segunda-feira, 8 de novembro de 2010

TRÁFICO INTERNACIONAL DE MULHERES 2

Tráfico de mulheres fez 100 mil vítimas na AL e no Caribe em 2006
PUBLICIDADE

da Efe, em Buenos Aires

O tráfico de mulheres gera receitas anuais de US$ 32 bilhões no mundo todo, e 85% desse dinheiro vem da exploração sexual, que só na América Latina e no Caribe fez 100 mil vítimas em 2006.

São dados de um relatório da Organização Internacional de Migrações (OIM), fornecido pelo diretor regional do Cone Sul do órgão, Eugenio Ambrosi, que declarou que uma mulher pode ser "vendida" para uma rede de exploração sexual por entre US$ 100 e US$ 1.600.

As vítimas das organizações que traficam pessoas para obrigá-las a exercer a prostituição geram um lucro líquido de US$ 13 mil para seus exploradores, disse o funcionário italiano.

O estudo da OIM, que se concentrou na Argentina, no Chile e no Uruguai, revela que as vítimas costumam ser mulheres de classe social baixa, que vivem em um ambiente de marginalidade, com um entorno familiar instável, além do precário nível educacional. Assim, com pequenas possibilidades de trabalho, essas mulheres estão predispostas a migrar e cair em diferentes esquemas.

Há muitos ganchos para atrair estas mulheres, mas na maioria das vezes, são outras mulheres, ligadas de alguma maneira com o âmbito familiar da vítima, e que têm a confiança da vítima, como vizinhas ou até mesmo membros da própria família, que apresentam uma oferta de emprego bem remunerada no exterior, ou em seu país, mas longe da família.

Os captadores também recorrem a táticas como a publicação de anúncios, nos quais o trabalho a desenvolver não está claramente especificado, testes de elenco para trabalhar no mundo da publicidade, ou como modelos, e até seqüestros.

Na maioria dos casos, os "contratantes" se encarregam das despesas da viagem. Assim, quando as mulheres chegam a seu destino, já têm uma dívida contraída.

Abusos

Ambrosi destacou que as vítimas do tráfico de mulheres podem se transformar em captadoras ou exploradoras, seja por coação ou como resultado dos abusos sofridos, e que pelo menos 50% das mulheres não têm consciência da sua condição de vítima.

Além dos agentes diretos, o tráfico também conta com a intervenção dos secundários, como motoristas de táxis, funcionários públicos, policiais, juízes e políticos, que colaboram implicitamente ou que, com sua indiferença, tornam possível este tipo de prática.

A relevância de algumas das figuras envolvidas no processo dificulta a declaração das vítimas e a interposição de denúncias, e atualmente não existe um sistema de proteção para estas na Argentina, no Chile e no Uruguai, porque esta prática não é considerada um crime. Por isso, os exploradores têm que ser julgados por outras causas.

O tráfico sexual de pessoas na Argentina registrou 47 casos penais durante 2006, das quais 30% corresponderam a menores de idade e, entre 50% e 60%, a mulheres de 18 a 24 anos.

Além disso, foram registradas 400 denúncias de desaparecimento durante o ano passado, dentre as quais a maioria corresponde ao perfil das mulheres seqüestradas para o tráfico sexual.

Países

O relatório revela que a Província de Tucumán (nordeste da Argentina) é onde mais se recorre ao seqüestro para o recrutamento.

A Argentina, onde o predomínio é do tráfico interno, também é um país de passagem de mulheres latino-americanas para a Europa, e um receptor de dominicanas e paraguaias, destacou Ambrosi.

Cerca de 52% dos 118 casos de paraguaias vítimas do tráfico sexual analisadas pela OIM em 2005 tiveram a Argentina como destino final.

Em 2006, o Chile foi o país de destino para 40% de mulheres argentinas, 25% de peruanas, 24% de colombianas, 5% de chinesas e 2% de dominicanas, brasileiras e equatorianas.

O estudo também revela que o Uruguai não é um país de destino de vítimas do tráfico com fins de exploração sexual, embora alguns casos de mulheres argentinas e brasileiras tenham sido registrados. No entanto, o Uruguai é um exportador para países como Espanha e Itália e, em menor escala, para Argentina e Alemanha.
Contra o tráfico de mulheres e crianças
O tráfico humano para exploração sexual é a terceira maior fonte de renda ilegal do mundo e o Brasil é o maior “exportador” das Américas. É contra esse universo pavoroso que luta a jornalista Priscila Siqueira. Do lado de lá, o criminoso declara que é melhor vender mulher a drogas e armas porque drogas e armas só se vendem uma vez – e a mulher pode ser revendida até morrer ou ficar louca
- A A +
Patrícia Negrão
Revista Claudia – 04/2009

Share
9


"Quem suporta conviver com o fato de uma criança, mantida prisioneira em um bordel, ter o intestino perfurado durante uma relação sexual?”, pergunta com indignação a jornalista Priscila Siqueira, 69 anos. Em sua casa, em São Sebastião, no litoral paulista, ela conta que, desde 1996, passa boa parte do seu tempo em viagens pelo país e pelo exterior. O objetivo: denunciar o tráfico humano para exploração sexual e exigir medidas oficiais para acabar com ele. “ Muita gente ainda duvida de que esse comércio exista ou fica indiferente, talvez acreditando que oproblema é grande demais para ser enfrentado”, diz.

Mas não dá para fechar os olhos a um negócio que, depois do contrabando de armas e drogas, é a maior fonte de renda ilegal do mundo e também a que mais cresce. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o lucro mundial com esse tráfico chega a 31,6 bilhões de dólares ao ano. “O Brasil é o maior exportador de crianças e mulheres para prostituição das Américas e serve como país de trânsito para aliciadas nas nações latino-americanas a caminho da Europa, Ásia e dos Estados Unidos”, afirma.

Seu primeiro contato com o tema deu-se na Suécia, no 1º Congresso Mundial contra a Exploração Comercial e Sexual de Crianças e Adolescentes, realizado pelo Unicef, órgão das Nações Unidas para a infância. Voltou chocada. “O cálculo era de 1 milhão de crianças traficadas no mundo. Isso sem contar jovens e adultos”, lembra. Começou então a divulgar o assunto na mídia brasileira com a equipe da ONG Serviço à Mulher Marginalizada (SMM), da qual é uma das articuladoras. “Quando falávamos em tráfico de crianças e mulheres no país, nos chamavam de loucas, escreviam para as redações dizendo que isso não existia”, recorda.

