milagre, na verdade não o foi. Pelo menos não foi um milagre de cura de doença física. Foi apenas um caso de pré-ciência a respeito do curso da lei natural, exatamente aquele conhecimento ao qual Jesus freqüentemente recorreu, depois do seu batismo.

146:5:3 16451 E novamente Jesus foi obrigado a apressar-se para sair de Caná, por causa da atenção indevidamente atraída pelo segundo episódio dessa espécie, que acontecia à sua ministração nessa aldeia. Os habitantes da aldeia lembraram-se da água e do vinho e, agora que se supunha que ele tinha curado o filho do nobre, a uma distância tão grande, vinham até ele, não apenas trazendo os doentes e aflitos, mas, também, enviando mensageiros com a solicitação de que ele curasse sofredores à distância. E quando Jesus percebeu que toda a região estava mobilizada, ele disse: “Vamos para Naim”.

6. NAIM E O FILHO DA VIÚVA


146:6:1 16452 Nos sinais, essa gente acreditava; eram pessoas de uma geração à espera de prodígios. Nessa altura dos acontecimentos, os habitantes do centro e do sul da Galiléia tinham a mente voltada sempre para os milagres quando pensavam em Jesus e na ministração pessoal dele. Dezenas, centenas de pessoas sinceras, que sofriam de desordens puramente nervosas, e aflitos, com distúrbios emocionais, vinham à presença de Jesus e então voltavam para as suas casas anunciando aos seus amigos que Jesus as tinha curado. E esse povo ignorante e de mente simples considerava esses casos de cura mental como sendo de curas físicas miraculosas.

146:6:2 16453 Quando Jesus tentou deixar Caná e ir para Naim, uma multidão grande de crentes e curiosos o seguiu. Eles estavam inclinados a ver milagres e prodígios, e não se deixariam decepcionar. Quando Jesus e os seus apóstolos aproximaram-se do portão da cidade, depararam-se com o cortejo de um funeral, a caminho de um cemitério vizinho dali, levando o único filho de uma mãe viúva de Naim. Essa mulher era muito respeitada; e metade da aldeia seguia os que carregavam o esquife desse rapaz, que se supunha estar morto. Quando o funeral passou por Jesus e os seus seguidores, a viúva e os seus amigos, reconhecendo o Mestre, suplicaram que ele trouxesse o filho dela de volta à vida. A expectativa, que tinham, de milagres havia sido elevada até um ponto tão alto que eles imaginavam Jesus como alguém capaz de curar qualquer doença humana. E por que esse curador não poderia até mesmo ressuscitar os mortos? Jesus, assim importunado, deu um passo adiante e, levantando o tampo do esquife, examinou o rapaz. Descobrindo que o moço não estava realmente morto, ele percebeu a tragédia que a sua presença podia evitar; assim, voltando-se para a mãe, Jesus disse: “Não chores. O teu filho não está morto; ele dorme. E te será devolvido”. E então, tomando o jovem pela mão, ele disse: “Acorda e levanta”. E o jovem, que se supunha estar morto, logo se assentou e começou a falar, e Jesus os mandou de volta para as suas casas.

146:6:3 16454 Jesus empenhou-se em acalmar a multidão e tentou, em vão, explicar que o jovem não estava morto realmente, que ele não o tinha trazido de volta da morte, mas foi inútil. A multidão que o seguia, e toda a aldeia de Naim, foi levada ao ponto alto de um frenesi emocional. Muitos foram tomados pelo medo, outros pelo pânico, enquanto outros ainda caíram em prece e nas lamentações dos próprios pecados. E só muito depois do cair da noite é que a multidão clamorosa pôde ser dispersada. E, claro está, não obstante a afirmação feita por Jesus de que o rapaz não estava morto, todos insistiam que um milagre tinha acontecido. Que até mesmo um morto tinha sido ressuscitado. Embora Jesus tivesse dito a eles que o rapaz estava meramente em um sono profundo, eles justificaram-se dizendo ser este o seu modo de falar, chamando a atenção para o fato de que Jesus, sempre na sua grande modéstia, tentava esconder os próprios milagres.

146:6:4 16461 E assim, por toda a Galiléia e pela Judéia, espalhou-se a nova de que Jesus tinha ressuscitado dos mortos o filho da viúva, e muitos que ouviram esse relato acreditaram nele. Jesus nunca foi capaz de fazer nem mesmo com que os seus apóstolos compreendessem inteiramente que o filho da viúva não estava realmente morto quando ele o havia convocado a acordar e levantar-se. Todavia, ele os convenceu, o suficiente para que o episódio ficasse suprimido de todos os registros subseqüentes, exceto do de Lucas, que o registrou como o episódio lhe tinha sido contado. E, de novo, Jesus foi tão assediado como médico que partiu bem cedo no dia seguinte para En-dor.

7. EM EN-DOR


146:7:1 16462 Em En-dor Jesus escapou, por uns poucos dias, do clamor das multidões em busca de curas físicas. Durante a permanência deles, nesse lugar, o Mestre narrou novamente, para instruir os apóstolos, a história do rei Saul e da bruxa de En-dor. Jesus disse claramente aos seus apóstolos que os seres intermediários extraviados e rebeldes, que tantas vezes tinham personificado os supostos espíritos dos mortos, seriam em breve colocados sob controle, de tal modo que não mais pudessem fazer essas coisas estranhas. Ele disse aos seus seguidores que, depois que ele voltasse para o Pai, e depois que o Pai e ele tivessem vertido o espírito Deles sobre toda a carne, esses seres semi-espirituais – os considerados espíritos impuros – não mais poderiam possuir os mortais de inteligência mais débil ou de mente perversa.

146:7:2 16463 Jesus explicou ainda, aos seus apóstolos, que os espíritos de seres humanos já mortos não retornam ao mundo da sua origem, para comunicar-se com os seus semelhantes vivos. Apenas depois de ter passado uma era dispensacional é que seria possível ao espírito, em avanço, do homem mortal, retornar à Terra e, ainda assim, só em casos excepcionais e como parte da administração espiritual do planeta.

146:7:3 16464 Após dois dias de repouso, Jesus disse aos seus apóstolos: “Retornemos amanhã a Cafarnaum para ficarmos lá e ensinarmos, enquanto o interior do país se acalma. Nas casas deles, passado esse tempo, todos ficarão recuperados desse tipo de agitação”.

DOCUMENTO 147

O INTERLÚDIO DA VISITA A JERUSALÉM
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Jesus e os apóstolos chegaram a Cafarnaum na quarta-feira, 17 de março, e passaram duas semanas na sua sede-alojamento, em Betsaida, antes de partir para Jerusalém. Nessas duas semanas, os apóstolos ensinaram ao povo, perto do mar, enquanto Jesus passou muito tempo a sós, nas colinas, cuidando dos assuntos do seu Pai. Durante esse período, Jesus, acompanhado por Tiago e João Zebedeu, fez duas viagens secretas a Tiberíades, onde se encontraram com os crentes e instruíram-nos sobre o evangelho do Reino.

147:0:2 16472 Muitos dos membros que cuidavam da casa de Herodes acreditavam em Jesus e compareciam a esses encontros. Foi a influência desses crentes, da família oficial de Herodes, que ajudou a diminuir a inimizade do governante para com Jesus. Esses crentes de Tiberíades tinham explicado muito bem a Herodes que o “Reino” o qual Jesus proclamava era de natureza espiritual e não uma especulação política. Herodes preferiu acreditar nesses membros da sua própria casa e não se permitiu ficar indevidamente alarmado com a ampla divulgação a respeito das curas e dos ensinamentos de Jesus. Ele não tinha objeções nem ao trabalho de cura de Jesus, nem à sua obra como Mestre religioso. Não obstante a atitude favorável de muitos dos conselheiros de Herodes, e até mesmo a do próprio Herodes, existia um grupo de subordinados seus que era bastante influenciado pelos líderes religiosos de Jerusalém, a ponto de continuarem sendo inimigos amargos e ameaçadores de Jesus e dos apóstolos; e que, mais tarde, muito fizeram para obstruir as atividades públicas deles. O maior perigo para Jesus estava nos líderes religiosos de Jerusalém, e não em Herodes. E foi por essa mesma razão que Jesus e os apóstolos passaram tanto tempo na Galiléia e fizeram a maioria das pregações públicas na Galiléia, mais do que em Jerusalém e na Judéia.

1. O SERVO DO CENTURIÃO


147:1:1 16473 No dia anterior aos preparativos da festa de Páscoa em Jerusalém, para onde iriam, Mangus, um centurião, ou capitão da guarda romana aquartelada em Cafarnaum, foi até os dirigentes da sinagoga e disse: “O meu fiel ordenança está doente a ponto de morrer. Poderíeis vós, portanto, ir até Jesus, da minha parte, e implorar a ele que cure o meu servo?” O capitão romano fez isso porque pensou que os líderes judeus teriam mais influência junto a Jesus. E então os anciães foram ver Jesus, e o seu porta-voz disse: “Instrutor, nós te pedimos sinceramente que vá até Cafarnaum e salve o servo favorito do centurião romano, que se faz digno da tua atenção, porque ele ama a nossa nação e até nos construiu aquela mesma sinagoga onde tantas vezes tu falaste”.

147:1:2 16474 E, depois de ouvi-los, Jesus disse: “Eu irei convosco”. E foi com eles até a casa do centurião e, antes de entrarem na casa, o soldado romano enviou os seus amigos para receberem Jesus, instruindo-os para que dissessem: “Senhor, não te incomodes de entrar na minha casa, pois não sou digno de que estejas sob o meu teto. Nem me julguei digno de ir até a ti; motivo pelo qual eu enviei os anciães do teu próprio povo até a ti. Mas sei que podes dizer uma palavra, de onde estás, e o meu servo será curado. Pois estou eu próprio sob as ordens de outros, e eu tenho soldados sob as minhas ordens e, se eu digo a este que vá, ele vai; se a outro digo que venha, ele vem, e aos meus servos digo que façam isso ou aquilo, e eles fazem”.

147:1:3 16481 E quando Jesus ouviu essas palavras, voltou-se e disse aos seus apóstolos e àqueles que estavam com eles: “Estou admirado com a crença do gentio. Em verdade, em verdade, eu vos digo que não encontrei uma fé tão grande assim, não em Israel”. E, afastando-se da casa, Jesus disse: “Vamos embora, então”. E os amigos do centurião foram até a casa e contaram a Mangus o que Jesus havia dito. E, a partir daquela hora, o servo começou a melhorar, até voltar à saúde e capacidade normais.

147:1:4 16482 Mas nós nunca soubemos o que aconteceu nessa ocasião. Isso é simplesmente o que está registrado, se os seres invisíveis ministraram a cura ao servo do centurião ou não, isso não foi revelado àqueles que acompanhavam Jesus. Sabemos apenas do fato da recuperação completa do servo.

2. A VIAGEM A JERUSALÉM


147:2:1 16483 Cedo, na manhã de terça-feira, 30 de março, Jesus e o grupo dos apóstolos iniciaram a sua viagem a Jerusalém, para a Páscoa, indo pela estrada do Vale do Jordão. Eles chegaram na tarde de sexta-feira, 2 de abril, e estabeleceram o seu centro de operações na Betânia, como de costume. Passando por Jericó, eles pararam para descansar, enquanto Judas fez um depósito de algumas das economias comuns, no banco de um amigo da sua família. Essa foi a primeira vez que Judas tinha levado uma quantidade excedente de dinheiro, e esse depósito foi deixado intacto, até que eles passassem por Jericó novamente, quando daquela última viagem, cheia de acontecimentos, até Jerusalém, pouco antes do julgamento e da morte de Jesus.

147:2:2 16484 O grupo fez uma viagem sem incidentes até Jerusalém, mas, mal se tinham instalado na Betânia, quando, vindos de perto e de longe, começaram a reunir-se todos aqueles que procuravam curas para os seus corpos, conforto para as mentes angustiadas e a salvação para as suas almas. E o seu número cresceu tanto que Jesus pouco tempo teve para descansar. E então o grupo armou as barracas no Getsêmane, e o Mestre ia de Betânia ao Getsêmane e voltava, para evitar as multidões, que tão constantemente assediavam-no. O grupo dos apóstolos passou quase três semanas em Jerusalém, mas Jesus conclamou-os a não fazer pregações públicas, que ensinassem apenas em particular e por meio do trabalho pessoal.

147:2:3 16485 Na Betânia, eles celebraram a Páscoa sem estardalhaço. E essa foi a primeira vez que Jesus e todos os doze partilharam de uma festa de Páscoa, sem derramamento de sangue. Os apóstolos de João não cearam com Jesus e os seus apóstolos, na Páscoa; eles celebraram a festa com Abner e muitos dos antigos crentes das pregações de João. Essa era a segunda Páscoa que Jesus observava, junto com os seus apóstolos, em Jerusalém.

147:2:4 16486 Quando Jesus e os doze partiram para Cafarnaum, os apóstolos de João não foram com eles. Sob a direção de Abner, eles permaneceram em Jerusalém e nas vizinhanças; trabalhando silenciosamente para a expansão do Reino, enquanto Jesus e os doze retornaram para trabalhar na Galiléia. Nunca mais, os vinte e quatro estiveram todos juntos, até um pouco antes da escolha e do envio dos setenta evangelistas. Todavia, os dois grupos cooperaram entre si e, não obstante as diferenças de opinião entre eles, prevaleceu o melhor dos sentimentos.

3. NA PISCINA DE BETESDA


147:3:1 16491 Na tarde do segundo sábado em Jerusalém, pouco antes de o Mestre e os apóstolos iniciarem a sua participação nos serviços do templo, João disse a Jesus: “Vem comigo, quero mostrar-te uma coisa”. João levou Jesus até um dos portões de Jerusalém, onde havia uma piscina de água chamada Betesda. Em volta desta piscina havia uma estrutura de cinco arcadas, sob as quais um grande grupo de doentes aguardava a cura. Tratava-se de uma fonte cuja água quente avermelhada borbulhava em intervalos irregulares, por causa do acúmulo de gás nas cavernas de rocha, por baixo da piscina. Tal alteração periódica, nas águas quentes, era considerada por muitos como sendo devido a influências sobrenaturais. E era uma crença popular que a primeira pessoa a entrar na água, depois daquele borbulhamento, seria curada de qualquer enfermidade.

147:3:2 16492 Os apóstolos ficaram um tanto desassossegados sob as restrições impostas por Jesus e João, o mais jovem dos doze, estava especialmente inquieto com essa restrição. Ele tinha levado Jesus até a piscina, pensando que a visão dos doentes reunidos fizesse um tal apelo à sua compaixão que ele fosse induzido a realizar um milagre de cura e, pois, assim, toda Jerusalém ficaria maravilhada e em breve seria levada a crer no evangelho do Reino. Disse João a Jesus: “Mestre, vê todos esses sofredores; não há nada que possamos fazer por eles?” E Jesus respondeu: “João, por que tu me tentas para que eu me desvie do caminho que escolhi? Por que continuar desejando substituir a proclamação do evangelho da verdade eterna, pela realização de prodígios e cura dos doentes? Meu filho, posso não fazer o que desejas, mas reúna esses doentes e afligidos para que eu possa dizer umas palavras de novo ânimo e conforto eterno a eles”.

147:3:3 16493 Diante dos que lá estavam, Jesus disse: “Muitos de vós, doentes e afligidos, estais aqui por causa dos vossos longos anos de vida errônea. Alguns sofrem em vista de acidentes do tempo, outros em conseqüência de erros dos seus ancestrais, enquanto alguns de vós lutais contra as limitações das condições imperfeitas da vossa existência temporal. Mas o meu Pai trabalha, e eu gostaria também de trabalhar, para melhorar o vosso estado terreno, mas mais especialmente para assegurar-vos o vosso estado como seres eternos. Nenhum de nós nada mais pode fazer, para mudar as dificuldades da vida, a menos que descubramos que o Pai no céu quer assim. Afinal, todos estamos destinados a fazer a vontade do Eterno. Se pudésseis, todos, ser curados das vossas aflições físicas, vós todos, de fato, ficaríeis maravilhados, porém, mais importante ainda é que sejais todos purificados de quaisquer doenças espirituais e que vos vejais curados de quaisquer enfermidades morais. Sois todos filhos de Deus; sois os filhos do Pai celeste. Os elos do tempo podem parecer afligir-vos, mas o Deus da eternidade vos ama. E, quando a hora do julgamento tiver chegado, não temais, vós todos encontrareis, não apenas a justiça, mas uma abundância de misericórdia. Em verdade, em verdade, eu vos digo: Aquele que ouve o evangelho do Reino, e crê nesse ensinamento de filiação a Deus, tem a vida eterna; e os crentes como esses já estão passando do julgamento e da morte para a luz e a vida. E a hora está chegando em que mesmo aqueles que estão nas sepulturas escutarão a voz da ressurreição”.

147:3:4 16494 E muitos dos que ouviram, acreditaram na boa-nova do Reino. Alguns dos aflitos sentiram-se tão inspirados tão revivificados espiritualmente, que saíram proclamando também ter sido curados das suas indisposições físicas.

147:3:5 16495 Um homem que tinha estado deprimido e gravemente afligido, durante muitos anos, pelas enfermidades da sua mente perturbada, rejubilou-se com as palavras de Jesus e, recolhendo o seu leito, foi para a sua casa, mesmo sendo o dia de sábado. Esse homem aflito havia esperado, durante muitos anos, por alguém que o ajudasse; ele era uma vítima do sentimento de seu próprio desamparo, que nunca sequer havia concebido a idéia de ajudar a si próprio; e ficou demonstrado que a única coisa que ele tinha a fazer para recuperar-se de fato era pegar o seu leito e andar.

147:3:6 16501 Então disse Jesus a João: “Partamos, antes que o dirigente dos sacerdotes e escribas venham a nós e se ofendam, porque eu disse as palavras de vida a esses aflitos”. E voltaram ao templo para unir-se aos seus companheiros, e logo todos partiram com o objetivo de passar a noite na Betânia. Mas João nunca disse aos outros apóstolos sobre essa visita, dele e de Jesus, à piscina de Betesda naquele sábado à tarde.

4. A REGRA DE VIVER


147:4:1 16502 Na noite desse mesmo dia de sábado, na Betânia, enquanto Jesus, os doze, e um grupo de crentes estavam reunidos em volta do fogo, no jardim de Lázaro, Natanael fez a Jesus esta pergunta: “Mestre, embora tenhas tu ensinado a nós a versão positiva da velha regra de viver, instruindo-nos para que façamos aos outros do modo como gostaríamos que fizessem a nós, eu não sei totalmente como podemos estar sempre obedecendo a essa injunção. Deixe-me ilustrar a minha pergunta, citando o exemplo de um homem cheio de desejo sensual, que vê, assim, em pecado, a sua futura consorte. Como podemos ensinar a esse homem, com intenções más, que ele deveria fazer aos outros o que gostaria que fizessem a si?”

147:4:2 16503 Ao ouvir a pergunta de Natanael, imediatamente Jesus colocou-se de pé e, com o dedo apontado para o apóstolo, disse: “Natanael, Natanael! Que modo de pensar está acontecendo no teu coração? Tu não recebes os meus ensinamentos como alguém que nasceu do espírito? Tu não ouves a verdade como faz um homem de sabedoria e de compreensão espiritual? Quando te aconselhei a fazer aos outros do mesmo modo como gostarias que fizessem a ti, referia-me a homens de ideais elevados, não àqueles que seriam tentados a distorcer os meus ensinamentos a ponto de transformá-los em uma licença para encorajar as más ações”.

147:4:3 16504 Depois que o Mestre falou, Natanael levantou-se e disse: “Mestre, mas tu não devias pensar que eu aprovo uma tal interpretação para o teu ensinamento. Eu fiz a pergunta porque conjecturei que muitos homens poderiam julgar assim erradamente o teu conselho, e eu esperava que tu fosses gostar de dar-nos mais instruções a respeito dessas questões”. E, então, quando Natanael tinha-se assentado, Jesus continuou falando: “Eu bem sei, Natanael, que essa idéia do mal não encontra aprovação na tua mente, mas estou desapontado pelo fato de que todos vós, tão freqüentemente, deixais de dar uma interpretação genuinamente espiritual aos meus ensinamentos mais comuns, a umas instruções que vos devo dar em linguagem humana e na maneira como os homens falam. Deixe-me agora vos ensinar a respeito dos níveis diferentes de significados ligados à interpretação dessa regra de viver, sobre esse conselho de ‘fazer aos outros o que desejais que seja feito a vós’:

147:4:4 16505 “1. No nível da carne. Essa interpretação puramente egoísta e cheia de desejo sensual seria bem exemplificada pela suposição da tua pergunta.

147:4:5 16506 “2. No nível dos sentimentos. Esse plano é um nível mais elevado do que aquele da carne e implica que a compaixão e a piedade elevem a nossa interpretação dessa regra de viver.

147:4:6 16507 “3. No nível da mente. Agora, vêm à ação a razão da mente e a inteligência da experiência. O bom julgamento dita que essa regra para viver deveria ser interpretada em consonância com o idealismo mais elevado, incorporado na nobreza do auto-respeito profundo.

147:4:7 16511 “4. No nível do amor fraterno. Ainda mais elevado descobre-se ser o nível da devoção não egoísta ao bem-estar do nosso semelhante. Nesse plano mais elevado, do serviço social sincero, que nasce da consciência da paternidade de Deus e do reconhecimento conseqüente da irmandade entre os homens, é descoberta uma interpretação nova e muito mais bela dessa regra básica para viver.

147:4:8 16512 “5. No nível moral. E então, quando alcançardes os níveis filosóficos verdadeiros de interpretação, quando tiverdes o verdadeiro discernimento do certo e do errado, quando perceberdes a eterna adequação das relações humanas, começareis a ver tal problema de interpretação como se vos imaginásseis como uma terceira pessoa, de mente elevada, idealista, sábia e imparcial, a ver e interpretar essa injunção, enquanto aplicada aos vossos problemas pessoais de ajustamentos às situações da vossa vida.

147:4:9 16513 “6. No nível espiritual. E então alcançamos finalmente o mais elevado de todos, o nível do discernimento do espírito e das interpretações espirituais que nos impelem a reconhecer, nessa regra de viver, o comando divino para tratar a todos os homens como concebemos que Deus os trataria. Esse é o ideal universal nas relações humanas. E essa é a vossa atitude para com todos esses problemas, quando o vosso desejo supremo chegar a ser sempre o de fazer a vontade do Pai. Eu gostaria, portanto, que fizésseis a todos os homens aquilo que vós sabeis que eu faria a eles, nas mesmas circunstâncias”.

147:4:10 16514 Nada que Jesus dissera aos apóstolos, até este momento, os tinha espantado mais. Eles continuaram a discutir as palavras do Mestre, até muito depois de Jesus ter saído. Embora Natanael tenha sido lento para recuperar-se da sua suposição de que Jesus não tinha compreendido o espírito da sua pergunta, os outros estavam mais do que agradecidos pelo fato de que o filosófico apóstolo, companheiro deles, tinha tido a coragem de fazer uma pergunta tão estimulante para o pensamento.

5. A VISITA A SIMÃO, O FARISEU


147:5:1 16515 Embora Simão não fosse um membro do sinédrio judeu, ele era um fariseu influente em Jerusalém. Era um crente pouco fervoroso e, ainda que pudesse ser criticado severamente por isso, ele ousou convidar Jesus e os seus colaboradores pessoais, Pedro, Tiago e João, para um banquete social na sua casa. Simão vinha já observando o Mestre, há longo tempo, e estava muito bem impressionado com os seus ensinamentos e mais ainda com a sua personalidade.

147:5:2 16516 Os fariseus ricos eram dados a prestar assistência aos mendigos, e não evitavam a publicidade dada à sua filantropia. Algumas vezes faziam até soar as trombetas, quando estavam para conceder alguma caridade a algum mendigo. Era costume desses fariseus, ao oferecerem banquetes para convidados distintos, deixarem abertas as portas da casa, para que até mesmo os mendigos das ruas pudessem entrar e, permanecendo perto das paredes da sala, atrás dos sofás dos que se banqueteavam, ficavam em posição de receber as porções de comida que lhes era lançada pelos convivas.

147:5:3 16517 Nessa ocasião, em particular, na casa de Simão, entre aqueles que vieram das ruas, estava uma mulher de reputação duvidosa, que tinha recentemente tornado-se uma crente das boas-novas do evangelho do Reino. Essa mulher era bem conhecida em toda Jerusalém como sendo a antiga dona de um dos chamados bordéis de altaclasse, localizado bem perto da praça dos gentios no templo. Tinha ela, ao aceitar os ensinamentos de Jesus, fechado o seu nefando local de negócios e havia induzido a maioria das mulheres ligadas a ela a aceitarem o evangelho e a mudarem os seus meios de vida; não obstante isso, os fariseus ainda mantinham por ela um grande desdém, e ela era obrigada a usar os seus cabelos soltos para baixo – o que era um estigma da prostituição. Essa mulher, de nome não revelado, tinha trazido consigo um grande frasco de ungüento perfumado e, permanecendo por trás de Jesus, enquanto assentado ele tomava a refeição, começou a ungir os seus pés, ao mesmo tempo em que também umedecia os pés dele com as suas lágrimas de gratidão, enxugando-os com o próprio cabelo. E quando acabou essa unção, ela continuou chorando e beijando os seus pés.

147:5:4 16521 Quando Simão viu tudo isso, ele disse para si próprio: “Se esse homem fosse um profeta, teria percebido que espécie de mulher é essa, que toca nele assim; e que é uma pecadora notória”. E Jesus, sabendo o que se passava na mente de Simão, manifestou-se, dizendo: “Simão, tenho algo que gostaria de dizer a ti”. Simão respondeu: “Mestre, diga, pois, o que é”. Jesus então disse: “Um certo homem rico, que emprestava dinheiro, tinha dois devedores. Um devia-lhe quinhentos denários e o outro cinqüenta. Ora, nenhum dos dois possuía com que pagar e ele perdoou-os a ambos. Qual dos dois supões, Simão, que o amará mais?” Simão respondeu: “Suponho que seja aquele a quem ele perdoou a maior quantia”. E Jesus disse: “Tu julgaste certo” e, apontando para a mulher, ele continuou: “Simão, dá uma boa olhada nessa mulher. Eu entrei na tua casa como um convidado, mas tu não me deste nenhuma água para os meus pés. Essa mulher agradecida lavou os meus pés com lágrimas e enxugou-os com os próprios cabelos. Tu não me deste nenhum beijo de acolhimento amistoso, mas essa mulher, desde que veio até aqui, não cessou de beijar os meus pés. Tu não ungiste a minha cabeça, mas ela ungiu os meus pés com loções preciosas. E qual o significado de tudo isso? Simplesmente que os seus muitos pecados lhe foram perdoados, e isso levou-a amar muito. Mas aqueles que não receberam senão um pouco de perdão, algumas vezes não amam senão só um pouco”. E voltando-se para a mulher, tomou-a pela mão e, levantando-a, disse: “Tu de fato te arrependeste dos teus pecados, e eles te foram perdoados. Não fiques desencorajada com a atitude impensada e pouco gentil dos teus semelhantes, vai, no júbilo e na liberdade do Reino do céu”.

147:5:5 16522 Quando Simão e os seus amigos, que se assentaram à mesa para banquetear-se, ouviram essas palavras, ficaram ainda mais atônitos e começaram a sussurrar entre si: “Quem é esse homem, que chega mesmo a ousar perdoar pecados?” Quando os ouviu murmurando assim, Jesus voltou-se para despedir-se da mulher, dizendo: “Mulher, vai em paz; a tua fé te salvou”.

147:5:6 16523 Ao levantar-se, com os seus amigos, a fim de saírem, Jesus voltou-se para Simão e disse: “Conheço o teu coração, Simão, sei o quanto estás dilacerado entre a fé e as dúvidas, o quanto estás tomado pelo medo e perturbado pelo orgulho; mas eu oro para que possas alcançar a luz e para que apenas experimentes transformações de mente e de espírito, durante o teu período de vida, tão grandiosas que possam ser comparáveis às tremendas mudanças que o evangelho do Reino já fez no coração dos teus convidados intrusos e que não foram bem-vindos. E eu declaro a todos vós que o Pai abriu as portas do Reino celeste para que entrem todos os que têm fé, e nenhum homem, ou grupo de homens, pode fechar essas portas nem mesmo para a alma mais humilde, nem para aquele que for supostamente o mais flagrante pecador na Terra, se tal pecador buscar entrar com sinceridade”. E Jesus, com Pedro, Tiago e João deixaram o seu anfitrião e foram juntar-se ao restante dos apóstolos, no acampamento, no jardim do Getsêmane.

147:5:7 16531 Naquela mesma noite Jesus fez, aos apóstolos, o discurso, que ficaria por tanto tempo na memória de todos, a respeito do valor relativo do estado do homem perante Deus e do progresso na sua ascensão eterna ao Paraíso. Jesus disse: “Meus filhos, se existe uma conexão viva e verdadeira entre o filho e o Pai, o filho pode ficar seguro de progredir continuamente na direção dos ideais do Pai. Bem verdade é que o filho pode ser inicialmente lento no seu progresso, mas, nem por isso o progresso deixa de ser seguro. A coisa importante não é a rapidez do vosso progresso, mas, antes, a sua segurança. A vossa realização factual não é tão importante quanto o fato de que a direção do vosso progresso é no sentido de Deus. Aquilo em que vos estais transformando, dia após dia, é de uma importância infinitamente maior do que o que sois hoje.

147:5:8 16532 “Essa mulher transformada, a quem alguns de vós hoje vistes na casa de Simão encontra-se, neste momento, vivendo em um nível muito abaixo daquele de Simão e seus companheiros bem-intencionados; mas, enquanto esses fariseus ocupam-se com um progresso falso, na ilusão de atravessar ciclos enganosos de serviços cerimoniais sem significado, essa mulher começou, infalivelmente, na busca longa e cheia de acontecimentos por Deus, e o seu caminho na direção do céu não está bloqueado pelo orgulho espiritual e pela auto-satisfação moral. Humanamente falando, essa mulher está muito mais distante de Deus do que Simão, mas a sua alma encontra-se em um movimento progressivo; ela está no caminho da meta eterna. Nessa mulher estão presentes imensas possibilidades espirituais para o futuro. Alguns de vós podeis não estar em níveis factuais elevados de alma e de espírito, mas estais fazendo progressos diários, no caminho vivo, aberto para cima, por intermédio da fé, até Deus. Há possibilidades imensas em cada um de vós, para o futuro. É, de longe, melhor ter uma fé pequena, mas viva e em crescimento, do que estar possuído por um grande intelecto, com os seus estoques mortos de sabedoria temporal e de incredulidade espiritual. ”

147:5:9 16533 Jesus, contudo, advertiu sinceramente os seus apóstolos contra a tolice do filho de Deus que passa a vangloriar-se do amor do Pai. Ele declarou que o Pai celeste não é um Pai lasso, frouxo ou tolo, na indulgência, que está sempre pronto a perdoar os pecados e relevar as negligências. Ele preveniu aos seus ouvintes para não aplicarem de modo errado os seus exemplos sobre o pai e o filho, a ponto de fazer parecer que Deus é como alguns pais ultra-indulgentes e pouco sábios, que conspiram, com os tolos da Terra, para aceitar a ruína moral dos seus filhos imprudentes e que, com isso, contribuem, com certeza e diretamente, para a delinqüência e a desmoralização prematura da sua própria progênie. Jesus disse: “O meu Pai não fecha os seus olhos, com indulgência, para os atos dos seus filhos e para as suas práticas autodestrutivas e suicidas contra o crescimento moral e o progresso espiritual. Essas práticas pecaminosas são uma abominação aos olhos de Deus”.

147:5:10 16534 Jesus compareceu a muitos outros encontros semiprivados, com os poderosos e com os humildes, os ricos e os pobres de Jerusalém, antes que ele e os seus apóstolos finalmente partissem para Cafarnaum. E muitos, de fato, tornaram-se crentes no evangelho do Reino e foram posteriormente batizados por Abner e pelos seus condiscípulos, que permaneceram em Jerusalém e nas suas vizinhanças, com o intuito de despertar o interesse para o Reino.

