Articulação vai intensificar combate de tráfico de mulheres
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Adital -
A efetivação de acordos bilaterais é uma das principais saídas para combater o problema do tráfico de seres humanas que atinge, sobretudo, as mulheres, e que tem a região Nordeste como principal fornecedora do país. O assunto foi discutido durante a articulação dos movimentos sociais e Ongs para o enfrentamento do tráfico de pessoas para exploração sexual, em atividade final do II Fórum Social Nordestino, que se encerrou neste domingo (05), em Salvador, Bahia.
De comum acordo, as organizações e entidades presentes manifestaram que todas as ações deverão ser centradas em torno da publicação do Plano Nacional de Combate ao Tráfico de Pessoas, que deverá ser publicado pelo Governo em setembro. A idéia é intensificar a articulação no sentido da prevenção, atuando de forma incisiva junto aos poderes que trabalham com as políticas públicas.
De acordo com a Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de Exploração Sexual no Brasil (Prestraf), de 2002, havia 110 rotas de tráfico interno e 131 rotas de tráfico internacional. Os principais países de destino das mulheres revelados na pesquisa foram Espanha, Holanda, Venezuela, Itália, Portugal, Paraguai, Suíça, Estados Unidos Alemanha e Suriname.
Priscila Siqueira, articuladora do serviço à Mulher Marginalizada (SMM), explica que os dados exatos sobre o tema são desconhecidos. "A Onu fala em 4 milhões de pessoas por ano. A OIT fala em 2 milhões e 600. Esse número não importa. Se há uma ou duas pessoas traficadas, essa não é a questão. O problema é que isso tem que acabar", afirmou.
Por sua vez, Jaqueline Leite, do Centro Humanitário de Apoio à Mulher (Chame), acrescentou que é necessário fazer uma articulação com as organizações européias, já que é para a Europa que recebe mais mulheres em situação de tráfico.
Rogéria Araújo, jornalista da Adital, enviada a Salvador, Bahia.
Os preconceitos e a sexualidade como tema tabu fazem com que as mulheres usadas pelo mercado de tráfico de seres humanos sejam vistas como criminosas. Todo o sofrimento vivenciado por elas parece não ser suficiente para que a sociedade as reconheça como vítimas, o que é mais um dificultador no combate a esse tipo de crime.
O texto da Pesquisa Sobre Trafico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil (Pestraf) resume bem a visão refletida por grande parte da sociedade: “algumas vozes justificam que o consentimento e sua inserção na prostituição não as fazem vítimas, mas, sim, co-participantes nesse processo. Isso banaliza a situação e favorece o crescimento de um comércio lucrativo e a impunidade das organizações criminosas do sexo”.
A advogada e professora de Relações Internacionais, que também é mestra em União Européia e coordenadora executiva do Observatório Negro, Aurenice Nascimento Lima, comenta: “é preciso ficar claro que, mesmo que a mulher saiba que irá se prostituir, dificilmente fará idéia de que estará sujeita ao cárcere privado, terá seu passaporte recolhido pelo aliciador, será ameaçada de morte pelos traficantes e utilizada no comércio de drogas ilícitas.”
Tomando como referência a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os direitos não podem ser vendidos e, mesmo tendo concordado com a prostituição e assinado um contrato, essas mulheres são vítimas que precisam do cuidado do Estado e da Sociedade Civil.
O combate - Aliciadores e, algumas vezes, até as vítimas, não se entenderem como tal, é só uma das dificuldades encontradas no combate ao tráfico de mulheres. Muitos outros fatores, como a invisibilidade do crime, a discriminação de prostitutas e o silêncio social, tornam ainda mais difíceis a captura dos criminosos. Tráfico de mulheres ainda é um tema tabu, semelhante à violência doméstica. A afirmação feita por muitos é: “o que acontece no campo privado, a sociedade não deve se meter”.
A coordenadora do Grupo de Pesquisa sobre Violência e Exploração Sexual Comercial (Violes), da Universidade de Brasília, entidade parceira do DED, Maria Lúcia Leal, comenta que, embora tráfico de mulheres, crianças e adolescentes “esteja politicamente agendado pelas organizações mundiais de defesa dos direitos humanos, como um crime contra a humanidade, esta questão não é vista da mesma forma pelo conjunto da sociedade”.
No Prólogo da pesquisa PESTRAF, ela acrescenta: “este tema está imbuído de visões conservadoras, principalmente por se tratar de uma violação relacionada à sexualidade e formas distintas de prostituição, assunto de âmbito privado que, culturalmente, esteve sob uma racionalidade moral-repressiva, objeto de tabu e de discriminação pela sociedade e suas instituições. Tratar publicamente esta temática requer confrontar os diferentes projetos de sexualidade e a sua relação com a violência sexual e os projetos
Questão de direitos humanos
O tráfico de mulheres, crianças e adolescentes não é um fenômeno isolado, mas o fruto de uma sociedade com desigualdades de gênero, raça, etnia e nacionalidade. Simplesmente denunciar não vai resolver o problema, é o que dizem alguns especialistas.
A Professora Doutora da Universidade de Brasília e coordenadora do Grupo de Pesquisa VIOLES Maria Lúcia Leal, comenta: “o desafio da sociedade civil, do poder público, da mídia, da academia a das agências multilaterais é o fortalecimento da correlação de forças em nível local e global, para interferir nos planos e estratégias dos blocos hegemônicos, a fim de diminuir as disparidades sociais entre países; dar visibilidade ao fenômeno para desmobilizar as redes de crime organizado; e criar instrumentos legais e formas democráticas de regular a ação do mercado global do sexo”.
Para a advogada e professora de Relações Internacionais , Aurenice Nascimento Lima, a sociedade deve denunciar casos de tráfico de mulheres, porque é uma violação aos direitos humanos. “O tráfico de pessoas, independentemente de sexo ou motivação, é crime. Pode-se denunciar à Polícia Federal, que possui delegacias espalhadas em quase todo o Brasil. Quando isso não for possível, é necessário recorrer à delegacia de polícia mais próxima”, explica.
“Não existe paraíso aqui nessa terra, o que existe é a enorme satisfação de nos sentirmos com o poder sobre nós, e a total responsabilidade de decidir o que é melhor ou pior para cada um de nós, reconhecer que é possível ser feliz, só depende unicamente de nós, acreditar e lutar por essa possibilidade.” - Coletivo Mulher Vida
FONTE:
http://brasilien.ded.de/cipp/ded/custom/pub/content,lang,5/oid,7397/ticket,g_u_e_s_t/~/Reportagem_Tr%C3%A1fico_de_Mulheres.html
Perfil das Vítimas e dos Aliciadores
VÍTIMAS:
Ø A grande maioria das vitimas de exploração sexual, turismo e trafico é do sexo feminino e negra;
Ø As mulheres e adolescentes em situação de trafico são da classe popular, de baixa renda, com baixa escolaridade, habitam espaços urbanos periféricos com carência de saneamento, transporte etc., moram com algum familiar e têm filhos;
Ø Muitas nunca trabalharam como profissionais do sexo antes de serem traficadas, mas a maioria traz na sua história de vida experiências de violência física e psicológica como estupro, abandono, negligência, maus-tratos, abuso e exploração sexual, muitas vezes intrafamiliar.
ALICIADORES:
Ø A maioria dos aliciadores é do sexo masculino, entre 20 e 56 anos, e brasileiro (de 161 aliciadores identificados na pesquisa, 52 eram estrangeiros, 109 brasileiros)
Ø Os aliciadores brasileiros vêm de todas as classes sociais, alguns pertencem às elites econômicas, são proprietários ou funcionários de boates, e muitos “exercem funções públicas nas cidades de origem ou de destino do tráfico de mulheres, crianças e adolescentes”.
Ø Existem também aliciadoras, muitas vezes vítimas de tráfico que foram forçadas ou convencidas a chamar outras mulheres.
O que acontece às vítimas de tráfico humano?
O tráfico humano é considerado escravidão moderna, onde homens, mulheres e crianças são forçadas ou fraudulentas recrutadas, transportadas e abrigou para exploração sexual ou de trabalho. As vítimas de tráfico humano são geralmente pode proporcionar sexo sob ameaça e sem consentimento.
No entanto, eles também são usados como trabalhadores ligados ao trabalho nos campos, certas indústrias como a tecelagem ea pesca, fábricas ou como empregada doméstica.
O fato é que as vítimas de tráfico de seres humanos não recebem um único centavo para o trabalho que fazem e todo o dinheiro que ganham vai directamente para os seus proprietários. Muitas vezes as meninas e mulheres jovens são coagidos a ir para o estrangeiro e trabalhar como prostitutas e à chegada eles são escravizados e tratados horrivelmente.
Então, o que acontece com as vítimas do tráfico humano? Infelizmente, a maioria das vítimas nunca se ouviu falar dele. Alguns conseguem escapar de sua captura e retornar para seus países e da aldeia, mas passar o resto de suas vidas sendo banido e humilhado. No entanto, estas vítimas escaparam ter narrado contos de horror em que seus cativos obrigou-os em sua apresentação através de meios cruéis e desumanos de intimidação, que incluem estupro, tortura, ameaças de morte, espancamentos, fome e prisão. Além disso, muitas das vítimas de tráfico humano são vendidos muitas vezes como escravos modernos, e quando isso acontece, é difícil encontrar vestígios de vítimas ou descobrir o que aconteceu com eles.
Os traficantes usam todos os meios possíveis para explorar as vítimas e uma das primeiras coisas que eles fazem é tirar seu dinheiro, identidade, passaportes e outros documentos de identificação. Isso deixa as vítimas completamente deficientes em um país que é estranho e alienígena. E então, essas vítimas simplesmente desaparecem sem deixar vestígios.
A Conferência Mundial de Coligação contra o Tráfico de Mulheres de 1999, que aconteceu em Dhaka, Bangladesh, escolheu o 23 de setembro como o Dia Internacional Contra a Exploração Sexual e o Tráfico de Mulheres e Crianças.
Esta data foi escolhida para lembrar a promulgação daprimeira lei que puniu, com penas de 03 a 06 anos de prisão, quem promovesse ou facilitasse a prostituição e corrupção de menores de idade. A lei argentina, conhecida como Palacios, foi promulgada em 23 de setembro de 1913. (Veja o Documento de Bangladesh).
Pequenas vítimas, grandes criminais
O negócio da exploração sexual de meninas e meninos cresce no mundo de maneira incontrolável. Depois do comércio de drogas e de armas, é a atividade mais rentável do crime organizado. O turismo sexual, a prostituição infantil e a pornografia, são as linhas principais desta lucrativa “indústria” presente em todos os cantos do planeta.
Para termos uma idéia rápida do que isso significa, basta saber que:
Na internet, a cada dia, são abertas mais de 100 paginas web de pornografia infantil.
Cinco milhões de meninos, meninas e adolescentes são vítimas de exploração sexual comercial. Estes dados foram revelados no Segundo Congresso Mundial sobre o tema realizado em Yokohama (Japão), em 2001.
Somente na Colômbia, o número de meninas prostituídas multiplicou-se por cinco nos últimos anos. A República Dominicana, o México, a Guatemala e o Brasil estão entre os principais fornecedores de “mão de obra sexual infantil”.
Existem redes internacionais que lucram com os corpos das meninas e dos meninos.
Podem apontar-se sinais, agências de turismo, de publicidade, agências matrimoniais, de adoção e de emprego, autoridades e até pais e mães que se prestam a este repulsivo “negócio”.
Não somente as meninas são exploradas sexualmente. Um grande número de meninos tem sido incorporado a este tráfico.
Em Sri Lanka, sabe-se de 30 mil meninos dedicados à prostituição. Na República Dominicana, outro tanto. Em Senegal, na Costa de Marfim e nos países da África Ocidental também se contam aos milhares. Nas cidades da Europa do Leste, a prostituição masculina infantil está cada vez mais estendida.
A exploração sexual infantil é um sintoma gravíssimo de um problema ainda maior: a pobreza, a miséria extrema, o desemprego e a discriminação, que se fortalecem com as guerras e com a migração forçada...
“Exportações” brasileiras
Sabemos que cerca de 04 milhões de pessoas são traficadas anualmente no mundo. Segundo estimativas da Federação Internacional Helsinque de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas), o Brasil contribui para a formação desse assombroso número com cerca de 75 mil mulheres que são exploradas sexualmente na União Européia, representando 15% do total de mulheres exploradas nesses países. Por isso, o Brasil detém o título de maior exportador de mulheres para fins de exploração sexual comercial da América do Sul.
Observe-se que, como o tráfico de seres humanos tem como principais vítimas as mulheres e as meninas não há dados referentes ao tráfico e exploração sexual de homens e meninos, o que inviabiliza quaisquer comparações entre os gêneros. O simples fato de não haver dados, por si só, indica a baixa freqüência, se é que ela existe, do tráfico de homens e meninos para tais fins. Assim, acaba-se por confirmar a tese de que este tipo de violação a direitos funda-se em uma desigualdade de gênero, atingindo somente (ou prioritariamente) as mulheres.