O ceticismo não desanimou essa ativista paranaense, mãe de cinco filhos, com uma experiência de 50 anos de militância. Ainda na faculdade, em Curitiba, integrou a Juventude Universitária Católica, que teve participação importante nos movimentos sociais brasileiros das décadas de 1950 e 1960. Depois de casada e formada, morando no Rio de Janeiro, fazia um trabalho preventivo de saúde visitando periferias e zonas de prostituição. Em 1963, mudou com o marido para São Sebastião, onde continuou o trabalho de conscientização. Nas décadas de 1970 e 1980, dedicouse a denunciar a especulação imobiliária no litoral e a expulsão de caiçaras e indígenas das suas terras, publicando o livro GENOCÍDIO DOS CAIÇARAS (ED. MASSAO OHNO, esgotado) e, em 1993, foi trabalhar no SMM. Sua luta na denúncia do tráfico de mulheres levou-a a escrever também o estudo Oferta, Demanda, Impunidade – Tráfico de Mulheres.

Quem são as principais vítimas do tráfico para exploração sexual?

Existe um tráfico interno poderoso, que atinge principalmente adolescentes. A maioria é aliciada no interior e levada para as cidades mais ricas ou para locais com alta concentração de mão-de-obra masculina. Para o exterior, seguem as maiores de 18 anos, com baixa escolaridade, muitas delas afro-descendentes e mães solteiras. A Pesquisa Nacional sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes (Pestraf), realizada em 2002 pelo Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria), com participação de várias ONGs, apontou 110 rotas de tráfico interno (78 interestaduais e 32 intermunicipais) e 131 de tráfico internacional.

Como ocorre o aliciamento?

Elas recebem, na cidade onde vivem, uma roupa bonita, documentos e, se estão indo para o exterior, uma grana para passar pela alfândega. Quando chegam ao país de destino, alguém já as espera no aeroporto e tira delas o passaporte e o dinheiro, fazendo com que comecem a se prostituir. Nordeste e Centro-Oeste são as principais regiões de origem.

Ao sair, elas sabem que serão prostitutas?

A maioria é enganada com a promessa de trabalhar como dançarina, recepcionista de boate, babá ou cuidadora de idosos.
em duvida o tráfico de mulheres concorre com o trafico de drogas como um dos mercados de maiores rendas a nível mundial. Esse mercado, de acordo com estimativas de especialistas, durante um ano é capaz de gerar receitas de até US$ 32 bilhões em todo o mundo, sendo que desse total 85% tem origem na exploração sexual e as cifras são assustadoras, pois somente na América Latina e Caribe faz por ano nada menos do que 100.000 vítimas. Na verdade dá para se ter uma idéia de como o trafico de mulheres e mercado de órgãos cresce embora apenas parte dos dados sejam compilados pela OIM- Organização Internacional de Migração que faz relatórios onde constam os valores pelos quais podem ser vendidas as mulheres que vão para redes de exploração sexual espalhadas por diferentes países no mundo todo e esse valor pode variar entre US$ 100 e US$ 1.600. As vitimas das pessoas que fazem esse tipo de trafico, dão a elas um lucro liquido em torno de US$ 13 mil.


Trafico
Venda de Órgãos Humanos

Outra história trágica e tão grave quanto o é o trafico de mulheres para fins de exploração sexual e o comércio com venda de órgãos de seres humanos. Na China este comércio é feito as claras, através da internet onde podem ser encontrados sites que tratam do assunto da maneira mais natural do mundo. Ali são tratados todos os detalhes da negociação, o doador, o receptor seja de olhos, rins, pulmão, coração ou medula óssea. O centro Internacional de Assistência aos Transplantados anuncia em seu site a atividade comercial envolvendo órgãos humanos, sem a menor cautela ou mesmo constrangimento. Convocam doadores e avisam a quem precisa dos órgãos qual a melhor época para se candidatarem ao transplante devido à oferta de órgãos serem maior e este período de acordo com os anúncios vai de dezembro a janeiro. Nessa época a espera por um órgão é bem menor.


Crime
O Preço de um Órgão

No site referido acima, os preços dos órgãos vem especificados sem o menor problema. Para um rim o preço é de US$ 62.000, por um fígado se paga US$ 100.000, para um pâncreas o preço varia entre US$ 150.000 e US$ 170.000, por um coração paga-se apenas US$ 160.000 e pela córnea US$ 30.000. Como se podem observar excentricidades é que não faltam nos anúncios feitos objetivando o movimento cada vez maior deste que já é um grande comércio. O economista e filósofo escocês Adam Smith já dizia que o consumo é a única finalidade e o único propósito de toda a produção. Sempre que existe alguém ofertando uma mercadoria, por excêntrica que possa parecer, uma hora irá encontrar alguém disposta a comprá-la e assim o comércio de órgãos tende a crescer como outro qualquer.
Estudo sobre tráfico de mulheres analisou rotas e condições de saúde delas

Agência Brasil
Publicação: 01/09/2010 16:17 Atualização: 01/09/2010 16:23
Baseados em pesquisa da Universidade de Brasília, representantes do governo federal e da sociedade civil discutem hoje (1º/9), em Brasília, políticas de saúde direcionadas para mulheres vítimas do tráfico de pessoas. O estudo, feito em fronteiras brasileiras e nos países da Europa, detectou rotas de tráfico de mulheres e analisou as condições de saúde em que elas vivem.

“A gente ouve falar em tráfico de pessoas e pensa só em problemas de polícia e segurança pública, mas, por trás, existe uma série de problemas sociais e de saúde que precisa ser enfrentada”, defendeu o professor e coordenador do estudo, Mário Angelo Silva.

De acordo com ele, observou-se que, frequentemente, essas mulheres têm disfunções hormonais, dado que surpreendeu os pesquisadores. “Para não menstruar e não perder alguns dias de trabalho, muitas tomam pílula anticoncepcional ininterruptamente, o que leva a sérios problemas físicos e psicológicos”, disse. Muitas sofrem também com a dependência química já que a associação entre tráfico de pessoas e tráfico de drogas é muito comum.

Para melhorar a situação das mulheres, o pesquisador acredita que é preciso adotar medidas que garantam acesso ao serviço de saúde no exterior, pois, por migrarem ilegalmente, elas temem procurar hospitais ou postos de saúde nestes países. Além disso, é necessário criar programas e ações de saúde específicos para quando elas voltam ao Brasil.