6. RETORNANDO A CAFARNAUM


147:6:1 16535 Na última semana de abril, Jesus e os doze partiram do seu centro na Betânia, perto de Jerusalém, e começaram a sua viagem de volta para Cafarnaum, pelo caminho de Jericó e do Jordão.

147:6:2 16541 Os sacerdotes principais e os líderes religiosos dos judeus tiveram muitos encontros secretos com o propósito de decidir o que fazer com Jesus. Eles concordavam que alguma coisa deveria ser feita, para colocar um ponto final nos seus ensinamentos, mas não conseguiam chegar ao consenso quanto ao método. Eles haviam esperado que as autoridades civis dessem a ele um destino, da mesmo forma que Herodes tinha dado um fim em João, mas descobriram que Jesus estava conduzindo a sua obra de um modo que os oficiais romanos não ficassem muito alarmados com as suas pregações. Dessa maneira, em um encontro que aconteceu no dia antes da partida de Jesus para Cafarnaum, ficou decidido que ele teria de ser apreendido sob uma acusação religiosa e ser julgado pelo sinédrio. Por essa razão, uma comissão de seis espiões secretos ficou encarregada de seguir Jesus e observar as suas palavras e os seus atos; e, quando tivesse reunido evidências suficientes de atos contra a lei e de blasfêmias, devia retornar a Jerusalém com o seu relatório. Esses seis judeus alcançaram o grupo apostólico, em número aproximado de trinta pessoas, em Jericó; e, com o pretexto de desejarem tornar-se discípulos, vincularam-se à família de seguidores de Jesus, permanecendo com o grupo até a época do início da segunda viagem de pregação na Galiléia; depois do que, três deles retornaram a Jerusalém para submeterem o seu relatório ao dirigente dos sacerdotes e ao sinédrio.

147:6:3 16542 Pedro pregou à multidão reunida na travessia do Jordão e, na manhã seguinte, eles seguiram rio acima, até Amatos. Eles queriam prosseguir direto até Cafarnaum, mas uma tal multidão ajuntou-se que eles permaneceram lá por três dias, pregando, ensinando e batizando. Eles não se deslocaram na direção de casa antes de sábado cedo, o primeiro dia de maio. Os espiões de Jerusalém estavam certos de assegurarem, então, a sua primeira acusação contra Jesus – a de não guardar o sábado –, pois eles presumiram ter ele começado a sua viagem no dia de sábado. Mas eles estavam fadados ao desapontamento porque, pouco antes da sua partida, Jesus chamou André à sua presença e, diante deles todos, instruiu André a continuar até uma distância de apenas mil metros, a caminhada máxima que seria legal segundo a lei judaica para uma viagem no dia de sábado.

147:6:4 16543 Mas os espiões não tiveram que esperar muito por uma oportunidade para acusar Jesus e os seus seguidores de não guardarem o sábado. Quando o grupo passava por uma estrada estreita na qual, em ambos os lados, ao alcance das mãos, o trigo tremulava maduro e, alguns dos apóstolos, estando famintos, arrancaram o grão maduro e comeram. Era costumeiro entre os viajantes servir-se do grão ao passar pela estrada; e, portanto, nenhum pensamento de estar fazendo algo errado ligava-se à tal conduta. Contudo, os espiões apegaram-se a isso como um pretexto para injuriar Jesus. Quando viram André esfregando nas mãos os grãos, foram até ele e disseram: “Não sabes que é ilegal colher e triturar o grão no dia de sábado?” E André respondeu: “Mas estamos famintos e trituramos apenas o suficiente para as nossas necessidades; e desde quando se tornou um pecado comer grão no dia de sábado?” E os fariseus responderam: “Nada de mal, em comer, mas tu estás contra a lei quando arrancas e trituras o grão entre as mãos; o teu Mestre certamente não aprovaria tais atos”. E então André disse: “Mas se não é errado comer o grão, certo é que o esfregar, entre as nossas mãos, dificilmente é mais trabalho do que mastigar o grão, que é permitido. Qual motivo que vos leva a preocupar com tais minúcias de pouca importância?” Quando André sugeriu que estavam apegando-se a ninharias, eles ficaram indignados e, correndo até onde Jesus caminhava, falando com Mateus, eles protestaram: “Olhai, Instrutor, os teus apóstolos fazem o que está fora da lei, no dia de sábado; eles arrancam, amassam e comem o grão. Estamos seguros de que tu irás mandar que eles parem”. E então Jesus disse aos acusadores: “Vós sois de fato zelosos com a lei, e fazeis bem em lembrar que deveis manter o dia de sábado santificado. Todavia, nunca lestes nas escrituras que, num dia em que Davi estava faminto, ele e aqueles que o acompanhavam entraram na casa de Deus e comeram o pão das oferendas, das quais não seria legal que ninguém comesse, a não ser os sacerdotes? E Davi também deu desse pão àqueles que estavam com ele. E não lestes na vossa lei, que temos o direito de fazer muitas coisas que são imprescindíveis, no dia de sábado? E não vos verei, antes do dia terminar, comendo aquilo que trouxestes para as necessidades desse dia? Meus bons homens, fazeis bem em serdes zelosos com o dia de sábado, mas faríeis melhor se guardásseis a saúde e o bem-estar dos vossos semelhantes. Eu declaro que o sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado. E, se estais presentes aqui conosco, para guardar as minhas palavras, então eu proclamarei abertamente que o Filho do Homem é senhor até mesmo do sábado”.

147:6:5 16551 Os fariseus ficaram atônitos e confundidos com aquelas palavras de discernimento e de sabedoria. Pelo restante do dia, eles mantiveram-se sós e não ousaram fazer mais perguntas.

147:6:6 16552 O antagonismo que Jesus tinha para com as tradições e os cerimoniais judaicos escravizadores era sempre positivo. Consistia no que ele fazia e no que ele afirmava. O Mestre gastou pouco do seu tempo em denúncias negativas. Ele ensinou que aqueles que conhecem a Deus podem gozar da liberdade de viver sem enganarem-se a si próprios sobre as licenças do pecado. Disse Jesus aos seus apóstolos: “Homens, se fordes esclarecidos pela verdade e se realmente souberdes o que estais fazendo, sereis abençoados; mas se não conheceis o caminho divino, vós sereis infelizes e violadores da lei”.

7. DE VOLTA A CAFARNAUM


147:7:1 16553 Quando Jesus e os doze chegaram em Betsaida, de barco, passando por Tariquéia, era já meio-dia da segunda-feira, 3 de maio. Atravessaram de barco para desviar daqueles que iam atrás deles. No dia seguinte, todavia, os outros, incluindo os espiões oficiais de Jerusalém, tinham encontrado Jesus de novo.

147:7:2 16554 Na terça-feira à noite, Jesus estava dando uma das suas palestras costumeiras, feitas de perguntas e respostas, quando o líder dos seis espiões disse a ele: “Hoje eu estava conversando com um dos discípulos de João, que se encontra aqui ouvindo ao teu ensinamento, e nós não conseguimos compreender por que tu nunca mandas aos teus discípulos que jejuem e orem como nós fariseus jejuamos e como João proclamava aos seus seguidores que fizessem”. E Jesus, referindo-se ao que tinha sido afirmado por João, respondeu ao seu interlocutor: “Acaso os acompanhantes nupciais do noivo jejuam, quando o noivo está com eles? Enquanto o noivo permanece com eles, mal eles podem jejuar. Mas é chegado o tempo em que o noivo deve afastar-se, e durante esses tempos os acompanhantes do noivo à câmara nupcial sem dúvida jejuarão e orarão. Orar é natural para os filhos da luz, mas jejuar não é uma parte do evangelho do Reino do céu. Lembrai-vos de que um alfaiate sábio não costura um pedaço de tecido novo e passado, em uma roupa velha, para que, quando for molhado, esse tecido não encolha nem cause um rasgo pior. E os homens também não colocam o vinho novo em odres velhos, para que o vinho novo não rompa a pele do odre, fazendo com que tanto o vinho quanto o odre se estraguem. O homem sábio põe o vinho novo em odres de peles novas. E, portanto, os meus discípulos demonstram sabedoria de não trazerem muito da velha ordem para o ensinamento novo, do evangelho do Reino. Para vós, que perdestes o vosso instrutor, pode justificar-se que jejuem por um determinado tempo. O jejum pode ser uma parte apropriada da Lei de Moisés, mas no Reino vindouro os filhos de Deus terão a experiência de serem livres do medo e de rejubilarem-se no espírito divino”.

147:7:3 16561 Ao ouvirem essas palavras os discípulos de João ficaram confortados, ao passo que os próprios fariseus tornaram-se ainda mais confusos. Então o Mestre continuou advertindo os seus discípulos para que não nutrissem a noção de que todos os velhos ensinamentos devem ser inteiramente substituídos por novas doutrinas. Disse Jesus: “Aquilo que é velho, mas que é também verdade deve permanecer. Do mesmo modo, aquilo que é novo, mas que é falso, deve ser rejeitado. Contudo, deveis ter a fé e a coragem de aceitar aquilo que é novo e que também é verdadeiro. Lembrai-vos do que está escrito: ‘Não abandoneis um velho amigo, pois o novo não é comparável a ele. Um novo amigo é como um vinho novo; se envelhecer, vós bebereis dele com contentamento’”.

8. A FESTA DA BONDADE ESPIRITUAL


147:8:1 16562 Naquela noite, bem depois que os ouvintes habituais tinham-se retirado, Jesus continuou a ensinar aos seus apóstolos. E começou essa instrução especial citando do profeta Isaías:

147:8:2 16563 “Por que jejuastes? Por que razão então afligis as vossas almas, se continuais a ter prazer na opressão e a deliciar-vos com a injustiça? Vede, vós jejuais para poderdes contestar e discutir e para vos inflamar com os punhos da maldade. Contudo, não deveis jejuar desse modo no intuito de fazer as vossas vozes ouvidas no alto.

147:8:3 16564 “‘É esse o jejum que eu escolhi – um dia para um homem afligir a sua alma? É necessário que ele abaixe a sua cabeça como um touro, que se rebaixe na aniagem e nas cinzas? Ousareis chamar a isso de jejum e de um dia aceitável perante os olhos do Senhor? Não é esse o jejum que eu deveria escolher? O de romper as correntes da maldade, desfazer os nós das cargas pesadas, deixar liberto o oprimido e arrebentar com todo o jugo? Não é para eu partilhar o meu pão com os famintos e levar à minha casa aqueles que são pobres, e que não têm teto? E, quando eu vir aqueles que estão despidos, eu colocarei roupa neles.

147:8:4 16565 “‘Então a vossa luz irromperá, como a manhã, e a vossa saúde aflorará rapidamente. A vossa retidão chegará antes de vós, enquanto a glória do Senhor manterá a vossa retaguarda. Então apelareis ao Senhor e Ele responderá; gritareis, e Ele dirá: Aqui estou Eu. E tudo isso ele fará se vos abstiverdes da opressão, da condenação e da vaidade. O Pai deseja, mais, que sejais pródigos de coração para com os famintos, e que ministreis às almas afligidas; então a vossa luz brilhará na escuridão, e as vossas trevas serão mesmo como a luz do meio-dia. Então o Senhor guiar-vos-á continuamente, satisfazendo a vossa alma e renovando a vossa força. Vos transformareis em um jardim bem irrigado, como uma fonte cujas águas não faltam. E, aqueles que fazem essas coisas, restaurarão as glórias enfraquecidas; eles erigirão as fundações para muitas gerações; serão chamados os reconstrutores das paredes derrubadas, os restauradores dos caminhos seguros nos quais residir’”.

147:8:5 16566 E então, até tarde da noite, Jesus expôs aos seus apóstolos a verdade de que a própria fé que mantinham era o que os deixava seguros quanto ao reino do presente e o Reino do futuro, e não a sua aflição de alma, nem o jejum para o corpo. Ele exortou os apóstolos a viver ao menos à altura das idéias do antigo profeta e expressou a esperança de que eles iriam progredir muito, à frente até mesmo dos ideais de Isaías e dos profetas mais antigos. As últimas palavras dele, naquela noite, foram: “Crescei em graça, por meio da fé viva que leva à compreensão do fato de que sois filhos de Deus e que, ao mesmo tempo, vos faz reconhecer em cada homem um irmão”.

147:8:6 16567 Quando Jesus terminou de falar já eram mais de duas horas da manhã e todos se recolheram para dormir.

DOCUMENTO 148

PREPARANDO OS EVANGELISTAS EM BETSAIDA
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Desde o dia 3 de maio até o dia 3 de outubro do ano 28 d. C. , Jesus e o grupo apostólico estiveram na residência de Zebedeu em Betsaida. Durante esse período de cinco meses na estação da seca, um acampamento enorme foi mantido à beira-mar, perto da residência de Zebedeu, que tinha sido bastante ampliada para acomodar a sempre crescente família de Jesus. Esse acampamento à beira-mar, ocupado por uma população de buscadores da verdade, de candidatos à cura e de curiosos fervorosos, que se alternavam sempre, abrigava de quinhentas a mil e quinhentas pessoas. Essa cidade de tendas ficava sob a supervisão geral de Davi Zebedeu, ajudado pelos gêmeos Alfeus. O acampamento era um modelo de higiene e de ordem e administração geral. Doentes de tipos variados ficavam separados e sob a supervisão de um crente médico, um homem sírio chamado Elman.

148:0:2 16572 Durante esse período, os apóstolos iam pescar pelo menos uma vez por semana, vendendo a Davi o que pegavam, para o consumo do acampamento à beira-mar. Os fundos recebidos iam para as economias do grupo. Aos doze era permitido passar uma semana por mês com as suas famílias ou amigos.

148:0:3 16573 Enquanto André continuava como encarregado geral das atividades apostólicas, Pedro ficava encarregado inteiramente da escola dos evangelistas. Todos os apóstolos tinham a sua parte no ensino de grupos de evangelistas, todas as manhãs, e tanto os instrutores quanto os alunos ensinavam ao povo durante as tardes. Depois da refeição da noite, cinco noites por semana, os apóstolos dirigiam horas de perguntas e respostas para aprimorar os evangelistas. Uma vez por semana Jesus presidia essa hora de perguntas, respondendo às questões não respondidas nas sessões anteriores.

148:0:4 16574 Durante cinco meses, vários milhares vieram a esse acampamento e partiram. Pessoas interessadas, de todas as partes do império romano e das terras no leste do Eufrates, eram a audiência freqüente. Esse foi o período estabelecido e bem organizado mais longo de ensinamento do Mestre. A família pessoal de Jesus passou a maior parte desse período em Nazaré ou em Caná.

148:0:5 16575 O acampamento não era dirigido como uma comunidade de interesses comuns, como o era a família apostólica. Davi Zebedeu administrava essa grande cidade feita de tendas, de um modo que ela se tornou uma empresa auto-sustentada, mas nem por isso ninguém jamais foi rejeitado lá. Esse acampamento, cujos residentes estavam sempre mudando, era um aspecto indispensável da escola de aperfeiçoamento evangélico de Pedro.

1. UMA NOVA ESCOLA DE PROFETAS


148:1:1 16576 Pedro, Tiago e André formavam o comitê designado por Jesus para admitir os candidatos à escola dos evangelistas. Todas as raças e nacionalidades do mundo romano, do leste e do oeste, até de um lugar tão distante quanto a Índia, estavam representadas entre os estudantes nessa nova escola de profetas. Era uma escola dirigida à atividade de aprender e de fazer. O que os estudantes aprendiam durante a manhã, eles ensinavam aos que se reuniam à tarde, à beira-mar. Depois do almoço eles discutiam informalmente tanto o aprendizado da parte da manhã quanto o que haviam ensinado à tarde.

148:1:2 16581 Cada um dos professores apostólicos ensinava segundo a própria visão do evangelho do Reino. Nenhum esforço era feito para ensinarem de um modo uniforme; não havia uma formulação padronizada, nem dogmatizada das doutrinas teológicas. Embora todos eles ensinassem a mesma verdade, cada apóstolo apresentava a sua própria interpretação pessoal do ensinamento do Mestre. E Jesus aprovava tais apresentações diversas, de experiências pessoais com as coisas do Reino, e infalivelmente harmonizava e coordenava essas visões múltiplas e divergentes do evangelho, durante as horas semanais nas quais dava as respostas. Não obstante esse alto grau de liberdade pessoal em relação às questões a serem ensinadas, Simão Pedro tinha a tendência de dominar a teologia da escola dos evangelistas. Depois de Pedro, Tiago Zebedeu exercia a maior influência pessoal.

148:1:3 16582 Os mais de cem evangelistas treinados durante esses cinco meses à beira-mar representavam o corpo do qual (exceto Abner e os apóstolos de João) foram retirados os futuros setenta educadores e pregadores do evangelho. A escola de evangelistas não teve tudo em comum e no mesmo grau que os doze tiveram.

148:1:4 16583 Esses evangelistas, embora ensinassem e pregassem o evangelho, não batizavam os crentes antes que fossem designados e ordenados por Jesus como os setenta mensageiros do Reino. Apenas sete, do grande número daqueles que haviam sido curados ao entardecer naquele local, encontravam-se entre esses estudantes evangélicos. O filho do nobre de Cafarnaum era um dos treinados para o serviço do evangelho na escola de Pedro.

2. O HOSPITAL DE BETSAIDA


148:2:1 16584 Ligado ao acampamento à beira-mar e com a assistência de um corpo de vinte e cinco jovens mulheres e de vinte homens, Elman, o médico sírio, organizou e conduziu durante quatro meses o que deveria ser considerado como o primeiro hospital do Reino. Nessa enfermaria localizada a uma curta distância ao sul da principal cidade das tendas, eles tratavam os doentes de acordo com os métodos materiais conhecidos e também segundo as práticas espirituais de encorajamento pela oração e pela fé. Jesus visitava os doentes desse acampamento nada menos do que três vezes por semana e fazia contato pessoal com cada um dos sofredores. Até onde sabemos, nenhum chamado milagre de cura supranatural ocorreu entre as mil pessoas afligidas e doentes que saíram melhores ou curadas dessa enfermaria. Contudo, a grande maioria desses indivíduos beneficiados não parou de proclamar que Jesus os tinha curado.

148:2:2 16585 Muitas das curas efetuadas por Jesus, ligadas com a sua ministração aos pacientes de Elman, de fato, assemelhavam-se a milagres, mas foi-nos indicado que se tratava apenas de transformações da mente e do espírito, tais como as que podem ocorrer na experiência de pessoas em expectativa, e dominadas pela fé, quando estão sob a influência imediata e inspiradora de uma personalidade forte, positiva e benéfica, cuja ministração expulsa o medo e põe fim à ansiedade.

148:2:3 16586 Elman e os seus companheiros esforçaram-se para ensinar a esses doentes a verdade sobre a “possessão pelos maus espíritos”, mas tiveram pouco êxito. A crença de que a doença física e o desarranjo mental poderiam ser causados pela presença de espíritos chamados impuros, na mente ou no corpo da pessoa afligida, era quase universal.

148:2:4 16591 Em todo esse contato com os doentes e afligidos, quando se tratava da técnica de tratamento ou da revelação de causas desconhecidas para a doença, Jesus não desconsiderava as instruções de Emanuel, o seu irmão do Paraíso, dadas antes de ter embarcado na aventura da encarnação de Urântia. Não obstante isso, aqueles que ministravam aos doentes aprenderam muitas lições úteis, observando o modo pelo qual Jesus inspirava fé e confiança nos doentes e nos sofredores.

148:2:5 16592 O acampamento dispersou-se pouco antes que se aproximasse a estação na qual ocorre o aumento dos resfriados e das febres.

3. THE FATHER'S BUSINESS




148:3:1 16593 Durante esse período, Jesus conduziu por menos do que doze vezes os serviços públicos no acampamento e falou apenas uma vez na sinagoga de Cafarnaum, no segundo sábado antes da partida deles junto com os evangelistas recém-treinados para a segunda viagem de pregação pública na Galiléia.

148:3:2 16594 Desde o seu batismo, o Mestre não passara tanto tempo na solidão quanto neste período do acampamento de aperfeiçoamento dos evangelistas, em Betsaida. Quando um dos apóstolos aventurava-se a perguntar a Jesus por que ele havia-se afastado deles por tanto tempo, ele responderia invariavelmente que estava “cuidando dos negócios do Pai”.

148:3:3 16595 Durante esses períodos de ausência, Jesus estivera acompanhado apenas por dois dos apóstolos. Ele tinha liberado Pedro, Tiago e João temporariamente do compromisso de acompanhantes pessoais para que eles pudessem participar também do trabalho de aperfeiçoamento dos novos candidatos evangelistas, cujo número era de mais de cem. Quando o Mestre desejava ir para as colinas cuidar dos assuntos do Pai, ele chamava para acompanhá-lo qualquer um dos apóstolos que estivesse livre. Desse modo todos os doze desfrutavam de uma oportunidade de ligação reservada e de contato estreito com Jesus.

148:3:4 16596 Não foi revelado, para os propósitos deste registro, mas nós fomos levados a inferir que, durante muitas dessas permanências solitárias nas colinas, o Mestre esteve em contato direto e em associação, para fins organizadores, junto aos seus principais diretores de assuntos do universo. Desde o tempo do seu batismo, aproximadamente, que o Soberano encarnado do nosso universo tornava-se cada vez mais ativo e consciente na direção de certas fases da administração do universo. E nós temos sempre sustentado a opinião de que, de algum modo não revelado aos seus colaboradores imediatos, durante essas semanas de menor participação nos assuntos da Terra, ele estava empenhado na direção daquelas altas inteligências espirituais, encarregadas de dirigir um vasto universo. E o Jesus humano escolheu então denominar essas suas atividades como sendo “os assuntos do meu Pai”.

148:3:5 16597 Muitas vezes, quando Jesus estava sozinho durante horas, e acontecia de dois dos seus apóstolos encontrarem-se por perto, eles observavam as suas feições passarem por alterações rápidas e numerosas, embora eles não o escutassem dizendo nenhuma palavra. E também eles não observavam nenhuma manifestação visível de seres celestes que poderiam ter estado em comunicação com o seu Mestre, como aquelas que alguns deles testemunharam em uma ocasião posterior.

4. MAL, PECADO E INIQÜIDADE


148:4:1 16598 Era hábito de Jesus manter uma conversa especial, por duas noites a cada semana, com indivíduos que desejavam falar com ele, em um certo canto isolado e abrigado do jardim de Zebedeu. Numa dessas conversas noturnas em particular, Tomé fez ao Mestre esta pergunta: “Por que é necessário para os homens nascerem do espírito para entrarem no Reino? O renascimento é necessário para escapar do controle do maligno? Mestre, o que é o mal?” Quando ouviu essas perguntas, Jesus disse a Tomé:

148:4:2 16601 “Não cometas o erro de confundir o mal com o maligno, a quem, mais corretamente, chamaremos de iníquo. Aquele a quem tu chamas de maligno é filho do amor-próprio, é o alto administrador que deliberadamente entrou em rebelião consciente contra o governo do meu Pai e dos seus Filhos leais. Mas eu já triunfei sobre esses rebeldes pecadores. Que fiquem claras na tua mente essas atitudes diferentes para com o Pai e o seu universo. Nunca te esqueças dessas leis de relação com a vontade do Pai:

148:4:3 16602 “O mal é a transgressão inconsciente ou não intencional da lei divina, a vontade do Pai. O mal é, do mesmo modo, a medida da imperfeição da obediência à vontade do Pai.

148:4:4 16603 “O pecado é a transgressão consciente, consabida e deliberada da lei divina, a vontade do Pai. O pecado é a medida da falta de vontade de ser-se conduzido divinamente e dirigido espiritualmente.

148:4:5 16604 “A iniqüidade é a transgressão voluntária, determinada e persistente da lei divina, a vontade do Pai. A iniqüidade é a medida da rejeição continuada do plano de amor do Pai para a sobrevivência da personalidade e da ministração misericordiosa de salvação do Filho.

148:4:6 16605 “Por natureza, antes do renascimento do espírito, o homem mortal fica sujeito a tendências inerentes para o mal, mas tais imperfeições naturais de comportamento não são pecado, nem iniqüidade. O homem mortal está apenas começando a sua longa ascensão até a perfeição do Pai no Paraíso. Ser imperfeito ou parcial, por dom natural, não é pecaminoso. O homem está de fato sujeito ao mal, mas ele não é, em nenhum sentido, o filho do maligno, a menos que ele tenha consciente e deliberadamente escolhido os caminhos do pecado e da vida da iniqüidade. O mal é inerente à ordem natural deste mundo, mas o pecado é uma atitude de rebelião consciente que foi trazida a este mundo por aqueles que caíram da luz espiritual entrando em trevas espessas.

148:4:7 16606 “Tu estás confuso, Tomé, por causa das doutrinas dos gregos e pelos erros dos persas. Tu não compreendes as relações entre o mal e o pecado porque tu visualizas a humanidade como tendo começado na Terra, com um Adão perfeito que se degenerou rapidamente, por meio do pecado, até o estado deplorável atual do homem. Mas por que tu te recusas a compreender o significado do registro que revela como Caim, o filho de Adão, foi para a terra de Nod e lá tomou uma mulher como esposa? E por que te recusas a interpretar o significado do registro que retrata os filhos de Deus encontrando esposas para si próprios entre as filhas dos homens?

148:4:8 16607 “Os homens são, de fato, maus por natureza, mas não são necessariamente pecadores. O novo nascimento – o batismo do espírito – é essencial para a libertação do mal e é necessário para a entrada no Reino do céu, mas nada disso trai o fato de o homem ser filho de Deus. E essa inerente presença, em potencial, do mal, não significa que o homem esteja, de um modo misterioso, apartado do Pai que está no céu, de uma maneira tal que deva, como se fora um estranho, um forasteiro, ou um filho adotado, de algum modo, buscar a adoção legal do Pai. Todas essas noções nascem, em primeiro lugar, do teu entendimento errado do Pai e, em segundo lugar, da tua ignorância da origem, da natureza e do destino do homem.

148:4:9 16608 “Os gregos e outros povos ensinaram a ti que o homem descende da melhor perfeição, tendo caído diretamente no olvido ou destruição; eu vim para mostrar-te que, com a entrada no Reino, o homem está ascendendo certa e seguramente até Deus e a perfeição divina. Qualquer ser que, de alguma maneira, não alcança os ideais divinos e espirituais da vontade do Pai eterno é potencialmente mau, mas tais seres não são, em nenhum sentido, pecadores, e menos ainda iníquos.

148:4:10 16611 “Tomé, tu já não leste sobre isso nas escrituras, onde está escrito: ‘Vós sois filhos do Senhor o vosso Deus’. ‘Eu serei o seu Pai e ele será o meu filho’. ‘Eu escolhi a ele para ser o meu filho – eu serei o seu Pai’. ‘Trazei os meus filhos e as minhas filhas de longe, dos confins da Terra; e até mesmo a todos os que são chamados pelo meu nome, pois eu os criei para a minha glória’. ‘Vós sois os filhos do Deus vivo’. ‘Aqueles que têm o espírito de Deus de fato são os filhos de Deus’. Conquanto haja uma parte material do pai humano no filho natural, há uma parte espiritual do Pai celeste em todos os filhos, pela fé, do Reino”.

148:4:11 16612 Tudo isso e muito mais Jesus disse a Tomé, e os apóstolos compreenderam grande parte de tudo; no entanto Jesus lhe advertiu para “não falar aos outros desses assuntos antes que eu tenha retornado para o Pai”. E Tomé só mencionou essa entrevista depois que o Mestre tinha partido deste mundo.

5. O PROPÓSITO DA AFLIÇÃO


148:5:1 16613 Numa outra dessas entrevistas particulares no jardim, Natanael perguntou a Jesus: “Mestre, embora eu esteja começando a entender por que tu te recusas a praticar indiscriminadamente a cura, eu ainda não consigo compreender por que o Pai celeste, cheio de amor, permite que tantos dos seus filhos na Terra sofram de tantas aflições”. O Mestre respondeu a Natanael, dizendo:

148:5:2 16614 “Natanael, tu e muitos outros estão perplexos assim porque tu não compreendes como a ordem natural deste mundo tem sido, por tantas vezes, desorganizada pelas aventuras pecaminosas de alguns traidores rebeldes para com a vontade do Pai. E eu vim para começar a colocar essas coisas em ordem. Mas muitas idades serão necessárias para reorientar e devolver esta parte do universo ao caminho anterior e, assim, libertar os filhos dos homens das cargas adicionais vindas do pecado e da rebelião. A presença do mal por si só é um teste suficiente para a ascensão do homem – o pecado não é essencial à sobrevivência.

148:5:3 16615 “No entanto, meu filho, tu deverias saber que o Pai não aflige aos seus filhos propositalmente. O homem traz aflições desnecessárias a si próprio, em resultado da sua recusa persistente de conduzir-se dentro dos melhores caminhos da vontade divina. A aflição existe potencialmente no mal, mas grande parte dela foi produzida pelo pecado e pela iniqüidade. Muitos eventos incomuns tiveram lugar neste mundo; não é estranho que todos os homens que pensam fiquem perplexos com as cenas de sofrimento e de aflição que testemunham. Mas de uma coisa tu podes estar certo: O Pai não envia a aflição como uma punição arbitrária para o erro. As imperfeições e as limitações do mal são inerentes a este; as punições para o mal são inevitáveis; as conseqüências destrutivas da iniqüidade são inexoráveis. O homem não deveria culpar a Deus por essas aflições, que são o resultado natural da vida que ele escolhe viver; nem deveria o homem reclamar das experiências que são parte da vida como é vivida neste mundo. A vontade do Pai é que o homem mortal devesse trabalhar com persistência, e coerentemente, no sentido da melhora do seu estado na Terra. O empenho inteligente capacitaria o homem a superar grande parte da sua miséria terrena.

148:5:4 16621 “Natanael, é parte da nossa missão ajudar os homens a resolverem os seus problemas espirituais e, desse modo, vivificar as suas mentes de um modo tal que eles possam estar mais bem preparados e inspirados para resolver os seus múltiplos problemas materiais. Eu sei da tua confusão quando leste as escrituras. Muito freqüentemente tem prevalecido a tendência de atribuir a Deus a responsabilidade por tudo o que a ignorância do homem não o deixa compreender. O Pai não é pessoalmente responsável por tudo aquilo que não podes compreender. Não duvides do amor do Pai apenas por acontecer que te aflija alguma lei justa e sábia, ordenada por Ele, talvez por teres tu, inocente ou deliberadamente, transgredido a essa ordem divina.

148:5:5 16622 “No entanto, Natanael, há muitas coisas nas escrituras que te teriam servido de instrução se as tivesses lido com discernimento. Não te lembras de que está escrito: ‘Meu filho, não desprezes o castigo do Senhor; nem te aborreças com a correção Dele, pois o Senhor corrige àquele a quem ama, do mesmo modo que o pai corrige o filho em quem ele se compraz’. ‘O Senhor não aflige voluntariamente’. ‘Antes de me afligir, eu me desviei, mas agora eu observo a lei. A aflição me foi benéfica, para que eu pudesse aprender os estatutos divinos’. ‘Conheço os vossos sofrimentos. O Deus eterno é o vosso refúgio, enquanto debaixo estão os seus braços eternos’. ‘O Senhor é também um refúgio para os oprimidos, um ancoradouro de descanso nos tempos de complicações’. ‘O Senhor fortalecerá aquele que cai no leito da aflição; o Senhor não esquecerá os doentes’. ‘Como um pai demonstra compaixão pelos seus filhos, também o Senhor é compassivo com aqueles que O temem. Ele conhece o vosso corpo; Ele lembra-Se de que sois pó’. ‘Ele cura os corações partidos e fecha as suas feridas’. ‘Ele é a esperança do pobre, a força do necessitado, na sua angústia, um Refúgio na tempestade, e uma Sombra em um calor devastador’. ‘Ele dá poder aos fracos, para aqueles que não têm nenhum poder, Ele aumenta as forças’. ‘Ele não quebrará uma cana já lascada, e a fibra em chama ele não apagará’. ‘Quando tu passas pelas águas da aflição, Eu estarei contigo e, quando os rios da adversidade te submergirem, Eu não te abandonarei’. ‘Ele enviou-me para fechar as feridas no teu coração alquebrado, para proclamar a liberdade aos cativos, e para confortar a todos os que pranteiam’. ‘A correção acompanha o sofrimento; a aflição não brota do pó’ ”.