Já os aliciadores são majoritariamente do sexo masculino, sendo que 59% deles têm idade entre 20 e 56 anos. A Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil (Pestraf) apontou para a existência, no âmbito nacional, de um total de 161 aliciadores, dos quais 52 são estrangeiros e 109 brasileiros. Curiosamente, a pesquisa também identificou 66 agenciadoras do sexo feminino, compondo 41% do total de 161 aliciadores encontrados.
A Pestraf indicou uma estreita relação entre a pobreza e a exploração sexual comercial, pois, as rotas de tráfico apresentam-se em maior número nas regiões menos favorecidas e desenvolvidas econômica e socialmente do Brasil. A pesquisa revela que a região Norte apresenta a maior concentração de rotas (76 rotas), seguida pela região Nordeste (69 rotas), e com maior diferença, das regiões Sudeste (35 rotas), Centro-Oeste (33 rotas) e Sul (28 rotas).
O total de rotas de tráfico identificadas é, portanto, de 241. Destinam-se ao tráfico interno (rotas intermunicipais e interestaduais) 110 rotas, sendo que dessas, 93 envolvem prioritariamente adolescentes. O tráfico internacional, por sua vez, mobiliza 131 rotas, das quais 120 enfocam apenas mulheres. Assim, conclui-se que as rotas internacionais são preferencialmente destinadas ao tráfico de mulheres adultas, enquanto que as rotas internas têm como foco privilegiado
as adolescentes.
Ainda com relação ao tráfico internacional, a Pestraf indicou que os principais destinos são a Europa (com destaque para a Itália, Espanha e, mais recentemente, Portugal) e países da América Latina (como Paraguai, Suriname, Venezuela e Republica Dominicana).
Dentre os casos identificados de mulheres e adolescentes traficadas dentro do Brasil, 53% eram adultas, sendo a faixa etária de maior incidência entre 23 e 24 anos, e 47% eram adolescentes, com idade predominante entre 16 e 17 anos. Segundo a Pestraf os principais fatores que levam as adolescentes a aceitarem as propostas dos aliciadores são a necessidade de sobrevivência e a violência intra-familiar.
Em 12 de novembro de 2005, o “Jornal Nacional” da Rede Globo divulgou reportagem, com base em informações da Polícia Federal, sobre a descoberta de uma nova rota de tráfico de mulheres, saindo de Marabá, sul do Pará, com destino a Suriname, Portugal, Espanha, Itália e Holanda. O que atraiu a atenção da polícia foi a grande quantidade de passaportes emitida em um curto espaço de tempo, quase cem em um mês. A partir dessa informação, as autoridades decidiram investigar o motivo da emissão de tantos passaportes chegando assim a mais uma rota de tráfico de pessoas.
O combate ao tráfico de mulheres e meninas tem entre seus principais obstáculos o preconceito e a percepção estereotipada que as autoridades policiais têm das mulheres. Muitas vezes as mulheres traficadas não são vistas como vítimas, mas sim como prostitutas, sendo esta a razão pela qual foram aliciadas. Considerando, então, que essas mulheres “livremente escolheram” tal caminho, a questão não demandaria das autoridades uma investigação aprofundada.
O preconceito vai além, já que não raro os supostos responsáveis por investigar o crime preferem se dedicar a ações “mais relevantes” como, por exemplo, o tráfico de drogas e de armas. Ressalte-se que para a legislação brasileira o comportamento da vítima é irrelevante para a constituição do fato típico, e, portanto, punível, não devendo ser o comportamento da vítima um fator a ser levado em conta durante a investigação criminal. Ademais, ainda que essa fosse uma questão relevante para o tema, dados da Pestraf revelam que grande parte das mulheres traficadas não é profissional do sexo.
Uma outra dificuldade alegada pelas autoridades policiais no que se refere ao tráfico de mulheres adultas é a de como barrar a sua saída do país. Muitas vezes, apesar da suspeita de tráfico, essas mulheres possuem passaportes legalmente emitidos.
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Fonte: “Tráfico e exploração sexual de mulheres e meninas no Brasil”, ensaio de Helena Pires e Tamara Amoroso Gonçalves, em: ultimainstancia.uol.com.br
Recomendamos: Assistir o Filme “Anjos do Sol”, de Rudi Lagemann
Ver: “As escravas do Século XXI”
Cada año se trafica con cuatro millones de mujeres y niñas para la explotación sexual en todo el mundo. De ellas, unas 500.000 mujeres ingresan a Europa para el ejercicio de la prostitución.
El comercio de personas, según lo señala Naciones Unidas, constituye la tercera actividad ilegal más lucrativa del mundo, generando unos 12 mil millones de dólares por año, después del tráfico de armas y el de drogas, y con escasos riesgos para sus organizadores, pero ultrajante y vejatorio para las millones de mujeres y niñas explotadas bajo condiciones de esclavitud en la industria mundial del sexo.
…¨El tráfico de mujeres, antes conocido como "trata de blancas", significa agrupar mediante engaño, abuso de autoridad o coacción a mujeres para obligarlas a prostituirse en beneficio de otras personas. CENDOC de Cidhal
Son sacadas de sus pueblos o ciudades, raptadas violentamente o engañadas con atractivas ofertas de trabajo, y terminan siendo obligadas a prostituirse a fuerza de amenazas y golpes.
El tráfico de personas (mujeres, niños/as adolescentes) no sólo constituye un delito o un problema de migración, sino que toca la esencia misma de los derechos humanos; se convierte en una manifestación apabullante de la desigualdad entre sexos y, de la condición de subordinación de la mujer a escala mundial. En todo el mundo, la mayoría de los seres sometidos a la trata sexual son mujeres y niñas de baja condición económica y las principales corrientes de este comercio fluyen desde los países en vías de desarrollo hacia los más prósperos.
Hay tres factores que influyen en esta nueva forma de esclavitud:
La demanda: este factor en el tráfico sexual sigue siendo el menos visible. Cuando se habla de esta problemática, la demanda es invisible, parece que nadie demanda prostitución; resulta fácil olvidar que en la industria del sexo no se trafica con seres humanos para satisfacción de los traficantes sino para satisfacer a los compradores, hombres en su mayoría.
La insaciable demanda de mujeres y criaturas para establecimientos de masajes, espectáculos de strip-tease, servicios de acompañamiento, burdeles, pornografía y prostitución callejera, hacen de este “comercio sexual” tan lucrativo.
Si bien para algunos varones el acercamiento a la prostitución tiene su origen en el apetito sexual, para otros constituye una expresión de misoginia, de racismo, o de ambas cosas. “El espectáculo de mujeres y adolescentes alineadas en un burdel, numeradas y a disposición de cualquier hombre que las elija, permite verlas dominadas y humilladas, despojadas de su poder de ‘resistir’ el abordaje sexual, que para muchos hombres es una cuestión fundamental para su propio bienestar” (Davidson 1996).
La oferta:: es el factor más transparente. Los traficantes, además de agredir, amenazar, explotan las necesidades económicas y sacan provecho de la vulnerabilidad de las mujeres y niñas cuando éstas han huido de su hogar debido a la violencia o que han sido desplazadas por conflictos armados o desastres naturales.
El impacto psicológico del rapto o el estigma social del engaño, pueden aumentar la debilidad de la mujer ante la manipulación y la explotación por parte de los traficantes. En Guatemala, por ejemplo, los tratantes causaron estragos entre las muchachas que habían sido violadas durante el conflicto armado, cuya huella como víctimas de ese crimen las había arruinado sus perspectivas matrimoniales y quedaron marcadas para el resto de la sociedad.
La impunidad: las leyes nacionales e internacionales brillan por su ausencia o son insuficientes; donde hay leyes, las sentencias son insuficientes y para nada, disuasivas.
Contribuye considerablemente a esa impunidad, la corrupción policial y de los funcionarios de inmigración que coluden, aceptan sobornos o “miran para otro lado”.
"Mi vida está acabada. Viví el infierno y mi alma está destrozada completamente. Sólo soy Somaly de cara. Mi cuerpo no tiene nada, nada de nada. Mi vida está acabada. Ahora sólo me mueve un objetivo: luchar contra el tráfico de mujeres y todas las formas de esclavitud. Se trata de dar la paz a las demás mujeres, a las niñas. Por eso no temo la muerte. ¿Qué es la muerte? nada, yo ya estoy muerta. "
“La única solución para poner fin al tráfico de mujeres es la abolición de la prostitución… sólo los gobiernos pueden acabar con el crimen organizado. Yo puedo sacar a diez niñas de la prostitución, pero mañana son sustituidas por otras diez. Los gobernantes deben hacer algo más que leer informes sobre explotación sexual. No la legalicen. Todas las víctimas sentimos lo mismo cuando sufrimos 15 o 20 violaciones al día. Solo hay una solución: abolir la prostitución y castigar el proxenetismo”Somaly Mam, Premio Príncipe de Asturias de Cooperación en el 2006 y presidenta de Acción por las Mujeres en Situación Precaria, fue vendida a los 13 años por la familia que la acogía y obligada a prostituirse.
MUNDIAL 2010: CHUTE O TRÁFICO DE MULHERES
“Este é o ano da Copa do Mundo de futebol. No dia 11 de junho, pela primeira vez, poderemos assistir à cerimônia de abertura no Continente Africano! A África do Sul se prepara para acolher este grande evento esportivo com entusiasmo, mostrando o lado positivo das pessoas e a beleza da natureza que esta terra pode oferecer. Quem chega na África do Sul pode assistir aos grandes preparativos para o excepcional evento dos mundiais: canteiros de obras para alargar as estradas, festas de inaugurações dos estádios de futebol, slogan publicitários, souvenir, bandeiras e as indispensáveis “vuvuzelas” (cornetas dos torcedores) decoradas com as diferentes cores dos times nacionais que participarão. Entre as várias atividades realizadas em função da Copa do Mundo de 2010 chamam a atenção as várias campanhas informativas que estão sendo realizadas na África do Sul contra o tráfico de seres humanos.
divulgarão a Campanha preventiva nas escolas, nas comunidades e entre os grupos de maior risco como os jovens e as mulheres, informando sobre o tráfico e divulgando o número telefônico gratuito para denúncias e assistência às vítimas do tráfico de seres humanos na África do Sul.
A Campanha é dirigida também aos torcedores que estão se preparando para participarem da Copa do mundo, para que saibam, e sejam conscientes, que muitos dos serviços a eles oferecidos são organizados através do serviço de pessoas que são exploradas e constritas, às vezes até mantidas em situação de escravidão. Como primeira iniciativa foram escritas 4 cartas endereçadas, respectivamente, aos líderes religiosos, às potenciais vítimas, aos potenciais traficantes de pessoas e aos torcedores. As cartas valorizam as relações interpessoais e o diálogo, aspectos fundamentais do trabalho de prevenção e na tutela das vítimas do tráfico.
Tráfico de seres humanos na África do Sul
A África do Sul é país de origem, de destino e de trânsito do tráfico de pessoas. A associação de mulheres da magistratura sul africanas durante a própria conferência em outubro de 2007 já tinham denunciado que mulheres tailandesas, russas, bulgaras e moçambicanas são traficadas na África do Sul; as nigerianas passam pela África do Sul para depois serem vendidas na Alemanha, Itália e Canadá; as sul africanas são levadas verso Hong Kong e Macau.
Segundo as estátisticas elaboradas sobre as vítimas assistidas de 2004 a janeiro de 2010 (fonte Oim – Pretória) 50% eram de origem tailandesa, cerca de 12% da República Democrática do Congo, 9,5% do Zimbabwe, 8% sul africanas, 6,5% moçambicanas e em uma porcentagem menor as indianas, chinesas, nigeriana, ruandesas, camaronesas, filipinas e algumas angolanas, quenianas, romenas, búlgaras, sômalas, do Swaziland, Malawi e Lesoto.
A esta voz de denúncia se unem aquela das religiosas que participam da rede Sarwatip . Segundo elas, o tráfico de pessoas na África do Sul é interno e externo e há a preocupação pelo aumento de pessoas traficadas no período que antecede a Copa do mundo de futebol, sobretudo nos países fronteiriços com a África do Sul como o Moçambique, Lesoto, Zimbabwe e Zâmbia, mas também distantes com a Tailândia e a Nigéria. O evento dos mundiais reforça o poder atrativo da África do Sul no contexto africano, como país, economicamente emergente, alimenta o sonho de melhorar a expectativa de trabalho e de vida.
Uma posterior preocupação de quem luta na África do Sul contra o tráfico de seres humanos é a grande dificuldade de controle, por parte das autoridades competentes, das vastas zona de fronteira; com 10 aeroportos e 8 portos que favorecem ótimas e rápidas conexões com todo o mundo, a África do Sul é uma rota importante para o tráfico de pessoas. Mulheres e crianças são as principais vítimas da violência.
Segundo a relação de 2009, da UNODC a África do Sul é um dos países com o maior índice de criminalidade do mundo, sobretudo contra a mulher: a cada 6 horas uma mulher é assassinada pelo próprio parceiro. Na África do Sul, 4 entre 10 mulheres foram vítimas de estrupo. A maioria das pessoas traficadas são mulheres, crianças e adolescentes destinados a alimentar o mercado da prostituição: a África do Sul é uma das internacionais do turismo sexual. Para tentar reduzir o risco de contrair o vírus HIV, os clientes do mercado da prostituição pedem mulheres sempre mais jovens, quando não crianças e adolescentes. Diversas pessoas caem na rede do tráfico dos órgãos, para serem explorados no trabalho mal remunerado e serem reduzidos a condição de escravidão.