Durante a abertura do seminário Saúde, Migração e Tráfico de Mulheres: o que o SUS Precisa Saber, o coordenador de Ações Programáticas Estratégicas do Ministério da Saúde, José Luiz Telles, também destacou a necessidade de um serviço de atenção à saúde direcionado a vítimas do tráfico de pessoas. “Os agravos são mais profundos do que as doenças sexualmente transmissíveis que elas possam ter contraído. É fundamental que haja um atendimento psíquico para essas pessoas que sofreram e que voltam em frangalhos”, afirmou.

O relatório Tráfico de Pessoas para a Europa para fins de Exploração Sexual, divulgado dia 29 de junho, pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), revelou que só na Europa existem cerca de 140 mil mulheres vítimas do tráfico humano que servem àqueles que procuram o mercado da exploração sexual. Por ano também são feitas 70 mil novas vítimas do crime organizado para exploração sexual.

A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que estas 140 mil mulheres traficadas, em condições de servidão, façam, juntas, cerca de 50 milhões de programas sexuais por ano, a um valor médio de 50 euros cada. No total, isso representa um lucro anual que atinge 2,5 bilhões euros, ou seja, o equivalente a R$ 5,5 bilhões.

Os dados se referem apenas à Europa Ocidental e mostram que a maior parte das pessoas traficadas vem de regiões vizinhas, como os Bálcãs (32%) e países da antiga União Soviética (19%). A América do Sul aparece em terceiro lugar de origem das vítimas, com representatividade de 13%. Segundo o relatório, é cada vez maior o número de brasileiras traficadas. Em seguida, aparece a Europa Central com 7%, África, com 5% e Leste Asiático com 3%.

De modo geral, o estudo aponta a Espanha como o principal país de destino das vítimas, seguida por Portugal, Holanda e Alemanha. Entretanto, o relatório detalhou que as brasileiras e paraguaias, entre as vítimas sul-americanas, são destinadas, principalmente, para Espanha, Itália, Portugal, França, Holanda, Alemanha, Áustria e Suíça. Os dados revelam uma mudança nos últimos anos, pelo menos na Espanha, já que antes de 2003, eram as colombianas, a maioria das vítimas no país.

A estimativa de mulheres traficadas na Europa foi levantada pela o nU com base no número de 7.300 vítimas detectadas na Europa Ocidental em 2006. De acordo com a Organização, 1 em cada 20 vítimas seria detectada, chegando, então, ao total de 140 mil mulheres. O relatório indica que as novas 70 mil vítimas anuais, expressam a rotatividade e o movimento do tráfico de pessoas, e explica que elas substituem aquelas que conseguiram se livrar do crime organizado, abandonando sua antiga condição ou, ainda tenham se transformado em novas aliciadoras.

Tráfico em Portugal

Já o Relatório Anual de 2009 do Observatório do Tráfico de Seres Humanos, do Ministério da Administração Interior de Portugal, revelou que 40% das mulheres vítimas do tráfico humano em Portugal são brasileiras. Baseado em 85 casos identificados em 2009, o estudo apontou que a maioria dessas mulheres originárias dos estados de Goiás, Minas Gerais e de estados do Nordeste.

Para o diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal, Manuel Jarmela Paulus, o alto índice de brasileiras entre as vítimas está relacionado apenas ao número expressivo da comunidade brasileira em Portugal - com 100 mil pessoas, ou seja, mais de 20% do total de imigrantes no país. Segundo ele, o Serviço de Estrangeiros está trabalhando em parceria com autoridades brasileiras para combater o tráfico de seres humanos nos dois países.

O relatório de Segurança Interna português também especificou algumas características sobre os traficantes e aliciadores. Geralmente são de nacionalidade portuguesa, romena, brasileira, ucraniana e eslovaca, e para conquistar a vítima, oferecem propostas de trabalho com falsos benefícios.

Começa campanha contra tráfico de mulheres na Eurocopa

Campanha quer sensibilizar torcedores da Eurocopa. ()
SOBRE O MESMO ASSUNTO
Mulheres farão campanha contra prostituição no Euro 2008
Suíça promete rigor da lei para estrangeiros criminosos
Economia suíça depende de mão-de-obra estrangeira
Direção Euro 2008!
Segundo a polícia suíça, entre 1,5 mil e 3 mil vítimas do tráfico de mulheres chegam ao país por ano. Elas trabalham em bordéis, viram "escravas domésticas" ou entram no "mercado do matrimônio".
Neste Dia Internacional da Mulher, uma campanha chamada "Euro 2008 contra o tráfico de mulheres" pede mais proteção às vítimas desse tipo de "escravidão moderna".

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que cerca de 2,5 milhões de pessoas anualmente se tornam vítimas do tráfico de seres humanos, sendo que 80% são mulheres.

Segundo Doro Winkler, do Centro de Informação para Mulheres da África, Ásia e América Latina (FIZ), poucas dessas mulheres na Suíça são reconhecidas como vítimas.

O governo suíço estima que o número de vítimas pode chegar a 3 mil, mas apenas 5% procuram auxílio no FIZ. "Muitas delas não se arriscam a ir à polícia por temer a expulsão do país", disse Winkler.

As 25 entidades organizadoras da campanha "Euro 2008 contra o tráfico de mulheres" querem que as vítimas não sejam mais tratadas como imigrantes ilegais, criminalizadas e expulsas do país.

Foco nas cidades-sede


Por isso, neste sábado, Dia Internacional da Mulher, os organizadores da campanha, que será centrada principalmente nas quatro cidades-sede do Euro na Suíça (Basiléia, Berna, Genebra e Zurique), lançam uma petição por "mais direitos e proteção para as vítimas do tráfico de mulheres". Eles esperam recolher 25 mil assinaturas de apoio.

O documento apresenta uma série de reivindicações aos governos estaduais e federal, entre elas, a concessão às vítimas do direito de permanência no país, isso independentemente de as mulheres deporem ou não na polícia.

Convenção contra TSH
Além disso, o texto pede padrões unificados de proteção às vítimas em todos os estados suíços e a realização de campanhas informativas. A Suíça também deve ratificar logo a Convenção do Conselho da Europa para o Combate ao Tráfico de Seres Humanos, continua o documento.

Uma outra reivindicação é que os cantões (estados) concedam vistos de permanência e prestem uma assistência especial às vítimas, bem como ofereçam treinamentos à polícia, às autoridades de imigração e aos funcionários da Justiça sobre como lidar com o problema.