6. O MAL-ENTENDIDO DO SOFRIMENTO – O DISCURSO SOBRE JÓ


148:6:1 16623 Foi nessa mesma noite em Betsaida que João também perguntou a Jesus porque tantas pessoas aparentemente inocentes sofriam de tantas doenças e passavam por tantas aflições. Ao responder às perguntas de João, entre muitas outras coisas, o Mestre disse:

148:6:2 16624 “Meu filho, tu não compreendes o significado da adversidade nem a missão do sofrimento. Tu não leste aquela obra-prima da literatura semita – a história das aflições de Jó nas escrituras? Tu não te lembras que essa parábola maravilhosa começa com o recital da prosperidade material do servo do Senhor? Tu te lembras bem de que Jó era abençoado com filhos, saúde, dignidade, posição, riqueza e tudo o mais que os homens valorizam nesta vida temporal. De acordo com os ensinamentos, há tanto tempo respeitados, dos filhos de Abraão, a prosperidade material era uma evidência, suficiente por si mesma, do favorecimento divino. No entanto as posses materiais e a prosperidade temporal não indicam o favorecimento de Deus. Meu Pai no céu ama os pobres tanto quanto os ricos; Ele não tem preferências por ninguém.

148:6:3 16631 “Embora a transgressão da lei divina seja, mais cedo ou mais tarde, seguida da colheita da punição e, conquanto os homens certamente colham o que semeiam, tu ainda devias saber que o sofrimento humano nem sempre é uma punição por um pecado anterior. Tanto Jó, quanto os seus amigos, não conseguiram encontrar a verdadeira resposta para o motivo das suas perplexidades. E, com a luz de que agora tu desfrutas, dificilmente tu poderias atribuir, seja a Satã, seja a Deus, os papéis que eles têm nessa parábola singular. Embora Jó não tenha encontrado, por meio do sofrimento, a solução dos seus problemas intelectuais, nem a resolução para as suas dificuldades filosóficas, ele conseguiu grandes vitórias; e, mesmo diante do desmoronamento das suas defesas teológicas, ele ascendeu até aquelas alturas espirituais, de onde ele podia dizer sinceramente: ‘eu abomino a mim próprio’; então foi concedida a ele a salvação de ter uma visão de Deus. E assim, por meio de um sofrimento incompreendido, Jó ascendeu a um plano supra-humano de compreensão moral e de discernimento espiritual interno. Quando o servidor que sofre consegue ter uma visão de Deus, segue-se uma paz de alma que ultrapassa toda a compreensão humana.

148:6:4 16632 “O primeiro dos amigos de Jó, Elifas, exortou-o, como sofredor, a demonstrar, durante suas aflições, a mesma fortaleza que ele havia indicado aos outros durante os dias da sua prosperidade. Esse falso confortador disse: ‘Confie na tua religião, Jó; lembra-te de que é o perverso e não o justo que sofre. Tu deves merecer este castigo, ou então não estarias afligido. Tu bem sabes que nenhum homem pode ser reto aos olhos de Deus. Tu sabes que o perverso nunca realmente prospera. De qualquer modo, o homem parece estar predestinado a ter problemas e talvez o Senhor esteja apenas castigando-te para o teu próprio bem’. Não é de espantar que o pobre Jó não tivesse conseguido nenhum conforto com essa interpretação do problema do sofrimento humano.

148:6:5 16633 “Mas o conselho do seu segundo amigo, Bildad, foi ainda mais deprimente, não obstante a sua integridade, do ponto de vista da então aceita teologia. Disse Bildad: ‘Deus não pode ser injusto. Os teus filhos devem ter sido pecadores já que faleceram; tu deves estar cometendo algum erro, pois de outro modo não estarias tão afligido. E, se tu és realmente reto, Deus certamente irá libertar-te das tuas aflições. Deverias aprender, da história das relações de Deus com o homem, que o Todo-Poderoso apenas destrói os malvados’.

148:6:6 16634 “E então, tu te lembras como Jó respondeu aos seus amigos, dizendo: ‘Eu bem sei que Deus não me ouve clamar por ajuda. Como pode Deus ser justo e, ao mesmo tempo, desconsiderar completamente a minha inocência? Estou aprendendo que não posso ter nenhuma satisfação apelando para o Todo-Poderoso. Acaso não podeis discernir que Deus tolera a perseguição dos bons pelos malvados? E, já que o homem é tão fraco, com que possibilidade ele conta para ter consideração nas mãos de um Deus onipotente? Deus me fez como eu sou e, quando Ele volta-se assim contra mim, eu fico indefeso. E por que Deus criou-me só para sofrer desse jeito miserável?’

148:6:7 16635 “E quem pode objetar-se à atitude de Jó, em face do conselho dos seus amigos e das idéias errôneas sobre Deus, que ocuparam sua própria mente? Não vês que Jó aspirava por um Deus humano, que ele tinha fome de comungar com um Ser divino que conhece o estado mortal do homem e entende que o justo deve sempre sofrer na inocência, como uma parte dessa primeira vida da longa ascensão ao Paraíso? E a razão que fez o Filho do Homem vir do Pai, para viver esta vida na carne, é para que ele se torne capaz de confortar e de socorrer a todos aqueles que devem, doravante, ser chamados para suportar as aflições de Jó.

148:6:8 16636 “O terceiro amigo de Jó, Zofar, então pronunciou palavras ainda menos confortantes quando disse: ‘É tolice tua pretender que estás na retidão, sendo que estás aflito assim. Mas eu admito que é impossível compreender os caminhos de Deus. Talvez haja algum propósito oculto em todas as tuas misérias’. E depois de ter escutado a todos os seus três amigos, Jó apelou diretamente a Deus pedindo ajuda, pleiteando o fato de que ‘o homem, nascido de mulher, é pobre de dias e rico de complicações’.

148:6:9 16641 “E então começou a segunda sessão com os seus amigos. Elifas tornou-se mais austero, acusador e sarcástico. Bildad ficou indignado com o desprezo de Jó pelos seus amigos. Zofar reiterou o seu conselho melancólico. Jó a essa altura tinha ficado enojado com os seus amigos e apelou de novo para Deus, e agora ele suplicava a um Deus justo, em oposição ao Deus da injustiça, incorporado na filosofia dos seus amigos e mantido mesmo, em um relicário, pela sua própria atitude religiosa. Em seguida Jó buscou refúgio na consolação de uma vida futura, na qual as injustiças da existência mortal pudessem ser compensadas com mais equanimidade. O fracasso de receber a ajuda do homem leva Jó a Deus. E então acontece, no seu coração, a grande batalha entre a fé e a dúvida. Finalmente, o sofredor humano começa a ver a luz da vida; a sua alma torturada ascende a novos níveis de esperança e de coragem; ele pode continuar sofrendo e mesmo morrer, mas a sua alma esclarecida profere agora aquele grito de triunfo: ‘O meu Reivindicador vive!’

148:6:10 16642 “Jó estava totalmente certo quando colocou em dúvida a doutrina de que Deus aflige os filhos no fito de punir os pais. Jó esteve sempre pronto a admitir que Deus é reto e justo, mas Jó almejava uma revelação do caráter pessoal do Eterno, que satisfizesse a alma. E essa é a nossa missão na Terra. Não mais será negado, aos mortais sofredores, o conforto de conhecerem o amor de Deus e de compreenderem a misericórdia do Pai que está no céu. Conquanto o discurso de Deus, falando de dentro de uma tempestade, tivesse sido um conceito majestoso, para a época em que foi proferido, vós já aprendestes que o Pai não Se revela desse modo. Ele fala, sim, dentro do coração humano e com uma voz calma e suave, que diz: ‘Este é o caminho; caminhe por ele’. E tu não compreendes que Deus reside dentro de ti, que Ele transformou-Se no que tu és, para que Ele possa fazer de ti o que Ele é”.

148:6:11 16643 Então Jesus fez a sua afirmação final: “O Pai no céu não aflige os filhos dos homens por seu próprio desejo. O homem sofre, em primeiro lugar, por causa dos acidentes do tempo e imperfeições do mal de uma existência física imatura. Em seguida, ele sofre as conseqüências inexoráveis do pecado – a transgressão das leis da vida e da luz. E finalmente o homem faz a colheita da sua própria e iníqua persistência na rebelião contra o governo justo do céu sobre a Terra. Mas as misérias do homem não são uma visitação pessoal de julgamento divino. O homem pode fazer, e irá fazer, muito, para minimizar os seus sofrimentos temporais. Mas, de uma vez por todas, sede libertados da superstição de que Deus aflige o homem a comando daquele que é o maligno. Estudai o Livro de Jó, para simplesmente descobrirdes quantas idéias errôneas de Deus podem nutrir até mesmo os homens bons e sinceros. E, então, observai como, até mesmo aquele Jó, dolorosamente afligido, encontrou o Deus confortador e salvador, a despeito dos ensinamentos errôneos. Afinal a sua fé perfurou as nuvens do sofrimento e discerniu a luz da vida sendo vertida do Pai, como misericórdia de cura e equanimidade eterna”.

148:6:12 16644 João ponderou sobre essas palavras no seu coração, durante muitos dias. Toda a sua vida, depois disso, foi modificada de um modo marcante mediante essa conversa com o Mestre no jardim e, posteriormente, ele fez muito para levar os outros apóstolos a mudarem os seus pontos de vista a respeito da fonte, da natureza e do propósito das aflições humanas comuns. Mas João nunca falou dessa conversa, até que o Mestre tivesse partido.

7. O HOMEM DA MÃO DEFORMADA


148:7:1 16645 No segundo sábado, antes da partida dos apóstolos e do novo corpo de evangelistas para a sua segunda viagem de pregações na Galiléia, Jesus falou na sinagoga de Cafarnaum sobre as “Alegrias de uma vida de retidão”. Quando Jesus terminou o seu discurso, um grupo grande de mutilados, coxos, doentes e afligidos amontoou-se em volta dele, em busca de cura. Nesse grupo também estavam os apóstolos, muitos dos novos evangelistas, e os espiões fariseus de Jerusalém. Para todos os lados que Jesus ia (exceto quando ele estava nas colinas, cuidando dos assuntos do Pai), por certo os seis espiões de Jerusalém o seguiriam.

148:7:2 16651 O líder dos espiões fariseus, enquanto Jesus estava falando ao povo, induziu um homem com uma mão murcha a aproximar-se dele e a perguntar-lhe se estaria dentro da lei ele ser curado no dia de sábado ou se deveria ele buscar ajuda em um outro dia. Quando Jesus viu o homem, e ouviu as suas palavras, ele percebeu que tinha sido enviado pelos fariseus, e disse: “Avança um pouco enquanto eu te faço uma pergunta. Se tu tivesses uma ovelha e se ela caísse em um fosso, no dia de sábado, tu estenderias a mão até ela, pegá-la-ia e a traria para fora? É da lei fazer tais coisas no dia de sábado?” E o homem respondeu: “Sim, Mestre, seria da lei fazer tal bem no dia de sábado”. Então Jesus falou, dirigindo-se a todos eles: “Eu sei o motivo pelo qual vós enviastes este homem à minha presença. Vós gostaríeis de ter uma causa para inculpar-me, se pudésseis tentar-me a demonstrar misericórdia no dia de sábado. Pelo silêncio, vós todos concordastes que é da lei tirar a infeliz ovelha para fora do fosso, mesmo no sábado, e eu vos chamo a testemunhar que é legal exibir amor e bondade no dia de sábado, não apenas aos animais, mas também aos homens. Quanto mais valioso é um homem do que uma ovelha! Eu proclamo que é legítimo fazer o bem aos homens, no dia de sábado”. E como eles permaneciam diante dele em silêncio, Jesus, dirigindo-se ao homem com a mão inválida, disse: “Fica aqui ao meu lado para que todos possam ver-te. E agora para que todos vós possais ficar sabendo que é da vontade do meu Pai que vós façais o bem no dia de sábado, se tu tiveres a fé para seres curado, eu convoco-te a esticar a tua mão”.

148:7:3 16652 E quando esse homem esticou a sua mão atrofiada, ela tornou-se sã. O povo tinha decidido voltar-se contra os fariseus, mas Jesus ordenou a eles que ficassem calmos, dizendo: “Eu vos disse apenas que é lícito fazer o bem no dia de sábado, salvar a vida, mas eu não vos instruí a fazer o mal, nem a dar vazão ao desejo de matar”. Os fariseus enfurecidos foram-se dali e, não obstante aquele fosse um dia de sábado, eles apressaram-se a ir até Tiberíades e aconselharam-se com Herodes, fazendo tudo o que estava ao alcance deles para despertar a prevenção dele, com o fito de assegurar os herodianos como aliados contra Jesus. Mas Herodes recusou-se a tomar medidas contra Jesus, aconselhando-os a levar as suas queixas a Jerusalém.

148:7:4 16653 Esse é o primeiro caso de um milagre realizado por Jesus, como resposta ao desafio dos seus inimigos. E o Mestre realizou esse chamado milagre, não como uma demonstração do seu poder de curar, mas como um protesto efetivo contra transformar o descanso religioso do sábado em uma verdadeira escravidão a restrições sem sentido para toda a humanidade. Esse homem retornou para o seu trabalho de pedreiro, dando provas de ser um daqueles cuja cura foi seguida de uma vida de agradecimento e de retidão.

8. A ÚLTIMA SEMANA EM BETSAIDA


148:8:1 16654 Na sua última semana de permanência em Betsaida, os espiões de Jerusalém estavam divididos quanto à sua atitude para com Jesus e os seus ensinamentos. Três desses fariseus estavam tremendamente bem impressionados com o que eles tinham visto e ouvido. Nesse meio tempo, em Jerusalém, Abraão, um membro jovem e influente do sinédrio, esposou publicamente os ensinamentos de Jesus e foi batizado por Abner na piscina de Siloé. Toda Jerusalém ficou interessada por esse acontecimento, e mensageiros foram enviados imediatamente para Betsaida chamando de volta os seis espiões fariseus.

148:8:2 16661 O filósofo grego que tinha sido conquistado para o Reino, na viagem anterior pela Galiléia, retornou com uns certos judeus abastados de Alexandria, e uma vez mais eles convidaram Jesus para ir à cidade deles com o propósito de implantar uma escola de estudos conjuntos de filosofia e de religião, bem como uma enfermaria para os doentes. Mas Jesus declinou o convite de um modo cortês.

148:8:3 16662 Por volta dessa época, chegou ao acampamento de Betsaida um profeta, em estado de transe, vindo de Bagdá, um certo Kirmet. Esse suposto profeta tinha visões estranhas quando ficava em transe e sonhava coisas fantásticas quando o seu sono era incomodado. Ele gerou uma perturbação considerável no acampamento, e Simão zelote era mais a favor de negociar do que de tratar rudemente o simulador, que se auto-enganava, mas Jesus interveio e permitiu a ele toda a liberdade de ação durante alguns dias. Todos aqueles que ouviram a sua pregação logo reconheceram que o seu ensinamento não era sadio, se visto segundo o evangelho do Reino. Em breve ele retornou para Bagdá, levando consigo apenas meia dúzia de almas instáveis e erráticas. Mas antes de Jesus ter intercedido pelo profeta de Bagdá, Davi Zebedeu, com a assistência de um comitê autoconvocado, tinha levado Kirmet até o lago e, depois de mergulhá-lo repetidamente na água, havia aconselhado a ele partir logo dali – para organizar e construir o seu próprio acampamento.

148:8:4 16663 Nesse mesmo dia, Bete-Marion, uma mulher fenícia, tornou-se tão fanática que ficou fora de si; depois de quase se afogar, tentando andar sobre as águas, foi mandada embora pelos seus amigos.

148:8:5 16664 O novo convertido de Jerusalém, Abraão, o fariseu, deu todos os seus bens terrenos para os fundos apostólicos, e essa contribuição colaborou muito para possibilitar o envio imediato dos cem evangelistas recém-treinados. André tinha já anunciado o final do acampamento, e todos já estavam preparados para retornar à casa ou seguir os evangelistas até a Galiléia.

9. HEALING THE PARALYTIC




148:9:1 16665 Na sexta-feira à tarde, 1o de outubro, quando Jesus participava do seu último encontro com os apóstolos, evangelistas e outros líderes do acampamento, que estava sendo desmontado, e os seis fariseus de Jerusalém assentados na primeira fila nessa reunião na espaçosa e ampliada sala da frente da casa de Zebedeu, aconteceu um dos episódios mais estranhos e únicos de toda a vida terrena de Jesus. O Mestre estava, nesse momento, falando, na sala grande que tinha sido construída para acomodar essas reuniões durante a estação das chuvas. A casa estava inteiramente cercada de uma grande multidão que forçava os seus próprios ouvidos para captar alguma parte das palavras de Jesus.

148:9:2 16666 Enquanto a casa estava, assim, sendo atropelada de gente e totalmente cercada por ouvintes ávidos, um homem, há muito afligido pela paralisia, veio, de Cafarnaum, em uma cadeirinha carregada pelos seus amigos. Esse paralítico soubera que Jesus estava para sair de Betsaida e, como conversara com Aaron, o pedreiro, que há pouco tempo tinha sido curado, ele pediu que o carregassem até a presença de Jesus para buscar a cura. Os seus amigos tentaram entrar na casa de Zebedeu, não só pela porta da frente, mas também pela dos fundos, mas havia muita gente acotovelando-se ali. No entanto o paralítico recusou-se a aceitar esse malogro; pediu então aos seus amigos que buscassem escadas, e por elas subiram ao telhado da sala onde Jesus estava falando. E assim, depois de retirar as telhas, ousadamente eles abaixaram o homem doente no seu assento, suspenso por cordas, até que o homem afligido estivesse no chão, exatamente na frente do Mestre. Quando Jesus viu o que eles haviam feito, parou de falar, enquanto aqueles que estavam com ele na sala ficaram maravilhados com a perseverança do doente e dos seus amigos. E o paralítico disse: “Mestre, não gostaria de interromper o seu ensinamento, mas estou determinado a ser curado. Não sou como aqueles que receberam a cura e esqueceram-se imediatamente dos seus ensinamentos. Gostaria de ser curado para que possa servir ao Reino do céu”. Ora, não obstante a aflição desse homem ter sido causada pela sua vida desregrada, Jesus, vendo a sua fé, disse ao paralítico: “Filho, não temas; os teus pecados estão perdoados. A tua fé salvar-te-á”.

148:9:3 16671 Quando os fariseus de Jerusalém, junto com outros escribas e advogados, que estavam assentados com eles, ouviram esse pronunciamento de Jesus, começaram a dizer a si próprios: “Como este homem ousa falar assim? Será que ele não entende que tais palavras são uma blasfêmia? Quem pode perdoar o pecado senão Deus?” Jesus percebeu, no seu espírito, que eles pensavam assim nas suas próprias mentes e uns com os outros, então dirigiu-se a eles, dizendo: “Por que pensam assim nos vossos corações? Quem sois vós para julgar-me? Qual a diferença entre eu dizer a este paralítico, os teus pecados estão perdoados, ou levanta, pegue do seu leito e ande? Mas para que vós, que testemunhastes tudo isso, possais finalmente saber que o Filho do Homem tem autoridade e poder na Terra para perdoar os pecados, eu direi a este homem afligido: Levanta, toma o teu assento e vá para a tua própria casa”. E, depois de Jesus ter falado assim, o paralítico levantou-se e, à medida que lhe davam passagem, ele caminhava para fora diante de todos. E aqueles que viram essas coisas ficaram assombrados. Pedro dispersou a assembléia, enquanto muitos oravam e glorificavam a Deus, confessando que nunca antes tinham visto acontecimentos tão estranhos.

148:9:4 16672 E foi nesse momento que chegaram os mensageiros do sinédrio no intuito de chamar os seis espiões para voltar a Jerusalém. Quando ouviram essa mensagem, eles entraram em um debate sério; e, depois de terem terminado as discussões, o líder e dois dos seus colaboradores retornaram com os mensageiros para Jerusalém; enquanto três dos fariseus espiões confessaram a sua fé em Jesus e, indo imediatamente ao lago, foram batizados por Pedro e recebidos na comunidade pelos apóstolos como filhos do Reino.

DOCUMENTO 149

A SEGUNDA CAMPANHA DE PREGAÇÃO
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A segunda viagem de pregação pública pela Galiléia começou no domingo, 3 de outubro, do ano 28 d. C. , e continuou por quase três meses, terminando no dia 30 de dezembro. Participando desse esforço estavam Jesus e os doze apóstolos, assistidos pelo corpo de cento e dezessete evangelistas recém-recrutados, e por numerosas outras pessoas interessadas. Nessa viagem, eles visitaram Gadara, Ptolemais, Jafia, Dabarita, Megido, Jezrel, Citópolis, Tariquéia, Hipos, Gamala, Betsaida-Júlias e muitas outras cidades e aldeias.

149:0:2 16682 Nesse domingo pela manhã, antes da partida, André e Pedro pediram a Jesus para dar as atribuições definitivas aos novos evangelistas, mas o Mestre rejeitou fazer isso dizendo que não era atribuição sua fazer as coisas que outros podiam executar aceitavelmente. Depois da devida deliberação ficou decidido que Tiago Zebedeu deveria administrar essas atribuições. Quando Tiago terminou as suas observações, Jesus disse aos evangelistas: “Ide fazer o trabalho segundo lhes foi atribuído e, mais tarde, quando tiverdes mostrado que sois competentes e fiéis, eu vos darei a ordenação para pregardes o evangelho do Reino”.

149:0:3 16683 Nessa viagem, apenas Tiago e João foram junto com Jesus. Pedro e cada um dos outros apóstolos levaram consigo doze evangelistas e mantiveram um contato íntimo com eles, enquanto faziam o seu trabalho de pregação e de ensinamento. Tão logo os crentes ficavam prontos para entrar no Reino, os apóstolos ministravam-lhes o batismo. Jesus e os seus dois companheiros viajaram bastante durante esses três meses, visitando freqüentemente duas cidades em um dia para observar o trabalho dos evangelistas e para estimulá-los nos seus esforços de estabelecimento do Reino. Toda essa segunda viagem de pregação foi principalmente um esforço para que esse corpo, de cento e dezessete evangelistas recém-preparados, pudesse adquirir experiência prática.

149:0:4 16684 Durante esse período e, posteriormente, até o momento da partida final de Jesus e dos doze, para Jerusalém, Davi Zebedeu manteve, na casa do seu pai, em Betsaida, um centro permanente de apoio ao trabalho do Reino. Foi lá a sede central da obra de Jesus na Terra e o centro do revezamento para o serviço de mensageiros, que Davi operava, composto daqueles que faziam o trabalho em várias partes da Palestina e regiões adjacentes. Ele fez tudo isso por iniciativa própria, mas com a aprovação de André. Davi usava entre quarenta e cinqüenta mensageiros nesse serviço de informação da obra do Reino, que rapidamente se expandia. Empregando bem o seu tempo, ele ganhava a vida parcialmente, passando uma parte do tempo no antigo trabalho de pesca.

1. O RENOME DE JESUS


149:1:1 16685 Na época em que havia sido desarmado o acampamento de Betsaida, o renome de Jesus, especialmente como curador, encontrava-se difundido em todas as partes da Palestina e por toda a Síria e países vizinhos. Durante semanas, depois de haver saído de Betsaida, os doentes continuaram a chegar e, quando não encontravam o Mestre, ao saberem por meio de Davi onde ele estava, iam atrás dele. Nessa viagem, Jesus deliberadamente não fez nenhum chamado milagre de cura. Contudo, às dezenas, os afligidos encontraram a restauração da sua saúde e da felicidade, mediante o poder reconstrutivo da fé intensa que os impelia a buscar a cura.

149:1:2 16691 Começou a surgir, por volta da época dessa missão – continuando durante o restante da vida de Jesus na Terra –, uma série especial e inexplicada de fenômenos de cura. No decorrer dessa viagem de três meses, mais de cem homens, mulheres e crianças da Judéia, Iduméia, Galiléia, Síria, Tiro e Sidom, e vindos até de além do Jordão, foram beneficiários dessa cura inconsciente de Jesus e, ao retornarem para as suas casas, aumentaram a fama de Jesus. E faziam isso não obstante a recomendação, feita diretamente por Jesus ao beneficiário, de “não contar a ninguém”, sempre que ele observava um desses casos de cura espontânea.

149:1:3 16692 Nunca nos foi revelado o que exatamente ocorreu nesses casos de cura espontânea e inconsciente. O Mestre nunca explicou aos seus apóstolos como foram efetuadas essas curas, a não ser dizendo meramente em várias ocasiões: “eu percebo que uma força saiu de mim”. Numa ocasião ele observou, quando tocado por uma criança que se curava: “Percebo que um pouco de vida exalou de mim”.

149:1:4 16693 Na ausência da palavra direta do Mestre, sobre a natureza desses casos de cura espontânea, seria presunçoso da nossa parte tentar explicar como foram realizadas, mas nos será permitido registrar a nossa opinião sobre tais fenômenos de cura. Acreditamos que muitos desses milagres aparentes de cura, acontecidos ao longo da ministração terrena de Jesus, resultaram da coexistência das três seguintes influências, poderosas e potentes, em conjunto:

149:1:5 16694 1. A presença de uma forte fé, dominante e viva, no coração do ser humano que buscava persistentemente a cura, junto com o fato de que essa cura estava sendo desejada pelos seus benefícios espirituais, mais do que pela pura restauração física.

149:1:6 16695 2. A existência, concomitante com essa fé humana, da grande simpatia e da grande compaixão do Filho Criador de Deus, encarnado e dominado por uma misericórdia que na verdade tinha, na sua pessoa, poderes e prerrogativas criativos de cura, quase ilimitados e fora do tempo.

149:1:7 16696 3. Junto com a fé da criatura e a vida do Criador, deveria ser também notado, que esse Deus-homem era a expressão personificada da vontade do Pai. Quando, durante o contato entre a necessidade humana e o poder divino que vai ao encontro dessa necessidade, se a vontade do Pai não tiver sido diferente, os dois tornam-se um, e a cura ocorre inconscientemente para o Jesus de natureza humana, mas que é imediatamente reconhecida pela sua natureza divina. A explicação, então, para muitos desses casos de cura deve ser encontrada em uma grande lei há muito conhecida nossa; a saber: Aquilo que o Filho Criador deseja e que é da vontade do Pai eterno, É.

149:1:8 16697 A nossa opinião, pois, é que, na presença pessoal de Jesus, algumas formas de profunda fé humana compelem, literal e verdadeiramente, a manifestação da cura, em certas forças e personalidades criativas do universo, as quais estavam, na época, muito intimamente associadas ao Filho do Homem. Torna-se, portanto, um fato notório que Jesus proporcionava, freqüentemente, aos homens curarem a si próprios na presença dele, por meio da poderosa fé pessoal.

149:1:9 16701 Muitos outros buscaram a cura com propósitos puramente egoístas. Uma viúva rica de Tiro, com a sua comitiva, chegou buscando ser curada das suas enfermidades, que eram muitas; e, enquanto seguia Jesus por toda a Galiléia, ela ia oferecendo mais e mais dinheiro, como se o poder de Deus fosse alguma coisa a ser comprada pela oferta mais elevada. Mas nunca tornou-se interessada no evangelho do Reino; apenas buscava a cura dos seus males físicos.

2. ATITUDE DO POVO


149:2:1 16702 Jesus compreendia as mentes dos homens. Ele sabia o que estava no coração do homem e, caso os seus ensinamentos tivesem sido mantidos como ele os apresentou, tendo como único comentário a interpretação inspirada oferecida pela sua vida terrena, todas as nações e religiões do mundo teriam mais do que depressa abraçado o evangelho do Reino. Os esforços bem intencionados dos primeiros seguidores de Jesus, de restabelecer os seus ensinamentos, de modo a torná-los mais aceitáveis para certas nações, raças e religiões, apenas resultou em tornar tais ensinamentos menos aceitáveis para todas as outras nações, raças e religiões.

149:2:2 16703 Num esforço para fazer com que os ensinamentos de Jesus fossem notados, mais favoravelmente, por certos grupos da sua época, o apóstolo Paulo escreveu muitas cartas de instrução e de admoestação. Outros instrutores do evangelho de Jesus fizeram também assim, mas nenhum deles imaginou que alguns desses escritos fossem ser reunidos, subseqüentemente, por aqueles que iriam apresentá-los como incorporados aos ensinamentos de Jesus. E assim, ao mesmo tempo em que o chamado cristianismo contém mais do evangelho do Mestre do que qualquer outra religião, ele também contém muita coisa que Jesus não ensinou. À parte a incorporação de diversos ensinamentos vindos dos mistérios persas e de muitos vindos da filosofia grega, ao cristianismo primitivo, dois grandes erros foram cometidos:

149:2:3 16704 1. O esforço para ligar o evangelho diretamente à teologia judaica, como ilustrado pelas doutrinas cristãs da expiação – o ensinamento de que Jesus foi o Filho cujo sacrifício satisfaria a justiça severa do Pai e apaziguaria a ira divina. Esses ensinamentos originaram-se em um esforço louvável de tornar o evangelho do Reino mais aceitável aos judeus descrentes. Embora esses esforços tenham falhado em conquistar os judeus, eles não fracassaram em confundir e alienar muitas almas honestas das gerações futuras.

149:2:4 16705 2. A segunda grande asneira dos primeiros seguidores do Mestre, e que todas as gerações posteriores persistiram em perpetuar, foi organizar os ensinamentos cristãos tão completamente sobre a pessoa de Jesus. Essa ênfase exagerada da personalidade de Jesus, na teologia do cristianismo, colaborou para obscurecer os seus ensinamentos, e tudo isso tornou cada vez mais difícil para os judeus, os maometanos, os hindus e outros religiosos orientais aceitarem os ensinamentos de Jesus. Não é da nossa intenção diminuir o lugar da pessoa de Jesus, em uma religião que poderia levar o seu nome, mas não gostaríamos de possibilitar que essa consideração eclipsasse a sua vida inspirada nem que suplantasse a sua mensagem salvadora: A paternidade de Deus e a fraternidade entre os homens.

149:2:5 16706 Os instrutores da religião de Jesus deveriam tentar uma aproximação com outras religiões, mais por meio de um reconhecimento das verdades comuns (muitas das quais vieram direta ou indiretamente da mensagem de Jesus) e abstendo-se de colocar tanta ênfase nas diferenças.

149:2:6 16711 Conquanto, naquela época em especial, a fama de Jesus tivesse repousado principalmente na sua reputação de curador, isso não quer dizer que devesse continuar assim. Com o passar do tempo, mais e mais ele era procurado para prestar ajuda espiritual. Mas foram as curas físicas que exerceram o apelo mais direto e imediato para a gente comum. Jesus ia sendo cada vez mais procurado pelas vítimas da escravização moral e de problemas mentais e, invariavelmente, ele ensinava-lhes o caminho da libertação. Os pais buscavam o seu conselho sobre como administrar a educação dos filhos, e as mães buscavam ajuda na condução das filhas. Aqueles que estavam na escuridão vinham a ele, e ele revelava-lhes a luz da vida. O seu ouvido estava sempre aberto para o sofrimento da humanidade, e ele sempre ajudou aqueles que buscaram a sua ministração.

149:2:7 16712 Quando o próprio Criador estava na Terra, encarnado à semelhança da carne mortal, era inevitável que algumas coisas extraordinárias acontecessem. No entanto, vós nunca deveis abordar Jesus através dessas ocorrências, chamadas milagrosas. Aprendei a abordar e a entender o milagre através de Jesus, mas não cometais o erro de tentar compreender Jesus através do milagre. E essa advertência é legítima, não obstante Jesus de Nazaré ser o único fundador, de uma religião, a realizar atos supramateriais na Terra.