A África do Sul é um dos países que assinaram o “Protocolo das Nacões Unidas sobre a prevenção, abolição e perseguição ao tráfico de seres humanos, em particular mulheres e crianças” (conhecido como Protocolo de Palermo ), que entrou em vigor em desembro de 2003. Os países que assinaram o Protocolo de Palermo estão empenhados em desenvolver políticas públicas com a finalidade da prevenção do tráfico de pessoas, da tutela das vítimas e da introdução de normas no sistema jurídico e penal pela responsabilização dos traficantes.
No dia 16 de março de 2010, a África do Sul aprovou uma nova lei contra o tráfico, uma norma que entrou em vigor em abril, mesmo às vésperas da Copa do mundo de futebol. Segundo a Agência jornalítstica Reuters, a África do Sul, com esta decisão, segue o Moçambique, o Zâmbia, o Swaziland e o Tanzânia. Países do sul da áfrica que já aprovaram uma lei específica contra o tráfico de seres humanos.
Esta lei era esperada e reforça a esperança na prevenção, tutela e responsabilização penal das pessoas envolvidas nesta grave violação dos direitos humanos, que às vezes não conseguimos perceber que existe, simplesmente porque é bem escondida.
Como dar continuidade à campanha
A Campanha lançada especificamente para o evento esportivo da Copa do mundo de futebol de 2010 na África do Sul, não se considera um ponto de chegada no empenho na prevenção do tráfico. É preciso continuar neste trabalho, multiplicando as forças e envolvendo o maior número de pessoas possíveis, tecendo redes velhas e novas pra continuar contrastando as causas principais que favorecem o tráfico: pobreza, desocupação, discriminação de gênero, desigualdade social e um modelo econômico perverso e injusto que mira exclusivamente no lucro de poucos sem importar-se minimamente com a vida das mulheres e crianças.”
Gabriella Bottani – Rede Um Grito pela Vida/Fortaleza/ Plataforma contra o tráfico de pessoas.
Luta contra o tráfico de seres humanos
O tráfico de seres humanos, qualquer que sejam as razões a ele subjacentes – exploração sexual ou laboral, é uma violação fundamental dos direitos humanos. Na medida em que afecta sobretudo grupos vulneráveis como as mulheres e as crianças, a União Europeia centrou a sua acção em torno de objectivos que visam a protecção destes grupos e a prevenção e a luta contra este fenómeno, designadamente reforçando a cooperação e a coordenação entre as autoridades policiais e judiciais dos Estados-Membros. Introduziu ainda um conjunto de disposições comuns com o intuito de abordar certas questões, tais como a criminalização e as sanções ou as circunstâncias agravantes em casos de tráfico de seres humanos. A acção da União que, desta forma, pretende proteger igualmente as vítimas do tráfico de seres humanos assenta em instrumentos que definem objectivos e prioridades, ao mesmo tempo que se integra num quadro mais abrangente de protecção contra a violência, o turismo sexual e a pedopornografia.
Novo grupo de peritos sobre o tráfico de seres humanos
A Comissão criou um novo grupo de peritos de natureza consultiva e de apoio à acção da Comissão no domínio da luta contra o tráfico de seres humanos. Este grupo, que prossegue os trabalhos encetados pelo anterior grupo de peritos criado em 2003, tem por missão, nomeadamente, apresentar sugestões em matéria de harmonização das diferentes práticas na União Europeia.
ACTO
Decisão 2007/675/CE da Comissão, de 17 de Outubro de 2007, que cria o grupo de peritos sobre o tráfico de seres humanos
SÍNTESE
A presente decisão cria um "Grupo de peritos sobre o tráfico de seres humanos", que pode ser consultado pela Comissão Europeia sobre qualquer assunto relacionado com o tráfico de seres humanos.
Em especial, as atribuições do Grupo são:
Estabelecer a cooperação entre os Estados-Membros, as organizações intergovernamentais, internacionais e não governamentais, e a Comissão Europeia no domínio do tráfico de seres humanos.
Formular pareceres e garantir um tratamento coerente deste fenómeno.
Ajudar a Comissão a avaliar a evolução das políticas no domínio do tráfico de seres humanos a nível nacional, europeu e internacional, bem como a identificar e definir eventuais medidas, a nível europeu e nacional, entre as diferentes políticas de combate ao tráfico de seres humanos.
O grupo é composto por de 21 membros provenientes de:
Administrações dos Estados-Membros (até 11 membros).
Organizações intergovernamentais, internacionais e não governamentais, activas a nível europeu no domínio do tráfico de seres humanos (até 5 membros).
Parceiros sociais e associações de empregadores que operem a nível europeu (até 4 membros).
Europol (um membro).
Podem também ser peritos com experiência em investigação académica para universidades ou institutos públicos ou privados dos Estados-Membros (até dois membros).
Os membros do grupo são nomeados pela Comissão, com excepção do membro proveniente da Europol. Os membros são nomeados para um mandato de três anos renovável.
O Grupo adopta o seu regulamento interno e elege um presidente e dois vice-presidentes entre os seus membros. Podem ser criados subgrupos para analisar questões específicas. O Grupo e os seus subgrupos reúnem-se por regra nas instalações da Comissão, assegurando esta o secretariado das reuniões.
A Comissão pode convidar para participar nos trabalhos do Grupo peritos ou observadores externos que tenham competências específicas num assunto específico.
Tanto os membros como os peritos e observadores, não são remunerados pelos serviços que prestam.
Contexto
A presente decisão revoga a decisão que criou o primeiro grupo de peritos sobre o tráfico de seres humanos. Desde 2003, os trabalhos desse grupo tinham permitido à Comissão desenvolver a sua política em matéria de luta contra este fenómeno. Em seu resultado, foi adoptado, em 2005, o plano de acção da União Europeia (UE) sobre as melhores práticas, normas e procedimentos para prevenir e combater o tráfico de seres humanos, baseado em grande medida no relatório redigido pelo grupo de peritos no final de 2004.
Esta nova decisão tem em conta o alargamento da UE e alarga as competências do Grupo de peritos visando adaptá-las à evolução do fenómeno do tráfico de seres humanos.
SÍNTESE
O tráfico de seres humanos constitui uma grave violação dos direitos do Homem. Desde 1996, a União Europeia (UE) estabeleceu uma abordagem global e pluridisciplinar em matéria de luta contra este fenómeno, que inclui a adopção de vários instrumentos jurídicos como a Decisão-quadro 2002/629/JAI e uma série de programas, nomeadamente:
O programa de incentivo e de intercâmbio STOP (I ( ) e II ( )) destinado aos responsáveis pela luta contra o tráfico de seres humanos e a exploração sexual de crianças.
O programa DAPHNE relativo a medidas preventivas de combate à violência exercida contra as crianças, os adolescentes e as mulheres.
O programa-quadro AGIS relativo à cooperação policial e judiciária em matéria penal.
No âmbito do programa STOP II, a Comissão Europeia organizou, em Setembro de 2002, em colaboração com a Organização Internacional das Migrações (OIM) e o Parlamento Europeu, a Conferência Europeia sobre a Prevenção e a Luta contra o Tráfico de Seres Humanos - Desafio Global para o Século XXI.
O resultado final da Conferência é a Declaração de Bruxelas (pdf ), que define o tráfico de seres humanos como «um fenómeno abominável e preocupante, que envolve a exploração sexual coerciva, a exploração do trabalho em condições próximas da escravatura, a exploração da mendicidade e da delinquência juvenil, bem como a servidão doméstica».
Nas recomendações constantes do seu anexo, a Declaração prevê a criação de um grupo de peritos com o objectivo de consolidar e de reforçar a validade e a eficácia das normas e das melhores práticas aplicadas no âmbito da política de luta contra o tráfico de seres humanos.
Disposições relativas ao grupo de peritos
O grupo de peritos assume a forma de um grupo consultivo, em conformidade com a prática actual noutros domínios. O objectivo consiste em fornecer peritagens à União Europeia, sob a forma de pareceres ou de relatórios, no domínio da prevenção e do combate ao tráfico de seres humanos. No prazo de nove meses a contar da sua criação, o grupo deve apresentar um relatório destinado a permitir à Comissão lançar novas iniciativas a nível europeu.
O grupo será composto por peritos no domínio do tráfico de seres humanos. Estes peritos deverão ter adquirido experiência em actividades desenvolvidas no seio de entidades empenhadas na luta contra o tráfico de seres humanos. Serão designados pela Comissão no termo de um processo que envolve todos os intervenientes em causa. As funções exercidas pelos peritos não serão remuneradas.
A fim de garantir uma composição equilibrada, o grupo de peritos terá vinte membros, dos quais sete das administrações dos Estados-Membros da UE, quatro das administrações dos países candidatos e nove das organizações intergovernamentais, internacionais e não governamentais activas a nível europeu e com experiência e conhecimentos comprovados na área do tráfico de seres humanos.
O mandato dos membros terá a duração de um ano renovável. A decisão de renovação é tomada em função dos resultados obtidos pelo grupo.
Actividades do grupo
Para cumprir a sua missão, o grupo de peritos pode criar grupos de trabalho ad hoc, compostos por 8 membros, no máximo.
O grupo de peritos apresentará os seus pareceres e relatórios à Comissão, que pode decidir publicá-los na Internet. Se o parecer ou o relatório for adoptado por unanimidade pelo grupo de peritos, este redigirá conclusões comuns.
Peritos suplementares
A decisão prevê a participação nos trabalhos do grupo de representantes oficiais dos Estados-Membros, dos países candidatos ou de países terceiros, bem como de organizações internacionais, intergovernamentais e não governamentais, a fim de iniciar um diálogo precoce entre o grupo de peritos e os Estados e organizações que deverão aplicar as medidas futuras que poderão inspirar-se nas recomendações do grupo.
SÍNTESE
Estas decisões visam prevenir e combater o tráfico ilícito de migrantes. O Conselho recorda em primeiro lugar que este tipo de tráfico põe em risco a segurança e a vida dos migrantes. A fim de pôr termo a estas actividades, insta os Estados Partes e os organismos das Nações Unidas a reforçarem a cooperação internacional. O Conselho tenciona assim:
combater as causas profundas das migrações, designadamente as que estão ligadas à pobreza;
demonstrar as inúmeras vantagens dos movimentos migratórios legais;
incentivar os mecanismos inter-regionais, regionais e sub-regionais a continuarem a tratar da questão do desenvolvimento e das migrações.
Estas decisões são aplicáveis à prevenção, investigação e repressão das infracções cometidas com o objectivo de obter um benefício financeiro ou outro benefício material. Tais actos dizem respeito:
à introdução clandestina de migrantes, isto é, facilitar a entrada ilegal de uma pessoa num Estado do qual essa pessoa não é nacional ou residente;
à elaboração de um documento de viagem ou de identidade fraudulento, isto é, à falsificação ou à alteração de um documento por uma pessoa que não esteja legalmente autorizada a fazê-lo;
à utilização de documentos de identidade por outra pessoa que não o seu titular legítimo;
à obtenção e à emissão de documentos fraudulentos;
ao facto de permitir a uma pessoa que permaneça num Estado sem preencher as condições legais necessárias para o efeito.
Os Estados Partes cooperam com vista a adoptar medidas legislativas que definam as infracções penais e as circunstâncias agravantes. Estas últimas são as que ameaçam a segurança e põem em perigo a vida dos migrantes em causa ou que se caracterizam por um tratamento desumano ou degradante desses migrantes.
Medidas de luta contra o tráfico ilícito de migrantes por via marítima
Um Estado Parte que tenha motivos razoáveis para suspeitar que um navio que arvora o seu pavilhão ou que invoca o registo da matrícula neste Estado, sem nacionalidade, pode pedir assistência a outros Estados Partes para pôr termo à utilização do referido navio. Este pedido é igualmente válido no caso de o navio ter a nacionalidade do Estado, mas recusar mostrar o seu pavilhão ou arvorar um pavilhão estrangeiro. Um Estado que tenha motivos razoáveis para suspeitar que um navio sem nacionalidade está a ser utilizado para o tráfico ilícito de migrantes, pode entrar a bordo e revistar o navio.
Um Estado Parte que tenha motivos razoáveis para suspeitar que um navio registado no estrangeiro se dedica ao tráfico de migrantes, notifica o Estado do pavilhão e solicita a confirmação do registo da matrícula. Tal pedido deve ser tratado o mais rapidamente possível. Se se confirmarem as suspeitas, o Estado requerente pode entrar a bordo e proceder à busca. Se forem encontradas provas que confirmem o tráfico, esse Estado Parte tem o direito de tomar medidas apropriadas quanto ao navio, às pessoas e à carga. Em contrapartida, o Estado Parte não pode tomar qualquer decisão sem autorização prévia do Estado do pavilhão, salvo em caso de perigo iminente. As autoridades habilitadas a receber pedidos de confirmação do registo de matrícula , de assistência e de autorização são designadas pelos Estados.