Durante a Eurocopa, spots da campanha serão exibidos na televisão e em telões instalados em locais públicos. Os organizadores disseram que escolheram o Campeonato Europeu de Futebol como plataforma para atingir o maior público possível.

swissinfo com agências
Casos graves de tráfico de mulheres e crianças

Mocambique crianças
Carlos Jossia
Crianças vulneráveis no sul de Moçambique junto à fronteira com a África do Sul.
Mais de mil mulheres e crianças são anualmente traficadas a partir de Moçambique para a África do Sul – revela estudo da Save the Children. O relatório divulgado esta quinta-feira em Maputo pela Organização Não Governamental Save The Children denuncia casos graves de tráfico de mulheres e crianças em Moçambique.

Com o nosso correspondente em Maputo, Carlos Jossia



De acordo com o estudo, a pobreza que afeta as potenciais vítimas favorece esta prática e facilita o assédio. – “As principais formas para recrutar pessoas que serão traficadas não é rapto é o recurso a promessa falsas, promessas de comida, de bens matérias, de trabalho e educação sobretudo promessas de acesso ao ensino” – revelou Ilundi Cabral, responsável pela pesquisa, citando o relatório.



É com o recurso a promessas com o mais básico das necessidades de sobrevivência que mulheres e crianças moçambicanas são alvo fácil dos traficantes e exploradores que obtêm grandes lucros com esta prática. Um caso de estudo vem da província de Tete no centro de Moçambique onde uma mulher prostituía a sobrinha e suas filhas menores de idade.

Ainda de acordo com a pesquisa os casos de tráfico e exploração sexual interna de mulheres e crianças está a aumentar ao mesmo ritmo que aumenta o tráfico transfronteiriço … e a vizinha África do sul é o principal destino.

A pesquisa da SaveThe Children decorreu nas províncias de Maputo, Gaza, Manica, Solafa, Tete e Zambézia e envolveu mais de 500 crianças e 74 informantes adultos.
Tráfico de mulheres usa 241 rotas no Brasil
Pesquisa do Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (Cecria) detectou 241 rotas de tráfico que passam pelo Brasil, das quais 110 dizem respeito ao tráfico interno e 131 ao tráfico internacional.

As maiores vítimas do tráfico são mulheres negras, entre 15 e 27 anos de idade. Pará, Amazonas e Amapá são Estados ponto de origem das principais rotas internacionais, que levam mulheres ao Suriname e à Bolívia, Espanha e Alemanha.

A Região Norte também absorve boa parte do tráfico sexual interno. “As mulheres acompanham o fluxo de desenvolvimento da Amazônia emigram junto com a mão-de-obra masculina para construções e fazendas, dando apoio a esses homens como cozinheiras ou prostitutas”, disse o pesquisador Marcel Hazeu, da Sociedade de Defesa dos Direitos Sexuais da Amazônia (Só Direitos) à repórter Fabíola Munhoz, do sítio Amazônia.

O tráfico de mulheres da região Norte para o Brasil dá-se a partir do Acre, Amapá, Amazonas, Tocantins, Rondônia e Roraima, levantou o Cecria. A maioria das mulheres e adolescentes que migra para se prostituir dificilmente consegue se restabelecer depois, afirmou Hazeu.

“Temos um tipo de coronelismo na Amazônia, em que as pessoas que têm uma certa posição de poder se apropriam das pessoas que estão submetidas a elas. Prefeitos, delegados, grandes fazendeiros, comerciantes atuam especialmente no interior do Estado, vivendo como 50 anos atrás, em que podiam mandar nas pessoa do seu entorno”, relatou o pesquisador da Só Direitos.

De maio de 2003 a outubro de 2008, o Disque Denúncia Nacional de Abuso e Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes – Disque 100 – recebeu 14 mil ligações da Amazônia Legal, o que dá uma média de 2.800 denúncias por mês.

A informação é muito importante nesses casos, por causa da impunidade reinante, uma vez que é difícil de chegar até os criminosos responsáveis pelo tráfico de mulheres e adolescentes.

Fonte: ALC

BRASIL: O BERÇO DO TRÁFICO DE MULHERES E DA EXPLORAÇÃO SEXUAL



Danielly Ferlin*

RESUMO

O tráfico de pessoas é uma forma de a sociedade moderna perpetuar a prática da escravatura. Atualmente, há inúmeras organizações criminosas especializadas neste tipo de crime. Todos os dias mulheres, homens e crianças são vítimas deste comércio que tem como objetivo a exploração sexual, o trabalho escravo, adoção de crianças e a venda de órgãos. Vulneráveis aos traficantes pelo fato de que grande parte, ou quiçá a totalidade destes, serem acometidos pela pobreza, sem escolaridade, iludidos, almejam uma perspectiva de vida melhor. Destarte, quando chegam ao seu destino percebem que foram vítimas de organizações inescrupulosas, ora motivadas pelo lucro as mantêm como mercadorias. O tráfico é um meio de violação e coerção dos direitos humanos que necessita ser banido do ról dos crimes cometidos contra a dignidade da pessoa humana.

Palavras chave: Tráfico de pessoas. Exploração sexual. Aliciamento. Mulheres.

ABSTRACT

Human trafficking is a form of modern society to perpetuate the practice of slavery. Currently, there are many criminal organizations specialized in this type of crime. Every day men, women and children are victims of this trade that aims at sexual exploitation, forced labor, child adoption and the sale of organs. Vulnerable to traffickers by the fact that a large part or perhaps all of them, are affected by poverty, uneducated, deluded, target a prospect of better life. So when they reach their destination realize they were victims of unscrupulous organizations, now motivated by profit and keep the goods. Trafficking is a means of coercion and violation of human rights that need tobe banned from the list of crimes committed against human dignity.

Keywords: Trafficking in persons. Sexual exploitation. Grooming. Women.

1 INTRODUÇÃO

A realidade sóciocultural que estrutura o comércio de seres humanos cada vez mais precoce, não se fundamenta unicamente no contexto atual.

Desde os primórdios, o tráfico de pessoas é uma constante na história da humanidade, a principiar da Grécia Antiga - onde meninas na faixa etária de cinco anos eram comercializadas como escravas e compelidas a prestar "favores sexuais" a seus donos - a exploração sexual é caracterizada como configuração comercial. Trata-se de uma prática ilícita, execrável e preocupante, haja vista a proeminente violação de direitos e garantias fundamentais, logo, exige-se um enfrentamento que responsabilize conjuntamente o agressor, a própria sociedade, o mercado propulsor e igualitariamente o Estado.