149:2:8 16713 O aspecto mais surpreendente e mais revolucionário da missão de Michael na Terra foi a sua atitude para com as mulheres. Numa época e em uma geração em que um homem não devia cumprimentar, nem mesmo a sua própria esposa em um lugar público, Jesus ousou levar mulheres como instrutoras do evangelho, na sua terceira viagem de ensinamentos na Galiléia. E ele teve a coragem consumada de fazer isso, a despeito do ensinamento dos rabinos que dizia: “Melhor que as palavras da lei sejam queimadas, do que entregues a mulheres”.

149:2:9 16714 Numa geração apenas, Jesus retirou as mulheres do esquecimento desrespeitoso e liberou-as da lida escravizadora dos tempos. E, uma coisa vergonhosa na religião, que presumiu levar o nome de Jesus, é que a ela faltou a coragem moral para seguir esse nobre exemplo, posteriormente, nas suas atitudes para com a mulher.

149:2:10 16715 Como Jesus misturava-se ao povo, eles o achavam inteiramente livre das superstições daquela época. Ele era livre de preconceitos religiosos e nunca mostrava-se intolerante. Nada tinha no seu coração que se pudesse assemelhar ao antagonismo social. Conquanto ele se pusesse de acordo com o que era bom na religião dos seus pais, ele não hesitou em desconsiderar as tradições, criadas pelos homens, da superstição e da servidão. Ele ousou ensinar que as catástrofes da natureza, os acidentes do tempo e outros acontecimentos calamitosos não são visitações do julgamento divino, nem dispensações misteriosas da Providência. Ele denunciou a devoção escravizadora a cerimoniais sem significado e denunciou a falácia do culto materialista. Ele proclamou arrojadamente a liberdade espiritual do homem e ousou ensinar que os mortais da carne são factual e verdadeiramente filhos do Deus vivo.

149:2:11 16716 Jesus transcendeu todos os ensinamentos dos seus antepassados quando, corajosamente, substituiu a exigência de lavar as mãos, concebendo como marca da verdadeira religião a limpeza do coração. Ele colocou a realidade no lugar da tradição e varreu todas as pretensões de vaidade e hipocrisia. E, ainda, este destemido homem de Deus não deu abertura para a crítica destrutiva, nem manifestou desconsideração para com os usos religiosos, sociais, econômicos e políticos da sua época. Ele não foi um militante revolucionário; foi um evolucionista progressivo. Ele só se lançava à destruição daquilo que já é quando simultaneamente ele oferecia aos seus semelhantes a coisa superior que deve ser.

149:2:12 16721 Jesus conseguia a obediência dos seus seguidores sem exigi-la. Apenas três dos homens que receberam o seu chamamento pessoal recusaram a aceitar o convite para o discipulado. Ele exercia uma força de atração especial sobre os homens, mas não era ditatorial. Merecia a confiança, e nenhum homem jamais se ressentiu de receber um comando seu. Assumia a autoridade absoluta sobre os seus discípulos, e ninguém jamais opôs objeção a isso. Permitia que os seus seguidores o chamassem de Mestre.

149:2:13 16722 O Mestre era admirado por todos que o conheciam, exceto por aqueles que alimentavam preconceitos religiosos arraigados ou por aqueles que julgavam enxergar perigos políticos nos seus ensinamentos. Os homens ficavam assombrados com a originalidade e a autoridade do seu ensinamento. Eles ficavam maravilhados com a sua paciência ao responder aos retrógrados e inoportunos. Ele inspirava a esperança e a confiança nos corações de todos aqueles que estavam sob a sua ministração. Apenas aqueles que não o conheciam, temiam-no; e era odiado apenas por aqueles que o encaravam como o campeão, o possuidor da verdade que viria a derrotar o mal e o erro, os quais eles tinham escolhido manter nos seus corações, a qualquer custo.

149:2:14 16723 Ele exercia uma influência forte e especialmente fascinante, tanto sobre os amigos como sobre os adversários. Multidões iriam segui-lo durante semanas, apenas para ouvir as suas palavras plenas de graça e para observar a sua vida simples. Homens e mulheres devotados amavam Jesus com um afeto quase supra-humano. E quanto mais eles o conheciam, tanto mais o amavam. E tudo isso é ainda uma verdade pura; mesmo hoje, e em todas as idades futuras; quanto mais o homem conhece esse Deus-homem, mais ele o amará e quererá segui-lo.

3. A HOSTILIDADE DOS LÍDERES RELIGIOSOS


149:3:1 16724 Não obstante a gente comum ter recebido Jesus, e o seu ensinamento, favoravelmente, os líderes religiosos em Jerusalém iam ficando sempre mais alarmados e hostis. Os fariseus tinham uma teologia sistemática e dogmática, já formulada. Jesus era um mestre que ensinou segundo a necessidade da ocasião; ele não era um instrutor sistemático. Jesus ensinou mais da vida do que da lei, por parábolas. (E quando ele empregava uma parábola, para ilustrar a sua mensagem, ele se dispunha a utilizar apenas um aspecto da história, com aquele propósito. Muitas idéias erradas envolvendo os ensinamentos de Jesus podem resultar das tentativas de tecer alegorias com as suas parábolas)

149:3:2 16725 Os líderes religiosos de Jerusalém iam ficando quase desvairados por causa da conversão recente do jovem Abraão e com a deserção dos três espiões que tinham sido batizados por Pedro, e que agora estavam com os evangelistas, nessa segunda viagem de pregações pela Galiléia. Os líderes judeus estavam cada vez mais cegos, pelo medo e pelo preconceito, e os seus corações encontravam-se endurecidos pela sua rejeição continuada das verdades atraentes do evangelho do Reino. Quando os homens se fecham para o apelo feito ao espírito que reside neles, pouco há que se possa fazer para modificar a sua atitude.

149:3:3 16726 Quando Jesus encontrou-se pela primeira vez com os evangelistas, no acampamento de Betsaida, ele disse, ao concluir a sua palestra: “Vós deveis lembrar-vos de que, no corpo e na mente – pela emoção –, os homens reagem individualmente. A única coisa uniforme que eles possuem é o espírito residente. Embora os espíritos divinos possam variar em alguma coisa, pela natureza e extensão da experiência que têm, eles reagem de um modo uniforme a todos os apelos espirituais. Somente por intermédio desse espírito, e por um apelo a ele, é que a humanidade poderá alcançar a unidade e a irmandade”. E muitos dos líderes dos judeus tinham fechado as portas dos seus corações ao apelo espiritual do evangelho. Assim, não cessaram de planejar e de conspirar para a destruição do Mestre. Eles estavam convencidos de que Jesus deveria ser detido, condenado e executado, como um transgressor religioso, um violador dos ensinamentos fundamentais da lei sagrada judaica.

4. O DESENROLAR DA CAMPANHA DE PREGAÇÃO


149:4:1 16731 Jesus fez poucos trabalhos públicos, nessa viagem de pregações, mas dirigiu muitas classes noturnas de instrução, com os crentes, na maior parte das cidades e aldeias onde ele teve a oportunidade de estar acompanhado de Tiago e João. Numa dessas sessões noturnas, um dos evangelistas mais jovens fez a Jesus uma pergunta sobre a ira, e o Mestre, respondendo, disse, entre outras coisas:

149:4:2 16732 “A ira é uma manifestação material que, de um modo geral, representa a medida do fracasso da natureza espiritual de conquistar o controle da natureza intelectual e da natureza física combinadas. A ira indica a vossa falta de amor fraterno tolerante somada à vossa falta de auto-respeito e de autocontrole. A ira exaure a saúde, degrada a mente e limita a atuação do espírito que instrui a alma do homem. Não lestes nas escrituras que ‘a raiva mata o homem tolo’, e que o homem ‘dilacera-se na própria cólera’? Que ‘aquele que tem a raiva lenta é de grande compreensão’, ao passo que ‘aquele que se irrita logo, exalta a loucura’? Vós todos sabeis que ‘uma resposta suave afasta a cólera’, e que ‘palavras pesadas estimulam a raiva’. ‘A prudência protela a cólera’, enquanto ‘aquele que não tem nenhum controle sobre o seu próprio ego é como uma cidade sem defesa e sem muros’. ‘A ira é cruel e a raiva é ultrajante’. ‘Os homens irados põem fogo na discussão, enquanto os furiosos multiplicam as suas transgressões’. ‘Não sejais apressados em espírito, pois a ira repousa no seio dos tolos’ ”. Antes de terminar, Jesus ainda disse: “Deixa o teu coração ser dominado pelo amor, para que o teu espírito-guia tenha pouco trabalho em libertar-te da tendência de dar vazão àquelas explosões de fúria animal, que são incompatíveis com a posição de filiação divina”.

149:4:3 16733 Nessa mesma ocasião, o Mestre falou ao grupo sobre quão desejável é ter um caráter bem equilibrado. Reconheceu que é necessário, para a maioria dos homens, devotarem-se à maestria de alguma vocação, mas ele deplorava toda a tendência à superespecialização, que torna a mente pouco aberta e circunscrita às atividades do ganhar a vida. Chamou a atenção para o fato de que qualquer virtude, se levada aos extremos, pode transformar-se em um vício. Jesus sempre aconselhava a temperança e ensinava uma coerência – o ajustamento equilibrado aos problemas da vida. Destacou que um excesso de compaixão e de piedade pode degenerar-se em uma instabilidade emocional séria; que o entusiasmo pode conduzir ao fanatismo. Discorreu sobre um dos antigos colaboradores deles, a quem a própria imaginação tinha levado a empreendimentos visionários e impraticáveis. Ao mesmo tempo preveniu a todos contra os perigos do embotamento da mediocridade superconservadora.

149:4:4 16734 E então Jesus discursou sobre os perigos da coragem e da fé, e como estas, algumas vezes, levam almas pouco prudentes até a temeridade e à presunção. E também mostrou como a prudência e a discrição, quando levadas até longe demais, chegam até a covardia e ao fracasso. Exortou os seus ouvintes a um esforço pela originalidade, evitando ao mesmo tempo toda a tendência à excentricidade. Ele defendeu a compaixão sem sentimentalismo, a piedade sem santimônia. E ensinou uma reverência liberta de temores e de superstição.

149:4:5 16741 Não era tanto o que Jesus ensinava, sobre o caráter equilibrado, que impressionava àqueles que se ligaram a ele, era mais o fato de a sua própria vida ser um exemplo tão eloqüente do seu ensinamento. Ele viveu em meio a uma tensão extenuante e em meio ao tumulto, mas nunca se deixou inquietar. Os seus inimigos armavam ciladas contínuas para ele, mas nunca se deixou apanhar. Os sábios e os instruídos tentaram fazê-lo tropeçar, mas ele não caiu. Buscaram confundi-lo com o debate; mas as suas respostas eram sempre esclarecedoras, condignas e definitivas. Quando era interrompido, nas suas palestras, com um excesso de perguntas, as suas respostas eram sempre relevantes e conclusivas. Nunca recorreu a táticas ignóbeis, ao enfrentar a pressão contínua dos seus adversários, que não hesitavam em empregar toda a sorte de modos falsos, injustos e iníquos para atacá-lo.

149:4:6 16742 Ainda que seja verdade que muitos homens e mulheres devam aplicar-se assiduamente em alguma busca definida de uma vocação, para o sustento próprio, contudo é inteiramente desejável que os seres humanos devam cultivar uma gama ampla de conhecimentos culturais, sobre a vida como é vivida na Terra. As pessoas verdadeiramente instruídas não se satisfazem, se permanecerem na ignorância sobre as vidas e sobre os feitos dos seus semelhantes.

5. A LIÇÃO SOBRE O CONTENTAMENTO


149:5:1 16743 Certo dia, quando Jesus estava em visita ao grupo de evangelistas, trabalhando sob a supervisão de Simão zelote, durante a conferência da tarde, Simão perguntou ao Mestre: “Por que algumas pessoas estão muito mais contentes e felizes do que as outras? O contentamento é uma questão ligada à experiência religiosa?” Entre outras coisas, em resposta à pergunta dele, Jesus disse:

149:5:2 16744 “Simão, algumas pessoas são naturalmente mais felizes do que as outras. E tudo depende muito, bastante mesmo, da disposição do homem de ser conduzido e dirigido pelo espírito do Pai, que reside no seu interior. Acaso não lestes nas escrituras as palavras do homem sábio, ‘O espírito do homem é a luz de vela do Senhor, perscrutando todas as partes internas’? E, também, que esses mortais guiados pelo espírito dizem: ‘Os desígnios caíram em mim em lugares agradáveis; sim, eu herdei uma boa coisa’. ‘O pouco que um homem reto tenha é melhor do que as riquezas de muitos homens maus’, pois ‘um bom homem tirará a satisfação do seu interior’. ‘Um coração feliz faz uma fisionomia alegre e é uma festa contínua. Melhor é ter só um pouco, com reverência ao Senhor, do que ter um grande tesouro e complicações junto com o mesmo. Mais vale uma refeição de legumes e com amor, do que um boi gordo e com ele o ódio. Melhor é o pouco, com justiça, do que grandes rendimentos, sem retidão’. ‘Um coração contente faz bem, tanto quanto um medicamento’. ‘Melhor é o pouco cheio de serenidade do que a superabundância repleta de tristeza e vexação de espírito’.

149:5:3 16745 “Grande parte da tristeza do homem vem do desapontamento das suas ambições e do seu orgulho ferido. Embora os homens possuam o dever para consigo mesmos, de fazer o melhor das suas vidas na Terra, eles deveriam, assim, tendo-se empenhado sinceramente e com contentamento, aceitar o que lhes cabe e voltar à pureza de tirar o melhor daquilo que lhes caiu nas mãos. São excessivos os problemas dos homens que têm origem no solo do temor natural dentro dos seus próprios corações. ‘O homem mau foge, mesmo quando ninguém o persegue’. ‘O perverso é como o mar revolto: ele não pode descansar, mas as suas águas lançam lama e sujeira; não há paz, declara Deus, para os malvados’.

149:5:4 16746 “Não buscai, então, a paz falsa e a alegria transitória, mas, antes, buscai a certeza da fé e as seguranças da filiação divina, que trazem a serenidade, o contentamento e o júbilo supremo para o espírito. ”

149:5:5 16751 Jesus dificilmente considerava este mundo um “vale de lágrimas”. Ele o via mais como “o vale da edificação das almas”, a esfera do nascimento dos espíritos eternos e imortais de ascensão ao Paraíso.

6. O “TEMOR AO SENHOR”


149:6:1 16752 Foi em Gamala, durante uma palestra noturna, que Filipe disse a Jesus: “Mestre, por que as escrituras nos instruem a ‘temer o Senhor’, enquanto tu gostarias que nós olhássemos para o Pai no céu sem medo? Como harmonizar esses ensinamentos?” E Jesus respondeu a Filipe, dizendo:

149:6:2 16753 “Meus filhos, não me surpreendo de que vós me façais tais perguntas. No começo foi apenas por meio do medo que o homem podia aprender a reverência, mas eu vim para revelar o amor do Pai, de um modo tal que vós possais sentir-vos voltados para a adoração do Eterno, em vista da atração exercida pelo reconhecimento afetuoso de um filho e a reciprocidade do amor profundo e perfeito do Pai. Eu gostaria de libertar-vos da servidão que vos compeliria, por um medo escravizador, ao serviço enfadonho de um Deus-Rei ciumento e irado. E gostaria de instruir-vos, em um relacionamento Pai-filho, entre Deus e o homem, de tal modo que possais ser conduzidos, com júbilo, à adoração livremente sublime e superna de um Deus-Pai de amor, de justiça e de misericórdia.

149:6:3 16754 “O ‘temor ao Senhor’ tem tido diferentes significados nas sucessivas eras, vindo do medo, passando pela angústia e pelo pavor, até a admiração e a reverência. E, atualmente, da reverência eu vos conduziria, por intermédio do reconhecimento, da compreensão e da apreciação grata, ao amor. Quando o homem apenas reconhece as obras de Deus, ele é levado a temer o Supremo; mas, quando o homem começa a compreender e a experienciar a personalidade e o caráter do Deus vivo, ele é induzido a amar cada vez mais este Pai bom e perfeito, universal e eterno. E é exatamente essa mudança, na relação do homem com Deus, que constitui a missão do Filho do Homem na Terra.

149:6:4 16755 “O filho que age com inteligência não tem medo de não receber as boas dádivas da mão desse pai; mas, tendo já recebido a abundância das boas coisas conferidas pelos ditames do afeto do pai pelos seus filhos e filhas, esses filhos muito amados são levados a amar o seu pai, em reconhecimento e em gratidão e para corresponder ao benefício generoso. A bondade de Deus conduz ao arrependimento; a beneficência de Deus conduz ao serviço; a misericórdia de Deus conduz à salvação; enquanto o amor de Deus conduz à adoração espontânea e inteligente e de todo o coração.

149:6:5 16756 “Os vossos antepassados tinham medo de Deus, porque ele era poderoso e misterioso. Vós ireis adorá-lo porque ele é grandioso em amor, abundante em misericórdia e glorioso em verdade. O poder de Deus engendra o medo no coração do homem, mas a nobreza e a retidão da sua personalidade leva à reverência, ao amor e à adoração voluntária. Um filho afetuoso e respeitoso não teme, nem receia, mesmo a um pai poderoso e nobre. Eu vim ao mundo para colocar o amor no lugar do medo, o júbilo no lugar da tristeza, a confiança no lugar do receio, o serviço amoroso e a adoração agradecida no lugar da servidão escrava e das cerimônias sem sentido. Todavia, é ainda verdade, para aqueles que estão nas trevas, que ‘o temor do Senhor é o começo da sabedoria’. Mas, quando a luz tiver chegado mais claramente, os filhos de Deus serão levados a louvar o Infinito pelo que Ele é, mais do que a temê-Lo pelo que Ele faz.

149:6:6 16757 “Quando os filhos são jovens e despreocupados, eles devem necessariamente ser advertidos a honrar os pais; mas quando eles ficam mais velhos e tornam-se um tanto mais agradecidos, pelos benefícios da ministração e da proteção paterna, por meio do respeito, da compreensão e da afeição crescente, são levados até aquele nível de experiência em que de fato amam os seus pais, pelo que são, mais do que pelo que eles fizeram. O pai ama o seu filho naturalmente, mas o filho deve desenvolver o seu amor pelo pai, a partir do medo daquilo que o pai possa fazer, a partir do receio, da dependência e da reverência, até a consideração grata e afetuosa do amor.

149:6:7 16761 “Já vos foi ensinado que devíeis ‘temer a Deus e guardar os Seus mandamentos, pois esse é todo o dever do homem’. Mas eu vim para dar-vos um mandamento mais elevado. Eu gostaria de ensinar-vos a ‘amar a Deus e aprender a fazer a vontade Dele, pois esse é o mais alto privilégio dos filhos libertados de Deus’. Aos vossos pais foi ensinado ‘temer a Deus – o Rei Todo-Poderoso’. Eu vos ensino a ‘Amar a Deus – o Pai todo-misericordioso’.

149:6:8 16762 “No Reino do céu, que eu vim proclamar, não há um rei poderoso no alto; este Reino é uma família divina. O centro e a cabeça, universalmente reconhecidos e adorados incondicionalmente, dessa vasta irmandade de seres inteligentes é o meu Pai e o vosso Pai. Eu sou o seu Filho, e vós também sois filhos Dele. E, portanto, é eternamente verdadeiro que todos vós e eu somos irmãos, no domínio celeste, e isso é ainda mais verdadeiro, já que nós nos tornamos irmãos na carne, nesta vida terrena. Cessai, pois, de temer a Deus como a um rei ou de servir a Ele como a um senhor; aprendei a reverenciá-Lo como o Criador; honrai-O por ser o Pai do vosso jovem espírito; amai-O como um defensor misericordioso; e enfim adorai-O como o Pai infinitamente sábio na vossa realização espiritual mais amadurecida e grata.

149:6:9 16763 “Dos vossos conceitos errados, sobre o Pai no céu, vêm as vossas idéias falsas, sobre a humildade, e brota grande parte da vossa hipocrisia. O homem pode ser um verme da terra, por natureza e origem, mas, quando ele passa a ser residido pelo espírito do meu Pai, esse homem torna-se divino no seu destino. O espírito outorgado do meu Pai certamente retornará para a sua fonte divina e para o seu nível de origem no universo, e a alma humana do homem mortal que se tornou o filho renascido desse espírito residente certamente ascenderá com o espírito divino à própria presença do Pai eterno.

149:6:10 16764 “A humildade, de fato, se transforma no homem mortal quando ele recebe todas essas dádivas do Pai no céu, se bem que haja uma dignidade divina ligada a todos os candidatos, pela fé, à ascensão eterna do Reino celeste. As práticas sem sentido e servis, de uma humildade falsa e ostentosa, são incompatíveis com a apreciação da fonte da vossa salvação e o reconhecimento do destino das vossas almas nascidas do espírito. No fundo dos vossos corações é que a humildade diante de Deus é totalmente apropriada; a modéstia diante dos homens é elogiável; mas a hipocrisia de uma humildade falsa ou consciente de si e que clama por atenção é infantil, e indigna dos filhos esclarecidos do Reino.

149:6:11 16765 “Fazei bem de serdes brandos diante de Deus e autocontrolados diante dos homens, mas deixai que a vossa humildade tenha uma origem espiritual e que não seja uma exibição ilusória do sentimento autoconsciente de superioridade. O profeta falou ponderadamente quando disse: ‘Ande humildemente com Deus’, pois, conquanto o Pai do céu seja o Infinito e o Eterno, Ele também reside ‘com aquele que tem uma mente contrita e um espírito humilde’. O meu Pai desdenha o orgulho, repugna a hipocrisia e abomina a iniqüidade. E é para enfatizar o valor da sinceridade e da confiança perfeita no amparo amoroso e no guiamento fiel do Pai celeste, que eu tão freqüentemente me refiro à criança pequenina, como ilustração da atitude da mente e da resposta do espírito, que são tão essenciais à entrada do homem mortal nas realidades espirituais do Reino do céu.

149:6:12 16771 “O profeta Jeremias descreveu bem, a muitos mortais, quando ele disse: ‘Estás perto de Deus na tua boca, mas estás longe dele no coração’. E também não lestes aquele aviso medonho do profeta que disse: ‘Os sacerdotes daqui ensinam por um salário, e os profetas daqui predizem por dinheiro. Ao mesmo tempo, eles professam piedade e proclamam que o Senhor está com eles’. Não fostes bem prevenidos contra aqueles que ‘pregam a paz aos seus semelhantes, com a injúria nos seus corações’, aqueles que ‘elogiam com os lábios, enquanto o coração é dado ao jogo-duplo’? De todas as tristezas de um homem que confia, nenhuma é tão terrível quanto ser ‘ofendido na casa de um amigo de confiança’ ”.

7. RETORNANDO A BETSAIDA


149:7:1 16772 André, em consulta com Simão Pedro e com a aprovação de Jesus, instruiu a Davi, em Betsaida, para despachar mensageiros até os vários grupos de pregação, com instruções de que terminassem a viagem e retornassem para Betsaida, em algum momento da quinta-feira, 30 de dezembro. Na hora do almoço, naquele dia chuvoso, todo o grupo apostólico e os evangelistas, que pregavam, haviam chegado à casa de Zebedeu.

149:7:2 16773 O grupo permaneceu junto durante o dia de sábado, ficando acomodado nas casas de Betsaida e nas redondezas de Cafarnaum, depois do que a todos foi concedido um recesso, de duas semanas, para irem às suas casas ver as famílias, visitar os amigos, ou ir pescar. Os dois ou três dias que estiveram juntos em Betsaida, foram, verdadeiramente, divertidos e inspiradores; mesmo os instrutores mais velhos ficaram edificados ao ver os jovens pregadores narrando as suas experiências.

149:7:3 16774 Dos cento e dezessete evangelistas que participaram dessa segunda viagem de pregação na Galiléia, apenas cerca de setenta e cinco sobreviveram ao teste da realidade da experiência, e estavam disponíveis para ser designados ao serviço, no final das duas semanas de recesso. Jesus, junto com André, Pedro, Tiago e João permanecerem na casa de Zebedeu e passaram bastante tempo em conversas a respeito da prosperidade e da expansão do Reino.

DOCUMENTO 150

A TERCEIRA CAMPANHA DE PREGAÇÃO
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À noite no domingo, 16 de janeiro do ano 29 d. C. , Abner e os apóstolos de João chegaram a Betsaida e, no dia seguinte, tiveram uma conversa conjunta com André e os apóstolos de Jesus. Abner e os seus condiscípulos fizeram de Hebrom o seu ponto central, e mantiveram o hábito de vir a Betsaida periodicamente para as reuniões.

150:0:2 16782 Entre as muitas questões consideradas nessa conferência conjunta, estava a prática de ungir os doentes com alguns tipos de óleo, junto com orações para a cura. Jesus declinou de novo participar das discussões deles e expressar-se a respeito das conclusões tiradas. Os apóstolos de João tinham sempre usado o óleo para unção nas suas ministrações aos doentes e afligidos, e buscavam estabelecer isso como uma prática uniforme para ambos os grupos, mas os apóstolos de Jesus recusaram a ater-se a essas regras.

150:0:3 16783 Na terça-feira, 18 de janeiro, os vinte e quatro, junto com cerca de setenta e cinco evangelistas aprovados, reuniram-se na casa de Zebedeu, em Betsaida, em uma preparação para ser enviados na sua terceira viagem de pregação na Galiléia. Essa terceira missão durou um período de sete semanas.

150:0:4 16784 Os evangelistas foram enviados em grupos de cinco, enquanto Jesus e os doze viajaram juntos, a maior parte do tempo; os apóstolos indo, dois a dois, para batizar os crentes como era solicitado pela ocasião. Por um período de quase três semanas, Abner e os seus condiscípulos também trabalharam com os grupos evangélicos, aconselhando-os e batizando os crentes. Eles visitaram Magdala, Tiberíades, Nazaré e todas as principais cidades e aldeias das partes central e sul da Galiléia, foram a todos os locais anteriormente visitados e a muitos outros. Essa foi a sua última mensagem à Galiléia, exceto às suas regiões do norte.

1. O CORPO EVANGÉLICO DAS MULHERES


150:1:1 16785 De todas as coisas ousadas que Jesus fez, na sua carreira terrena, a mais surpreendente foi o seu anúncio súbito, na tarde de 16 de janeiro: “Amanhã pela manhã nós selecionaremos dez mulheres para o trabalho de ministração do Reino”. No começo do período de duas semanas durante o qual os apóstolos e os evangelistas deviam estar ausentes de Betsaida na sua licença, Jesus solicitou a Davi que chamasse os seus pais de volta para a casa deles e que despachasse mensageiros, chamando a Betsaida dez mulheres devotas que tinham servido na administração do acampamento anterior e na enfermaria nas tendas. Essas mulheres, todas, tinham ouvido a instrução dada aos jovens evangelistas, mas nunca tinha ocorrido aos instrutores delas, nem a elas próprias, que Jesus ousaria colocar mulheres na missão de ensinar o evangelho do Reino e de ministrar aos doentes. Essas dez mulheres, escolhidas e colocadas na missão por Jesus, eram: Susana, filha do antigo chazam da sinagoga de Nazaré; Joana, mulher de Cuza, camareiro de Herodes Antipas; Isabel, filha de um rico judeu de Tiberíades e Séforis; Marta, irmã mais velha de André e Pedro; Raquel, cunhada de Judá, irmão na carne do Mestre; Nasanta, filha de Elman, médico sírio; Milcha, uma prima do Apóstolo Tomé; Rute, a filha mais velha de Mateus Levi; Celta, filha de um centurião romano; e Agaman, uma viúva de Damasco. Subseqüentemente, Jesus acrescentou mais duas outras mulheres a este grupo – Maria Madalena e Rebeca, filha de José de Arimatéia.

150:1:2 16791 Jesus autorizou essas mulheres a formarem a sua própria organização e instruiu a Judas que provesse fundos para os seus equipamentos e para animais de carga. As dez elegeram Susana como dirigente e Joana como a tesoureira. Desse momento em diante, elas proveram os próprios fundos de caixa; e nunca mais elas recorreram a Judas para sustentá-las.

150:1:3 16792 Muito espantoso era, naquela época, quando às mulheres nem era permitido que permanecessem no andar principal da sinagoga (ficando confinadas à galeria das mulheres), vê-las sendo reconhecidas como instrutoras autorizadas do novo evangelho do Reino. O encargo que Jesus deu a essas dez mulheres, quando ele as escolheu para ensinar o evangelho e para ministrar, foi o da proclamação da emancipação que libertava todas as mulheres, para todos os tempos; não mais era para que o homem visse a mulher como inferior espiritualmente. Isso foi decididamente um choque, até mesmo para os doze apóstolos. Não obstante elas terem muitas vezes ouvido o Mestre dizer que “no Reino do céu não há rico ou pobre, livre ou escravo, masculino ou feminino, todos são igualmente os filhos e filhas de Deus”; elas ficaram literalmente atordoadas, quando ele propôs formalmente dar missões a essas mulheres como instrutoras religiosas e mesmo permitir que viajassem com eles. Todo o país ficou agitado com esse procedimento, os inimigos de Jesus tiraram um grande partido dessa decisão, mas, em todos os lugares, as mulheres crentes nas boas-novas, ficaram firmes em apoio às suas irmãs escolhidas e exprimiram uma aprovação sem hesitação a esse reconhecimento tardio do lugar da mulher no trabalho religioso. E essa liberação das mulheres, dando a elas o devido reconhecimento, foi praticada pelos apóstolos imediatamente após a partida do Mestre, embora fossem voltar aos velhos costumes, nas gerações posteriores. Durante os primeiros tempos da igreja cristã, as mulheres instrutoras e ministras eram chamadas diáconas e eram dignas do reconhecimento geral. Mas Paulo, a despeito do fato de admitir tudo isso em teoria, nunca realmente incorporou nada disso na sua própria atitude, pois pessoalmente achava difícil de ser colocado em prática.

2. A PARADA EM MAGDALA


150:2:1 16793 Quando o grupo apostólico saiu de Betsaida, as mulheres viajaram na retaguarda. Durante as conferências sempre se assentavam agrupadas na frente e à direita do palestrante. E às mulheres, que cada vez mais se tornavam crentes no evangelho do Reino, sempre que haviam desejado manter uma conversa pessoal com Jesus ou com um dos apóstolos, acontecera uma porção de dificuldades e embaraços sem fim. Agora tudo isso estava mudado. Quando qualquer das mulheres crentes desejava ver o Mestre ou conversar com os apóstolos, ia até Susana e, em companhia de uma das doze mulheres evangelistas, ela iria imediatamente à presença do Mestre ou de um dos seus apóstolos.

150:2:2 16801 Foi em Magdala que, pela primeira vez, as mulheres demonstraram a sua utilidade e justificaram a sabedoria da sua escolha. André tinha imposto regras bastante estritas aos seus condiscípulos sobre fazer trabalhos pessoais com as mulheres, especialmente com aquelas de caráter questionável. Quando o grupo entrou em Magdala, essas dez mulheres evangelistas foram liberadas para ir aos locais do pecado e pregarem as boas-novas diretamente às residentes dali. E quando visitavam os doentes, essas mulheres podiam chegar até muito mais perto, na sua ministração às suas irmãs afligidas. Em resultado da ministração dessas dez mulheres (mais tarde conhecidas como as doze mulheres) nesse local, Maria Madalena foi conquistada para o Reino. Por meio de uma série de infortúnios e em conseqüência da atitude da sociedade bem reputada para com as mulheres que cometem tais erros de julgamento, essa mulher tinha ido parar em um desses locais nefandos de Magdala. Foi Marta e Raquel que deixaram claro, para Maria, que as portas do Reino estavam abertas mesmo para as que tinham sido como ela. Maria acreditou nas boas-novas e foi batizada por Pedro no dia seguinte.

150:2:3 16802 Maria Madalena tornou-se a instrutora mais eficiente do evangelho, desse grupo de doze mulheres evangelistas. Ela foi escolhida para esse serviço, junto com Rebeca, em Jotapata, cerca de quatro semanas depois da sua conversão. Maria e Rebeca, com outras desse grupo, continuaram trabalhando, até o fim da vida de Jesus na Terra, fiel e eficientemente, para o esclarecimento e a elevação das suas irmãs oprimidas; e, quando o último e trágico episódio no drama da vida de Jesus estava sendo desempenhado, não obstante terem todos os apóstolos fugido, exceto um, essas mulheres todas permaneceram presentes, e nem uma delas sequer o negou ou traiu.