Só os navios ao serviço do Estado são autorizados a entrar a bordo do navio suspeito e a proceder a uma revista. Tais navios têm por obrigação:
garantir a segurança das pessoas a bordo, do navio e da sua carga;
não prejudicar os interesses comerciais ou os direitos do Estado do pavilhão;
assegurar que quaisquer medidas tomadas sejam ecologicamente razoáveis.
Para uma cooperação internacional
Cada Estado Parte deverá reforçar os controlos fronteiriços e têm o direito de recusar a entrada de pessoas envolvidas na prática de tráfico ilícito de migrantes. Os Estados que têm fronteiras comuns ou se encontram situados em itinerários utilizados pelos traficantes trocarão entre si informações relevantes, designadamente sobre:
os pontos de embarque e de destino utilizados pelos traficantes;
os itinerários e os meios de transporte utilizados;
a identidade e os seus métodos;
a autenticidade, as características, as modificações e a reprodução ilícita dos documentos de viagem e de identidade;
os métodos de dissimulação e de transporte dos migrantes;
a experiência legislativa;
as questões técnicas.
Os Estados deverão assegurar a formação dos funcionários dos serviços de imigração no domínio da prevenção do tráfico, do tratamento humano dos migrantes e do respeito dos seus direitos. Os Estados Partes que tenham conhecimentos especializados relevantes e recursos técnicos adequados deverão prestar assistência aos países de origem ou de trânsito dos migrantes. Os Estados Partes deverão cooperar entre si e com organizações competentes e outros sectores da sociedade civil, para assegurar uma formação adequada no domínio:
da melhoria da segurança e da qualidade dos documentos de viagem;
da detecção de documentos fraudulentos;
das actividades de recolha de informações;
dos métodos utilizados para o transporte de migrantes;
da melhoria de procedimentos para a detecção dos migrantes;
do tratamento humano de migrantes e da protecção dos seus direitos;
Medidas de prevenção, de protecção, de assistência e de regresso
Cada Estado Parte deverá lançar campanhas de informação destinadas a sensibilizar o público. Além disso, cada Estado Parte deverá promover programas de desenvolvimento e de cooperação a nível nacional, regional e internacional, de forma a combater as causas profundas da introdução clandestina de migrantes, tais como a pobreza e o subdesenvolvimento.
Os Estados deverão adoptar as disposições necessárias, a fim de proteger os direitos dos migrantes à vida e o direito a não ser submetido a tratamentos desumanos ou degradantes. Deverão ter em conta as necessidades específicas das mulheres e das crianças.
Cada Estado Parte acorda em facilitar o regresso de uma pessoa que foi objecto do tráfico de migrantes e que é seu nacional. A fim de facilitar o regresso de um migrante, o Estado Parte do qual essa pessoa é nacional deverá aceitar emitir os documentos necessários. Compromete-se a usar todos os meios para respeitar a segurança e a dignidade da pessoa.
Disposições finais
Nenhuma disposição deste Protocolo prejudicará outros direitos, obrigações e responsabilidades dos Estados. Os Estados Partes deverão procurar resolver os diferendos relativos à interpretação ou à aplicação do Protocolo por via da negociação. Em caso de desacordo, o diferendo é submetido a arbitragem. Se não se chegar a acordo sobre a organização da arbitragem, o diferendo é submetido ao Tribunal Internacional de Justiça. Cada Estado Parte pode declarar que não se considera ligado ao n.º 2 do artigo 20.º do Protocolo. No entanto, os Estados Partes podem retirar esta reserva mediante notificação dirigida ao Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Decorridos cinco anos sobre a data de entrada em vigor do Protocolo, um Estado Parte poderá propor uma emenda ao Secretário-Geral das Nações Unidas. Este último transmitirá, em seguida, a proposta de emenda para apreciação e as Partes no Protocolo farão todos os esforços para conseguirem chegar, por consenso, a um acordo. Se não se conseguir chegar a acordo, será tomada uma decisão por uma maioria de dois terços dos votos dos Estados Partes.
SÍNTESE
O programa Daphne III destina-se a prevenir e combater todas as formas de violência (física, sexual e psicológica), tanto na esfera pública como na esfera privada, contra as crianças, os jovens e as mulheres, e a proteger as vítimas e os grupos de risco. Completa os programas existentes nos Estados-Membros e baseia-se nas políticas e nos objectivos definidos nos dois programas Daphne anteriores (Daphne e Daphne II).
A dotação financeira prevista para o programa ascende a 116,85 milhões de euros para o período de 2007 a 2013.
Âmbito de aplicação e acesso ao programa
Os beneficiários do programa são as crianças, os jovens (entre os 12 e os 25 anos) e as mulheres que sejam vítimas de violência ou corram o risco de o ser. Estas categorias são consideradas vítimas de violência, mesmo nos casos em que sejam testemunhas de agressões contra um parente próximo.
O programa dirige-se a grupos-alvo como as famílias, os professores, os assistentes sociais, a polícia, o pessoal médico e judiciário, bem como às organizações não governamentais (ONG) e às autoridades públicas.
É aberto aos Estados-Membros da União e aos países da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA), aos signatários do acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE), bem como, em certas condições, aos países candidatos e aos países dos Balcãs.
São elegíveis para apresentar propostas as organizações e instituições privadas ou públicas (autoridades locais, departamentos universitários e centros de investigação) activas no domínio da prevenção e da luta contra a violência ou do apoio às vítimas.
Objectivos do programa
O programa visa especificamente:
Apoiar e incentivar as ONG e outras organizações que se mobilizam contra a violência.
Criar redes pluridisciplinares para reforçar a cooperação entre ONG.
Definir e executar acções de sensibilização dirigidas a públicos-alvo.
Divulgar os resultados obtidos no âmbito dos dois programas Daphne anteriores.
Garantir a troca de informações e de boas práticas, por exemplo através de visitas de estudo e intercâmbios de pessoal.
Estudar os fenómenos ligados à violência e o seu impacto sobre as vítimas e a sociedade (custos sanitários, sociais e económicos).
Elaborar programas de assistência às vítimas e às pessoas em risco, bem como programas de intervenção junto dos autores de violências.
Acções apoiadas
Para atingir tais objectivos, o programa apoia três tipos de projectos:
Acções levadas a cabo pela Comissão Europeia: trabalhos de investigação, sondagens e inquéritos de opinião, recolha e divulgação de dados, seminários, conferências e reuniões de peritos, criação e actualização de sítios da Internet, etc.
Projectos transnacionais de interesse comunitário em que participem pelo menos dois Estados-Membros.
Apoio às ONG ou outras organizações cujos objectivos têm interesse geral europeu.
Aplicação
O financiamento comunitário pode assumir as formas seguintes:
Subvenções (de acção ou de funcionamento) com base em convites à apresentação de propostas.
Concursos públicos para medidas complementares (por exemplo, despesas de informação e de comunicação, de acompanhamento e de avaliação), para financiar a aquisição de serviços e bens.
Todos os anos, a Comissão adopta um programa de trabalho que fixa as suas prioridades e propõe uma repartição indicativa dos fundos a atribuir às subvenções. Por outro lado, publica todos os anos uma lista dos projectos financiados no âmbito do programa.
O Daphne III completa os programas "Segurança e protecção das liberdades" e "Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios ( )", o 7.º Programa-quadro de investigação e desenvolvimento, os programas " PROGRESS " e " Safer Internet Plus ", bem como as actividades do Instituto Europeu para a Igualdade de Género.
Acompanhamento e avaliação
Os beneficiários do financiamento devem apresentar relatórios técnicos e financeiros sobre a execução das acções, bem como um relatório final, no prazo de três meses após a conclusão das acções. É igualmente efectuado um acompanhamento e um controlo financeiro.
A Comissão apresenta ao Parlamento e ao Conselho um relatório intercalar de avaliação da execução dos projectos e respectivos resultados (até 31 de Março de 2011), bem como um relatório de avaliação ex post sobre a execução e os resultados do programa (até 31 de Dezembro de 2014). Entretanto, até 31 de Maio de 2012, deve apresentar uma comunicação sobre a prossecução do programa.
Contexto
O programa específico "Daphne III" faz parte do programa geral "Direitos fundamentais e justiça", o qual, juntamente com os programas "Solidariedade e gestão dos fluxos migratórios" e "Segurança e protecção das liberdades", substitui os instrumentos que a Comissão geria nos domínios da justiça, liberdade e segurança. Estes novos programas inscrevem-se no quadro financeiro para 2007-2013.
Artigos, Pareceres, Memoriais e Petições
Tráfico de Mulheres: Prevenção, Punição e Proteção
Mônica de Melo
Procuradora do Estado de São Paulo, Professora Assistente Mestre da PUC/SP de Direito Constitucional, Diretora do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública – IBAP e
Coordenadora da ONG “Oficina dos Direitos da Mulher”.
Letícia Massula
Advogada. Assessora Técnica da AGENDE Ações em Gênero Cidadania e Desenvolvimento e integrante do CLADEM Brasil – seção nacional do Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher, Diretora Executiva da ONG Centro Dandara de Promotoras Legais Populares.
Sumário: 1- Tráfico de Mulheres: dados, causas, conseqüências e vulnerabilidade das mulheres. 2- Proteção Internacional: conceito de tráfico de mulheres do Protocolo Adicional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças. 3- Proteção Interna. 4- Conclusão e Propostas.
1- Tráfico de Mulheres: dados, causas, conseqüências e vulnerabilidade das mulheres.
O Congresso Nacional, através do Senado Federal aprovou, através da Resolução n. 231 de 29/5/03, o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças. Falta apenas o Decreto do Presidente da República para que a ratificação seja enviada à Organização das Nações Unidas (ONU) e o Protocolo possa ser aplicado no Brasil.
O Protocolo representa um avanço fundamental na proteção das mulheres vítimas do tráfico internacional de pessoas, reconhecendo a necessidade de especial proteção às mulheres que representam o grupo mais vulnerável ao tráfico e a exploração sexual bem como às modernas formas de escravidão.
O Protocolo reconhece a necessidade de proteção global e internacional dos direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos que se ressentem da falta de um instrumento universal que trate de todos os aspectos relativos ao tráfico de pessoas, apesar da existência de uma variedade de instrumentos internacionais que contém normas e medidas práticas para combater a exploração de pessoas, especialmente mulheres e crianças. Daí sua importância ímpar na proteção de centenas de mulheres, jovens e crianças que são verdadeiramente comercializadas para fins de exploração sexual inclusive internamente, no Brasil, e não só para o exterior.
Pesquisa Nacional sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de Exploração Sexual Comercial(1) realizada entre 2001 e 2002 identificou, no Brasil, 241 rotas de tráfico, sendo 131 internacionais, 78 interestaduais e 32 intermunicipais. As mulheres e adolescentes vítimas do tráfico internacional são levadas para a Espanha (destino mais frequente com 32 rotas), Holanda (11 rotas), Venezuela (10 rotas), Itália, Portugal, Paraguai, Suíça, Estados Unidos, Alemanha e Suriname. A Região Norte apresenta o maior número de origem das rotas, seguida de perto pela Região Nordeste e, um pouco mais distante, pela Sudeste, pela Centro-Oeste e pela Sul, no tráfico nacional. No tráfico internacional predomina a Região Nordeste.
São vários os casos de mulheres que são convidadas para trabalhar no exterior e lá descobrem que foram levadas para casas de prostituição, ou mesmo de mulheres que são atraídas para se prostituírem no exterior e lá têm documentos confiscados pelos aliciadores, sob o pretexto de que têm que pagar pela estadia, comida e roupas, ficando em cárcere privado por deverem mais do que conseguem ganhar.
Mais de 700.000 pessoas são traficadas todo o ano com o propósito de exploração sexual e trabalho forçado. Elas são levadas para fora de seus países e vendidas para o que poderíamos chamar de "novo mercado da escravidão" segundo dados da divisão das Nações Unidas para Drogas e Crimes.(2)
Foi identificado que, no Brasil, o tráfico para fins sexuais é, predominantemente, de mulheres e garotas negras e morenas, com idade entre 15 e 27 anos.
É inegável, historicamente, que a construção legal dos direitos fundamentais da pessoa, se deu, inicialmente, com a exclusão da mulher.
Um dos documentos históricos paradigma de todas as cartas de direitos contemporâneas é a clássica "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão" da Revolução Francesa de 1789. Na ocasião a célebre Olimpe de Gouges foi guilhotinada por reclamar igualdade política para ambos os sexos. Escritora, ela elaborou a "Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã" (1791), na qual pedia que fossem abolidos todos os privilégios masculinos. O primeiro artigo dessa declaração proclama que "a mulher nasce livre e permanece igual ao homem em seus direitos". Na condenação de Olimpe de Gouges consta a acusação "de ter querido ser um homem de Estado e ter esquecido as virtudes próprias do seu sexo" (3)
Embora os principais documentos internacionais de proteção dos direitos humanos e praticamente todas as Constituições da era moderna proclamem a igualdade de todos, essa igualdade, foi em um primeiro momento compreendida apenas em seu aspecto formal, de vedação de discriminação por parte da lei. E só muito recentemente é que se passou a refletir sobre a insuficiência dessa fórmula, desse conteúdo jurídico para garantir a igualdade real, a igualdade de fato. Assim, logo se instalou um abismo entre o que se poderia esperar da igualdade formal e a igualdade real, almejada.