É preciso insistir também na indagação: Até que ponto o Estado, a coletividade e a família estão sendo complacentes quanto a este evento factual que majora corriqueiramente? Indubitável é que na sociedade contemporânea torna-se inadmissível a perpetuação de um mercado desumano e degradante como este.

Cumpre examinarmos que o tráfico de mulheres, adolescentes como também crianças envolve em seu bojo um contexto de gênero e exploração, esta última, por sua vez, distingue-se pela obtenção de lucro, seja este financeiro ou de outra espécie. Outrossim, a exploração sexual abarca quatro modalidades correlatas, quais sejam: o turismo sexual, o tráfico, a pornografia e a prostituição.

Esta tipificação está catalogada com redes de falsificação de documentos, contrabando ilegal de imigrantes, drogas, armas, lavagem de dinheiro, pedofilia entre outras atividades ilícitas.

É sobremodo importante assinalar que o Brasil está comprometido com o combate a esse delito e vem desenvolvendo, desde 2002, parcerias com outros países e organismos internacionais como, por exemplo, o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. A proteção aos direitos garantidos constitucionalmente deve ser uma constante em todas as relações humanas, políticos e sociais ora no ordenamento interno ora no internacional.



2 O TRÁFICO DE SERES HUMANOS



No intento de discorrer a respeito do tráfico de pessoas, mister se faz ressaltar que tomaremos por base as normativas internacionais dispostas nos termos do Protocolo de Palermo, art.2°, alínea a, onde:

[...] o tráfico de pessoas é o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou a recolha de pessoas, pela ameaça de recursos, à força ou a outras formas de coação, por rapto, por fraude, e engano, abuso de autoridade ou de uma situação de vulnerabilidade, ou através da oferta ou aceitação de pagamentos, ou de vantagens para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre uma outra para fins de exploração.



Em assonância, visando ampliar o conceito de tráfico, Leal (2001, p.04) define exploração sexual como:



[...] uma violência sexual que se realiza nas relações de produção e mercado (consumo, oferta e excedente) através da venda dos serviços sexuais de crianças e adolescentes pelas redes de comercialização do sexo, pelos pais ou similares, ou pela via de trabalho autônomo. Esta prática é determinada não apenas pela violência estrutural (pano de fundo) como pela violência social e interpessoal. É resultado, também, das transformações ocorridas nos sistemas de valores arbitrados nas relações sociais, especialmente o patriarcalismo, o racismo, e a apartação social, antítese da idéia de emancipação das liberdades econômicas/culturais e das sexualidades humanas.



O instituto da escravidão perpetua-se desde a antiguidade, quando a vítima era o vencido nas guerras, e, usualmente, o ser humano era tido como objeto de negociação. Grandes guerreiros, conquistadores, apropriavam-se tanto das riquezas das terras tomadas, como também das mulheres e dos homens, em especial dos jovens, ora para a satisfação dos ímpetos sexuais, ora para realização de trabalhos forçados e escambos. A compra e venda de indivíduos passou a ser considerada prática comum nas sociedades ancestrais, onde certas camadas sociais não eram consideradas detentoras de direitos e, portanto, tratadas como mercadorias e propriedades de seus senhores.

O Brasil ateve sua participação com o comércio do tráfico de negros para a prática laboral em minas, plantações de cana-de-açúcar, cacau, café, construções, como também afazeres domésticos. Entretanto, um aspecto que merece proeminência é o fato de que embora seu curto prazo de descobrimento, nosso país desvirtuou sua condição de importador a exportador de seres humanos, sobretudo mulheres.

Mas, todavia, é na Tailândia que encontramos uma das piores realidades da problemática do tráfico, pois crianças podem ser comercializadas legalmente pelos "mascates". Nesse sentido, roborando o assunto, Nogueira (2000, s.p) nos lembra:



O que acontece na Tailândia é que as crianças do sexo feminino podem ser legalmente vendidas pelos pais. Assim, naquele país existe a figura de uma espécie de mascate, o tipo de comerciante que percorria o interior brasileiro, geralmente a cavalo, vendendo artigos encontrados somente nas cidades maiores. Só que, na Tailândia, a geografia se inverte: o mascate compra as crianças no interior do país, para serem revendidas nos prostíbulos das cidades maiores. Então, uma menina de seis, oito ou 10 anos é vendida numa transação que provoca dor e choro da própria criança, de sua mãe, de seu pai ou dos avós, mas que assim mesmo se realiza pois a família, por exemplo, quer trocar o aparelho de TV branco e preto por um colorido, etc. (1º Congresso Mundial contra a Exploração Sexual e Comercial de Crianças e Adolescentes, Estocolmo,1996).



O tráfico de seres humanos é uma prática que se sofisticou através dos tempos, possibilitando a consolidação de redes internacionais especializadas neste tipo de delinquência. Como se depreende, em virtude de um processo de globalização extremamente veloz, pode um mesmo país ser ponto de partida, chegada ou servir de elo entre nações no tráfico.

Segundo estimativas das Organizações das Nações Unidas (ONU), esta é a terceira forma de crime mais rentável, ficando atrás somente do tráfico de drogas e armas. Com fulcro no relatório, esta modalidade criminal movimenta cerca de R$ 31,6 bilhões de dólares anuais, decorrentes do aliciamento de pelo menos dois milhões de mulheres no mundo todo. Os países industrializados obtemperam por metade dessa soma (15,5 bilhões de dólares), ficando o resto com Ásia (9,7 bilhões de dólares), países do Leste Europeu (3,4 bilhões de dólares), Oriente Médio (1,5 bilhão de dólares), América Latina (1,3 bilhão de dólares) e África (159 milhões de dólares). Estima-se que o lucro das redes criminosas com o trabalho de cada ser humano transportado ilegalmente de um país para outro chegue a 13 mil dólares por ano, podendo chegar a 30 mil dólares no tráfico internacional, segundo estimativas do escritório da Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC).

2.1 ASPECTOS SOCIAIS

O desejo de escapar da miséria que aflige grande parte da população brasileira faz com que o anúncio de trabalho em outras regiões e países, seja visto como ponto de obtenção de uma vida mais digna através de uma pseudo-estabilidade financeira. Dentre as principais causas do tráfico, podemos enfatizar: pobreza, ausência de oportunidades de trabalho, violência doméstica, turismo sexual, discriminação de gênero emigração indocumentada, leis deficientes.