3. O SÁBADO EM TIBERÍADES


150:3:1 16803 Os serviços do grupo apostólico, para o sábado, tinham sido colocados, por André, na mão das mulheres, por instrução de Jesus. Isso significava, claro está, que eles não poderiam acontecer na nova sinagoga. As mulheres escolheram Joana para encarregar-se dessa ocasião, e o encontro foi feito no novo palácio de Herodes, na sala de banquetes, Herodes estando ausente da residência em Júlias, na Peréia. Joana leu, das escrituras, a respeito do trabalho das mulheres na vida religiosa de Israel, fazendo referência a Míriam, Débora, Ester e outras.

150:3:2 16804 Mais tarde, naquela noite, Jesus fez, com o grupo reunido, uma palestra memorável sobre “Magia e Superstição”. Naqueles dias o aparecimento de uma estrela brilhante e supostamente nova foi encarado como um sinal indicando que um grande homem tinha nascido na Terra. Essa estrela tinha sido recentemente descoberta e André perguntou a Jesus se essas crenças eram bem fundadas. Na longa resposta à pergunta de André o Mestre entrou em um exame profundo sobre toda a questão da superstição humana. A exposição que Jesus fez nessa ocasião pode ser resumida, em uma linguagem moderna, como é feito a seguir:

150:3:3 16805 1. Os trajetos das estrelas no céu, absolutamente nada têm a ver com os acontecimentos da vida humana na Terra. A astronomia é uma busca própria da ciência, mas a astrologia é uma massa de erros supersticiosos, que não tem nenhum lugar no evangelho do Reino.

150:3:4 16806 2. O exame dos órgãos internos de um animal morto há pouco, nada pode revelar sobre o tempo, sobre os acontecimentos futuros nem sobre os resultados vindouros das questões humanas.

150:3:5 16807 3. Os espíritos dos mortos não voltam para comunicar-se com as suas famílias, nem com os antigos amigos, de entre os vivos.

150:3:6 16811 4. Os encantos e as relíquias são impotentes para curar a doença, para proteger contra os desastres ou a influência de maus espíritos; a crença de que todo esse material influencie o mundo espiritual, nada é senão uma superstição grosseira.

150:3:7 16812 5. Tirar a sorte, embora possa ser uma forma conveniente de decidir sobre dificuldades menores, não é um método indicado para desvelar a vontade divina. As conseqüências são uma questão de acaso material. O único meio de comunhão com o mundo espiritual está contido na dotação do espírito à humanidade, o espírito residente do Pai, junto com o espírito efusionado do Filho e a influência onipresente do Espírito Infinito.

150:3:8 16813 6. A adivinhação, a bruxaria e a feitiçaria são superstições de mentes ignorantes, como o são também as ilusões da magia. A crença em números mágicos, em presságios de boa sorte e nos arautos da má sorte, é tudo uma pura e infundada superstição.

150:3:9 16814 7. A interpretação dos sonhos é um sistema ignorante de especulação fantástica, amplamente supersticioso e sem base. O evangelho do Reino nada deve ter em comum com os sacerdotes-adivinhos da religião primitiva.

150:3:10 16815 8. Os espíritos do bem ou do mal não podem residir em símbolos materiais de argila, madeira ou metal; os ídolos nada mais são do que o material de que são feitos.

150:3:11 16816 9. As práticas dos magos, dos bruxos e dos feiticeiros derivaram-se das superstições dos egípcios, dos assírios, dos babilônios e dos antigos cananeus. Os amuletos e todas as espécies de encantamentos são inúteis tanto para ganhar a proteção dos bons espíritos, quanto para proteger dos supostos espíritos maus.

150:3:12 16817 10. Jesus colocou a nu e denunciou as crenças em feitiços, ordálios, despachos, pragas, sinais, mandrágoras, nós em cordas e todas as outras formas de superstições ignorantes e escravizadoras.

4. ENVIANDO OS APÓSTOLOS, DOIS A DOIS


150:4:1 16818 Na noite seguinte, tendo reunido os doze apóstolos, os apóstolos de João e o grupo recém-formado das mulheres, Jesus disse: “Podeis ver, por vós próprios, que a colheita é abundante, mas os trabalhadores são poucos. Que todos nós, portanto, oremos ao Senhor das colheitas para que Ele nos envie mais trabalhadores ainda, para os Seus campos. Enquanto permaneço confortando e instruindo os mais jovens, eu gostaria de enviar os mais antigos, dois a dois, para que eles possam ir rapidamente a toda a Galiléia pregando o evangelho do Reino, enquanto ainda é conveniente e tudo ainda está pacífico”. Então, ele designou os pares de apóstolos como desejava que fossem enviados, e que eram: André e Pedro, Tiago e João Zebedeu, Filipe e Natanael, Tomé e Mateus, Tiago e Judas Alfeu, Simão zelote e Judas Iscariotes.

150:4:2 16819 Jesus acertou uma data para encontrar os doze em Nazaré e, ao partirem, ele disse: “Nessa missão não ide a nenhuma cidade dos gentios, nem a Samaria, em vez disso, ide buscar a ovelha perdida da casa de Israel. Pregai o evangelho do Reino e proclamai a verdade salvadora de que o homem é um filho de Deus. Lembrai de que o discípulo dificilmente está acima do seu mestre e de que um servo raramente é maior do que o seu senhor. É suficiente ao discípulo ser igual ao seu mestre e ao servo tornar-se semelhante ao seu senhor. Se alguma gente tiver ousado chamar de mestre da casa a um parceiro de Belzebu, tanto mais assim eles considerarão aqueles que tomam conta da sua casa! Mas vós não deveis temer esses inimigos descrentes. Eu declaro a vós que nada daquilo que está encoberto deixará de ser revelado; nada há escondido, que não será conhecido. O que eu vos ensinei em particular, pregai-o abertamente com sabedoria. O que eu revelei a vós no interior da vossa morada, isso vós o ireis proclamar na hora certa, de cima dos telhados. E eu vos digo, meus amigos e discípulos, não temais aqueles que podem matar o corpo e, no entanto, não são capazes de destruir a alma; colocai a vossa confiança Nele que pode sustentar o corpo e salvar a alma.

150:4:3 16821 “Dois pardais não são vendidos por um tostão? E ainda eu vos declaro que nenhum deles foi esquecido aos olhos de Deus. Não sabeis que os próprios cabelos da vossa cabeça estão todos contados? Não temais, portanto; vós sois de mais valor que uma grande quantidade de pardais. Não fiqueis envergonhados com o meu ensinamento; ide proclamar a paz e a boa vontade, mas não vos enganeis – a paz nem sempre acompanhará a vossa pregação. Eu vim para trazer a paz à Terra, mas quando os homens rejeitam a minha dádiva, o tumulto e a divisão advêm. Quando toda a família recebe o evangelho do Reino, a paz verdadeira reside naquela casa; mas quando alguns da família entram no Reino e outros rejeitam o evangelho, essa divisão só pode produzir tristezas e mágoas. Trabalhai seriamente para salvar toda a família, para que os inimigos do homem não sejam aqueles da sua própria casa. Mas, quando tiverdes feito o vosso máximo possível, por todos de cada família, eu declaro a vós que aquele que ama o pai ou a mãe mais do que a esse evangelho não é digno do Reino”.

150:4:4 16822 Depois que os doze ouviram essas palavras, eles estavam prontos para partir. E não se viram mais, até o momento da sua reunião em Nazaré, para encontrarem-se com Jesus e os outros discípulos, como o Mestre tinha marcado.

5. O QUE DEVO FAZER PARA ME SALVAR?


150:5:1 16823 Numa noite em Shunem, depois que os apóstolos de João tinham retornado a Hebrom, e depois que os apóstolos de Jesus tinham sido enviados, dois a dois, e quando o Mestre estava empenhado em ensinar a um grupo de doze dos evangelistas mais jovens, que trabalhavam juntos com as doze mulheres, sob a direção de Jacó, Raquel fez a seguinte pergunta a Jesus: “Mestre, o que devemos responder quando as mulheres perguntarem a nós, o que devo eu fazer para me salvar?”Jesus ouviu essa pergunta e respondeu:

150:5:2 16824 “Quando os homens e as mulheres perguntarem o que devem fazer para salvarem-se, vós deveis responder-lhes: Acreditar nesse evangelho do Reino; aceitar o perdão divino. Reconhecer, pela fé, o espírito residente de Deus, cuja aceitação faz de vós um filho de Deus. Não lestes nas escrituras onde diz: ‘No Senhor eu tenho a retidão e a força’. E também onde o Pai diz: ‘A minha retidão está próxima; a minha salvação já se manifestou, e os meus braços envolverão o meu povo’. ‘A minha alma estará em júbilo no amor do meu Deus, pois Ele agasalhou-me com as vestes da salvação e cobriu-me com o manto da Sua retidão’. Não lestes também sobre o Pai, que o Seu nome ‘será chamado o Senhor da nossa retidão’. ‘Retirai as vestes sujas daquele que considera virtuoso só a si, e vesti esse meu filho com o manto da retidão divina e da eterna salvação’. Para sempre é verdade que ‘o justo viverá na fé’. A entrada no Reino do Pai é totalmente livre, mas o progresso – o crescimento na graça – é essencial para se continuar no Reino.

150:5:3 16825 “A salvação é a dádiva do Pai e é revelada pelos seus Filhos. A aceitação pela fé, da vossa parte, faz com que vós compartilheis da natureza divina, como um filho ou uma filha de Deus. Pela fé sois justificados; pela fé sois salvos; e por essa mesma fé vós avançais eternamente no caminho da perfeição progressiva e divina. Pela fé Abraão foi justificado; ele tornou-se sabedor da salvação por meio dos ensinamentos de Melquisedeque. Em todas as épocas, essa mesma fé salvou os filhos dos homens, mas agora um filho veio do Pai para fazer com que a salvação fique mais real e aceitável”.

150:5:4 16831 Quando Jesus terminou de falar, havia um grande júbilo entre aqueles que tinham ouvido essas palavras cheias de graça e, nos dias que se seguiram, todos foram proclamar o evangelho do Reino com força nova e com energia e entusiasmo renovados. E as mulheres encheram-se de júbilo ainda mais ao saberem que estavam incluídas nesses planos para o estabelecimento do Reino na Terra.

150:5:5 16832 Resumindo essa afirmação final, Jesus disse: “Vós não podeis comprar a salvação; não podeis adquirir a retidão. A salvação é uma dádiva de Deus, e a retidão é o fruto natural da vida que nasce da filiação ao Reino. Vós não sereis salvos porque viveis uma vida na retidão; antes deveis viver uma vida na retidão porque já fostes salvos, porque reconhecestes a filiação como uma dádiva de Deus e o serviço no Reino como a suprema delícia da vida na Terra. Quando os homens acreditam nesse evangelho, que é uma revelação da bondade de Deus, eles se conduzirão voluntariamente ao arrependimento, de todos os pecados conhecidos. A compreensão da filiação é incompatível com o desejo de pecar. Os crentes do Reino têm fome de retidão e sede da perfeição divina”.

6. AS LIÇÕES DA NOITE


150:6:1 16833 Nas argumentações noturnas, Jesus falou sobre muitas questões. Durante o restante dessa viagem – antes de reunirem-se todos em Nazaré – ele examinou “O Amor de Deus”, “Sonhos e Visões”, “Malícia”, “Humildade e Brandura”, “Coragem e Lealdade”, “Música e Adoração”, “Serviço e Obediência”, “Orgulho e Presunção”, “Perdão em Relação ao Arrependimento”, “Paz e Perfeição”, “Maledicência e Inveja”, “Mal, Pecado e Tentação”, “Dúvidas e Descrença”, “Sabedoria e Adoração”. Com os apóstolos mais antigos à distância, os grupos mais recentes de homens e de mulheres entraram mais livremente nas conversas com o Mestre.

150:6:2 16834 Depois de passar dois ou três dias com um grupo de doze evangelistas, Jesus ia juntar-se a outro grupo, sendo informado sobre os locais de permanência, e sobre os movimentos de todos esses trabalhadores, pelos mensageiros de Davi. Sendo essa a sua primeira viagem, as mulheres permaneceram grande parte do tempo com Jesus. Por intermédio do serviço dos mensageiros, cada um desses grupos era mantido totalmente informado a respeito do progresso da viagem; e receber novas sobre os outros grupos era sempre uma fonte de encorajamento para esses trabalhadores espalhados e isolados.

150:6:3 16835 Antes da sua separação ficou marcado e arranjado para os doze apóstolos, junto com os evangelistas e o grupo das mulheres, encontrar-se em Nazaré para reunir-se com o Mestre, na sexta-feira, 4 de março. E assim, por volta do momento certo, de todas as partes do centro e do sul da Galiléia, esses vários grupos de apóstolos e de evangelistas começaram a viajar para Nazaré. Por volta do meio da tarde, André e Pedro, os últimos a chegar, estavam alcançando o acampamento preparado por aqueles que chegaram cedo, e situado nas colinas ao norte da cidade. E esta era a primeira vez que Jesus visitava Nazaré, desde o começo da sua ministração pública.

7. A PERMANÊNCIA EM NAZARÉ


150:7:1 16836 Nessa sexta-feira à tarde, Jesus caminhou pela cidade de Nazaré sem ser observado e sem ser reconhecido. Passou pela casa da sua infância e pela oficina de carpinteiro e permaneceu cerca de meia hora na colina em que ele tanto gostava de estar quando era menino. Desde o dia do seu batismo, feito por João no Jordão, que o Filho do Homem não tinha um tal fluxo de emoção humana mexendo com a sua alma. Enquanto descia da montanha, ele ouviu os sons familiares da trombeta anunciando o pôr-do-sol, exatamente como ele tinha ouvido tantas e tantas vezes quando era um menino crescendo em Nazaré. Antes de retornar ao acampamento, ele caminhou até a sinagoga em cuja escola ele havia estudado, e então permitiu à sua mente muitas reminiscências dos dias da sua infância. Naquele dia, bem cedo, Jesus tinha enviado Tomé para arranjar, com o dirigente da sinagoga, a sua pregação no serviço do sábado, pela manhã.

150:7:2 16841 O povo de Nazaré nunca teve a reputação de ser pio, nem de ser reto, no seu modo de viver. Com o passar dos anos, essa aldeia tornou-se cada vez mais contaminada pelos padrões morais baixos da vizinha Séforis. Durante a adolescência e a juventude de Jesus, tinha havido muita divisão nas opiniões sobre ele em Nazaré; houve muito ressentimento quando ele mudou-se para Cafarnaum. Os habitantes de Nazaré tanto ouviram sobre as obras do seu antigo carpinteiro, que ficaram ofendidos porque ele nunca tinha incluído a sua aldeia de nascimento em qualquer das suas viagens anteriores de pregação. Eles tinham de fato ouvido sobre a fama de Jesus, mas a maioria dos cidadãos estava zangada porque ele não tinha feito nenhum dos seus grandes trabalhos na cidade da sua juventude. Durante meses o povo de Nazaré discutiu muito sobre Jesus, mas as suas opiniões, em geral, eram desfavoráveis para com ele.

150:7:3 16842 Assim, o Mestre encontrava-se em meio, não a uma recepção de boas-vindas à casa paterna, mas decididamente em meio a uma atmosfera hostil e de muita crítica. Mas isso não era tudo. Os seus inimigos, sabendo que ele devia passar esse dia de sábado em Nazaré e supondo que ele iria falar na sinagoga, tinham contratado inúmeros homens grosseiros e rudes para fustigá-lo e para criarem complicações de todos os modos possíveis.

150:7:4 16843 Os amigos mais idosos de Jesus, na maior parte, incluindo o chazam já caduco, que tinha sido o professor da sua infância, eram falecidos ou tinham deixado Nazaré, e a geração mais jovem estava predisposta a se ressentir da sua celebridade, com muitos ciúmes. Eles não se lembravam da sua devoção à família do seu pai, e eram amargos nas suas críticas por causa da negligência dele em visitar o seu irmão e as suas irmãs casadas que viviam em Nazaré. A atitude da família de Jesus para com ele gerava também uma tendência de fazer aumentar esse sentimento indelicado dos habitantes da cidade. Os ortodoxos, entre os judeus, tinham a presunção de até mesmo criticar Jesus por ele ter caminhado muito depressa a caminho da sinagoga, nessa manhã de sábado.

8. O SERVIÇO DO SÁBADO


150:8:1 16844 Esse sábado foi um lindo dia, e toda a Nazaré, amiga e inimiga, apareceu para ouvir esse antigo cidadão da aldeia falar-lhes na sinagoga. Muitos, da comitiva apostólica, tiveram de permanecer do lado de fora da sinagoga; não havia lugar para todos que tinham vindo para ouvi-lo. Quando era um homem mais jovem, Jesus tinha, muitas vezes, tido a palavra nesse lugar de adoração e, nessa manhã, quando o dirigente da sinagoga passou a ele o rolo das escrituras sagradas, de onde ele leria a lição da Escritura, nenhum dos presentes parecia lembrar-se de ser esse o mesmo manuscrito com o qual ele tinha presenteado a essa sinagoga.

150:8:2 16845 Os serviços nesse dia foram conduzidos exatamente como, quando inda menino, Jesus assistira a eles. Ele subiu no estrado dos oradores, com o dirigente da sinagoga, e o serviço teve início com a recitação de duas orações: “Abençoado é o Senhor, Rei do mundo, que forma a luz e que cria as trevas, que faz a paz e cria tudo; que, na misericórdia, dá luz à Terra e àqueles que residem nela e que, na sua bondade, dia após dia, e todos os dias, renova as obras da criação. Abençoado é o Senhor nosso Deus, para a glória das obras da sua mão e pela luz que ilumina e que ele criou para o Seu louvor. Selá. Abençoado é o Senhor nosso Deus, que criou as luzes”.

150:8:3 16851 Depois de um momento de pausa eles oraram novamente: “Com um grande amor, o Senhor nosso Deus nos amou e, com uma piedade transbordante, ele teve piedade de nós, nosso Pai e nosso Rei, em nome dos nossos pais que confiaram Nele. Vós ensinastes a eles os estatutos da vida; tende misericórdia de nós e ensinai-nos. Esclarecei os nossos olhos para a lei; levai os nossos corações a aderir aos Vossos mandamentos; uni os nossos corações para amar e temer o Vosso nome, e nós não seremos expostos à vergonha neste mundo sem fim. Pois sois um Deus que prepara a salvação, e a nós escolhestes, entre todas as nações e línguas, e na verdade Vós nos trouxestes para perto do Vosso grande nome – selá – para que possamos louvar a Vossa unidade com amor. Abençoado é o Senhor, que no amor escolheu o seu povo em Israel”.

150:8:4 16852 A congregação recitou então o Shema, o credo da fé judaica. Esse ritual consistia em repetir inúmeras passagens da lei e indicava que os adoradores tomavam a si o jugo do Reino do céu, e também o jugo dos mandamentos, como aplicados ao dia e à noite.

150:8:5 16853 E então se seguiu a terceira oração: “Verdade é que tu és Yavé, o nosso Deus e o Deus dos nossos pais; o nosso Rei e o Rei dos nossos pais; o nosso Salvador e o Salvador dos nossos Pais; o nosso Criador e o rochedo da nossa salvação; a nossa ajuda e o nosso libertador. O Vosso nome é o do eterno, e não há Deus além de Vós. Uma nova canção os libertados fizeram em Vosso nome, à beira do mar; e juntos todos Vos louvaram e reconheceram-Vos como Rei e dizem: Yavé reinará nesse mundo sem fim. Abençoado é o Senhor que salva Israel”.

150:8:6 16854 O dirigente da sinagoga então ocupou o seu lugar diante da arca, ou cofre, contendo as escrituras sagradas e começou a recitar as dezenove orações do eucológio, ou as bendições. Mas, nessa ocasião, era desejável encurtar o serviço para que o ilustre convidado pudesse ter mais tempo para pregar; desse modo, apenas a primeira e a última das bendições foram recitadas. A primeira foi: “Abençoado é o Senhor nosso Deus, e o Deus dos nossos pais, o Deus de Abraão, e o Deus de Isaac, e o Deus de Jacó; o grande, o poderoso e o terrível Deus, que demonstra misericórdia e bondade, que cria todas as coisas, que lembra as promessas graciosas dos pais e que traz um salvador para os filhos dos seus filhos e, na causa do próprio nome, no amor. Ó Rei, nossa ajuda, salvação e proteção! Abençoado sois Vós, ó Yavé, escudo protetor de Abraão”.

150:8:7 16855 Então se seguiu a última bendição: “Ó, concedei ao vosso povo de Israel uma grande paz para sempre, pois Vós sois o Rei e o Senhor de toda a paz. E é bom aos Vossos olhos abençoar Israel em todos os tempos e a toda hora com a paz. Abençoado sois Vós, Yavé, que abençoais o povo de Israel com a paz”. A assembléia não olhava para o dirigente quando ele recitava as bendições. Em seguida às bendições ele ofereceu uma prece informal adequada para a ocasião e, quando esta foi concluída, todos juntos disseram amém.

150:8:8 16856 Então o chazam foi até a arca e trouxe o rolo, que passou a Jesus, para que ele pudesse ler a lição da escritura. Era costume chamar sete pessoas para ler nunca menos do que três versos da lei, mas essa prática foi posta de lado, nessa ocasião em que o visitante poderia ler a lição da sua própria escolha. Jesus, tomando o rolo, levantou-o e começou a ler no Deuteronômio: “Pois este mandamento que eu vos dou nesse dia não está oculto para vós, nem distante de vós. Não está no céu, de modo que vós possais dizer, quem irá até o céu lá em cima em nosso nome para trazê-lo até aqui para nós de modo que possamos ouvi-lo e cumpri-lo? Nem está mais longe do que o mar, para que possais dizer, quem irá até o mar trazer o mandamento até a nós para que possamos ouvi-lo e cumpri-lo? Não, a palavra da vida está muito perto de vós, está mesmo na vossa presença e no vosso coração, para que possais conhecê-la e obedecê-la”.

150:8:9 16861 E depois de parar de ler a palavra da lei, ele procurou Isaías e começou a ler: “O espírito do Senhor está em mim porque ele ungiu-me para pregar as boas-novas aos pobres. Ele enviou-me, para proclamar a liberdade aos cativos e a recuperação da vista aos cegos, para colocar em liberdade os que estão feridos e proclamar o ano das boas-vindas ao Senhor”.

150:8:10 16862 Jesus fechou o livro e, depois de entregá-lo de volta ao dirigente da sinagoga, assentou-se e começou a pregação ao povo. Começou por dizer: “Hoje estas escrituras estão cumpridas”. E então Jesus falou durante quase quinze minutos sobre “Os Filhos e Filhas de Deus”. Muitas, dentre aquelas pessoas, ficaram contentes com o que ouviram, e maravilharam-se com a graça e a sabedoria de Jesus.

150:8:11 16863 Era hábito, na sinagoga, depois da conclusão do serviço formal, que o orador permanecesse lá, de modo que aqueles que estivessem interessados pudessem fazer-lhe perguntas. E, desse modo, nessa manhã de sábado, Jesus desceu até a multidão que se comprimia na frente para fazer perguntas. E entre esses estavam muitos indivíduos agitadores cujas mentes estavam voltadas para a injúria e, em meio dessa multidão circulavam aqueles homens de baixo calão, que tinham sido contratados para criar problemas para Jesus. Muitos dos discípulos e dos evangelistas, que haviam permanecido fora, estavam agora sendo comprimidos para dentro da sinagoga e logo se aperceberam de que aconteceriam complicações. Eles procuraram tirar o Mestre dali, mas ele não quis ir com eles.

9. A REJEIÇÃO DE NAZARÉ


150:9:1 16864 Jesus viu-se cercado, na sinagoga, por uma grande multidão de inimigos seus e de uns poucos dentre os seus próprios seguidores e, em resposta às perguntas grosseiras e aos escárnios sinistros ele replicou, não sem uma leve ponta de humor: “Sim, sou o filho de José; sou o carpinteiro, e não estou surpreso de que vós me fazeis lembrar do provérbio, ‘médico, cures a ti mesmo’, e que vós me desafiais a fazer em Nazaré o que ouvistes que fiz em Cafarnaum; mas eu vos convoco a testemunhar que até mesmo as escrituras declaram que ‘um profeta pode ter honrarias, mas não na sua própria terra, nem entre os do seu próprio povo’ ”.

150:9:2 16865 Mas eles o acotovelaram e, apontando-lhe dedos acusadores, disseram: “Achas que és melhor que o povo de Nazaré; tu te afastaste de nós, mas o teu irmão é um trabalhador comum, e as tuas irmãs ainda vivem entre nós. Conhecemos a tua mãe, Maria. Onde estão eles hoje? Ouvimos coisas importantes sobre ti, mas nós percebemos que não fazes nenhum prodígio quando voltas aqui”. Jesus respondeu a eles: “Eu amo o povo que reside na cidade onde eu cresci, e eu me rejubilaria de ver todos vós entrando no Reino do céu, mas não sou eu quem determina as obras de Deus. As transformações feitas pela graça vêm em resposta à fé viva daqueles que são os seus beneficiários”.

150:9:3 16866 Jesus teria controlado, com benevolência, a multidão e teria efetivamente desarmado até aos inimigos violentos, não fosse por um erro tático de um dos seus próprios apóstolos, Simão zelote, que, com a ajuda de Nahor, um dos evangelistas mais jovens, nesse meio tempo, havia reunido um grupo de amigos de Jesus no meio da multidão e, assumindo uma atitude beligerante, tinha notificado aos inimigos do Mestre para irem-se dali. Jesus havia, muitas vezes, ensinado aos apóstolos que uma resposta suave afasta a ira, mas os seus seguidores não estavam acostumados a ver o seu amado instrutor, a quem com tão boa vontade chamavam de Mestre, ser tratado com tanta descortesia e desdém. Era demais para eles, e então se viram dando vazão a ressentimentos apaixonados e veementes, todos os quais apenas serviam para alevantar os ânimos da multidão, nesse ajuntamento malsão e rude. E assim, sob a liderança dos mercenários, esses rufiões apoderaram-se de Jesus e empurraram-no para fora da sinagoga, até a beira de um precipício, em uma colina próxima, onde eles tinham a intenção de empurrá-lo da borda, para que morresse na queda. Mas no momento em que estavam para dar-lhe o empurrão até a beirada íngreme, Jesus voltou-se subitamente para os seus captores e, encarando-os, calmamente dobrou os braços. Ele nada disse, mas os seus amigos ficaram mais do que atônitos quando, à medida que ele andava para frente, a multidão abria-se e permitia que ele passasse sem ser molestado.

150:9:4 16871 Jesus, seguido pelos seus discípulos, rumou para o acampamento, onde tudo isso foi contado a todos. E eles aprontaram-se, naquela noite, para voltar para Cafarnaum, bem cedo na manhã seguinte, como mandado por Jesus. Esse final turbulento da terceira viagem pública de pregação teve um efeito de moderação sobre todos os seguidores de Jesus. Eles começavam a compreender o significado de alguns dos ensinamentos do Mestre; e despertavam-se para o fato de que o Reino viria apenas depois de muita tristeza e de desapontamentos amargos.

150:9:5 16872 Deixaram Nazaré, nesse domingo pela manhã e, viajando por estradas diferentes, todos finalmente se reuniram em Betsaida, ao meio-dia, na quinta-feira, 10 de março. Eles reuniram-se mais como um grupo moderado, sério e sem ilusões de pregadores do evangelho da verdade e não como um bando de cruzados entusiasmados e triunfantes, que a tudo quisesse conquistar.

DOCUMENTO 151

ENSINAMENTOS E PERMANÊNCIA À BEIRA-MAR
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Por volta de 10 de março todos os grupos de pregação e ensinamento estavam congregados em Betsaida. Na quinta-feira à noite e na sexta-feira, muitos deles saíram para pescar, já no dia de sábado eles foram à sinagoga para ouvir um judeu idoso de Damasco discursar sobre a glória do pai Abraão. Jesus passou a maior parte desse sábado a sós nas colinas. À noite, desse sábado, o Mestre falou aos grupos reunidos, durante mais de uma hora, sobre “A missão da adversidade e o valor espiritual do desapontamento”. Essa foi uma ocasião memorável, e os seus ouvintes nunca esqueceram a lição que ele lhes ministrou.

151:0:2 16882 Jesus ainda não se tinha recuperado totalmente da mágoa da recente rejeição que tivera em Nazaré; os apóstolos sabiam que uma tristeza evidente misturava-se ao seu comportamento geralmente alegre. Tiago e João acompanhavam-no na maior parte do tempo; Pedro estava mais do que ocupado com as muitas responsabilidades, que tinham a ver com a direção e o bem-estar do novo corpo de evangelistas. As mulheres passaram esse tempo de espera, antes de partirem para a Páscoa em Jerusalém, indo de casa em casa, ensinando o evangelho, visitando e ministrando aos doentes em Cafarnaum e nas cidades e aldeias vizinhas.

1. A PARÁBOLA DO SEMEADOR


151:1:1 16883 Naquela época, e pela primeira vez, Jesus começara a utilizar o método da parábola, para ensinar às multidões que tão freqüentemente se ajuntavam em volta dele. Já que Jesus tinha conversado com os apóstolos e com outros até tarde da noite, nesse domingo pela manhã pouquíssimos do grupo estavam de pé para o desjejum; assim, ele foi para a beira-mar e assentou-se a sós no barco, o velho barco de pesca de André e Pedro, que estava sempre à disposição dele; e então meditou sobre o próximo passo a ser dado na obra de expandir o Reino. Todavia, o Mestre não ficou só por muito tempo. Logo, o povo de Cafarnaum e das aldeias próximas começou a chegar e, às dez horas, naquela manhã, quase mil pessoas estavam reunidas, na praia, perto do barco de Jesus, e clamavam pela atenção dele. Pedro, que agora já estava de pé, a caminho do barco, disse a Jesus: “Mestre, devo falar a eles?” E Jesus respondeu: “Não, Pedro, eu vou contar-lhes uma história”. E então Jesus começou a contar a parábola do semeador, uma das primeiras de uma longa série de parábolas com as quais ele ensinou às multidões que o seguiam. Esse barco tinha um assento elevado, no qual ele assentou-se (pois era costume ficar assentado, enquanto se ensinava) para falar às pessoas reunidas ao longo da praia. Pedro tendo falado umas poucas palavras, Jesus disse depois:

151:1:2 16884 “Um semeador saiu para semear, e aconteceu que, ao semear, algumas sementes caíram à beira do caminho, onde seriam pisadas ou devoradas pelos pássaros do céu. Outras sementes caíram em locais rochosos, onde havia pouca terra, e imediatamente brotavam, porque não havia profundidade no solo, mas, tão logo veio o sol, elas murcharam, porque não tinham raízes com as quais absorver a umidade. Outras sementes caíram entre os espinhos e, quando os espinhos cresceram, ficaram estranguladas, de modo que nada produziram. Outras sementes, ainda, caíram em solo bom e, crescendo, produziram trinta grãos, algumas, outras, sessenta, e outras, cem grãos. ” E, quando ele terminou de contar essa parábola, disse à multidão: “Aquele que tem ouvidos para ouvir, que ouça”.