Em 1997 o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) criou dois índices para medir as diferenças por gênero: o Índice de Desenvolvimento por Gênero (IDG) que leva em conta as diferenças de esperança de vida, alfabetização, matrícula na escola e renda entre homens e mulheres e o Índice de Poder por Gênero (IPG) que mede o grau de participação das mulheres na força de trabalho, nos cargos de chefia, na política e em profissões técnicas. Quando pela primeira vez os dados sobre as mulheres foram analisados de forma separada o PNUD sustentou em seu Relatório do Desenvolvimento Humano de 1997 que "Nenhuma sociedade trata suas mulheres tão bem quanto seus homens".
O processo de globalização econômica tem gerado um agravamento da desigualdade econômica e social e um fenômeno específico que tem sido designado internacionalmente de "feminização da pobreza",(4) pois a maioria das um milhão e quinhentas mil (1.500.000) pessoas que vivem com 1 dólar ou menos por dia são mulheres.
Relatório do Banco Mundial de 2.000(5) divulgado por ocasião da reunião mundial destinada a avaliar os avanços e retrocessos após cinco anos da Conferência Internacional das Nações Unidas sobre a Mulher (Pequim+5), argumenta que o desenvolvimento econômico é uma questão de gênero e países que diminuem as desigualdades entre homens e mulheres têm índices menores de corrupção e taxas de crescimento econômico mais elevadas. Portanto, onde os direitos das mulheres são mais respeitados e onde elas têm mais acesso ao poder, ao trabalho, à saúde e à educação, o desenvolvimento econômico ganha outra dimensão.
Em todo o mundo, segundo dados divulgados pela ONU, por ocasião do encontro mundial de avaliação dos cinco anos da Conferência Mundial de Pequim, as mulheres ganham um pouco mais de 50% do que recebem os homens. Ou seja, a pobreza no mundo, afeta sobretudo as mulheres e os efeitos negativos do processo de globalização da economia repercutem desproporcionalmente sobre a mulher.
Enfim, vivemos uma situação de desigualdade de fato entre mulheres e homens que se camufla na formula jurídica constitucional: "Todos são iguais perante a lei". Esta situação de desigualdade e de discriminação, cumpre destacar, é a base para outros abusos e para a prática de violência contra a mulher.
A maior parte das pessoas que migram de países em desenvolvimento em busca de trabalho são mulheres. Paralelamente às razões de ordem econômica e pobreza, as mulheres enfrentam o problema da discriminação e da violência que as forçam a fugir de seus países. Muitas acreditam estar migrando em busca de emprego e melhores condições de vida, mas a grande maioria é explorada por redes internacionais de tráfico para a prostituição forçada. Como a grande maioria vive na ilegalidade, quase não há dados sobre essas mulheres e elas acabam sofrendo dupla discriminação ao se verem impedidas de denunciarem sua situação.
Segundo Relatório da Anistia Internacional, divulgado em março de 2.001(6), o tráfico de seres humanos é a terceira maior fonte de lucro(7) do crime organizado internacional, depois das drogas e armas, movimentando bilhões de dólares, sendo que a Organização das Nações Unidas (ONU) acredita que quatro milhões de pessoas são traficadas todo ano. Relatório do Departamento de Estado dos EUA de 2.000 afirmou que entre 45.000 e 50.000 mulheres e crianças traficadas ingressam no país por ano.
Relatório divulgado a propósito do Dia Internacional da Mulher de 2001 pelo órgão executivo da União Européia (UE) destacou que 120 mil mulheres e crianças são introduzidas ilegalmente, por ano, na UE. A maior parte é do Leste Europeu. Há estimativas de que os bandos transportam até 500 mil mulheres para a UE a cada ano. A meta do tráfico de pessoas é não somente a prostituição, mas também a exploração de mão-de-obra sob condições semelhantes às da escravidão, diz o relatório.
De acordo com o grupo de pesquisa norte-americano Protection Project,(8) dois milhões de mulheres e crianças são "vendidas" a cada ano.
Todos os anos, pelo menos 120 mil mulheres são contrabandeadas para a Europa ocidental, a maioria procedente das regiões leste e central do continente, e obrigadas a trabalhar como prostitutas. São números que assombram. Outros fatos denunciados pelo Protection Project:
- As asiáticas são "vendidas" para bordéis da América do Norte por 16 mil dólares, cada;
- Cerca de 200 mil meninas do Nepal, a maioria menor de 14 anos, trabalham como escravas sexuais na Índia;
- Pelo menos 10 mil mulheres da antiga União Soviética transformaram-se, forçosamente, em prostitutas em Israel;
- O governo tailandês relatou a venda de 60 mil crianças para o mercado da prostituição;
- Dez mil crianças, entre seis e 14 anos de idade, passaram a trabalhar como escravas sexuais em bordéis de Sri Lanka;
- Cerca de 20 mil mulheres e crianças de Mianmar foram obrigadas a se converter à prostituição na Tailândia.
O grupo norte-americano diz, ainda, que, dos 155 casos de prostituição involuntária ou forçada levados perante tribunais na Holanda, apenas quatro resultaram na condenação dos traficantes sexuais. O Protection Project está compilando dados relativos a leis sobre tráfico de mulheres, prostituição forçada e escravidão em 190 países e 63 territórios.
Na Grã-Bretanha, estão surgindo detalhes sobre dezenas de adolescentes que estavam em custódia de serviços sociais e foram seqüestradas por gangues organizadas e obrigadas a trabalhar como prostitutas, principalmente na Itália.
As meninas em questão eram africanas, que haviam chegado à Grã-Bretanha em busca de asilo. Depois que chegavam ao aeroporto de Gatwick, no sul da Inglaterra, internavam-se em serviços sociais de West Sussex.
A ONU e a Federação Internacional Helsinque de Direitos Humanos dizem que 75 mil brasileiras estariam sendo obrigadas a se prostituir nos países da União Européia. De acordo com as Nações Unidas, o Brasil é hoje o maior "exportador" de mulheres escravas da América do Sul. Segundo o governo brasileiro, há uma estimativa de que a maioria das mulheres nessa situação vêm, pela ordem, de Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo. São moças que vão para o exterior em busca de uma vida melhor e acabam sendo vítimas de quadrilhas organizadas.
O tráfico de mulheres, diz Lená Medeiros de Menezes, (9)pode ser caracterizado sempre que são preenchidas quatro condições básicas: o cruzamento de uma fronteira, a existência de um intermediário que forneça transporte e carteira de identidade - seja esta falsa ou roubada -, a caracterização de uma relação comercial, e, finalmente, a entrada ou permanência ilegal da mulher no país de destino. O tráfico, dessa forma, define-se como um "processo migratório marginal" que acompanha os grandes fluxos internacionais, variando em suas rotas e impulsos, mas conservando um elemento básico propulsor: as crises internas que aquecem os movimentos populacionais sejam elas de ordem política, econômica ou social. Nesse sentido, a proximidade dos processos vividos nos idos de 1900 e na virada dos 2000 mostra-se surpreendente. Ontem como hoje, os deslocamentos populacionais contemplam em seus bastidores o tráfico de mulheres. Ontem como hoje, o Brasil figura como um dos países envolvidos: no passado, como lugar de chegada, no presente, como lugar de partida.
2- Proteção Internacional: conceito de tráfico de mulheres do Protocolo Adicional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças.
O tráfico de mulheres tem sido objeto de preocupação da comunidade internacional. "O primeiro documento internacional contra o tráfico (1904) mostrou-se ineficaz não somente porque não era propriamente universal, como também porque revelava uma visão do fato centrada na Europa. O segundo documento, de 1910, complementou o primeiro na medida em que incluía provisões para punir aliciadores, mas obteve apenas 13 ratificações. Os instrumentos seguintes, de 1921 e 1933, que foram elaborados no contexto da Liga das Nações, eram mais abrangentes, mas definiam o tráfico independentemente do consentimento da mulher.
Esses quatro instrumentos foram consolidados pela Convenção de 1949, que permaneceu como o único instrumento especificamente voltado ao problema do tráfico de pessoas até a adoção da Convenção de Palermo e de seus Protocolos".(10) Ainda, segundo o autor, a Convenção e Protocolo Final para a Supressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio (Convenção de 1949), que foi ratificada pelo Brasil em 1958, partiu de uma perspectiva proibicionista da prostituição. Estava centrada na questão da prostituição e procurou criminalizar os atos com ela relacionados, embora excluísse a própria prostituição da criminalização. Não trazia uma definição de tráfico de pessoas e excluía um vasto espectro de mulheres de sua proteção ao se confinar ao tema da prostituição.(11) O instrumento ainda vigora e iguala tráfico e a exploração da prostituição. O mais grave era que a Convenção permitia a expulsão de mulheres que tinham sido submetidas ao tráfico e que viviam da prostituição.
Sem tratar especificamente da punição do tráfico de pessoas, o sistema de proteção internacional dos direitos humanos foi se aperfeiçoando e um marco dessa proteção ocorreu em Viena, em 1993, por ocasião da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, para a qual o movimento de mulheres levou a bandeira de luta: "os direitos da mulher também são direitos humanos", ficando consignado na Declaração e Programa de Ação de Viena (item 18) que:
"Os direitos humanos das mulheres e das meninas são inalienáveis e constituem parte integral e indivisível dos direitos humanos universais".
Reflexão que foi renovada por ocasião do quinquagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948).
No plano de proteção internacional dos direitos da mulher no qual o Brasil também se insere, uma vez que a própria Constituição estabelece (§ 2o do art. 5.o) que os direitos e garantias nela expressos não excluem outros decorrentes do regime e princípios por ela adotados e dos tratados internacionais de que o Brasil seja parte, queremos ressaltar dois Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil que tratam especificamente dos direitos das mulheres: Convenção da ONU sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher ratificada em 1984 e Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher ratificada em 1995.
Os Tratados Internacionais que o Brasil ratifica, além de criarem obrigações para o Brasil perante a Comunidade Internacional, também criam obrigações internas gerando novos direitos para as mulheres que passam a contar com uma última instância internacional de decisão quando todos os recursos disponíveis no Brasil falharem na realização da justiça.
Mas, a resistência de todos os países em assegurar direitos às mulheres é muito grande. A Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) foi dentre as Convenções da ONU a que mais recebeu reservas por parte dos países que a ratificaram.
O artigo 6o da CEDAW estabelece que os Estados-partes tomarão as medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para suprimir todas as formas de tráfico de mulheres e exploração de prostituição da mulher. Essa Convenção foi fortalecida pela ratificação pelo Brasil, em 28 de junho de 2002, de seu Protocolo Facultativo que permite a apresentação de denúncias de sua violação ante o Comitê da ONU que monitora a Convenção. A Plataforma de Ação da Conferência Internacional da Mulher de Pequim de 1995 também determina que os países tomem medidas apropriadas para atacar as raízes do tráfico: a desigualdade, a discriminação, a falta de acesso às fontes de sobrevivência entre outros.
Entretanto é a Convenção da ONU, de Palermo, contra o Crime Organizado Transnacional que foi adotada em novembro de 2000, que vai tratar especificamente do tráfico de mulheres ao incluir o Protocolo para Prevenir, Punir e Erradicar o Tráfico de Pessoas, especialmente de Mulheres e Crianças.(12)
O tráfico de mulheres favorece uma ampla violação dos direitos humanos das mulheres. Mulheres que são traficadas com a finalidade de serem exploradas sexualmente são frequentemente torturadas, sexualmente abusadas, estupradas. São punidas se tentam escapar ou se recusam a ter relações sexuais com os clientes além dos riscos das doenças sexualmente transmissíveis e a AIDS.(13) Costumam ter seus documentos e passaportes apreendidos e tem que pagar para obtê-los de volta, o que nunca conseguem, vivendo presas, reduzidas à condição de escravas.
A definição do Protocolo da Convenção de Palermo é bastante ampla para abarcar as mais diversas atividades e finalidades envolvidas no tráfico de mulheres. O artigo 3º do Protocolo define o tráfico de pessoas, ressaltando a especificidade do tráfico de mulheres e crianças, como o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, à escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.
A questão do consentimento da vítima é irrelevante para a caracterização do tráfico, uma vez que a vítima pode até ter concordado em trabalhar para a prostituição,(14) mas jamais imaginou que seria escravizada, explorada sexual e economicamente e violada em seus direitos fundamentais. Portanto, a partir do momento em que ocorre uma situação de exploração sexual ou econômica, através de alguma das formas especificadas no artigo 3o do Protocolo, a vítima merece proteção. Ou seja, para a caracterização do tráfico de mulheres é necessário que se realize alguma espécie de locomoção da pessoa envolvida através de ameaças, coação, falsas promessas, abuso de poder, abuso de uma situação de fragilidade sempre para fins de exploração. Essa exploração pode ser de natureza sexual, para fins de prostituição ou outras formas de exploração sexual ou para que a mulher seja explorada economicamente, através de trabalho sem remuneração ou com remuneração sempre inferior às dívidas que é obrigada a contrair com o receptor que a mantém, envolvendo práticas similares à escravidão ou de serviços forçados, ou ainda para remoção de órgãos.