Nesta ânsia, mulheres são enganadas e passam a ser exploradas como mercadorias na indústria do sexo. Mesmo as mulheres sendo um maior percentual, há inúmeros casos de crianças e adolescentes que são oferecidas por seus pais ofuscados com uma promessa de melhorarem de vida. Todas estas pessoas são submetidas a regimes análogos à escravidão, sendo via exploração sexual, trabalhos sob condições abusivas, mendicância forçada e servidão involuntária de órgãos para transplantes.

O retorno ao seu país de origem torna-se uma utopia, visto que os traficantes retêm seus passaportes e outros documentos, criam dívidas permanentes além da coação de denunciá-las em alguma prática ilegal, para evitar que estas vítimas possam recorrer às Embaixadas e à justiça.

A ONU reconhece que cerca de quatro milhões de pessoas desaparecem anualmente, sobressaindo-se mulheres e crianças do sexo feminino. Aproximadamente setenta e cinco mil brasileiras encontram-se aliciadas no mercado do sexo europeu. Os dados demonstram que as "saídas" de mulheres são especialmente direcionadas para as fronteiras com países da América do Sul, Japão e Europa.

O aditamento exorbitante da prostituição e do tráfico de mulheres é mais uma sequela da crise capitalista, consumista e egocêntrica que aflige o mundo, vez que a deficiência de direitos ou a ignóbil aplicabilidade dos escassos que a massa mais pobre consegue alcançar, torna-se fator desencadeador de problemas de ordem sócioeconômicas, englobados por condições de habitação degradantes, violência doméstica, desigualdade de oportunidades e de renda perante o mercado de trabalho e preconceito social.

A pobreza do país e o rótulo vinculado à mulher brasileira, tida como exótica e concupiscente corroboram para a proliferação de um dos crimes mais sérios da atualidade que é a exploração sexual. Falsos anúncios, convites de casamento, catálogos fotográficos enviados pelo correio, promessas infundadas de trabalho altamente remunerado, contato direto/indireto com traficantes por intermédio de parentes, conhecidos ou amigos, são algumas das formas de abordagem para aliciamento das vítimas.

2.2 PERFIL

A perpetuação do comércio sexual no Brasil é fruto de um processo histórico de desigualdades sociais e injustiças. Com o desígnio de desempenhar um mapeamento no que concerne ao perfil das vítimas do tráfico e dos aliciadores, algumas instituições nacionais e internacionais concretizaram uma vasta pesquisa para auxiliar no desenvolvimento de ações de combate e prevenção dessa atividade ilícita.

Segundo estudo divulgado pela PESTRAF (Pesquisa sobre o Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil), organizada pelas pesquisadoras Maria Lúcia Leal e Maria de Fátima Leal, coordenada pelo CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes, o Brasil é apontado como país originário da maioria das pessoas traficadas. Juntamente com o Ministério da Justiça (MJ) o Escritório das Nações Unidas Contra Drogas e Crime (UNODC), analisou 36 processos judiciais e inquéritos policiais nos Estados do Ceará, Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo. As informações coletadas não surpreenderam ao assinalar que a pluralidade dos traficantes é caracterizada pelo sexo masculino. No entanto, observou-se que há igualmente uma alta presença de mulheres (43,7% dos indiciados por tráfico) que agem, sobretudo, no recrutamento das vítimas. Apontadores adjacentes a esses foram também observados em outros estudos, que aquilatou em 41% a participação feminina entre traficantes.

A pesquisa revelou ainda que o maior índice de vítimas é do sexo feminino, afrodescendentes, com idade abarcada entre os 15 e os 30 anos, solteira, com baixo nível de escolaridade, desempregada, exercendo atividades informais ou empregada no setor terciário, residente em locais periféricos das cidades, habitam com a família, têm filhos. Habitualmente padeceram de algum tipo de violência intrafamiliar (abuso sexual, estupro, atentado violento ao pudor, gravidez precoce, corrupção de menores, negligência, abandono, maus tratos, violência física e psicológica) e extrafamiliar (na rua, nas escolas, nos abrigos, redes de exploração sexual, concomitante ao uso de drogas, etc.), o que desencadeia uma vulnerabilidade destas defronte à malícia dos aliciadores.

Por sua vez, o levantamento MJ-UNODC revela que sumariamente os aliciadores homens, encontram-se na faixa etária de 30 anos, casados, com grau de escolaridade variável entre o nível médio e o superior, predominantemente brasileiros que se dizem empresários, atuando no ramo de casas de shows, bares, casas de encontros associados a um conjunto de negócios escusos, isto é, lavagem de dinheiro, drogas, contrabando, entre outros. No que concerne às mulheres aliciadoras, o fato de serem mais velhas ilusoriamente lhes afere credibilidade e autoridade para induzir as vítimas a aceitar as propostas advindas do exterior.

Insta salientar que no que tange à relação entre aliciador e vítima, nos casos em que estas já atuam como profissionais do sexo, várias são enviadas simultaneamente e geralmente não há qualquer ligação anterior com o aliciador. Em casos de tráfico isolado, normalmente as vítimas não são prostitutas e necessariamente prevalecem relações de amizade e/ou parentesco com os aliciadores. Este fator aumenta a confiança em falsas promessas de emprego no exterior.

Ainda que determinadas mulheres tenham ciência prévia de que o local de trabalho seja em shows eróticos ou como prostitutas, apenas ao atingirem seu destino é que descobrem que permanecerão em cárcere privado, padecerão de maus tratos, e ademais, serão coagidas a entregar grande percentual de todos os seus proveitos laborais aos "empregadores". Registre-se ainda que, de modo geral, as vítimas deste mercado negro ficam instaladas em recintos repugnantes, vivem na clandestinidade e submetem-se a trabalhar em condições miseráveis.

Por derradeiro, em relatório do I Seminário Internacional sobre Tráfico de Seres Humanos, LEAL e HAZEU (2.000) explanam de forma concisa:

Muitos acreditam que as mulheres foram aliciadas por serem prostitutas e, logo, carregariam uma parcela de culpa pela sua situação. Uma visão absolutamente equivocada do ponto de vista legal, uma vez que, em nenhum momento, a legislação menciona a conduta da vítima como relevante para o crime de tráfico.

2.3 ROTAS DO TRÁFICO

O negócio da prostituição assumiu tamanha magnitude, que obrigou os governos internacionais a adotarem medidas imperativas. Turismo sexual, noivas vendidas por correspondência, prostituição em bordéis, pornografia e serviços sexuais forçados podem ser exemplos do que está conexo diretamente com o tráfico de mulheres.