151:1:3 16891 Os apóstolos e aqueles que estavam com eles, quando ouviram Jesus ensinando ao povo daquele modo, ficaram bastante perplexos; e, depois de muito conversarem, entre si, naquela noite, no jardim de Zebedeu, Mateus disse a Jesus: “Mestre, qual é o significado das palavras obscuras que tu apresentaste à multidão? Por que falas por meio de parábolas àqueles que buscam a verdade?” E Jesus respondeu:

151:1:4 16892 “Eu vos tenho instruído com paciência durante todo esse tempo. A vós vos é dado conhecer os mistérios do Reino do céu, mas para a multidão, que não sabe discernir, e para aqueles que buscam a nossa destruição, de agora em diante, os mistérios do Reino serão apresentados em parábolas. E, assim, nós faremos para que aqueles que realmente desejem entrar no Reino possam discernir o significado do ensinamento e dessa forma encontrar a salvação, enquanto aqueles que nos estiverem escutando, apenas para nos pegar de surpresa, possam ficar mais confundidos, pois verão sem nada ver e ouvirão sem nada ouvir. Meus filhos, não conheceis a lei do espírito a qual decreta que àquele que tem, será dado, de um tal modo que ele terá em abundância; mas àquele que não tem será tomado até mesmo o que ele tem? Por isso, de agora em diante, eu falarei muita coisa ao povo, por meio de parábolas, para que os nossos amigos e aqueles que desejarem saber a verdade possam encontrar o que procuram, enquanto os nossos inimigos e aqueles que não amam a verdade possam ouvir sem entender. Muitos, dessa gente, não estão no caminho da verdade. O profeta de fato descreveu todas essas almas sem discernimento, quando ele disse: ‘Pois o coração desse povo tornou-se fechado e duro, e os seus ouvidos estão embotados e não escutam, e os seus olhos eles os fecharam para não ver a verdade e para não a compreender nos seus corações’”.

151:1:5 16893 Os apóstolos não compreenderam totalmente o significado das palavras do Mestre. Enquanto André e Tomé conversavam mais com Jesus, Pedro e os outros apóstolos retiraram-se para uma outra parte do jardim, onde iniciaram uma discussão sincera e prolongada.

2. A INTERPRETAÇÃO DA PARÁBOLA


151:2:1 16894 Pedro e o grupo à sua volta chegaram à conclusão de que a parábola do semeador era uma alegoria, e que cada aspecto tinha um sentido oculto e, assim, decidiram ir a Jesus e pedir uma explicação. E, desse modo, Pedro aproximou-se do Mestre, dizendo: “Nós não somos capazes de penetrar no significado dessa parábola, e desejamos que tu a expliques para nós, já que disseste que a nós nos é dado conhecer os mistérios do Reino”. E, depois de ter ouvido isso, Jesus disse a Pedro: “Meu filho, não desejo esconder nada de ti, mas, primeiro, que tal se disseres a mim sobre o que acabaste de conversar; qual a tua interpretação da parábola?”

151:2:2 16895 Após um momento de silêncio, Pedro disse: “Mestre, nós falamos muito a respeito da parábola, e a interpretação pela qual eu optei é a seguinte: O semeador é o pregador do evangelho; a semente é a palavra de Deus. A semente que cai à beira do caminho representa aqueles que não compreendem o ensinamento do evangelho. Os pássaros, que apanham as sementes que caem no chão endurecido, representam Satã, ou o maligno, que rouba aquilo que foi semeado nos corações dos ignorantes. A semente que caiu nos locais rochosos, e que brotam tão subitamente, representam aquelas pessoas superficiais e irreflexivas que, ao ouvirem as boas-novas, recebem a mensagem com júbilo; mas, como a verdade não tem nenhuma raiz real no seu entendimento mais profundo, a sua devoção tem vida curta diante da atribulação e perseguição. Quando chegam as dificuldades, esses crentes tropeçam; e sucumbem, quando tentados. A semente que caiu entre os espinhos representa aqueles que ouvem a palavra com boa vontade, mas que permitem que as preocupações do mundo e a natureza enganadora das riquezas asfixiem o mundo da verdade, de modo que as verdades se tornam infrutíferas. Agora, as sementes que caíram no bom solo, e que cresceram até darem, algumas trinta, outras sessenta e outras até cem grãos, representam aqueles que, após terem ouvido a verdade, recebem-na em vários níveis de entendimento – devido aos seus dons intelectuais diferentes – e, por isso, manifestam esses vários graus de experiência religiosa”.

151:2:3 16901 Jesus, após ter ouvido a interpretação de Pedro, para a parábola, perguntou aos outros apóstolos se também eles tinham sugestões a oferecer. A esse convite apenas Natanael respondeu. Disse ele: “Mestre, ainda que eu reconheça muitas boas coisas na interpretação de Simão Pedro para a parábola, eu não concordo totalmente com ele. A minha idéia dessa parábola seria: A semente representa o evangelho do Reino, enquanto o semeador significa os mensageiros do Reino. A semente que caiu à margem do caminho, na parte endurecida do solo, representa aqueles que não ouviram senão pouco do evangelho, e também aqueles que são indiferentes à mensagem, e que endureceram os seus corações. Os pássaros do céu, que levaram as sementes que caíram à beira do caminho, representam os hábitos da nossa vida, a tentação do mal, e os desejos da carne. A semente que caiu na rocha representa aquelas almas emocionais que são rápidas para receber os ensinamentos novos, mas as que são igualmente rápidas para desistir da verdade, quando enfrentam as dificuldades e realidades para viver de acordo com essa verdade; a elas falta a percepção espiritual. A semente que caiu entre os espinhos representa aqueles que são atraídos para as verdades do evangelho; eles têm a intenção de seguir os ensinamentos, mas são impedidos pelo orgulho da vida, o ciúme, a inveja e as ansiedades da existência humana. A semente que caiu em bom solo, que cresceu até dar, algumas trinta, algumas sessenta e algumas cem grãos, representa os graus de capacidade natural e variável para compreender a verdade e responder aos seus ensinamentos espirituais, que têm os homens e as mulheres, pois possuem dons diferentes de iluminação de espírito”.

151:2:4 16902 Quando Natanael terminou de falar, os apóstolos e os seus companheiros entraram em uma discussão séria e mesmo em um debate profundo, alguns sustentando a correção da interpretação de Pedro, e um número quase igual deles tentava defender a explicação de Natanael para a parábola. Nesse ínterim, Pedro e Natanael tinham retirado-se para a casa, onde se envolveram em um esforço vigoroso e determinado para convencer e mudar a idéia, um ao outro.

151:2:5 16903 O Mestre permitiu que essa confusão ultrapassasse o limite da sua expressão mais intensa; então ele bateu com as palmas das mãos a fim de chamá-los para perto de si. Quando eles estavam todos reunidos à sua volta, uma vez mais, ele disse: “Antes de falar-vos sobre essa parábola, algum de vós tem qualquer coisa a dizer?” Depois de um momento de silêncio, Tomé falou: “Sim, Mestre, eu gostaria de dizer umas poucas palavras. Lembro-me de que tu nos falaste, certa vez, para que Tomésemos cuidado exatamente com isso. Tu ensinaste a nós que, quando usássemos exemplos nas nossas pregações, deveríamos empregar histórias verdadeiras, não fábulas, e que deveríamos escolher uma história que melhor se adequasse como exemplo da verdade central e vital a qual gostaríamos de ensinar ao povo, e que, uma vez tendo usado a história, não deveríamos tentar fazer um emprego espiritual de todos os detalhes menores envolvidos na narrativa da história. Eu sustento que Pedro e Natanael estão ambos errados nas suas tentativas de interpretar essa parábola. Admiro a capacidade deles para essas coisas, mas estou igualmente seguro de que todas as tentativas, como essas, de fazer uma parábola natural produzir analogias espirituais, em todos os seus aspectos, pode apenas resultar em confusão e em sérios erros de concepção, sobre o verdadeiro propósito de uma tal parábola. E fica plenamente provado que eu devo estar certo, pelo fato de que, se há uma hora atrás comungávamos de um só pensamento, agora estamos divididos em dois grupos separados que sustentam opiniões diferentes a respeito dessa parábola e que mantêm tais opiniões tão honestamente a ponto de até interferir, na minha opinião, com a nossa capacidade de compreender plenamente a grande verdade que tu tinhas em mente, quando tu apresentaste essa parábola à multidão e quando posteriormente nos pediste para tecer comentários sobre ela”.

151:2:6 16911 As palavras ditas por Tomé tiveram um efeito de acalmar a todos eles. Ele levou-os a lembrarem-se do que Jesus lhes tinha ensinado em ocasiões anteriores e, antes que Jesus continuasse a falar, André ergueu-se e disse: “Estou persuadido de que Tomé está certo, e gostaria que ele nos contasse qual significado ele atribui à parábola do semeador”. Depois que Jesus acenou para que Tomé falasse, ele disse: “Meus irmãos, eu não gostaria de prolongar esta discussão, mas, se assim o desejardes, direi que penso que essa parábola foi contada para ensinar-nos uma grande verdade. E esta é a de que os nossos ensinamentos sobre o evangelho do Reino, não importa quão fiel e eficientemente executemos as nossas missões divinas, serão acompanhados por vários níveis de êxito; e que todas essas diferenças, nos resultados, são devidas diretamente às condições inerentes às circunstâncias da nossa ministração, condições sobre as quais temos pouco ou nenhum controle”.

151:2:7 16912 Quando Tomé acabou de falar, a maioria dos seus companheiros pregadores estava pronta para concordar com ele, até mesmo Pedro e Natanael estavam, por sua vez, prontos a falar com ele, quando Jesus levantou-se e disse: “Muito bem, Tomé; tu discerniste bem o verdadeiro significado das parábolas; mas Pedro e Natanael, ambos, fizeram a vós todos um bem igual, pois eles mostraram plenamente o perigo de se tentar fazer uma alegoria das minhas parábolas. Nos vossos próprios corações, vós podeis muitas vezes fazer, com proveito, esses vôos de conjectura imaginativa, mas vós cometeis um erro quando buscais oferecer as conclusões como uma parte do vosso ensinamento público”.

151:2:8 16913 Agora que a tensão tinha passado, Pedro e Natanael congratulavam-se um com o outro pelas suas interpretações e, à exceção dos gêmeos Alfeus, cada um dos apóstolos aventurava-se a fazer uma interpretação da parábola do semeador antes de retirarem-se para dormir. Mesmo Judas Iscariotes ofereceu uma interpretação bastante plausível. Os doze freqüentemente, entre si próprios, iriam tentar imaginar as parábolas do Mestre, como tinham feito, por uma alegoria, mas nunca mais eles levaram essas especulações a sério. Essa foi uma sessão bastante proveitosa para os apóstolos e para seus colaboradores, especialmente porque, desde então, cada vez mais Jesus empregou parábolas no seu ensinamento público.

3. MAIS A RESPEITO DAS PARÁBOLAS


151:3:1 16914 A mente dos apóstolos adaptava-se bem às parábolas e, tanto assim, que toda a noite seguinte foi dedicada a mais uma discussão sobre as parábolas. Jesus iniciou a conferência da noite dizendo: “Meus amados, vós deveis sempre amoldar os vossos modos de ensinar, adequando assim, a vossa apresentação da verdade às mentes e aos corações que estão diante de vós. Quando estiverdes diante de uma multidão de intelectos e de temperamentos vários, vós não podereis falar palavras diferentes para cada tipo de ouvinte, mas vós podeis contar uma história que passe o vosso ensinamento; e cada grupo, cada indivíduo mesmo, será capaz de dar a sua própria interpretação à vossa parábola, de acordo com os próprios dons intelectuais e espirituais. Deveis deixar a vossa luz brilhar, mas o façais com sabedoria e discrição. Nenhum homem, quando acende uma lâmpada, cobre-a com um vaso ou põe-na debaixo da cama; ele põe a sua lâmpada em um pedestal, onde todos possam ver a luz. No Reino do céu, permiti que vos diga, nada que está escondido deixará de tornar-se manifestado; nem há segredo algum que não se fará afinal conhecido. Finalmente, todas essas coisas virão à luz. Não penseis apenas nas multidões, e em como elas ouvem a verdade; prestai atenção também em vós próprios, em como escutais. Lembrai-vos do que eu vos disse muitas vezes: Para aquele que tem será dado mais, enquanto daquele que não tem será tomado até mesmo aquilo que ele pensa que tem”.

151:3:2 16921 A discussão contínua sobre as parábolas e as outras instruções para a sua interpretação podem ser resumidas e expressas, na forma moderna seguinte:

151:3:3 16922 1. Jesus preveniu contra o uso, fosse de fábulas, fosse de alegorias, para o ensino das verdades do evangelho. Ele recomendava o uso livre de parábolas, especialmente parábolas naturalistas. Ele enfatizava o valor de utilizar-se das analogias existentes entre o mundo natural e o mundo espiritual, como um meio para ensinar-se a verdade. Ele freqüentemente fazia alusão ao natural, como sendo “a sombra irreal e fugaz das realidades do espírito”.

151:3:4 16923 2. Jesus narrou três ou quatro parábolas das escrituras dos hebreus, chamando a atenção para o fato de que esse método de ensinar não era totalmente novo. Contudo, tornou-se quase um método novo de ensinar, do modo como ele o empregou, desse momento em diante.

151:3:5 16924 3. Ao ensinar aos apóstolos o valor das parábolas, Jesus chamou a atenção para os pontos seguintes:

151:3:6 16925 A parábola faz um apelo a vários níveis diferentes, simultaneamente, da mente e do espírito. A parábola estimula a imaginação, desafia o senso de discernimento e provoca o pensamento crítico; ela promove a simpatia, sem despertar antagonismos.

151:3:7 16926 A parábola parte das coisas conhecidas e chega ao discernimento do desconhecido. A parábola utiliza o material e o natural, como um meio de apresentar o espiritual e o supramaterial.

151:3:8 16927 As parábolas favorecem a tomada de decisões morais imparciais. A parábola escapa de muitos preconceitos e joga na mente uma nova verdade, de um modo encantador; e a tudo isso ela faz despertando um mínimo de autodefesa, por ressentimento pessoal.

151:3:9 16928 Rejeitar a verdade contida na analogia parabólica requer uma ação intelectual consciente, que despreza diretamente o vosso próprio julgamento honesto e a vossa decisão equânime. A parábola conduz ao esforço do pensamento por meio do sentido da audição.

151:3:10 16929 O ensino, sob a forma de parábola, capacita aquele que ensina a apresentar verdades novas e até surpreendentes, e ao mesmo tempo evita amplamente qualquer controvérsia e choque externo com a tradição e com a autoridade estabelecida.

151:3:11 16931 A parábola também possui a vantagem de estimular a lembrança da verdade ensinada, quando as mesmas cenas conhecidas forem encontradas posteriormente.

151:3:12 16932 Desse modo, Jesus buscava deixar os seus seguidores inteirados das muitas razões que motivavam a sua prática de usar cada vez mais as parábolas nos seus ensinamentos públicos.

151:3:13 16933 Mais para o fim da lição da noite, Jesus fez o seu primeiro comentário sobre a parábola do semeador. Ele disse que a parábola referia-se a duas coisas: em primeiro lugar, era um exame da sua própria ministração, até aquele momento, e uma previsão do que ele teria diante de si, durante o restante da sua vida na Terra. E, em segundo lugar, era também uma alusão ao que os apóstolos e os outros mensageiros do Reino poderiam esperar na sua ministração, de geração para geração, com o passar do tempo.

151:3:14 16934 Jesus também recorreu ao uso de parábolas, como a melhor refutação possível do esforço estudado dos líderes religiosos em Jerusalém para ensinar que todo o seu trabalho era feito com a assistência de demônios e do príncipe dos diabos. O apelo à natureza contradizia esse ensinamento, já que o povo daquele tempo encarava todos os fenômenos naturais como o produto da ação direta de seres espirituais e de forças sobrenaturais. Ele também optou por esse método de ensinar porque o capacitava a proclamar verdades vitais àqueles que desejavam conhecer o melhor caminho, permitindo, ao mesmo tempo, aos seus inimigos menos oportunidade de terem motivo de ofensa e de acusações contra ele.

151:3:15 16935 Antes de dispensar o grupo naquela noite, Jesus disse: “Agora eu vou contar-lhes o final da parábola do semeador. Eu gostaria de testá-los para saber como receberão isto: O Reino do céu é também como um homem que joga a boa semente na terra; e, enquanto ele dormiu à noite, e foi cuidar dos seus afazeres do dia, a semente brotou e cresceu e, embora ele não soubesse como aconteceu aquilo, a planta veio a frutificar. Primeiro surgiu a folha, depois a espiga e, então, surgiu o grão inteiro na espiga. E, finalmente, quando o grão estava amadurecido, ele passou a foice, e a colheita terminou. Aquele que tem ouvidos para ouvir, que ouça”.

151:3:16 16936 Os apóstolos repassaram essa parte muitas vezes nas suas mentes, mas o Mestre nunca mais fez outra menção ao trecho adicional da parábola do semeador.

4. MAIS PARÁBOLAS À BEIRA-MAR


151:4:1 16937 No dia seguinte, Jesus novamente ensinou ao povo de dentro do barco, dizendo: “O Reino do céu é como um homem que lançou a boa semente no seu campo; mas, enquanto ele dormia, o seu inimigo veio e plantou ervas daninhas em meio ao trigo e foi-se embora rapidamente. E assim, quando as folhinhas surgiram e quando mais tarde estavam para dar fruto, apareceram também as ervas daninhas. Então, os servos desse dono da casa vieram e lhe disseram: ‘Senhor, não plantaste uma boa semente no teu campo? De onde então vieram essas ervas daninhas?’ E, então, ele respondeu aos seus servos: ‘Um inimigo fez isso’. Os servos então perguntaram ao senhor deles: ‘Tu gostarias que fôssemos lá e arrancássemos essas ervas daninhas?’ Mas ele respondeu a eles, dizendo: ‘Não, para que enquanto as estiverdes ajuntando, não arranques o trigo também. É melhor deixar que as duas cresçam juntas, até a hora da colheita, quando eu direi aos ceifadores: ajuntem primeiro as ervas daninhas e amarrem-nas em feixes para serem queimadas e depois ajuntem o trigo que será estocado no meu celeiro’”.

151:4:2 16938 Após algumas perguntas, feitas pelo povo, Jesus contou uma outra parábola: “O Reino do céu é como um grão de semente de mostarda, que um homem semeia no seu campo. Ora, uma semente de mostarda é o menor dos grãos, mas, quando ele chega à plenitude do crescimento, torna-se a maior de todas as ervas e é como uma árvore, de tal modo que os pássaros do céu são capazes de vir e descansar nos seus galhos”.

151:4:3 16941 “O Reino do céu é também como o fermento, que uma mulher escondeu em três medidas de farinha e, desse modo, aconteceu que toda a farinha ficou fermentada”.

151:4:4 16942 “O Reino do céu é também como um tesouro escondido em um campo, e que um homem descobriu. No seu júbilo ele foi vender tudo o que tinha, para que pudesse ter o dinheiro para comprar o campo”.

151:4:5 16943 “O Reino do céu é também como um mercador buscando belas pérolas; e, tendo encontrado uma pérola de grande preço, ele saiu e vendeu tudo o que possuía para poder ser capaz de comprar a pérola extraordinária”.

151:4:6 16944 “E mais, o Reino do céu é como uma rede de arrastão que foi lançada ao mar, e ela pegou toda espécie de peixes. Ora, quando a rede estava cheia, os pescadores puxaram-na até a praia, e ali se assentaram e separaram os peixes, ajuntando os bons em vasos enquanto, os ruins, eles jogaram fora”.

151:4:7 16945 Muitas outras parábolas Jesus contou à multidão. De fato, dessa época em diante, raramente ele ensinava às massas a não ser por esse meio. Depois de falar a uma audiência pública por meio de parábolas, durante as instruções da noite, ele gostava de expor mais plenamente e explicitamente os seus ensinamentos aos apóstolos e aos evangelistas.

5. A VISITA A QUERESA


151:5:1 16946 A multidão continuou a crescer durante a semana. No sábado, Jesus apressou-se a sair para as colinas, mas quando chegou o domingo de manhã, as multidões retornaram. Jesus falou a elas, na primeira parte da tarde, depois da pregação de Pedro e, quando ele acabou, disse aos seus apóstolos: “Estou cansado das multidões; atravessemos o lago para que possamos descansar do outro lado, por um dia”.

151:5:2 16947 No meio da travessia do lago eles depararam-se com uma daquelas violentas e súbitas tempestades de vento, que são características do mar da Galiléia, especialmente naquela estação do ano. Essa massa de água está a quase setecentos metros abaixo do nível dos oceanos e é cercada por margens altas, especialmente a oeste. Há gargantas escarpadas que vão do lago às montanhas e, quando o ar aquecido forma uma bolsa sobre o lago, durante o dia, há uma tendência, depois do pôr-do-sol, de que o ar resfriado das gargantas corra sobre o lago. Esses golpes de vento vêm rapidamente e algumas vezes vão embora subitamente também.

151:5:3 16948 Era exatamente uma dessas ventanias noturnas que surpreendeu o barco que levava Jesus ao outro lado, nessa noite de domingo. Três outros barcos, levando alguns dos evangelistas mais jovens, estavam atrás na mesma trilha. Essa tempestade foi severa, não obstante estivesse confinada a essa região do lago, não tendo havido nenhuma evidência de tempestade na margem do lado oeste. O vento foi tão forte que as ondas começaram a bater acima do barco. O vento rápido tinha rasgado a vela, antes que os apóstolos a tivessem podido enrolar, e agora eles dependiam totalmente dos seus remos, os quais manejavam vigorosamente para alcançar a margem a uns três quilômetros de distância.

151:5:4 16949 Enquanto tudo isso acontecia, Jesus encontrava-se adormecido na popa do barco, sob um pequeno abrigo. O Mestre estava cansado quando eles deixaram Betsaida, e foi para garantir um descanso que tinha pedido aos apóstolos para velejar com ele até o outro lado. Esses ex-pescadores eram remadores fortes e experientes; mas essa foi uma das piores tempestades que jamais tinham encontrado. Embora o vento e as ondas fizessem o barco sacudir tal e qual um brinquedo, Jesus não teve o seu sono perturbado. Pedro estava no remo do lado direito, perto da popa. Quando o barco começou a encher-se de água, ele soltou seu remo e, precipitando-se até Jesus, sacudiu-o vigorosamente para despertá-lo e, quando ele despertou, Pedro disse: “Mestre, não vês que estamos no meio de uma tempestade violenta? Se não nos salvares, pereceremos todos”.

151:5:5 16951 Quando Jesus saiu na chuva, primeiro olhou para Pedro e, depois mirando na escuridão para os remadores na luta, ele pôs seu olhar de volta em Simão Pedro, que, na sua agitação, não tinha ainda voltado para o seu remo, e disse: “Por que estais tão cheios de medo? Onde está a vossa fé? Paz, acalmai-vos”. Mal Jesus tinha dado essa resposta a Pedro e aos outros apóstolos, e mal ele tinha pedido a Pedro que buscasse a paz com a qual aquietar a sua alma agoniada, quando a atmosfera perturbada restabeleceu o seu equilíbrio, veio a calmaria e o tempo ficou estabilizado. As ondas revoltas abaixaram quase que imediatamente, enquanto as nuvens escuras, tendo despejado-se naquela chuva curta, desapareceram, e as estrelas do céu brilharam acima. Tudo isso era uma pura coincidência, pelo que podemos julgar; mas os apóstolos, e Simão Pedro em particular, nunca deixaram de considerar o episódio como um milagre da natureza. Era especialmente fácil para os homens daquela época crerem em milagres da natureza, porquanto eles acreditavam firmemente que toda a natureza era um fenômeno diretamente sob o controle de forças espirituais e de seres sobrenaturais.

151:5:6 16952 Jesus explicou claramente aos doze que ele havia falado aos seus espíritos perturbados e dirigiu-se às suas mentes dominadas pelo medo, e que não tinha comandado os elementos a obedecerem a sua palavra, mas isso de nada valeu. Os seguidores do Mestre persistiram sempre em dar a sua própria interpretação a todos esses acontecimentos coincidentes. Desse dia em diante eles insistiram em considerar o Mestre como tendo poder absoluto sobre os elementos naturais. Pedro nunca se cansou de contar como “mesmo os ventos e as ondas obedecem a ele”.

151:5:7 16953 Quando Jesus e os seus companheiros chegaram à margem já era tarde da noite e, posto que fosse uma noite calma e bela, todos descansaram nos barcos, indo à praia somente pouco depois do amanhecer, na manhã seguinte. Quando estavam todos reunidos, cerca de quarenta pessoas ao todo, Jesus disse: “Permaneçamos lá, nas colinas, por uns dias, enquanto ponderamos sobre os problemas do Reino do Pai”.

6. O LUNÁTICO DE QUERESA


151:6:1 16954 A maior parte das margens vizinhas do lado leste do lago dava acesso às colinas por meio de rampas suaves, mas nesse ponto do desembarque, em particular, havia um declive íngreme; a margem em alguns lugares caía de modo brusco até o lago. Apontando para o lado da colina próxima, Jesus disse: “Vamos até aquela colina para tomarmos o desjejum e para descansarmos e conversarmos, bem abrigados”.

151:6:2 16955 Todo esse lado da colina era repleto de cavernas, que tinham sido lavradas na rocha. Muitos desses nichos eram antigos sepulcros. Na metade da subida da colina, em um local relativamente nivelado, estava o cemitério da pequena aldeia de Queresa. Quando Jesus e os seus seguidores passaram perto desse local de sepulturas, um lunático, que vivia em uma caverna desse lado da colina, correu até eles. Esse homem demente era bem conhecido nessas paragens, tendo uma vez sido aprisionado com algemas e correntes e confinado a uma das grotas. Havia já algum tempo que ele rompera os grilhões e agora errava à vontade pelas tumbas e sepulcros abandonados.

151:6:3 16961 Esse homem, de nome Amós, era afligido de forma periódica por uma insanidade. Havia longos períodos em que ele vestia alguma roupa e comportava-se bastante bem entre os companheiros. Durante um desses intervalos de lucidez, ele tinha ido a Betsaida, onde pôde ouvir a pregação de Jesus e dos apóstolos e, naquele momento tornou-se meio-crente do evangelho do Reino. Mas logo adveio uma fase tempestuosa do seu problema, e ele fugiu para as tumbas, onde se lamentava, gritava alto e assim se conduzia de modo a aterrorizar todos aqueles que acaso o encontrassem.

151:6:4 16962 Ao reconhecer Jesus, Amós caiu a seus pés e exclamou: “Eu te conheço, Jesus, mas estou possuído por muitos diabos, e suplico-te que não me atormentes”. Esse homem realmente acreditava que a sua aflição mental periódica era devido ao fato de que, nesses momentos, os espíritos maus ou impuros entravam nele e dominavam sua mente e seu corpo. Os seus problemas eram mais emocionais – o seu cérebro não estava gravemente doente.

151:6:5 16963 Jesus, vendo abaixo de si o homem humilhando-se como um animal a seus pés, tomou-o pela mão, levantou-o e disse a ele: “Amós, tu não estás possuído por nenhum demônio; tu já ouviste a boa-nova de que tu és um filho de Deus. Eu ordeno que saias desse transe”. E, quando Amós ouviu Jesus dizendo essas palavras, ocorreu uma tal transformação no seu intelecto que ele imediatamente voltou a ter a mente sadia e o controle normal das suas emoções. Nesse momento uma multidão considerável de uma aldeia próxima estava reunida, e essa gente, acrescida dos pastores de porcos das terras de cima, estava atônita de ver o lunático assentado com Jesus e os seus seguidores, na posse de uma mente sã e conversando livremente com eles.

151:6:6 16964 Enquanto os pastores correram à aldeia para contar as novidades do lunático domado, os cães atacaram uma pequena vara de cerca de trinta porcos, levando a maioria deles a um precipício, caindo no mar. E foi essa ocorrência acidental, ligada à presença de Jesus e à suposta cura miraculosa do lunático, que deu origem à lenda de que Jesus tinha curado Amós, retirando dele uma legião de demônios, e que esses demônios tinham entrado na vara de suínos, levando-os, em seguida, a precipitarem-se para a destruição, no mar abaixo. Antes de terminar o dia, esse episódio tinha tornado-se público entre os criadores de porcos e toda a aldeia acreditou nele. Com toda certeza Amós acreditou nessa história; ele viu os porcos pulando do cimo da colina pouco depois que a sua mente perturbada ficara calma, e sempre acreditou que eles levaram consigo os maus espíritos os quais, durante tanto tempo, o haviam atormentado e afligido. E isso tinha muito a ver com a confirmação da sua cura. É igualmente verdade que todos os apóstolos de Jesus (exceto Tomé) acreditaram que o episódio dos porcos estava diretamente ligado à cura de Amós.

151:6:7 16965 Jesus não teve o descanso que buscava. Durante a maior parte daquele dia foi atropelado por aqueles que vieram estimulados pela notícia de que Amós tinha sido curado, e que foram atraídos pela história de que os demônios tinham saído do lunático indo para dentro da vara de porcos. E assim, depois de só uma noite de descanso, cedo na manhã de terça-feira, Jesus e os seus amigos foram acordados por uma delegação desses gentios criadores de porcos que tinha vindo para pedir que ele fosse embora dali. O porta-voz deles disse a Pedro e a André: “Pescadores da Galiléia, ide para longe de nós e levai o vosso profeta convosco. Nós sabemos que ele é um homem santo, mas os deuses da nossa terra não o conhecem, e nós ficamos ameaçados de perder muitos porcos. O medo de vós desceu sobre nós, de modo que oramos para que ide daqui”. E, quando os ouviu, Jesus disse a André: “Retornemos à nossa casa”.

151:6:8 16971 Quando eles estavam para partir, Amós implorou a Jesus que permitisse que ele fosse junto, mas o Mestre não o permitiu. Disse Jesus a Amós: “Não esqueças de que és um filho de Deus. Volta para o teu próprio povo e mostra a eles as grandes coisas que Deus fez para ti”. E Amós foi a todos os lugares para tornar público que Jesus tinha expulsado da sua perturbada alma uma legião de demônios, e que esses espíritos maus tinham entrado em uma vara de porcos, levando-os à destruição imediata. E ele não parou, enquanto não foi a todas as cidades da Decápolis, declarando as grandes coisas que Jesus tinha feito por ele.

DOCUMENTO 152

OS ACONTECIMENTOS QUE LEVARAM À CRISE DE CAFARNAUM
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A história da cura de Amós, o lunático de Queresa, tinha já alcançado Betsaida e Cafarnaum, de modo que uma grande multidão estava esperando por Jesus, quando o seu barco aportou naquela terça-feira pela manhã. Em meio a essa multidão estavam os novos observadores do sinédrio de Jerusalém que tinham vindo a Cafarnaum para buscar motivo para a apreensão e a condenação do Mestre. Enquanto Jesus falava com aqueles que estavam reunidos para cumprimentá-lo, Jairo, um dos chefes da sinagoga, abriu caminho no meio da gente e, caindo a seus pés, tomou-o pela mão e implorou que Jesus se apressasse dali com ele, dizendo: “Mestre, a minha filha pequena, única filha, está na minha casa a ponto de morrer. Eu suplico que venha e cure-a”. Ao ouvir o pedido desse pai, Jesus disse: “Irei contigo”.

152:0:2 16982 Quando Jesus foi junto com Jairo, a grande multidão que tinha ouvido o pedido do pai seguiu-os para ver o que aconteceria. Pouco antes de chegar à casa de Jairo, apressando-se por um beco estreito e, enquanto a multidão o abalroava, Jesus parou de súbito, exclamando: “Alguém tocou em mim”. E quando aqueles que estavam perto dele negaram que tivessem tocado nele, Pedro falou: “Mestre, podes ver que toda essa gente te aperta, ameaçando comprimir-nos, e tu ainda dizes ‘alguém tocou em mim’. O que queres dizer?” Então Jesus disse: “Eu perguntei quem tocou em mim, pois eu percebi que uma energia de vida emanou de mim”. Quando Jesus olhou em volta de si, os seus olhos caíram sobre uma mulher que estava perto e que, adiantando-se, ajoelhou aos seus pés e disse: “Durante anos eu tenho sido afligida por uma forte hemorragia. Tenho sofrido bastante nas mãos de muitos médicos; gastei todas as minhas posses, mas ninguém pôde curar-me. Então eu ouvi falar de ti e pensei que se eu pudesse apenas tocar a bainha da tua veste, eu seria certamente curada. E, assim, eu me comprimi entre as pessoas, enquanto elas se moviam até que, estando perto de ti, Mestre, eu toquei na borda da tua veste, e eu me tornei curada; eu sei que fui curada da minha aflição”.