O Protocolo revela especial preocupação com as vítimas de tráfico de pessoas em mais de um momento, sendo que o princípio orientador do atendimento às vítimas é o da não discriminação internacionalmente reconhecido (artigo 14). No primeiro momento o Protocolo é claro ao não considerar relevante o consentimento da vítima para a configuração do tráfico, já que objetiva protegê-las da exploração. Também inclui a preservação da privacidade das vítimas. O artigo 6o determina que nos casos em que seja apropriado e na medida em que seja permitido pela legislação interna de cada país, deve-se proteger a privacidade e a identidade das vítimas de tráfico de pessoas, inclusive a confidencialidade dos procedimentos judiciais relacionados.
Outra importante medida para as vítimas diz respeito à previsão de orientação e assistência jurídica, ou seja, deve-se garantir às vítimas de tráfico informações sobre os procedimentos judiciais e administrativos e assistência para permitir que suas opiniões e preocupações sejam levadas em consideração nas fases adequadas do processo penal, sem prejuízo do direito de defesa. Também se prevê (artigo 6.3) que o Brasil deva adotar medidas que permitam a recuperação física, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas. Podendo, nesse aspecto, estabelecer convênios e parcerias com organizações não governamentais e outras da sociedade civil para garantir e incluir, se for o caso, alojamento adequado, aconselhamento e informação no tocante aos direitos reconhecidos em lei, em língua que as mulheres vítimas compreendam, assistência médica, psicológica e material e oportunidades de emprego, educação e formação. Sendo que toda essa assistência deverá observar as especificidades de idade, sexo e as necessidades específicas das vítimas de tráfico de pessoas, inclusive das crianças.
Há, ainda, a necessidade de cada Estado Parte desenvolver todos os esforços possíveis para garantir a segurança física das vítimas de tráfico enquanto se encontrarem em seu território e de assegurar que o seu sistema jurídico contenha medidas que ofereçam às vítimas de tráfico de pessoas a possibilidade de obterem indenização pelos danos sofridos.
Por fim, o Protocolo pede que os Estados-partes considerem a possibilidade de adotar medidas legislativas e outras que permitam às vítimas de tráfico de pessoas permanecerem em seu território a título temporário ou permanente, tendo-se em vista fatores de ordem humanitária e pessoais. Ainda sob esse aspecto, o país de nacionalidade ou de residência permanente da pessoa vítima de tráfico deve facilitar e aceitar, sem demora indevida ou injustificada o seu retorno, tendo em vista a segurança da mesma.
Quando se tratar de tráfico de crianças, basta apenas o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento para a caracterização de tráfico, sem a necessidade de comprovar ameaça, uso de força, rapto, fraude, engano e as demais formas previstas no artigo 3o do Protocolo, ou seja, há uma presunção do uso de meios ilícitos que favorece as crianças, que nos termos do Protocolo significa qualquer pessoa, menina ou menino com idade inferior a dezoito anos.
O Protocolo exige medidas de prevenção, investigação e repressão, ou seja, o Brasil se obriga a implementar políticas públicas capazes de prevenir (artigo 9o) o tráfico de mulheres e de proteger as pessoas vítimas de tráfico de nova ocorrência, através de pesquisas, campanhas de informação e de difusão através de órgãos de comunicação, divulgação de informações, publicações, orientação, debates, seminários, iniciativas sociais e econômicas dentre outras. Entretanto, se ainda assim ocorrer o tráfico, o Brasil se obriga a ter uma legislação adequada para sua punição, aparato policial e judiciário capaz de apurar e punir os infratores das condutas descritas no artigo terceiro. Para tanto os países deverão assegurar ou reforçar a formação dos agentes dos serviços competentes para a aplicação da lei, dos serviços de imigração ou de outros serviços competentes na punição e prevenção do tráfico de pessoas. Essa formação deverá levar em conta a proteção dos direitos humanos e os problemas específicos das mulheres e das crianças.
Por fim, também deve haver a preocupação com a adoção de medidas que a médio e longo prazo possam contribuir para a eliminação do tráfico de mulheres, ou seja, medidas que possam avançar no sentido da sua erradicação.
O Protocolo avança muito após mais de 50 anos da adoção da Convenção de 1949. Entretanto, nos parece ainda precário o seu sistema de monitoramento, já que não conta com a possibilidade do oferecimento de denúncias de sua violação por parte dos Estados-partes e pelas vítimas protegidas pelo Protocolo.
Ou seja, faltam mecanismos concretos para que as vítimas possam acessar o sistema internacional de proteção quando o País não estiver cumprindo o Protocolo, ou mesmo no caso de órgãos internacionais são responsáveis pelo monitoramento do cumprimento do Protocolo.
3- Proteção Interna
No âmbito interno o Código Penal Brasileiro trata apenas do tráfico internacional de mulheres (artigo 231). Quando o tráfico ocorre internamente, normalmente o enquadramento legal é o do crime de "favorecimento à prostituição" (artigo 228), já que não há um tipo penal específico para o tráfico interno de mulheres. Esse é um ponto no qual o Brasil deve se centrar se quiser realmente enfrentar o grave problema do tráfico de mulheres, já que a pesquisa do CECRIA identificou 110 rotas internas de tráfico.
Como o Código Penal Brasileiro não define como crime o tráfico interno, esse crime acaba não sendo punido adequadamente e, nos termos do Protocolo, o Brasil acaba por não adotar medidas concretas para punir, prevenir e reprimir o tráfico interno de mulheres.
O Protocolo determina que os Estados-partes deverão adotar as medidas legislativas internas necessárias à efetivação do Protocolo inclusive para estabelecer os tipos penais internos. O artigo 5o determina que o Brasil deve adotar medidas legislativas e outras que considere necessárias, de forma a estabelecer como infrações penais os atos descritos no artigo 3º que caracterizam o tráfico de mulheres, quando praticados intencionalmente.
O Protocolo assinala a necessidade de ser punida a "tentativa" de prática dos atos descritos como tráfico de mulheres, bem como a participação de todos os envolvidos, seja na qualidade de autor, co-autor, cúmplice, partícipe, mentor, organizador entre outros. Ou seja, o Protocolo obriga a punição não somente dos diretamente envolvidos, mas também dos indiretamente envolvidos. É claro que, cada um na medida de sua participação e responsabilidade.
Com a ratificação do Protocolo, por parte do Brasil, espera-se que a legislação interna seja aperfeiçoada de modo a cumprir o estatuído.
4- Conclusão e Propostas
Importantes avanços foram conquistados do ponto de vista da proteção internacional dos direitos humanos das mulheres com a adoção da CEDAW, da Plataforma de Ação de Pequim e, finalmente, do Protocolo da Convenção de Palermo para a repressão do tráfico de pessoas, em especial o de mulheres. Os avanços obtidos permitem afirmar que as vítimas do tráfico já não podem mais ser consideradas como criminosas e cúmplices do tráfico, mas sim como pessoas que sofreram sérias violações em seus direitos humanos fundamentais. Para tanto se torna irrelevante que a mulher tenha consentido em exercer a prostituição fora de seu país. Esse fato, por si só, não a torna ré do crime de tráfico de pessoas, pois com o Protocolo se reconhece expressamente sua vulnerabilidade e a necessidade de apoiá-la e protegê-la nessa situação.
Entretanto, a legislação interna não trata do tráfico interno de mulheres existente, o que nos leva a constatar a necessidade urgente de adequar a proteção interna aos padrões internacionais de proteção dos direitos humanos das mulheres.
Portugal não está preparado para lidar com o desafio que a Internet representa como arma no tráfico de mulheres para as redes de prostituição, alertou esta terça-feira uma representante da Associação das Mulheres contra a Violência, noticia a Lusa.
«As autoridades não se mexem à mesma velocidade que os agressores. Em Portugal, como na maior parte dos países, as redes que traficam ou as redes que utilizam a Internet para cometer crimes organizaram-se muito mais rapidamente que as próprias autoridades nacionais e, portanto, Portugal não está preparado para lidar com o nível de crimes e com a dimensão que neste momento o crime já tem a nível da Internet», disse à Lusa Margarida Medina Martins, no final de um debate sobre «O tráfico de mulheres para redes de prostituição», que decorreu na Escola Superior de Comunicação Social, em Lisboa.
Redes transportam jovens dentro do país
No entender da representante da Associação das Mulheres contra a Violência, os crimes fiscais ou patrimoniais são os que têm maior visibilidade e, por isso, merecem maior atenção das autoridades, mas sublinhou que a criminalidade exercida contra mulheres e crianças, para além da pedofilia, «começa a ter alguma dimensão em Portugal».
«Para além de termos jovens que são levados de uma zona do país para outras zonas por redes, nós não estamos a reagir à velocidade que deveríamos face ao risco que a Internet representa nas questões da segurança», salientou.
Traficantes recrutam mulheres em Portugal
Também presente no debate, o representante da Amnistia Internacional sublinhou que Portugal, no seio do tráfico de mulheres, tem alterado o seu papel. «Ao contrário do que acontecia até há uns anos atrás, em que Portugal era essencialmente um país de trânsito, até pela sua posição geográfica, e era também um país de destino de mulheres, nomeadamente do Brasil, começa a ser agora um país de recrutamento», alertou Pedro Krupenski.
«Há tentativas de recrutamento de algumas mulheres para serem integradas nestas redes e os mecanismos utilizados são variadíssimos, desde a coação a mulheres que não exercem qualquer tipo de prostituição, mas como mais pressão a recrutar aquelas que já são prostitutas», acrescentou.
O debate sobre «O tráfico de mulheres para redes de prostituição» insere-se no Dia Internacional para a Eliminação da Violência sobre as Mulheres que hoje se assinala.
A realização desta publicação só foi possível graças ao apoio do Consulado Geral dos Estados Unidos da América em São Paulo.
Introdução
Esta cartilha foi elaborada por ocasião do Seminário Internacional sobre Tráfico de Mulheres realizado em outubro de 2003, por uma parceria estabelecida entre o Consulado Geral dos Estados Unidos da América, a Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania de São Paulo, o CLADEM Brasil - seção nacional do Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher, o Conselho Estadual da Condição Feminina, a ONG Elas por Elas na Política e a Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo e com o apoio de outras entidades do movimento de mulheres.
O objetivo desta publicação é sensibilizar e alertar a sociedade para o grave problema do tráfico de seres humanos, em especial das mulheres, levar informações para os profissionais que trabalham no atendimento às vítimas e ainda anunciar publicamente a criação de um escritório modelo para atendimento de casos de tráfico de mulheres no Estado de São Paulo. Visa ainda informar as vítimas acerca de seus direitos e de como proceder quando se encontrarem numa situação de tráfico bem como ainda contribuir na formação d@s[3] profissionais que trabalham diretamente no atendimento dos casos.
Orienta esse trabalho a concepção de que os direitos das mulheres são direitos humanos e que, portanto, as escolhas das mulheres devem ser respeitadas, sem quaisquer discriminações ou preconceitos. Quem é traficada se encontra numa posição de vulnerabilidade e merece todo o respeito dos profissionais responsáveis pelo atendimento, independentemente do fato desta vítima haver concordado ou não com uma proposta de trabalhar como profissional do sexo.
Para atender a estes objetivos dividimos a cartilha em duas partes distintas: Guia Teórico e Guia Prático, sendo o primeiro voltado prioritariamente para os profissionais que trabalham no atendimento e o segundo para as vítimas e familiares de vítimas. Embora dividido em duas partes distintas, com concepções, linguagens e objetivos diferenciados, o material pode e deve ser analisado como um todo uma vez que as duas partes dialogam entre si e tanto a parte teórica pode auxiliar as vítimas como a parte prática pode subsidiar o trabalho dos profissionais que atendem diretamente aos casos.
Ao final, a cartilha traz ainda dois anexos, o primeiro com os locais para o oferecimento de denúncias e o segundo com a íntegra do Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças, aprovado pelo Senado Federal, através da Resolução n. 231 de 29/5/03.
Com essa cartilha esperamos contribuir com a prevenção, punição e erradicação do tráfico de mulheres no Brasil, possibilitando que as brasileiras vivam numa sociedade sem violência e com respeito à sua dignidade.
Essas belas mulheres e seus corpos milionários
Letra
A- A+
Maria Clara Lucchetti Bingemer *
Adital -
Problema número um de saúde pública do século XXI, o tráfico de drogas é também o negócio que mais movimenta dinheiro em todo o mundo. Não se consegue calcular quantos infinitos milhões de dólares circulam de um lado a outro do planeta através do pó mágico da cocaína, da erva da maconha, das pílulas de ecstasy ou de outras substâncias químicas. Estas prometem aos deprimidos e entediados seres humanos o paraíso das sensações artificiais de bem-estar, euforia e prazer. Portanto, não têm preço.
Ultimamente, no afã de transportar de um lado para outro as inebriantes drogas, o tráfico descobriu novo veículo: o corpo das mulheres. Não é de hoje que mulheres de todas as idades, de meninas quase crianças a senhoras respeitáveis, servem de "mula" para o tráfico. Ou seja, aceitam levar na bagagem um determinado contingente de droga em troca de remuneração (alta) a combinar.