As rotas do tráfico interno no Brasil atendem a demanda de atividades econômicas onde se encontra grande aglomeração de homens, como garimpos, construções de grande porte, estradas, hidrelétricas, etc. No entanto, é válido ressaltar que decorrente da multiplicação de "matéria-prima" de baixo custo ou até mesmo gratuita, há uma proliferação da escravidão humana.

No que tange às regiões Norte, Centro Oeste e à região Sul, sumariamente o meio de transporte mais utilizado nos casos de circulação via terrestre, são os táxis. Já as rotas que tem como ponto de partida via fluvial intercalado ao transporte terrestre temos destacadamente os estados das regiões Norte, principalmente o Pará e Nordeste com destino a países da América Latina bem como Europa.

Na região Norte, a prática mais comum é a da exploração sexual fluvial. Crianças e adolescentes prostituem-se em chalanas, barcos e bares na beira-rio. Já em regiões litorâneas, especialmente no Nordeste brasileiro, meninas inserem-se na vida da prostituição desde crianças. Decorrente do alto número de turistas estrangeiros, sendo que muitos destes procuram o Brasil mais pela beleza humana do que a natural, durante todo o dia e, mormente à noite, há grande quantidade de meninas e mulheres em busca de dinheiro e quiçá a possibilidade de serem convidadas para viajar a outros países, com promessas de falso matrimônio, emprego de bailarinas em casas noturnas, etc.

Já na região sul do país, as vítimas são em sua maioria levadas para regiões de fronteira do Mercosul.

No que diz respeito ao tráfico externo, a Espanha possui o maior percentual de mulheres brasileiras aliciadas no mercado sexual. Entretanto, cumpre-nos assinalar que há consideráveis números que reportam a países como Guiana Francesa e Suriname. A via aérea é a mais utilizada seguida pela via marítima.

2.4 EFEITO E COMBATE

Há uma propensa dificuldade no combate à prostituição e à exploração de meninas no que tange às distintas realidades encontradas no Brasil, pois há desde jovens que vivem nas ruas, garimpos, sem qualquer estrutura familiar, até o chamado turismo sexual nas cidades do litoral, o turismo sexual fluvial, o abuso sexual dentro da própria família e a exploração em prostíbulos.

Neste aspecto, o Código Penal Brasileiro, reza nos arts. 227 a 231, que "quem induzir, atrair alguém à prostituição" ou ainda "que facilite ou impeça que alguém a abandone será punido", e, por conseguinte, afirma ser crime promover ou facilitar a entrada no país de mulheres para prostituição, ou a saída para o estrangeiro com a mesma finalidade.

Atualmente busca-se maior aplicabilidade de ações incrementadas por diversas esferas da sociedade, voltadas a desmantelar as redes nacionais e internacionais de traficantes de mulheres e meninas, o combate ao turismo sexual por intermédio de apoio à criação de mecanismos de punição de agências que comercializam o sexo, e o fortalecimento do aparelho jurídico-policial.

Com papel primordial nesta batalha, a imprensa e a mídia em geral, tem a função não somente de informar, veiculando campanhas e programas, mas ao mesmo tempo promover debates e destarte, prover a possibilidade de uma ampla gama da população brasileira interagir e descobrir os fatos que levam ao acréscimo galopante do crime, pois, a conscientização é a principal ferramenta de ação impeditiva e a duelo à vulnerabilização que acomete as vítimas.

Portanto, mister se faz a estruturação de medidas governamentais de inclusão e justiça social e imbuídas para proscrever a impunidade, que é sentimento constante na população brasileira. Por meio de trabalhos educativos conseguiremos alertar a juventude sobre os perigos que acometerão a sua integridade física e dignidade quando se tornam vítimas desta máfia. Todas as classes sociais necessitam compartilhar de políticas de enfrentamento, à vista disso, alcançaremos sem delongas, resultados imediatos e permanentes e, quem sabe em médio prazo consigamos extirpar essa conduta que pode ser considerada como um dos mais desprezíveis crimes cometidos contra a humanidade.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tráfico de seres humanos é um problema globalizado que demanda respostas análogas à sua dimensão para acautelar e controlar tanto a oferta, quanto a demanda da exploração sexual. É de suma importância que leis severas sejam criadas para alicerçar a luta defronte esta prática, mas, no entanto, que a certeza da aplicabilidade e execução das mesmas seja inexorável.

Para reprimirmos o desenvolvimento desta, é basilar que abracemos ações predispostas a impedir e/ou limitar, tanto qualitativa quanto quantitativamente a prosperação dos índices de vítimas traficadas para estes fins. Ressalte-se que a maior parcela destas se encontra em posição vulnerável, ora decorrente de sua condição social, ora da situação psicológica.

A retomada da valorização do ser humano agregados a pacotes de políticas públicas com o intuito da inserção das camadas mais excluídas sejam elas pela via racial, sexual ou social, são programas amortizadores dentro do paradigma da exploração, haja vista que estas vítimas não sofrem traumas físicos e psicológicos exclusivamente durante o período em que permanecem expostas aos traficantes, mas, de igual forma, continuam desprezadas por uma sociedade individualista, preconceituosa que ignora os que não conseguiram se amoldar nos patamares estabelecidos.

Ademais, o Estado deve avocar para si o suprimento no fornecimento básico em termos de educação, formação profissional e, no caso das pessoas que já se tornaram vítimas, o repatriamento destas. Destarte, que o foco seja imediatamente alterado, pois permanecendo direcionado unicamente ao efeito e negligenciando as causas, tornar-se-á inviável qualquer programa de prevenção, depreciação e, consequentemente a penalização dos traficantes, o que implica em maior insegurança pública perante este aspecto.

Em análise última, que a sociedade em geral juntamente com a mídia e o Estado, vinculem forças para respaldar e fomentar medidas que promovam a efetiva liberdade, a justiça social, a ruptura dos padrões que ensejam às desigualdades sócioeconômicas e primordialmente que protejam a dignidade da pessoa humana.

Tráfico de mulheres na Europa movimenta 2,5 bilhões de euros
Segundo a ONU, há cerca de 140 mil mulheres vítimas do tráfico humano relacionado ao mercado da exploração sexual na Europa. Estima-se que, por ano, são feitas 70 mil novas vítimas do crime organizado para exploração sexual. A organização estima ainda que estas 140 mil mulheres traficadas, em condições de servidão, façam, juntas, cerca de 50 milhões de programas sexuais por ano, a um valor médio de 50 euros cada. No total, isso representa um lucro anual que atinge 2,5 bilhões euros, ou seja, o equivalente a R$ 5,5 bilhões.