152:0:3 16983 Quando Jesus ouviu isso, ele tomou a mulher pela mão e, levantando-a, disse: “Filha, a tua fé te curou; vai em paz”. Foi a fé e não o tocar na veste que curou a mulher. E esse caso é uma boa ilustração de muitas curas aparentemente miraculosas que aconteceram na carreira terrena de Jesus, mas que, em nenhum sentido, resultaram de um desejo consciente dele. O passar do tempo demonstrou que essa mulher realmente ficou curada da sua doença. A sua fé era daquela natureza que dispunha diretamente do poder criativo que residia na pessoa do Mestre. Com a fé que tinha, era necessário apenas aproximar-se da pessoa do Mestre. Não seria de todo necessário que tocasse a sua veste; aquilo era apenas a parte supersticiosa da crença dela. Jesus fez vir essa mulher, originária de Cesaréia-Filipe, chamada Verônica, à sua presença, para corrigir dois erros que poderiam ter ficado na mente dela, ou que poderiam ter persistido nas mentes daqueles que testemunharam essa cura: Ele não queria que Verônica fosse embora pensando que o seu medo, de tentar apossar-se da própria cura, tivesse tido alguma justificação, nem que a sua superstição de associar o toque na roupa dele à sua cura tivesse tido algum efeito. Ele desejava que todos soubessem que a sua fé pura e viva, tinha sido o que havia operado a sua cura.

1. NA CASA DE JAIRO


152:1:1 16991 Claro está que Jairo estava terrivelmente impaciente com a demora para chegar à sua casa; e, por isso, agora eles apressavam-se a passos mais largos. Antes mesmo de que tivessem entrado no jardim do dirigente da sinagoga, um dos seus servos veio para fora, dizendo: “Não incomodeis o Mestre; a vossa filha está morta”. Mas Jesus pareceu não dar atenção às palavras do servo, pois havia voltado a sua atenção para Pedro, Tiago e João; e então ele voltou-se para o pai agoniado: “Não temas; apenas crê”. Quando entrou na casa, ele já encontrou lá os tocadores de flauta com as pranteadoras, que estavam fazendo um tumulto inconveniente; os parentes ali choravam e se lamuriavam. Jesus, então, depois de colocar para fora do quarto todos os lamentadores, entrou com o pai e a mãe e os seus três apóstolos. Ao dizer para os lamentadores que a menina não estava morta, eles riram dele, com escárnio. Jesus, agora, voltava-se a para mãe, dizendo: “A tua filha não está morta; está adormecida apenas”. E, quando a casa voltou à calma, Jesus foi até onde a criança estava, tomou-a pela mão e disse: “Filha, eu te digo, desperta e levanta-te!” E, ao ouvir essas palavras, a menina imediatamente levantou-se e caminhou atravessando o quarto. E, em breve, depois que ela se recuperou do seu torpor, Jesus aconselhou-as a darem a ela algo para comer, pois ela estivera muito tempo sem alimento.

152:1:2 16992 Posto que houvesse bastante agitação, em Cafarnaum, contra Jesus, ele reuniu a família e explicou que a criança tinha passado por um estado de coma após uma longa febre, que ele a tinha meramente despertado e que, portanto, não a havia ressuscitado dos mortos. A mesma coisa foi explicada aos seus apóstolos, porém inutilmente; todos acreditaram que ele havia trazido a menina de entre os mortos. O que Jesus dizia para explicar muitos desses milagres aparentes tinha pouco efeito sobre os seus seguidores. Todos mantinham nas mentes a expectativa de milagres e não perdiam nenhuma oportunidade de atribuir a Jesus qualquer prodígio. Jesus e os apóstolos voltaram para Betsaida, não sem que ele antes tivesse recomendado, especificamente, a todos eles, que nada dissessem a ninguém sobre isso.

152:1:3 16993 Quando saiu da casa de Jairo, dois homens cegos, conduzidos por um menino mudo, seguiram-no e gritaram pedindo a cura. Nessa altura, o renome de Jesus como curador encontrava-se no seu apogeu. Por todos os locais aonde ia, os doentes e os aflitos esperavam por ele. O Mestre parecia, agora, estar muito desgastado, e todos os seus amigos estavam ficando preocupados, temendo que o seu trabalho de ensinar e de curar fosse levado até um verdadeiro colapso.

152:1:4 16994 Os apóstolos de Jesus, e a gente comum ainda mais, não podiam entender a natureza e os atributos desse Deus-homem. Nem qualquer geração posterior teria sido capaz de avaliar o que acontecera na Terra, com a pessoa de Jesus de Nazaré. E nunca pôde haver uma oportunidade para a ciência, nem para a religião, de averiguar esses acontecimentos notáveis, pela simples razão de que uma situação tão extraordinária não poderá jamais acontecer novamente, seja neste mundo seja em qualquer outro mundo de Nebadon. Nunca, de novo, em qualquer mundo, em todo este universo, aparecerá um ser à semelhança da carne mortal, que incorpore ao mesmo tempo todos os atributos de energia criativa combinados aos dons espirituais que transcendem o tempo e a maior parte de outras limitações materiais.

152:1:5 17001 Nunca antes, desde que Jesus esteve na Terra, nem depois, foi possível, tão direta e vividamente, assegurar os resultados que acompanhavam a fé viva e forte dos homens e mulheres mortais. Para repetir esses fenômenos, teríamos de ir à presença direta de Michael, o Criador, e encontrá-lo como ele era naqueles dias – o Filho do Homem. Do mesmo modo, hoje, quando a ausência de Cristo-Michael não permite essas manifestações materiais, vós deveríeis abster-vos de colocar qualquer espécie de limitação à demonstração possível do seu poder espiritual. Embora o Mestre esteja ausente, como ser material, ele está presente como uma influência espiritual nos corações dos homens. Ao ir embora deste mundo, Jesus tornou possível ao seu espírito viver ao lado do espírito do seu Pai, que reside nas mentes de toda humanidade.

2. ALIMENTANDO OS CINCO MIL


152:2:1 17002 Jesus continuou a ensinar ao povo durante o dia, enquanto à noite ele instruía os apóstolos e os evangelistas. Na sexta-feira ele concedeu uma licença de uma semana, para que todos os seus seguidores pudessem passar uns poucos dias em suas casas ou junto dos seus amigos, antes de se preparar para ir até Jerusalém presenciar a Páscoa. Todavia, mais da metade dos seus discípulos recusou-se a deixá-lo, e a multidão crescia diariamente, e tanto assim que Davi Zebedeu quis montar um novo acampamento, mas Jesus não consentiu. O Mestre teve tão pouco tempo para descansar no sábado, que, na manhã de domingo, 27 de março, ele tentou escapar do povo. Alguns dos evangelistas foram deixados para falar à multidão, enquanto Jesus e os doze planejavam escapar, sem serem notados, para a margem oposta do lago, onde eles se propunham conseguir o descanso tão necessário, em um belo parque ao sul de Betsaida-Júlias. Essa região era um recanto favorito de passeio para a gente de Cafarnaum; eles todos conheciam bem esses parques da margem leste.

152:2:2 17003 Mas o povo não quis entender isso. Eles viram a direção tomada pelo barco de Jesus e, alugando todas as embarcações disponíveis, saíram atrás. Aqueles que não puderam conseguir barcos foram caminhando a pé em torno do lago até a extremidade.

152:2:3 17004 No final da tarde, mais de mil pessoas haviam localizado o Mestre em um dos parques, e ele falou-lhes com brevidade, sendo secundado por Pedro. Muitos, dessa multidão, tinham trazido alimentos consigo e, depois de tomarem a refeição da noite, reuniram-se em grupos pequenos, enquanto os apóstolos e os discípulos de Jesus ensinavam a eles.

152:2:4 17005 Na segunda-feira à tarde, a multidão tinha aumentado, chegando a mais de três mil pessoas. E ainda – noite adentro – o povo continuava a afluir, trazendo consigo todas as espécies de doentes. Centenas de pessoas interessadas tinham feito os seus planos de parar em Cafarnaum, para ver e ouvir Jesus, a caminho da Páscoa; e eles simplesmente se negavam a decepcionar-se. Na quarta-feira, por volta do meio-dia, cerca de cinco mil homens, mulheres e crianças estavam reunidos ali, naquele parque ao sul de Betsaida-Júlias. O tempo permanecia agradável, estando perto do final da temporada das chuvas, naquela localidade.

152:2:5 17006 Filipe tinha uma provisão de alimento de três dias, para Jesus e os doze, que estava sob a custódia do jovem Marcos, o garoto faz-tudo. À tarde, desse que era o terceiro dia, para quase a metade da multidão, os alimentos que o povo havia trazido consigo tinham praticamente acabado. Davi Zebedeu não contava ali com nenhuma cidade de tendas para acomodar e alimentar as multidões. E Filipe também não tinha feito uma provisão de alimentos para um número tal de pessoas. Mas o povo, mesmo estando com fome, não ia embora. Estava sendo difundido, reservadamente, que Jesus, desejando evitar complicações, tanto com Herodes, quanto com os líderes de Jerusalém, tinha escolhido esse local sossegado, fora da jurisdição de todos os seus inimigos, como sendo o lugar adequado para ser coroado rei. O entusiasmo do povo aumentava a cada momento. Nem uma palavra foi dita a Jesus, embora, está claro, ele soubesse de tudo que estava acontecendo. Mesmo os doze apóstolos ainda achavam-se confusos sobre essas questões, especialmente os evangelistas mais jovens. Os apóstolos que eram a favor dessa tentativa de proclamar Jesus como rei eram Pedro, João, Simão zelote e Judas Iscariotes. Aqueles que se opunham ao plano eram André, Tiago, Natanael, e Tomé. Mateus, Filipe e os gêmeos Alfeus não tomaram posição. Quem liderava essa trama para fazer, de Jesus, um rei, era Joab, um dos jovens evangelistas.

152:2:6 17011 Essa era a situação por volta das cinco horas, na quarta-feira à tarde, quando Jesus pediu a Tiago Alfeu para convocar André e Filipe. Disse Jesus: “O que faremos com a multidão? Eles estão conosco já há três dias, e muitos deles estão famintos. Eles não têm alimentos”. Filipe e André trocaram olhares, e então Filipe respondeu: “Mestre, tu deverias mandar essa gente embora, para que todos possam ir às aldeias próximas, para comprar alimentos”. E André, temendo que aquela trama da coroação do rei se tornasse real, aderiu prontamente a Filipe e disse: “Sim, Mestre, acho que é melhor que tu despeças a multidão, para que cada um possa seguir o seu caminho e comprar alimentos, enquanto tu te assegurarás um descanso por um período”. Nessa altura, outros dos doze tinham aderido à conversa. Então, disse Jesus: “Mas não desejo mandá-los embora, com fome; não podeis alimentá-los?” Isso era demais para Filipe, e ele logo respondeu: “Mestre, neste local do interior, onde poderemos comprar pão para toda essa gente? O equivalente a duzentos denários em pão ainda não daria nem para o almoço”.

152:2:7 17012 Antes que os apóstolos tivessem a oportunidade de expressar-se, Jesus voltou-se para André e Filipe, dizendo: “Eu não quero mandar essa gente embora. Aqui estão eles, como ovelhas sem um pastor. Eu gostaria de alimentá-los. Que alimentos temos conosco?” Enquanto Filipe estava conversando com Mateus e Judas, André procurou o menino Marcos para certificar-se de quanto ainda tinham de provisões. Ele voltou a Jesus, dizendo: “O garoto só tem mais cinco pães de cevada e dois peixes secos” – e Pedro prontamente acrescentou: “E nós ainda temos de comer esta noite”.

152:2:8 17013 Por um momento Jesus permaneceu em silêncio. Os seus olhos mostravam que estava distante. Os apóstolos nada disseram. Jesus subitamente voltou-se para André e disse: “Traze-me os pães e os peixes”. E, depois que André tinha trazido a cesta a Jesus, o Mestre disse: “Instrui ao povo para que se assente na relva, divididos em grupos de cem, e que apontem um líder para cada grupo, enquanto irás trazer todos os evangelistas até aqui, para junto de nós”.

152:2:9 17014 Jesus tomou os pães nas suas mãos e, depois de ter agradecido, ele partiu o pão e o deu aos seus apóstolos, que o passaram aos seus condiscípulos, que por sua vez o levaram à multidão. Do mesmo modo, Jesus partiu e distribuiu os peixes. E essa multidão comeu e ficou satisfeita. E, quando terminaram de comer, Jesus disse aos discípulos: “Ajuntai os pedaços remanescentes, para que nada se perca”. E, quando eles tinham acabado de reunir os fragmentos, contavam com doze cestas cheias. Os que comeram desse banquete extraordinário foram cerca de cinco mil homens, mulheres e crianças.

152:2:10 17021 E esse foi o primeiro e o único milagre, com a natureza, que Jesus fez depois de um planejamento prévio consciente. É bem verdade que os seus discípulos estavam dispostos a chamar muitas coisas de milagres, coisas que não o eram, mas essa foi uma ministração sobrenatural genuína. Nesse caso, e assim nos foi ensinado, Michael multiplicou os elementos da comida, como ele sempre faz, exceto pela eliminação do fator tempo e do processo vital visivelmente observável.

3. O EPISÓDIO DA COROAÇÃO DO REI


152:3:1 17022 A alimentação das cinco mil pessoas, por meio de energia sobrenatural, foi um outro desses casos em que a piedade humana somada ao poder criativo, haviam levado ao que aconteceu. E, agora, que a multidão tinha sido alimentada plenamente e, desde que a fama de Jesus estava, ali e agora, aumentada por esse milagre estupendo, o projeto de se pegar o Mestre e de proclamá-lo rei, não mais requeria o comando pessoal de ninguém. A idéia parecia espalhar-se na multidão, como uma doença contagiosa. Era profunda e irresistível a reação da multidão a esse suprimento súbito e espetacular das suas necessidades físicas. Por um longo tempo, tinha sido ensinado aos judeus que o Messias, o filho de Davi, quando viesse, faria fluir de novo da terra o leite e o mel, e que o pão da vida seria concedido a eles como o maná do céu que supostamente teria caído para os seus ancestrais no deserto. E não tinha toda essa expectativa agora sido cumprida bem diante dos olhos de todos? Quando essa multidão faminta, subnutrida, tinha terminado de fartar-se com o alimento milagroso, não houve senão uma reação unâmine: “Aqui está o nosso rei”. O ser milagroso, o libertador de Israel tinha chegado. Aos olhos desse povo de mente simples, o poder de alimentar trazia consigo o direito de governar. Não é de se estranhar, então, que a multidão, depois de ter terminado o banquete, se levantasse como um só homem e gritasse: “Façamos dele um rei!”

152:3:2 17023 Esse grito poderoso entusiasmou a Pedro e aos apóstolos que ainda mantinham a esperança de ver Jesus reivindicar o seu direito de governar. Mas essas esperanças falsas não durariam muito. Esse grito poderoso da multidão mal tinha acabado de reverberar nas rochas próximas, quando Jesus subiu em uma pedra imensa e, levantando a sua mão direita para chamar a atenção, disse: “Meus filhos, a vossa intenção é boa, mas tendes uma visão curta e uma mente material”. Houve uma breve pausa; e esse galileu inflexível estava colocado majestosamente ali, sob o brilho encantador daquele crepúsculo oriental. Cada detalhe da sua figura era o de um rei, enquanto ele continuava a falar à sua multidão estupefata: “Gostaríeis de fazer de mim um rei, mas não porque as vossas almas foram iluminadas por uma grande verdade, e sim porque os vossos estômagos foram enchidos de pão. Quantas vezes eu não vos disse que o meu Reino não é deste mundo? Este Reino do céu, que eu proclamo, é uma fraternidade espiritual, e nenhum homem governa nele assentado em um trono material. O meu Pai no céu é o Soberano infinitamente-sábio e Todo-Poderoso dessa fraternidade espiritual dos filhos de Deus na Terra. Será que eu falhei tanto assim, ao revelar-vos o Pai dos espíritos, para que queirais fazer um rei deste Filho na carne? Agora todos vós ides daqui para as vossas casas. Se deveis ter um rei, que o Pai das luzes seja entronizado nos corações de cada um de vós, como o Soberano espiritual de todas as coisas”.

152:3:3 17024 Essas palavras de Jesus dispersaram a multidão, atordoada e desalentada. Muitos que tinham crido nele deram-lhe as costas e não mais o seguiram a partir daquele dia. Os apóstolos estavam sem palavras e, reunidos, ficaram em silêncio, ao lado das doze cestas com os fragmentos do alimento; apenas o menino Marcos falou: “E ele negou-se a ser o nosso rei”. Jesus, antes de retirar-se para ficar a sós nas colinas, voltou-se para André e disse: “Leva os teus irmãos de volta para a casa de Zebedeu e ora com eles, especialmente pelo vosso irmão Simão Pedro”.

4. A VISÃO NOTURNA DE SIMÃO PEDRO


152:4:1 17031 Os apóstolos – por sua própria conta – e sem o seu Mestre, entraram no barco e em silêncio começaram a remar para Betsaida, na margem ocidental do lago. Nenhum dos doze achava-se tão oprimido e abatido quanto Simão Pedro. Quase nada foi dito; eles todos estavam pensando no Mestre, sozinho nas colinas. Teria ele os abandonado? Nunca antes ele os tinha mandado a todos embora e negado-se a ir com eles. O que significaria tudo aquilo?

152:4:2 17032 A escuridão desceu sobre eles e, pois, tinha surgido um vento forte e contrário, que tornava quase impossível seguir para frente. Depois que passaram as horas de escuridão e de dificuldade de remar, Pedro ficou cansado e caiu em um sono profundo de exaustão. André e Tiago colocaram-no para descansar no assento de almofada na popa do barco. Enquanto os outros apóstolos lutavam contra o vento e as ondas, Pedro teve um sonho; ele teve a visão de Jesus vindo a eles, caminhando sobre o mar. E quando o Mestre parecia chegar ao barco, Pedro gritou: “Salva-nos, Mestre, salva-nos”. Aqueles que estavam na parte traseira do barco ouviram-no dizendo algumas dessas palavras. E essa aparição na noite prosseguiu na mente de Pedro, até sonhar com Jesus, que dizia: “Tende ânimo; sou eu; não tenhais medo”. Isso foi como o bálsamo de Gilead para a alma perturbada de Pedro; acalmou o seu espírito conturbado, e assim no seu sonho ele gritou para o Mestre: “Senhor, se realmente és tu, diga para que eu vá e caminhe contigo sobre as águas”. E, quando Pedro começou a caminhar sobre as águas, as ondas impetuosas amedrontaram-no, e ele estava quase afogando, quando gritou: “Senhor, salva-me!” E muitos dos doze ouviram-no soltar esse grito. Então Pedro sonhou que Jesus viera socorrê-lo e, estendendo a mão até ele, tomou-a e levantou-o, dizendo: “Ó, tu que tens pouca fé, por que duvidaste?”

152:4:3 17033 Durante a última parte do seu sonho, Pedro levantou-se do assento onde dormia e de fato caminhou para fora do barco até cair na água. E despertou do seu sonho quando André, Tiago e João alcançaram-no e tiraram-no do mar.

152:4:4 17034 Para Pedro, essa experiência foi sempre real. Ele acreditava sinceramente que Jesus veio até eles naquela noite. Ele convenceu João Marcos apenas parcialmente, o que explica por que Marcos deixou uma parte dessa história de fora da sua narrativa. Lucas, o médico, que fez uma busca cuidadosa sobre essas questões, concluiu que o episódio fora uma visão de Pedro e, portanto, recusou-se a dar lugar a essa história, quando preparou a sua narrativa.

5. DE VOLTA A BETSAIDA


152:5:1 17035 Na quinta-feira pela manhã, antes do dia nascer, eles ancoraram seu barco quase na margem, perto da casa de Zebedeu e procuraram dormir até por volta do meio-dia. André foi o primeiro a levantar-se e, indo para uma caminhada à beira do mar, encontrou Jesus, em companhia do menino Marcos, assentado em uma pedra na borda do mar. Não obstante os evangelistas jovens e muitos da multidão terem procurado por Jesus toda a noite e grande parte do dia seguinte, nas colinas do lado oriental, pouco depois da meia-noite ele e o menino Marcos tinham começado a caminhar em torno do lago e foram atravessando o rio e chegaram de volta em Betsaida.

152:5:2 17041 Dos cinco mil que foram miraculosamente alimentados e que, quando os seus estômagos estavam cheios e os seus corações vazios, queriam fazer dele um rei, apenas quinhentos continuaram seguindo-o. Mas, antes que esses últimos recebessem a notícia de que ele estava de volta a Betsaida, Jesus pediu a André para reunir os doze apóstolos e a todos os outros, incluindo as mulheres, dizendo: “Eu desejo falar com eles”. E, quando todos estavam prontos, Jesus disse:

152:5:3 17042 “Por quanto tempo devo suportar-vos? Será que todos vós sois lentos de compreensão espiritual e deficientes de fé viva? Todos esses meses eu vos ensinei as verdades do Reino e vós ainda estais dominados por motivos materiais, em vez de fazerdes considerações espirituais. Não lestes nas escrituras, em que Moisés exortou os filhos descrentes de Israel, dizendo: ‘Não temais, permanecei tranqüilos e vede a salvação do Senhor’? Disse o salmista: ‘Colocai a vossa confiança no Senhor. ’ ‘Sede pacientes, aguardai o Senhor e tende boa coragem. Ele irá fortalecer os vossos corações’. ‘Deixai a vossa carga nos ombros do Senhor, e ele vos sustentará. Confiai nele em todos os momentos, e desabafai os vossos corações com ele, pois Deus é o vosso refúgio’. ‘Aquele que reside no local secreto do Altíssimo, morará sob a sombra do Todo-Poderoso’. ‘É melhor confiar no Senhor do que colocar a vossa confiança em príncipes humanos’.

152:5:4 17043 “E, agora, todos vós ainda não vedes que operar milagres e efetuar prodígios materiais não conquistarão almas para o Reino espiritual? Nós alimentamos a multidão, mas isso não levou as pessoas a ficarem famintas pelo pão da vida, nem a terem sede das águas da retidão espiritual. Quando a sua fome ficou satisfeita, eles não buscaram a entrada no Reino do céu, mas buscaram, antes, proclamar rei ao Filho do Homem, à maneira dos reis deste mundo, apenas para que continuassem a comer o pão sem ter de trabalhar para tanto. E, tudo isso, de que muitos de vós participastes mais ou menos, nada faz, no sentido de revelar o Pai do céu, nem faz com que progrida o Seu Reino na Terra. Não temos inimigos suficientes entre os líderes religiosos da Terra, sem fazer coisas que nos levem a estar alienados também para as próprias leis civis? Eu oro ao Pai no intuito de que unja os vossos olhos, para que possais ver, e abra os vossos ouvidos, para que possais ouvir e ter finalmente uma fé plena no evangelho que eu vos ensinei”.

152:5:5 17044 Jesus então anunciou que gostaria de retirar-se por uns poucos dias e descansar com os seus apóstolos, antes que eles se aprontassem para ir a Jerusalém para a Páscoa, e ele proibiu qualquer dos discípulos e a multidão de segui-lo. E, desse modo, foram, de barco, para a região de Genesaré a fim de ter dois ou três dias de descanso e de sono. Jesus estava preparando-se para a grande crise da sua vida na Terra e, por isso, passou muito tempo em comunhão com o Pai no céu.

152:5:6 17045 As novidades da alimentação das cinco mil pessoas e da tentativa de fazer de Jesus um rei despertaram uma curiosidade que se espalhou acirrando o medo dos líderes religiosos e dos governantes civis, em toda a Galiléia e na Judéia. Conquanto esse grande milagre nada mais tenha feito para promover o evangelho do Reino, junto às almas de crentes pouco entusiastas e de mentes materiais, contudo, ele serviu ao propósito de fazer incidir sobre as suas cabeças, todas as tendências para a necessidade de milagres e de ânsia por um rei, alimentadas pela família direta de apóstolos e discípulos próximos de Jesus. Esse episódio espetacular colocou um fim ao período inicial de ensinamentos, aperfeiçoamento e cura, preparando desse modo o caminho para a inauguração desse último ano e a proclamação das fases mais elevadas e mais espirituais do novo evangelho do Reino – a filiação divina, a liberdade espiritual e a salvação eterna.

6. EM GENESARÉ


152:6:1 17051 Enquanto descansava na casa de um rico crente na região de Genesaré, Jesus manteve conversas informais diárias com os doze, todas as tardes. Os embaixadores do Reino, então, formavam um grupo sério, sóbrio e moderado, de homens desiludidos. Mesmo depois de tudo o que tinha acontecido e, como os eventos posteriores revelaram, esses doze homens não estavam ainda plenamente libertos das noções inatas e há muito acalentadas sobre a vinda de um messias judeu. Os eventos das semanas precedentes tinham passado muito rapidamente para que esses pescadores atônitos pudessem compreender toda a sua significação. O tempo se faz necessário para que os homens e as mulheres efetuem mudanças radicais e extensas nos seus conceitos básicos e fundamentais de conduta social, de atitudes filosóficas e de convicções religiosas.

152:6:2 17052 Enquanto Jesus e os doze estavam descansando em Genesaré, as multidões dispersaram-se, indo alguns para as suas casas, e outros a Jerusalém para a Páscoa. Em menos de um mês, os seguidores de Jesus, entusiastas e abertos, em um número maior do que cinqüenta mil pessoas, apenas na Galiléia, minguaram para menos até do que quinhentos. Jesus desejava dar aos seus apóstolos uma experiência como essa da volubilidade da aclamação popular, para que eles não ficassem tentados a contar com essas manifestações de histeria religiosa transitória, depois que ele os deixasse a sós no trabalho do Reino; nesse esforço, todavia, ele teve um êxito apenas parcial.

152:6:3 17053 Na segunda noite da permanência em Genesaré, o Mestre novamente contou aos apóstolos a parábola do semeador e acrescentou estas palavras: “Vós podeis ver, meus filhos, que o apelo aos sentimentos humanos é transitório e totalmente desapontador; o apelo exclusivo ao intelecto do homem é, do mesmo modo, vazio e estéril; apenas fazendo o vosso apelo ao espírito que vive dentro da mente humana é que podereis esperar alcançar um êxito duradouro e realizar aquelas transformações maravilhosas, no caráter humano, que são logo mostradas na colheita abundante dos frutos genuínos do espírito, nas vidas diárias de todos aqueles que estão, assim, libertos da escuridão da dúvida, pelo nascimento do espírito à luz da fé – no Reino do céu”.

152:6:4 17054 Jesus ensinou o apelo às emoções, como técnica de prender e de focalizar a atenção intelectual. Ele chamou a mente, assim despertada e vivificada, de “o portal da alma”, onde reside aquela natureza espiritual do homem que deve reconhecer a verdade, e responder ao apelo espiritual do evangelho, de modo a proporcionar os resultados permanentes das transformações verdadeiras de caráter.

152:6:5 17055 Jesus, assim, empenhava-se em preparar os apóstolos para o choque iminente – a crise da atitude pública para com ele estava para acontecer dentro de uns poucos dias, apenas. Ele explicou, aos doze, que os chefes religiosos de Jerusalém conspiravam junto com Herodes Antipas para efetivar a destruição deles. Os doze começaram a entender melhor (embora não totalmente) que Jesus não iria assentar-se no trono de Davi. Eles enxergaram mais plenamente que a verdade espiritual não se faria avançar por meio de milagres materiais. Eles começaram a compreender que a alimentação das cinco mil pessoas e o movimento popular para fazer de Jesus um rei, haviam sido o ápice da expectativa que o povo tinha de milagres e de prodígios, e o auge da aclamação popular feita a Jesus. Eles discerniam vagamente e previam difusamente a aproximação de tempos de pesados crivos espirituais e de adversidades cruéis. Esses doze homens estavam despertando, vagarosamente, para a compreensão da natureza real da sua tarefa como embaixadores do Reino, e começavam a preparar-se para as provas duras e severas do último ano da ministração do Mestre na Terra.

152:6:6 17061 Antes de deixarem Genesaré, Jesus instruiu-os a respeito da alimentação miraculosa das cinco mil pessoas, dizendo a eles exatamente por que ele se engajara nessa manifestação extraordinária de poder criativo, assegurando a eles, também, que ele não consentira nessa compaixão pela multidão sem antes se certificar de que estava de “acordo com a vontade do Pai”.

7. EM JERUSALÉM


152:7:1 17062 No domingo, 3 de abril, acompanhado apenas pelos doze apóstolos, Jesus saiu de Betsaida, em viagem a Jerusalém. Para evitar as multidões e para atrair tão pouca atenção quanto possível, eles viajaram pelo caminho de Gerasa e da Filadélfia. Ele os proibiu de fazer qualquer trabalho de pregação pública nessa viagem; nem permitiu a eles ensinar ou pregar enquanto permanecessem em Jerusalém. Chegaram a Betânia, perto de Jerusalém, tarde na noite de quarta-feira, 6 de abril. Por essa noite eles pararam na casa de Lázaro, Marta e Maria, mas, no dia seguinte, separaram-se. Jesus, junto com João, permaneceu na casa de um crente chamado Simão, perto da casa de Lázaro, na Betânia. Judas Iscariotes e Simão zelote ficaram com os amigos, em Jerusalém; enquanto o restante dos apóstolos permaneceu, dois a dois, em casas diferentes.

152:7:2 17063 Jesus entrou em Jerusalém apenas uma vez, durante essa Páscoa, e esta deu-se durante o grande dia da festa. Muitos dos crentes de Jerusalém foram trazidos por Abner para conhecer Jesus, na Betânia. Durante essa permanência em Jerusalém os doze souberam quão amargo era o sentimento, que crescia, contra o seu Mestre. Eles partiram de Jerusalém acreditando, todos, que a crise era iminente.

152:7:3 17064 No domingo, 24 de abril, Jesus e os apóstolos deixaram Jerusalém por Betsaida, indo pelo caminho das cidades costeiras de Jopa, Cesaréia e Ptolemais. Dali foram por Ramá e Corazim até Betsaida, chegando ali na sexta-feira, 29 de abril. Imediatamente ao chegar em casa, Jesus despachou André a fim de que fosse pedir permissão junto ao dirigente da sinagoga, para a sua fala no dia seguinte, um sábado, no serviço da tarde. E Jesus bem sabia que aquela seria a última vez que lhe seria permitido pregar na sinagoga de Cafarnaum.

DOCUMENTO 153

A CRISE EM CAFARNAUM
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No dia da sua chegada a Betsaida, sexta-feira à noite, e no sábado pela manhã os apóstolos notaram que Jesus estava seriamente ocupado com algum problema grave; eles perceberam que o Mestre estava dedicando de um modo pouco habitual o seu pensamento a alguma questão importante. Ele não tomou o desjejum e comeu pouquíssimo ao meio-dia. Todo o sábado, pela manhã, e na noite anterior, os doze e os condiscípulos estiveram reunidos em pequenos grupos pela casa, no jardim e na praia. Uma tensão de incerteza e uma dúvida cheia de apreensão pairavam sobre todos eles. E quase nada tinha Jesus dito-lhes desde que deixaram Jerusalém.

153:0:2 17072 Havia meses que não viam o Mestre tão preocupado e tão pouco comunicativo. Até Simão Pedro estava deprimido, e abatido mesmo. André não sabia o que fazer pelos seus companheiros desanimados. Natanael disse que estavam em meio à “calmaria antes da tormenta”. Tomé expressou a opinião de que “algo fora do extraordinário estava para acontecer”. Filipe aconselhou a Davi Zebedeu que “esquecesse os planos de alimentar e alojar a multidão, até que saibamos sobre o que o Mestre anda pensando”. Mateus estava fazendo esforços renovados para repor as economias do fundo de caixa. Tiago e João falavam sobre o sermão vindouro, na sinagoga, e especulavam muito quanto à sua natureza provável e o seu alcance. Simão zelote expressou a crença, uma esperança na verdade, de que “o Pai no céu pudesse estar para intervir de alguma maneira inesperada, para defender e dar apoio ao seu Filho”, enquanto Judas Iscariotes ousava entregar-se ao pensamento de que possivelmente Jesus estivesse oprimido de pesar por “não ter tido coragem e arrojo de permitir aos cinco mil que o proclamassem rei dos judeus”.