Agora, porém, parece que a bagagem não é mais meio de transporte tão seguro. A polícia anda alerta, os cachorros têm bom faro e a droga vai sendo descoberta mais freqüentemente do que seria de desejar. As "mulas" acabam presas e o prejuízo para o traficante é enorme. Buscando um transporte mais imponderável e seguro, é agora nos próprios corpos femininos que a droga se aloja para chegar sã e salva a seu destino.
Nas mais de dez mil mulheres que foram identificadas realizando esse tipo de ilegalidade na enorme via de mão dupla que se formou entre a América Latina e o hemisfério norte, quase 80% guardam o mesmo perfil: são jovens, bonitas e de classe média. Para carregarem seu precioso fardo, as belas moças aceitam fazer incisões cirúrgicas no próprio corpo, escondendo sob a pele mercadorias ilegais como cocaína e ecstasy. Pelo serviço, de acordo com a quantidade transportada e o tipo da mercadoria, recebem gordas quantias: nunca menos de US$ 1 mil podendo mesmo chegar a US$ 15 mil.
Para carregar a cocaína elas entregam ao bisturi as coxas e os seios. Ali, naquelas partes do corpo feminino, criadas e destinadas ao amor, ao carinho, à nutrição dos filhos, alojam-se quantidades gigantes de pasta de coca, que comprada a U$ 2000,00 o quilo em países latino-americanos podem chegar a ser revendidas na Europa por U$ 100 000. As cirurgias são realizadas em clínicas clandestinas bem escondidas em algum ponto de países latino-americanos. Dali as moças partem em direção à perigosa viagem que pode ser sem volta devido à carga milionária que levam nas entranhas. Já as pílulas de ecstasy se acomodam melhor no aparelho digestivo, seja no estômago ou no intestino, provocando graves distúrbios que afetam a saúde da mulher para sempre ou a levam inclusive à morte.
A gravidade do fato espanta e provoca perguntas que não querem calar. Como mulheres jovens e bonitas são seduzidas pelos traficantes? Por que uma moça jovem e bela, que teria tudo para ter uma vida intensa e realizada procura tal descaminho deixando retalhar o próprio corpo para transportar droga. A resposta, veiculada recentemente por importante revista brasileira, torna ainda mais triste o fato já de si tão tenebroso. O tráfico em geral consegue aliciar as mulheres que têm algum ponto vulnerável ao nível dos afetos, ou estão passando por algum momento difícil em suas vidas.
Os aliciadores do tráfico ganham por cada mulher recrutada, o que os estimula a investir na busca da quantidade cada vez maior para gerar lucros expressivos. Aonde vão eles buscar suas vítimas? Em shopping centers, filas de emprego e até mesmo portas de hospitais. Nesses lugares, seu olhar cúpido poderá identificar mulheres bonitas que sonhem conhecer o exterior, mas não possuam recursos suficientes para tal. Ou então mães solteiras com filhos doentes sem recursos para tratá-los. Essas parecem as mulheres mais fáceis de serem convencidas. A angústia com a vida dos filhos as podem levar facilmente a procurar saídas desesperadas como transformar o próprio corpo em lugar de carga para a droga sem pensar nas conseqüências.
Muitas igualmente estavam desempregadas ou sem atividade regular remunerada. O desespero de não ter como garantir a sobrevivência as faz dizerem sim à proposta do traficante. O ingrediente da beleza corre por conta de poder mais facilmente captar a benevolência da polícia ou de outras instancias que pudessem impedir a conclusão da ilegalidade. Mulheres bonitas têm mais chance de burlar a fiscalização.
Dignas de toda compaixão são essas belas "mulas" que vendem seus corpos e sua dignidade em um tipo de prostituição mais vil do que qualquer outro. Mas digna de toda indignação ética é a situação de uma humanidade que leva mulheres criadas por Deus para o amor e a maternidade a buscar um salto qualitativo na vida através de desvio tão profundo e equivocado!
Uma organização criminosa especializada em tráfico de seres humanos e responsável pelo assassinato de uma garota de programa goiana em março, no Distrito Federal, tem ramificações em pelo menos três continentes. Os aliciadores ligados ao grupo são do Leste Europeu, África e América do Sul. As informações são do Correio Braziliense. Segundo o jornal, a organização tem bases na Espanha, para onde as jovens aliciadas são levadas para trabalhar em casas de prostituição. A polícia espanhola identificou pelo menos 36 pessoas envolvidas, entre agenciadores, aliciadores e prostitutas. O Correio afirma que a exploração ocorre em regime de escravidão e faz com que muitas mulheres tentem fugir das casas de prostituição e algumas sejam até assassinadas. A goiana Letícia Peres Mourão, 31 anos, teria sido uma dessas vítimas, morta três meses antes de ir à Espanha depor sobre o esquema na Justiça. O assassinato seria uma queima de arquivo. Ainda de acordo com o jornal, 12 brasileiras foram mortas em 2009 por organizações de tráfico de seres humanos. Algumas das mortes ocorreram na Espanha e nos Estados Unidos. Duas vítimas morreram de causas naturais, mas, afirma a reportagem, em decorrência da rotina de escravidão.
BRASIL: O BERÇO DO TRÁFICO DE MULHERES E DA EXPLORAÇÃO SEXUAL
Danielly Ferlin*
RESUMO
O tráfico de pessoas é uma forma de a sociedade moderna perpetuar a prática da escravatura. Atualmente, há inúmeras organizações criminosas especializadas neste tipo de crime. Todos os dias mulheres, homens e crianças são vítimas deste comércio que tem como objetivo a exploração sexual, o trabalho escravo, adoção de crianças e a venda de órgãos. Vulneráveis aos traficantes pelo fato de que grande parte, ou quiçá a totalidade destes, serem acometidos pela pobreza, sem escolaridade, iludidos, almejam uma perspectiva de vida melhor. Destarte, quando chegam ao seu destino percebem que foram vítimas de organizações inescrupulosas, ora motivadas pelo lucro as mantêm como mercadorias. O tráfico é um meio de violação e coerção dos direitos humanos que necessita ser banido do ról dos crimes cometidos contra a dignidade da pessoa humana.
Palavras chave: Tráfico de pessoas. Exploração sexual. Aliciamento. Mulheres.
ABSTRACT
Human trafficking is a form of modern society to perpetuate the practice of slavery. Currently, there are many criminal organizations specialized in this type of crime. Every day men, women and children are victims of this trade that aims at sexual exploitation, forced labor, child adoption and the sale of organs. Vulnerable to traffickers by the fact that a large part or perhaps all of them, are affected by poverty, uneducated, deluded, target a prospect of better life. So when they reach their destination realize they were victims of unscrupulous organizations, now motivated by profit and keep the goods. Trafficking is a means of coercion and violation of human rights that need to be banned from the list of crimes committed against human dignity.
Keywords: Trafficking in persons. Sexual exploitation. Grooming. Women.
1 INTRODUÇÃO
A realidade sóciocultural que estrutura o comércio de seres humanos cada vez mais precoce, não se fundamenta unicamente no contexto atual.
Desde os primórdios, o tráfico de pessoas é uma constante na história da humanidade, a principiar da Grécia Antiga - onde meninas na faixa etária de cinco anos eram comercializadas como escravas e compelidas a prestar “favores sexuais” a seus donos - a exploração sexual é caracterizada como configuração comercial. Trata-se de uma prática ilícita, execrável e preocupante, haja vista a proeminente violação de direitos e garantias fundamentais, logo, exige-se um enfrentamento que responsabilize conjuntamente o agressor, a própria sociedade, o mercado propulsor e igualitariamente o Estado.
É preciso insistir também na indagação: Até que ponto o Estado, a coletividade e a família estão sendo complacentes quanto a este evento factual que majora corriqueiramente? Indubitável é que na sociedade contemporânea torna-se inadmissível a perpetuação de um mercado desumano e degradante como este.
Cumpre examinarmos que o tráfico de mulheres, adolescentes como também crianças envolve em seu bojo um contexto de gênero e exploração, esta última, por sua vez, distingue-se pela obtenção de lucro, seja este financeiro ou de outra espécie. Outrossim, a exploração sexual abarca quatro modalidades correlatas, quais sejam: o turismo sexual, o tráfico, a pornografia e a prostituição.
Esta tipificação está catalogada com redes de falsificação de documentos, contrabando ilegal de imigrantes, drogas, armas, lavagem de dinheiro, pedofilia entre outras atividades ilícitas.
É sobremodo importante assinalar que o Brasil está comprometido com o combate a esse delito e vem desenvolvendo, desde 2002, parcerias com outros países e organismos internacionais como, por exemplo, o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. A proteção aos direitos garantidos constitucionalmente deve ser uma constante em todas as relações humanas, políticos e sociais ora no ordenamento interno ora no internacional.
2 O TRÁFICO DE SERES HUMANOS
No intento de discorrer a respeito do tráfico de pessoas, mister se faz ressaltar que tomaremos por base as normativas internacionais dispostas nos termos do Protocolo de Palermo, art.2°, alínea a, onde:
[...] o tráfico de pessoas é o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou a recolha de pessoas, pela ameaça de recursos, à força ou a outras formas de coação, por rapto, por fraude, e engano, abuso de autoridade ou de uma situação de vulnerabilidade, ou através da oferta ou aceitação de pagamentos, ou de vantagens para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre uma outra para fins de exploração.
Em assonância, visando ampliar o conceito de tráfico, Leal (2001, p.04) define exploração sexual como:
[...] uma violência sexual que se realiza nas relações de produção e mercado (consumo, oferta e excedente) através da venda dos serviços sexuais de crianças e adolescentes pelas redes de comercialização do sexo, pelos pais ou similares, ou pela via de trabalho autônomo. Esta prática é determinada não apenas pela violência estrutural (pano de fundo) como pela violência social e interpessoal. É resultado, também, das transformações ocorridas nos sistemas de valores arbitrados nas relações sociais, especialmente o patriarcalismo, o racismo, e a apartação social, antítese da idéia de emancipação das liberdades econômicas/culturais e das sexualidades humanas.
O instituto da escravidão perpetua-se desde a antiguidade, quando a vítima era o vencido nas guerras, e, usualmente, o ser humano era tido como objeto de negociação. Grandes guerreiros, conquistadores, apropriavam-se tanto das riquezas das terras tomadas, como também das mulheres e dos homens, em especial dos jovens, ora para a satisfação dos ímpetos sexuais, ora para realização de trabalhos forçados e escambos. A compra e venda de indivíduos passou a ser considerada prática comum nas sociedades ancestrais, onde certas camadas sociais não eram consideradas detentoras de direitos e, portanto, tratadas como mercadorias e propriedades de seus senhores.
O Brasil ateve sua participação com o comércio do tráfico de negros para a prática laboral em minas, plantações de cana-de-açúcar, cacau, café, construções, como também afazeres domésticos. Entretanto, um aspecto que merece proeminência é o fato de que embora seu curto prazo de descobrimento, nosso país desvirtuou sua condição de importador a exportador de seres humanos, sobretudo mulheres.
Mas, todavia, é na Tailândia que encontramos uma das piores realidades da problemática do tráfico, pois crianças podem ser comercializadas legalmente pelos “mascates”. Nesse sentido, roborando o assunto, Nogueira (2000, s.p) nos lembra:
O que acontece na Tailândia é que as crianças do sexo feminino podem ser legalmente vendidas pelos pais. Assim, naquele país existe a figura de uma espécie de mascate, o tipo de comerciante que percorria o interior brasileiro, geralmente a cavalo, vendendo artigos encontrados somente nas cidades maiores. Só que, na Tailândia, a geografia se inverte: o mascate compra as crianças no interior do país, para serem revendidas nos prostíbulos das cidades maiores. Então, uma menina de seis, oito ou 10 anos é vendida numa transação que provoca dor e choro da própria criança, de sua mãe, de seu pai ou dos avós, mas que assim mesmo se realiza pois a família, por exemplo, quer trocar o aparelho de TV branco e preto por um colorido, etc. (1º Congresso Mundial contra a Exploração Sexual e Comercial de Crianças e Adolescentes, Estocolmo,1996).
O tráfico de seres humanos é uma prática que se sofisticou através dos tempos, possibilitando a consolidação de redes internacionais especializadas neste tipo de delinquência. Como se depreende, em virtude de um processo de globalização extremamente veloz, pode um mesmo país ser ponto de partida, chegada ou servir de elo entre nações no tráfico.
Segundo estimativas das Organizações das Nações Unidas (ONU), esta é a terceira forma de crime mais rentável, ficando atrás somente do tráfico de drogas e armas. Com fulcro no relatório, esta modalidade criminal movimenta cerca de R$ 31,6 bilhões de dólares anuais, decorrentes do aliciamento de pelo menos dois milhões de mulheres no mundo todo. Os países industrializados obtemperam por metade dessa soma (15,5 bilhões de dólares), ficando o resto com Ásia (9,7 bilhões de dólares), países do Leste Europeu (3,4 bilhões de dólares), Oriente Médio (1,5 bilhão de dólares), América Latina (1,3 bilhão de dólares) e África (159 milhões de dólares). Estima-se que o lucro das redes criminosas com o trabalho de cada ser humano transportado ilegalmente de um país para outro chegue a 13 mil dólares por ano, podendo chegar a 30 mil dólares no tráfico internacional, segundo estimativas do escritório da Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC).