153:0:3 17073 Do meio desse grupo de seguidores deprimidos e desconsolados, foi que Jesus saiu, na bela tarde de sábado, para pregar o seu sermão memorável na sinagoga de Cafarnaum. A única palavra de encorajamento ou de votos de êxito de todos os seus seguidores diretos veio de um dos insuspeitos gêmeos Alfeus, o qual, no momento em que Jesus deixou a casa a caminho da sinagoga, o saudou jovialmente dizendo: “Oramos para que o Pai te ajude, e para que possamos ter multidões maiores do que nunca”.

1. A PREPARAÇÃO DO CENÁRIO


153:1:1 17074 Uma audiência distinta cumprimentou Jesus às três horas dessa tarde linda de sábado, na nova sinagoga de Cafarnaum. Jairo presidia e passou a Jesus as escrituras para que as lesse. No dia anterior, cinqüenta e três fariseus e saduceus tinham chegado de Jerusalém; mais de trinta dos líderes e chefes das sinagogas vizinhas estavam também presentes. Esses líderes religiosos judeus atuavam diretamente sob as ordens do sinédrio de Jerusalém, e constituíam a frente ortodoxa que havia vindo para inaugurar uma guerra aberta a Jesus e aos seus discípulos. Assentados ao lado desses líderes judeus, nos assentos de honra da sinagoga, estavam os observadores oficiais de Herodes Antipas, que tinham sido enviados para certificar-se da verdade a respeito dos relatórios perturbadores de que uma tentativa havia sido feita, pelo populacho, de proclamar Jesus como o rei dos judeus nos domínios de Filipe, irmão de Herodes.

153:1:2 17081 Jesus compreendeu que estava enfrentando uma declaração direta de guerra irrestrita e aberta da parte dos seus inimigos crescentes e, ousadamente, ele escolheu assumir a ofensiva. Durante a alimentação das cinco mil pessoas, ele havia desafiado as idéias a respeito de um messias material; agora ele escolhia de novo contestar abertamente o conceito que tinham de um libertador judeu. Essa crise, que começou com a alimentação dos cinco mil, e que terminou com esse sermão na tarde de sábado, era o refluxo da maré do renome e da aclamação popular. Daqui por diante, o trabalho do Reino deveria ficar cada vez mais voltado à tarefa de importância progressiva de conquistar convertidos firmes para a verdadeira fraternidade religiosa da humanidade. Esse sermão marca uma crise de transição, do período de discussão, controvérsia e decisão, até aquele período de guerra aberta, para a aceitação final ou a rejeição definitiva.

153:1:3 17082 O Mestre bem sabia que muitos dos seus seguidores estavam preparando as próprias mentes, vagarosa mas firmemente, para rejeitá-lo finalmente. E, do mesmo modo, ele sabia que muitos dos seus discípulos estavam, lenta mas seguramente, passando por aquele aperfeiçoamento da mente e por aquela disciplina de alma que os capacitaria a triunfar sobre a dúvida e afirmar, corajosamente, a sua fé amadurecida no evangelho do Reino. Jesus entendia plenamente como os homens preparam-se para as decisões, numa crise, e como era o efeito dos atos súbitos da escolha corajosa, pelo processo lento da escolha reiterada entre as situações recorrentes do bem e do mal. Ele submeteu os seus mensageiros escolhidos a repetidas provas de desapontamentos, e proporcionou-lhes oportunidades freqüentes e testadoras, para que escolhessem entre o modo certo e o errado de fazer frente às dificuldades espirituais. Ele soube que podia contar com os seus seguidores, quando estivessem no teste final, para tomar as suas decisões vitais de acordo com as atitudes mentais habituais e as reações espirituais, já observadas anteriormente.

153:1:4 17083 Essa crise na vida terrena de Jesus começou com a alimentação dos cinco mil e terminou com esse sermão na sinagoga; a crise nas vidas dos apóstolos começou com o sermão na sinagoga e continuou por todo um ano, terminando apenas com o julgamento e a crucificação do Mestre.

153:1:5 17084 Naquela tarde, quando eles se assentaram na sinagoga, antes de Jesus começar a falar, havia apenas um grande mistério, só uma pergunta suprema, nas mentes de todos. Tanto os seus amigos, quanto os inimigos ponderavam em torno de só um pensamento, e que era: “Porque ele próprio, de um modo tão deliberado e efetivo, deu as costas à maré de entusiasmo popular?” E foi, imediatamente antes e imediatamente depois desse sermão, que as dúvidas e o desapontamento dos seus adeptos descontentes cresceu até a oposição inconsciente e finalmente se transformou em ódio de fato. Foi depois desse sermão na sinagoga que Judas Iscariotes alimentou o seu primeiro pensamento consciente de desertar. Mas, efetivamente, ele controlou, naqueles momentos, todas essas inclinações.

153:1:6 17085 Todos estavam em estado de perplexidade. Jesus os tinha deixado emudecidos e confundidos. Recentemente, ele tinha executado a maior demonstração de poder sobrenatural, que caracterizaria toda a sua carreira. A alimentação dos cinco mil era o acontecimento de maior apelo da sua carreira, segundo o conceito do Messias judeu esperado. Mas essa extraordinária vantagem foi imediata e inexplicadamente posta de lado pela sua recusa, pronta e inequívoca, de ser feito rei.

153:1:7 17091 Na sexta-feira à noite, e novamente no sábado pela manhã, os líderes de Jerusalém tinham trabalhado longa e empenhadamente, junto a Jairo, para impedir que Jesus falasse na sinagoga, mas de nada valeu. A única resposta de Jairo a todo esse pleito foi: “Eu já atendi esse pedido, e não violarei a minha palavra”.

2. O SERMÃO QUE MARCOU UMA ÉPOCA


153:2:1 17092 Jesus abriu este sermão lendo da lei como está no Deuteronômio Jesus abriu este sermão lendo da lei como está no Deuteronômio O Senhor vos fará esmagados pelos vossos inimigos; sereis removidos de todos os reinos da Terra. E o Senhor vos levará e levará o rei a quem entronizastes às mãos de uma nação estranha. Vós ficareis atônitos, sereis como um provérbio, uma máxima entre todas as nações. Os vossos filhos e as vossas filhas irão para o cativeiro. Os estrangeiros subirão alto em autoridade no vosso meio, enquanto vós estareis muito abaixo. E essas coisas cairão sobre vós e sobre a vossa semente, para sempre, porque não tereis ouvido a palavra do Senhor. E, portanto, vós servireis aos vossos inimigos, que virão contra vós. Passareis fome e sede e vestireis o jugo estrangeiro de ferro. O Senhor, de longe, trará uma nação contra vós, dos confins da Terra, uma nação cuja língua não entendereis, uma nação de rosto duro, uma nação que terá pouca consideração por vós. E eles vos cercarão, em todas as vossas cidades, até que caiam os muros altos fortificados, em que confiastes, e toda a terra cairá nas mãos deles. E acontecerá que vós sereis levados a comer os frutos dos vossos próprios corpos, a carne dos vossos filhos e filhas, durante esse tempo de cerco, por causa da penúria com a qual os vossos inimigos vos oprimirão”.

153:2:2 17093 E, quando Jesus acabou essa leitura, ele voltou-se para os profetas e leu, de Jeremias: “‘Se vós não ouvirdes as palavras dos meus servidores, os profetas que eu vos enviei, então farei desta casa como em Shiló, e farei desta cidade uma maldição para todas as nações da Terra’. E os sacerdotes e os instrutores ouviram Jeremias dizer essas palavras na casa do Senhor. E aconteceu que, quando Jeremias tinha acabado de falar tudo o que o Senhor tinha-lhe mandado dizer a todo o povo, os sacerdotes e os instrutores seguraram-no, dizendo: ‘Tu irás morrer certamente’. E todo o povo fez uma multidão em torno de Jeremias, na casa do Senhor. E, quando os príncipes de Judá ouviram essas coisas, eles julgaram Jeremias. E então falaram os sacerdotes e os instrutores aos príncipes e a todo o povo, dizendo: ‘Esse homem é digno de morrer, pois ele profetizou contra a nossa cidade, e vós o ouvistes com os vossos próprios ouvidos’. Então, Jeremias falou a todos os príncipes e a todo o povo: ‘O Senhor enviou-me para profetizar contra esta casa e contra esta cidade, com todas as palavras que ouvistes. Agora, portanto, corrigi os vossos hábitos e reformai as vossas ações e obedecei a voz do Senhor, vosso Deus, para que possais escapar do mal que foi pronunciado contra vós. Quanto a mim, vede que estou nas vossas mãos. Fazei comigo como parecer bem e direito aos vossos olhos. Mas sabeis, por certo, que, se me enviardes para a morte, vós derramareis sangue inocente sobre vós próprios e sobre esse povo, pois o Senhor me mandou para a verdade e para dizer todas essas palavras aos vossos ouvidos’.

153:2:3 17101 “Os sacerdotes e instrutores daqueles tempos tentaram matar Jeremias, mas os juízes não consentiriam, se bem que, pelas suas palavras de aviso, eles o fizeram descer por meio de cordas até uma masmorra imunda para que ele afundasse na lama até às axilas. Foi isso o que esse povo fez ao profeta Jeremias, por ele ter obedecido à ordem do Senhor de prevenir os seus irmãos sobre a iminente queda política deles. Hoje eu desejo perguntar-vos: O que irão os sacerdotes, os chefes e os líderes religiosos desse povo fazer com o homem que ousa avisar-vos sobre o dia da vossa condenação espiritual? Vós também buscareis levar à morte o instrutor que ousa proclamar a palavra do Senhor e que não teme mostrar como estais recusando caminhar no caminho da luz que leva à entrada do Reino do céu?

153:2:4 17102 “O que buscais como evidência da minha missão na Terra? Nós vos deixamos tranqüilamente nas vossas posições de influência e de poder, enquanto pregamos as boas-novas aos pobres e aos desterrados. Não fizemos nenhum ataque hostil àquilo a que mantendes reverência, mas antes proclamamos uma nova liberdade para a alma do homem oprimida pelo medo. Eu vim ao mundo para revelar o meu Pai e para estabelecer na Terra a fraternidade espiritual dos filhos de Deus, o Reino do céu. E, não obstante ter eu, por tantas vezes, vos relembrado de que o meu Reino não é deste mundo, e ainda o meu Pai concedeu-vos muitas manifestações de milagres materiais, além de transformações e regenerações espirituais mais evidentes.

153:2:5 17103 “Que novo sinal buscai de minhas mãos? Eu declaro que vós já tendes evidências suficientes para capacitar-vos a tomar a vossa decisão. Em verdade, em verdade, eu digo a tantos que se assentam diante de mim neste dia, que estais frente à necessidade de escolher que caminho tomareis; e eu vos digo, como Joshua disse aos vossos ancestrais: ‘Escolhei, neste dia, a quem servireis’. Hoje, muitos de vós estais na encruzilhada dos caminhos.

153:2:6 17104 “Quando não pudestes encontrar-me, depois do banquete da multidão, no outro lado do lago, alguns de vós alugastes os barcos de pesca em Tiberíades, que uma semana antes estavam abrigados por perto, durante uma tempestade, para saírem à minha procura, e para quê? Não para buscar a verdade e a retidão, nem para que pudésseis melhor saber como servir e ministrar aos vossos semelhantes! Não, mas, antes, para que tivésseis mais do pão pelo qual não trabalhastes. Não foi para preencher as vossas almas com a palavra da vida, mas apenas para que pudésseis encher o ventre com o pão da facilidade. E há muito vos foi ensinado que o Messias, quando viesse, faria aqueles prodígios que tornariam a vida agradável e fácil para todo o povo escolhido. Não é, pois, de se estranhar que vós, que fostes educados assim, almejásseis os pães e os peixes. Mas eu vos declaro que essa não é a missão do Filho do Homem. Eu vim para proclamar a liberdade espiritual, para ensinar a verdade eterna e para dar alento à fé viva.

153:2:7 17105 “Meus irmãos, não ansieis pelo alimento que perece, mas, antes buscai o alimento espiritual que nutre até à vida eterna; e esse é o pão da vida, que o Filho dá a todos que o tomarem e o comerem, pois o Pai deu, sem medidas, essa vida ao Filho. E quando vós me perguntastes: ‘O que devemos fazer, para executar a obra de Deus?’ Eu simplesmente vos disse: ‘Esta é a obra de Deus; que acrediteis naquele que Ele enviou’”.

153:2:8 17106 E então disse Jesus, apontando o desenho de um vaso de maná que decorava o lintel dessa nova sinagoga, e que era decorado com cachos de uva: “Vós pensastes que os vossos antepassados no deserto comeram maná – o pão do céu – mas eu vos digo que esse pão era da Terra. Embora Moisés não tenha dado aos vossos pais o pão do céu, o meu Pai agora está pronto para dar-vos o verdadeiro pão da vida. O pão do céu é aquele que vem de Deus e que dá a vida eterna aos homens do mundo. E quando me disserdes: Dê-nos este pão vivo; eu responderei: eu sou este pão da vida. Aquele que vem a mim não terá fome, e aquele que acredita nunca terá sede. Vós me vistes, vivestes comigo, e contemplastes minhas obras, e ainda não acreditais que tenha eu vindo do Pai. Mas aqueles que acreditam – que não temam. Todos aqueles que são conduzidos pelo Pai virão a mim e aquele que vem a mim de nenhum modo será rejeitado.

153:2:9 17111 “E deixai-me agora declarar, de uma vez por todas, que eu desci à Terra, não para fazer a minha própria vontade, mas a vontade Dele que me enviou. E a vontade final Daquele que me enviou é a de que eu não perca um só dentre aqueles que a mim foram dados. E esta é a vontade do Pai: Que todo aquele que vê o Filho e que acredita nele terá a vida eterna. Ainda ontem eu vos alimentei com o pão para os vossos corpos; hoje eu vos ofereço o pão da vida para as vossas almas famintas. E, agora, recebereis o pão do espírito com a mesma vontade com que comestes o pão deste mundo?”

153:2:10 17112 E quando Jesus parou por um momento para olhar a assistência, um dos instrutores de Jerusalém (um membro do sinédrio) levantou e perguntou: “Devo entender que dizes que tu és o pão que vem do céu, e que o maná que Moisés deu aos nossos pais no deserto não era?” E Jesus respondeu ao fariseu, “Compreendeste certo”. Então disse o fariseu: “Mas não és Jesus de Nazaré, o filho de José, o carpinteiro? O teu pai e a tua mãe, tanto quanto os teus irmãos e irmãs, não são bem conhecidos de muitos de nós? Como é que tu apareces aqui na casa de Deus e declaras que vieste do céu?”

153:2:11 17113 Nesse momento havia muito murmúrio na sinagoga, e ocorria uma tal ameaça de tumulto que Jesus levantou-se e disse: “Sejamos pacientes, a verdade nunca sofre com um exame honesto. Eu sou tudo o que dizes, e sou mais. O Pai e eu somos um; o Filho apenas faz aquilo que lhe ensina o Pai, e todos aqueles que forem dados ao Filho pelo Pai, o Filho os receberá consigo. Já lestes onde está escrito, nos profetas: ‘Todos vós sereis ensinados por Deus’. E que: ‘Aqueles que a quem o Pai ensina ouvirão também o seu Filho’. Todo aquele que consente nos ensinamentos do espírito residente do Pai, finalmente virá para mim. Não que algum homem tenha visto o Pai, mas que o espírito do Pai vive dentro do homem. E o Filho que desceu do céu, certamente viu o Pai. E aqueles que de fato acreditam nesse Filho, já têm a vida eterna.

153:2:12 17114 “Eu sou este pão da vida. Os vossos pais comeram o maná no deserto e estão mortos. Mas esse pão que desce de Deus, se um homem come dele, ele nunca morrerá em espírito. Eu repito, eu sou esse pão vivo, e toda alma que alcança a compreensão dessa natureza unificada, de Deus e de homem, viverá para sempre. E esse pão da vida que eu dou a todos que o receberem é a minha própria vida e natureza combinadas. O Pai, no Filho, e o Filho uno com o Pai – essa é a revelação que a minha vida dá ao mundo e a minha dádiva de salvação a todas as nações”.

153:2:13 17115 Quando Jesus terminou de falar, o dirigente da sinagoga deu a reunião por terminada, mas ninguém queria ir embora. Alguns se amontoaram em torno de Jesus para fazer mais perguntas, enquanto outros murmuravam e discutiam entre si. E esse estado de coisas continuou por mais de três horas. Era já mais de sete horas quando a audiência finalmente dispersou-se.

3. APÓS A REUNIÃO


153:3:1 17121 Muitas foram as perguntas feitas a Jesus, após a reunião. Algumas vinham dos seus discípulos perplexos, mas a maior parte delas foi perguntada por descrentes capciosos, que apenas queriam embaraçá-lo e tecer-lhe armadilhas.

153:3:2 17122 Um dos fariseus visitantes, subindo em um pedestal, fez esta pergunta aos berros: “Tu nos dizes que és o pão da vida. Como podes dar-nos a tua carne para comermos ou o teu sangue para bebermos? De que serve o teu ensinamento se ele não pode ser colocado em prática?” E Jesus respondeu a essa pergunta, dizendo: “Eu não vos ensinei que a minha carne é o pão da vida, nem que o meu sangue é a água da vida. Mas eu disse que a minha vida na carne é uma outorga do pão do céu. O fato da Palavra de Deus outorgada à carne e o fenômeno do Filho do Homem submetido à vontade de Deus constituem uma realidade da experiência que é equivalente ao sustento divino. Vós não podeis comer a minha carne nem podeis beber do meu sangue, mas vós podeis tornar-vos um em espírito comigo, do mesmo modo que eu sou uno em espírito com o Pai. Vós podeis ser nutridos pela palavra eterna de Deus, que é de fato o pão da vida, e que foi outorgado à semelhança da carne mortal; e vós podeis ter a vossa alma regada pelo espírito divino, que é verdadeiramente a água da vida. O Pai enviou-me ao mundo para mostrar como ele deseja residir nos homens e conduzi-los; e, assim, eu tenho vivido esta vida na carne para inspirar a todos os homens a buscar conhecer também a vontade do Pai celeste residente e fazer a Sua vontade”.

153:3:3 17123 Então, um dos espiões de Jerusalém que tinha estado observando Jesus e os seus apóstolos, disse: “Notamos que nem tu nem os teus apóstolos lavais as vossas mãos apropriadamente, antes de comerdes o pão. Deveis saber muito bem que essa prática de comer com as mãos sujas, e sem lavá-las é uma transgressão da lei dos mais velhos. E as vossas xícaras e os vasilhames, vós também não os lavais apropriadamente. Porque mostrais tal desrespeito pelas tradições dos pais e pelas leis dos nossos anciães? Quando Jesus o ouviu dizendo isso, respondeu: “Por que é que vós transgredis os mandamentos de Deus, segundo as leis da vossa tradição? Os mandamentos dizem: ‘Honrai o vosso pai e a vossa mãe’. E mandam que compartilheis com eles os vossos recursos, se necessário; mas vós aprovastes uma lei de tradição que permite que os filhos incumpridores digam que o dinheiro com o qual os pais poderiam ser assistidos foi ‘dado a Deus’. A lei dos anciães desobriga assim esses filhos astuciosos da sua responsabilidade, não obstante os filhos usarem, posteriormente, todo esse dinheiro para o seu próprio conforto. Por que, esvaziais assim o mandamento da vossa própria tradição? Bem fez a profecia de Isaías sobre todos vós, hipócritas, dizendo: ‘Esse povo me honra com os seus lábios, mas o seu coração está longe de mim. Em vão eles me adoram, ensinando os preceitos humanos como se fossem doutrinas’.

153:3:4 17124 “Podeis ver como vós estais desertando os mandamentos quando vos apegais às tradições dos homens. Estais totalmente dispostos a rejeitar a palavra de Deus ao manterdes as vossas tradições. E, de muitos outros modos, ousais estabelecer os vossos próprios ensinamentos acima da lei e dos profetas”.

153:3:5 17125 Jesus então dirigiu as suas observações a todos os presentes. Ele disse: “Mas ouvi a mim, todos vós. Não é aquilo que entra na boca o que suja espiritualmente o homem, mas mais aquilo que procede da boca e do coração”. Mas, mesmo os apóstolos não compreenderam o significado das suas palavras, pois Simão Pedro também lhe perguntou: “Para que alguns dos teus ouvintes não sejam desnecessariamente ofendidos, gostaríeis de explicar-nos o significado dessas palavras?” E então disse Jesus a Pedro: “Também para ti é difícil compreender? Não sabes que toda planta que o meu Pai celeste não tiver plantado será arrancada? Volta a tua atenção para aqueles que querem conhecer a verdade. Tu não podes obrigar os homens a amarem a verdade. Muitos desses instrutores são guias cegos. E tu sabes que, se um cego guia outro cego, ambos caem no fosso. Mas ouve enquanto eu te digo a verdade a respeito dessas coisas que sujam moralmente e que contaminam espiritualmente os homens. Eu declaro que não é o que entra no corpo pela boca, ou o que tem acesso à mente por meio dos olhos e ouvidos, que suja o homem. O homem só se suja por aquele mal que se origina dentro do coração, e que tem expressão nas palavras e feitos de tais pessoas ímpias. Não sabes que é do coração que saem os maus pensamentos, os projetos perversos de assassinato, de roubo, e os adultérios, junto com o ciúme, o orgulho, a ira, a vingança, as injúrias e o testemunho falso? E são essas as coisas que sujam os homens, e não que eles comam o pão com mãos que não foram lavadas segundo o cerimonial”.

153:3:6 17131 Os comissários fariseus do sinédrio de Jerusalém estavam agora quase convencidos de que Jesus deveria ser apreendido sob a acusação de blasfêmia ou de insultar a lei sagrada dos judeus; e daí os esforços deles para envolvê-lo na discussão, e levá-lo a um possível ataque às tradições dos anciães e às chamadas leis orais da nação. Não importa quão escassa a água pudesse estar, esses judeus tradicionalmente escravizados nunca deixariam de ir adiante com a lavação das mãos que era requerida pela cerimônia, antes de todas as refeições. Era a sua crença de que “é melhor morrer do que transgredir os mandamentos dos anciães”. Os espiões fizeram essa pergunta porque tinha sido descrito que Jesus tinha dito que: “A salvação é uma questão mais de corações limpos do que de mãos limpas”. Mas essas crenças, quando se tornam uma parte da religião, é difícil de se escapar delas. Mesmo muitos anos depois desse dia o apóstolo Pedro ainda estava preso nas amarras do medo, de muitas dessas tradições, sobre as coisas limpas e sobre as impuras, sendo finalmente libertado apenas quando experienciou um sonho extraordinário e vívido. Tudo isso pode ser mais bem compreendido quando é lembrado que esses judeus viam com a mesma gravidade o comer com as mãos não lavadas e o intercâmbio com uma prostituta, e que ambos os atos eram igualmente puníveis com a excomunhão.

153:3:7 17132 Assim o Mestre escolheu discutir e expor a tolice de todo o sistema rabínico de regras e regulamentações, que era representado pela lei oral – as tradições dos anciães, toda ela considerada como sendo mais sagrada e mais obrigatória para os judeus até mesmo do que os ensinamentos das escrituras. E Jesus falou com menos reserva porque ele sabia que a hora tinha chegado em que nada mais ele podia fazer para impedir uma ruptura aberta de relações com esses líderes religiosos.

4. ÚLTIMAS PALAVRAS NA SINAGOGA


153:4:1 17133 Em meio às discussões após essa reunião, um dos fariseus de Jerusalém trouxe a Jesus um jovem demente que estava possuído por um espírito indisciplinado e rebelde. Conduzindo esse menino demente até Jesus, ele disse: “O que podes fazer em uma aflição como esta? Tu podes expulsar os demônios?” E, quando olhou para o jovem, o Mestre ficou comovido de compaixão e, fazendo um sinal para que o jovem viesse até ele, tomou-o pela mão e disse: “Tu sabes quem eu sou; sai dele; e eu encarrego um dos teus companheiros leais de providenciar para que tu não voltes”. E imediatamente o jovem ficou normal e com a sua mente curada. E esse é o primeiro caso em que Jesus realmente expulsa um “espírito mau” de um ser humano. Todos os casos anteriores eram apenas de supostas possessões do demônio; mas esse era um caso genuíno de possessão demoníaca, como os que algumas vezes ocorreram naqueles dias e antes do Dia de Pentecostes, quando o espírito do Mestre foi efusionado sobre toda a carne, tornando para sempre impossível que esses poucos rebeldes celestes tirassem essa vantagem de certos tipos instáveis de seres humanos.

153:4:2 17141 Quando viu o povo maravilhado, um dos fariseus levantou-se e acusou Jesus de poder fazer essas coisas porque estava em aliança com os demônios; pois ele admitia que, na sua linguagem para expulsar esse demônio, eram conhecidos um do outro; e esse fariseu continuou, afirmando que os líderes e instrutores religiosos em Jerusalém tinham decidido que Jesus fazia todos esses chamados milagres pelo poder de Belzebu, o príncipe dos demônios. Disse ainda: “Não tenhais nada a ver com esse homem; ele está de parceria com Satã”.

153:4:3 17142 E então Jesus disse: “Como pode Satã expulsar Satã? Um reino dividido contra si próprio não sobrevive; se uma casa for dividida contra ela própria, ela será logo levada à ruína. Pode uma cidade suportar o cerco se não estiver unida? Se Satã expulsa Satã, ele está dividido contra si próprio; como então o seu reinado se mantém? E devias saber que ninguém pode entrar na casa de um homem forte e despojá-lo dos seus bens a menos que antes ele tenha dominado e acorrentado aquele forte homem. E assim, se eu, pelo poder de Belzebu, expulso demônios, por quem os vossos filhos os expulsam? E é por isso que eles serão os vossos juízes. Mas se eu, pelo espírito de Deus, expulso os demônios, então o Reino de Deus realmente veio até vós. Se não estivésseis cegos pelo preconceito e corrompidos pelo medo e o orgulho, teríeis facilmente percebido que um que é maior do que os demônios está no vosso meio. Vós me obrigais a declarar que aquele que não está comigo está contra mim, e que aquele que não se congrega a mim dispersa-se. Deixe-me fazer um aviso solene a vós, que, com os vossos olhos abertos, e com malícia premeditada, tendes a presunção de ousar atribuir a obra de Deus aos demônios! Em verdade, em verdade, eu vos digo, todos os vossos pecados serão perdoados, e mesmo as vossas blasfêmias, mas aquele que blasfemar contra Deus com deliberação e com má intenção nunca terá o perdão. Já que esses trabalhadores das iniqüidades não buscarão nem receberão jamais o perdão, eles são culpados do pecado de rejeitar eternamente o perdão divino.

153:4:4 17143 “Muitos de vós, nesse dia, chegastes à encruzilhada dos caminhos; vós começastes a fazer a escolha inevitável entre a vontade do Pai e o caminho das trevas escolhido por vós próprios. E o que escolherdes agora, assim finalmente vós sereis. Vós deveis fazer com que a árvore seja boa e que os frutos da árvore sejam bons, ou então a árvore se corromperá, assim como os seus frutos. Eu declaro que, no Reino eterno do meu Pai, a árvore é conhecida pelos seus frutos. Mas alguns de vós sois como víboras; como podeis, tendo já escolhido o mal, gerar bons frutos? Afinal, as vossas bocas falam pela abundância do mal nos vossos corações”.

153:4:5 17144 Então se levantou um outro fariseu, que disse: “Instrutor, gostaríamos que nos desses um sinal predeterminado, que nós concordaríamos, fosse o estabelecedor da tua autoridade e do teu direito de instruir. Tu concordarás com esse arranjo?” E quando Jesus ouviu isso, ele disse: “Essa geração sem fé, e à procura de um sinal, busca uma prova, mas nenhum sinal vos será dado a não ser aqueles que vós já tendes, e aqueles que vós vereis quando o Filho do Homem partir de entre vós”.

153:4:6 17145 E quando acabou de falar, os seus apóstolos cercaram-no e conduziram-no para fora da sinagoga. Em silêncio foram com ele para a casa em Betsaida. Estavam todos pasmos e tomados pelo terror, de um certo modo, por causa da súbita mudança na tática de ensinamento do Mestre. Eles estavam totalmente desacostumados a vê-lo atuar de um modo tão combativo.

5. A NOITE DE SÁBADO


153:5:1 17151 A todo momento Jesus quebrava em pedacinhos as esperanças dos seus apóstolos, repetidamente ele destruía as expectativas mais bem acalentadas deles, mas nenhum momento de desapontamento, nem tristeza, igualara-se aos que agora os surpreendiam. E, também, havia, agora, misturado à depressão deles, um medo real pela própria segurança. E estavam todos surpreendentemente assustados com a súbita e completa deserção do populacho. Eles estavam também um tanto amedrontados e desconsertados com a ousadia inesperada e com a determinação agressiva demonstrada pelos fariseus, que tinham vindo de Jerusalém. Mas, mais que tudo, eles estavam desnorteados com a súbita mudança de tática de Jesus. Sob circunstâncias normais eles teriam dado boas vindas ao aparecimento dessa atitude mais militante; contudo, vinda como veio, junto com tanta coisa inesperada, ela assustava-os.

153:5:2 17152 E agora, além de todas essas preocupações, quando eles chegaram em casa, Jesus negava-se a comer. Durante horas ele isolou-se em um dos quartos do andar de cima. Era quase meia-noite quando Joab, o líder dos evangelistas, retornou com a notícia de que cerca de um terço dos condiscípulos tinha desertado a causa. Durante toda a tarde, os discípulos leais tinham vindo e ido, para informar que o recuo de sentimentos para com o Mestre era geral em Cafarnaum. Os líderes de Jerusalém não tinham sido lentos em alimentar esse sentimento de desafeto e, em todos os sentidos possíveis, em buscar promover o movimento de afastamento de Jesus e dos seus ensinamentos. Durante essas horas de provação, as doze mulheres encontravam-se em uma reunião na casa de Pedro. Elas estavam fortemente transtornadas, mas nenhuma delas desertou.

153:5:3 17153 Era pouco mais de meia-noite quando Jesus desceu do quarto de cima e ficou entre os doze e os seus companheiros, que eram trinta pessoas ao todo. Ele disse: “Eu reconheço que essa separação no Reino vos angustia, mas é inevitável. E ainda, após todo a preparação e aperfeiçoamento que tivestes, houve alguma boa razão para tropeçardes nas minhas palavras? Por que ficais cheios de medo e de consternação ao verdes o Reino sendo despojado dessas multidões desinteressadas e desses discípulos com tão pouca disposição? Por que lamentais, quando nascendo está o novo dia do resplandecer de uma nova glória de ensinamentos espirituais do Reino do céu? Se julgastes difícil resistir a esse teste, o que fareis, então, quando o Filho do Homem voltar para o Pai? Quando e como ireis preparar-vos para quando eu ascender ao local de onde eu vim para este mundo?

153:5:4 17154 “Meus amados, deveis lembrar-vos de que é o espírito que vivifica; a carne, e tudo o que a ela é pertinente, é de pouco proveito. As palavras que eu vos falei são espírito e vida. Tende ânimo! Eu não os desertei. Muitos ofender-se-ão com as afirmações francas desses dias. Vós já soubestes que muitos dos meus discípulos já recuaram; eles já não caminham mais comigo. Desde o princípio eu sabia que esses crentes de coração frouxo cairiam pelo caminho. Eu não vos escolhi a vós, doze homens, e vos separei como embaixadores do Reino? E agora, em um momento como este, vós também desertaríeis? Que cada um de vós olhe para a própria fé, pois um de vós corre um grave perigo. ” E, quando Jesus acabou de falar, Simão Pedro disse: “Sim, Senhor, estamos tristes e perplexos, mas nunca te abandonaremos. Tu nos ensinaste as palavras da vida eterna. Nós acreditamos em ti e seguimos junto contigo todo este tempo. Nós não recuaremos, pois sabemos que foste enviado por Deus”. E, quando Pedro parou de falar, todos eles, em um só acorde, acenaram em aprovação a essa promessa de lealdade.

153:5:5 17161 Então disse Jesus: “Ide descansar, pois tempos pesados estão para vir; temos dias de muita ação pela frente”.

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