2.1 ASPECTOS SOCIAIS
O desejo de escapar da miséria que aflige grande parte da população brasileira faz com que o anúncio de trabalho em outras regiões e países, seja visto como ponto de obtenção de uma vida mais digna através de uma pseudo-estabilidade financeira. Dentre as principais causas do tráfico, podemos enfatizar: pobreza, ausência de oportunidades de trabalho, violência doméstica, turismo sexual, discriminação de gênero emigração indocumentada, leis deficientes.
Nesta ânsia, mulheres são enganadas e passam a ser exploradas como mercadorias na indústria do sexo. Mesmo as mulheres sendo um maior percentual, há inúmeros casos de crianças e adolescentes que são oferecidas por seus pais ofuscados com uma promessa de melhorarem de vida. Todas estas pessoas são submetidas a regimes análogos à escravidão, sendo via exploração sexual, trabalhos sob condições abusivas, mendicância forçada e servidão involuntária de órgãos para transplantes.
O retorno ao seu país de origem torna-se uma utopia, visto que os traficantes retêm seus passaportes e outros documentos, criam dívidas permanentes além da coação de denunciá-las em alguma prática ilegal, para evitar que estas vítimas possam recorrer às Embaixadas e à justiça.
A ONU reconhece que cerca de quatro milhões de pessoas desaparecem anualmente, sobressaindo-se mulheres e crianças do sexo feminino. Aproximadamente setenta e cinco mil brasileiras encontram-se aliciadas no mercado do sexo europeu. Os dados demonstram que as “saídas” de mulheres são especialmente direcionadas para as fronteiras com países da América do Sul, Japão e Europa.
O aditamento exorbitante da prostituição e do tráfico de mulheres é mais uma sequela da crise capitalista, consumista e egocêntrica que aflige o mundo, vez que a deficiência de direitos ou a ignóbil aplicabilidade dos escassos que a massa mais pobre consegue alcançar, torna-se fator desencadeador de problemas de ordem sócioeconômicas, englobados por condições de habitação degradantes, violência doméstica, desigualdade de oportunidades e de renda perante o mercado de trabalho e preconceito social.
A pobreza do país e o rótulo vinculado à mulher brasileira, tida como exótica e concupiscente corroboram para a proliferação de um dos crimes mais sérios da atualidade que é a exploração sexual. Falsos anúncios, convites de casamento, catálogos fotográficos enviados pelo correio, promessas infundadas de trabalho altamente remunerado, contato direto/indireto com traficantes por intermédio de parentes, conhecidos ou amigos, são algumas das formas de abordagem para aliciamento das vítimas.
2.2 PERFIL
A perpetuação do comércio sexual no Brasil é fruto de um processo histórico de desigualdades sociais e injustiças. Com o desígnio de desempenhar um mapeamento no que concerne ao perfil das vítimas do tráfico e dos aliciadores, algumas instituições nacionais e internacionais concretizaram uma vasta pesquisa para auxiliar no desenvolvimento de ações de combate e prevenção dessa atividade ilícita.
Segundo estudo divulgado pela PESTRAF (Pesquisa sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil), organizada pelas pesquisadoras Maria Lúcia Leal e Maria de Fátima Leal, coordenada pelo CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes, o Brasil é apontado como país originário da maioria das pessoas traficadas. Juntamente com o Ministério da Justiça (MJ) o Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime (UNODC), analisou 36 processos judiciais e inquéritos policiais nos Estados do Ceará, Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo. As informações coletadas não surpreenderam ao assinalar que a pluralidade dos traficantes é caracterizada pelo sexo masculino. No entanto, observou-se que há igualmente uma alta presença de mulheres (43,7% dos indiciados por tráfico) que agem, sobretudo, no recrutamento das vítimas. Apontadores adjacentes a esses foram também observados em outros estudos, que aquilatou em 41% a participação feminina entre traficantes.
A pesquisa revelou ainda que o maior índice de vítimas é do sexo feminino, afrodescendentes, com idade abarcada entre os 15 e os 30 anos, solteira, com baixo nível de escolaridade, desempregada, exercendo atividades informais ou empregada no setor terciário, residente em locais periféricos das cidades, habitam com a família, têm filhos. Habitualmente padeceram de algum tipo de violência intrafamiliar (abuso sexual, estupro, atentado violento ao pudor, gravidez precoce, corrupção de menores, negligência, abandono, maus tratos, violência física e psicológica) e extrafamiliar (na rua, nas escolas, nos abrigos, redes de exploração sexual, concomitante ao uso de drogas, etc.), o que desencadeia uma vulnerabilidade destas defronte à malícia dos aliciadores.
Por sua vez, o levantamento MJ-UNODC revela que sumariamente os aliciadores homens, encontram-se na faixa etária de 30 anos, casados, com grau de escolaridade variável entre o nível médio e o superior, predominantemente brasileiros que se dizem empresários, atuando no ramo de casas de shows, bares, casas de encontros associados a um conjunto de negócios escusos, isto é, lavagem de dinheiro, drogas, contrabando, entre outros. No que concerne às mulheres aliciadoras, o fato de serem mais velhas ilusoriamente lhes afere credibilidade e autoridade para induzir as vítimas a aceitar as propostas advindas do exterior.
Insta salientar que no que tange à relação entre aliciador e vítima, nos casos em que estas já atuam como profissionais do sexo, várias são enviadas simultaneamente e geralmente não há qualquer ligação anterior com o aliciador. Em casos de tráfico isolado, normalmente as vítimas não são prostitutas e necessariamente prevalecem relações de amizade e/ou parentesco com os aliciadores. Este fator aumenta a confiança em falsas promessas de emprego no exterior.
Ainda que determinadas mulheres tenham ciência prévia de que o local de trabalho seja em shows eróticos ou como prostitutas, apenas ao atingirem seu destino é que descobrem que permanecerão em cárcere privado, padecerão de maus tratos, e ademais, serão coagidas a entregar grande percentual de todos os seus proveitos laborais aos “empregadores”. Registre-se ainda que, de modo geral, as vítimas deste mercado negro ficam instaladas em recintos repugnantes, vivem na clandestinidade e submetem-se a trabalhar em condições miseráveis.
Por derradeiro, em relatório do I Seminário Internacional sobre Tráfico de Seres Humanos, LEAL e HAZEU (2.000) explanam de forma concisa:
Muitos acreditam que as mulheres foram aliciadas por serem prostitutas e, logo, carregariam uma parcela de culpa pela sua situação. Uma visão absolutamente equivocada do ponto de vista legal, uma vez que, em nenhum momento, a legislação menciona a conduta da vítima como relevante para o crime de tráfico.
2.3 ROTAS DO TRÁFICO
O negócio da prostituição assumiu tamanha magnitude, que obrigou os governos internacionais a adotarem medidas imperativas. Turismo sexual, noivas vendidas por correspondência, prostituição em bordéis, pornografia e serviços sexuais forçados podem ser exemplos do que está conexo diretamente com o tráfico de mulheres.
As rotas do tráfico interno no Brasil atendem a demanda de atividades econômicas onde se encontra grande aglomeração de homens, como garimpos, construções de grande porte, estradas, hidrelétricas, etc. No entanto, é válido ressaltar que decorrente da multiplicação de “matéria-prima” de baixo custo ou até mesmo gratuita, há uma proliferação da escravidão humana.
No que tange às regiões Norte, Centro Oeste e à região Sul, sumariamente o meio de transporte mais utilizado nos casos de circulação via terrestre, são os táxis. Já as rotas que tem como ponto de partida via fluvial intercalado ao transporte terrestre temos destacadamente os estados das regiões Norte, principalmente o Pará e Nordeste com destino a países da América Latina bem como Europa.
Na região Norte, a prática mais comum é a da exploração sexual fluvial. Crianças e adolescentes prostituem-se em chalanas, barcos e bares na beira-rio. Já em regiões litorâneas, especialmente no Nordeste brasileiro, meninas inserem-se na vida da prostituição desde crianças. Decorrente do alto número de turistas estrangeiros, sendo que muitos destes procuram o Brasil mais pela beleza humana do que a natural, durante todo o dia e, mormente à noite, há grande quantidade de meninas e mulheres em busca de dinheiro e quiçá a possibilidade de serem convidadas para viajar a outros países, com promessas de falso matrimônio, emprego de bailarinas em casas noturnas, etc.
Já na região sul do país, as vítimas são em sua maioria levadas para regiões de fronteira do Mercosul.
No que diz respeito ao tráfico externo, a Espanha possui o maior percentual de mulheres brasileiras aliciadas no mercado sexual. Entretanto, cumpre-nos assinalar que há consideráveis números que reportam a países como Guiana Francesa e Suriname. A via aérea é a mais utilizada seguida pela via marítima.
2.4 EFEITO E COMBATE
Há uma propensa dificuldade no combate à prostituição e à exploração de meninas no que tange às distintas realidades encontradas no Brasil, pois há desde jovens que vivem nas ruas, garimpos, sem qualquer estrutura familiar, até o chamado turismo sexual nas cidades do litoral, o turismo sexual fluvial, o abuso sexual dentro da própria família e a exploração em prostíbulos.
Neste aspecto, o Código Penal Brasileiro, reza nos arts. 227 a 231, que “quem induzir, atrair alguém à prostituição” ou ainda “que facilite ou impeça que alguém a abandone será punido”, e, por conseguinte, afirma ser crime promover ou facilitar a entrada no país de mulheres para prostituição, ou a saída para o estrangeiro com a mesma finalidade.
Atualmente busca-se maior aplicabilidade de ações incrementadas por diversas esferas da sociedade, voltadas a desmantelar as redes nacionais e internacionais de traficantes de mulheres e meninas, o combate ao turismo sexual por intermédio de apoio à criação de mecanismos de punição de agências que comercializam o sexo, e o fortalecimento do aparelho jurídico-policial.
Com papel primordial nesta batalha, a imprensa e a mídia em geral, tem a função não somente de informar, veiculando campanhas e programas, mas ao mesmo tempo promover debates e destarte, prover a possibilidade de uma ampla gama da população brasileira interagir e descobrir os fatos que levam ao acréscimo galopante do crime, pois, a conscientização é a principal ferramenta de ação impeditiva e a duelo à vulnerabilização que acomete as vítimas.
Portanto, mister se faz a estruturação de medidas governamentais de inclusão e justiça social e imbuídas para proscrever a impunidade, que é sentimento constante na população brasileira. Por meio de trabalhos educativos conseguiremos alertar a juventude sobre os perigos que acometerão a sua integridade física e dignidade quando se tornam vítimas desta máfia. Todas as classes sociais necessitam compartilhar de políticas de enfrentamento, à vista disso, alcançaremos sem delongas, resultados imediatos e permanentes e, quem sabe em médio prazo consigamos extirpar essa conduta que pode ser considerada como um dos mais desprezíveis crimes cometidos contra a humanidade.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tráfico de seres humanos é um problema globalizado que demanda respostas análogas à sua dimensão para acautelar e controlar tanto a oferta, quanto a demanda da exploração sexual. É de suma importância que leis severas sejam criadas para alicerçar a luta defronte esta prática, mas, no entanto, que a certeza da aplicabilidade e execução das mesmas seja inexorável.
Para reprimirmos o desenvolvimento desta, é basilar que abracemos ações predispostas a impedir e/ou limitar, tanto qualitativa quanto quantitativamente a prosperação dos índices de vítimas traficadas para estes fins. Ressalte-se que a maior parcela destas se encontra em posição vulnerável, ora decorrente de sua condição social, ora da situação psicológica.
A retomada da valorização do ser humano agregados a pacotes de políticas públicas com o intuito da inserção das camadas mais excluídas sejam elas pela via racial, sexual ou social, são programas amortizadores dentro do paradigma da exploração, haja vista que estas vítimas não sofrem traumas físicos e psicológicos exclusivamente durante o período em que permanecem expostas aos traficantes, mas, de igual forma, continuam desprezadas por uma sociedade individualista, preconceituosa que ignora os que não conseguiram se amoldar nos patamares estabelecidos.
Ademais, o Estado deve avocar para si o suprimento no fornecimento básico em termos de educação, formação profissional e, no caso das pessoas que já se tornaram vítimas, o repatriamento destas. Destarte, que o foco seja imediatamente alterado, pois permanecendo direcionado unicamente ao efeito e negligenciando as causas, tornar-se-á inviável qualquer programa de prevenção, depreciação e, consequentemente a penalização dos traficantes, o que implica em maior insegurança pública perante este aspecto.
Em análise última, que a sociedade em geral juntamente com a mídia e o Estado, vinculem forças para respaldar e fomentar medidas que promovam a efetiva liberdade, a justiça social, a ruptura dos padrões que ensejam às desigualdades sócioeconômicas e primordialmente que protejam a dignidade da pessoa humana.
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