Tatiana Félix (*) - Adital

O relatório Tráfico de Pessoas para a Europa para fins de Exploração Sexual, divulgado dia 29 de junho, pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), revelou que só na Europa existem cerca de 140 mil mulheres vítimas do tráfico humano que servem àqueles que procuram o mercado da exploração sexual. Por ano também são feitas 70 mil novas vítimas do crime organizado para exploração sexual.

A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que estas 140 mil mulheres traficadas, em condições de servidão, façam, juntas, cerca de 50 milhões de programas sexuais por ano, a um valor médio de 50 euros cada. No total, isso representa um lucro anual que atinge 2,5 bilhões euros, ou seja, o equivalente a R$ 5,5 bilhões.

Os dados se referem apenas à Europa Ocidental e mostram que a maior parte das pessoas traficadas vem de regiões vizinhas, como os Bálcãs (32%) e países da antiga União Soviética (19%). A América do Sul aparece em terceiro lugar de origem das vítimas, com representatividade de 13%. Segundo o relatório, é cada vez maior o número de brasileiras traficadas. Em seguida, aparece a Europa Central com 7%, África, com 5% e Leste Asiático com 3%.

De modo geral, o estudo aponta a Espanha como o principal país de destino das vítimas, seguida por Portugal, Holanda e Alemanha. Entretanto, o relatório detalhou que as brasileiras e paraguaias, entre as vítimas sul-americanas, são destinadas, principalmente, para Espanha, Itália, Portugal, França, Holanda, Alemanha, Áustria e Suíça. Os dados revelam uma mudança nos últimos anos, pelo menos na Espanha, já que antes de 2003, eram as colombianas, a maioria das vítimas no país.

A estimativa de mulheres traficadas na Europa foi levantada pela ONU com base no número de 7.300 vítimas detectadas na Europa Ocidental em 2006. De acordo com a Organização, 1 em cada 20 vítimas seria detectada, chegando, então, ao total de 140 mil mulheres. O relatório indica que as novas 70 mil vítimas anuais, expressam a rotatividade e o movimento do tráfico de pessoas, e explica que elas substituem aquelas que conseguiram se livrar do crime organizado, abandonando sua antiga condição ou, ainda tenham se transformado em novas aliciadoras.

Tráfico em Portugal

Já o Relatório Anual de 2009 do Observatório do Tráfico de Seres Humanos, do Ministério da Administração Interior de Portugal, revelou que 40% das mulheres vítimas do tráfico humano em Portugal são brasileiras. Baseado em 85 casos identificados em 2009, o estudo apontou que a maioria dessas mulheres originárias dos estados de Goiás, Minas Gerais e de estados do Nordeste.

Para o diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de Portugal, Manuel Jarmela Paulus, o alto índice de brasileiras entre as vítimas está relacionado apenas ao número expressivo da comunidade brasileira em Portugal - com 100 mil pessoas, ou seja, mais de 20% do total de imigrantes no país. Segundo ele, o Serviço de Estrangeiros está trabalhando em parceria com autoridades brasileiras para combater o tráfico de seres humanos nos dois países.

O relatório de Segurança Interna português também especificou algumas características sobre os traficantes e aliciadores. Geralmente são de nacionalidade portuguesa, romena, brasileira, ucraniana e eslovaca, e para conquistar a vítima, oferecem propostas de trabalho com falsos benefícios.

Jornalista da Adital (*)
Relatório da ONU alerta para o tráfico de mulheres na Amazônia
30 Jun 2010 . Redação . portald24am@gmail.com

Segundo dados da UNODC, cerca de 70 mil mulheres são vítimas de tráfico sexual para a Europa Ocidental por ano. Parte delas tem origem em Estados amazônicos.

O Amazonas, Pará, Roraima e Amapá compõem a região do Brasil de onde sai a maior parte das mulheres traficadas para o mercado da exploração sexual da Europa Ocidental, segundo relatório divulgado ontem pela UNODC, agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para o monitoramento e estudos sobre drogas e crimes em geral. O documento não traz números sobre o tráfico de pessoas nesses Estados, mas diz que o crime tem sido mais comum na região.

Segundo o relatório da UNODC, cerca de 70 mil mulheres são vítimas de tráfico sexual para a Europa Ocidental por ano. A maioria (32%) é ‘recrutada’ no sudeste da Europa, região conhecida como Balcãs, seguido do bloco da ex-União Soviética (19%) e pelos baixes da América do Sul (13%).

Estimativa realizada pela agência da ONU aponta que esse mercado movimenta 2,5 bilhões de euros por ano, o equivalente a R$ 5,47 bilhões. O valor se refere a aproximadamente 50 milhões de programas sexuais por ano, a um custo médio de 50 euros por cliente (cerca de R$ 109).

Além da Europa Ocidental, mulheres traficadas na Amazônia também são levadas para o Caribe e demais países do continente europeu. Pesquisa realizada pela professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Márcia de Oliveira revelou que 73% das mulheres prostituídas nos países do Caribe são oriundas da região. A maioria tem entre 18 e 26 anos, pele morena e nível educacional baixo (Ensino Fundamental).

Em entrevista em maio, a diretora do Departamento Estadual de Direitos Humanos (DEDH), da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (Sejus), Michelle Custódio Campbell, o Amazonas é rota para o tráfico de pessoas, de onde também saem mulheres para outros Estados brasileiros e países como Espanha, Alemanha, Holanda, Venezuela, Colômbia, Guiana Francesa e Suriname.
O tráfico de mulheres jovens que são forçadas a trabalhar como prostitutas foi identificado como o principal fator para o aumento da Aids na Índia.
O país já tem cerca de 5,1 milhões de soropositivos – o segundo maior número no mundo depois da África do Sul.

Algumas estimativas indicam que, em apenas seis anos, seriam 20 milhões de infectados.

Em distritos como Sonagachi, em Calcutá, onde há pelo menos 10 mil prostitutas, alguns homens insistem em mater relações sexuais sem camisinha.

As garotas provenientes do tráfico são obrigadas a aceitar. Muitas são originárias de vilas rurais e não sabem o que é Aids antes de serem vendidas.

À medida que elas viajam pelo país, a doença é, inconscientemente, espalhada.

No leste da Índia, Calcutá emergiu como o centro do tráfico de meninas, que também chegam do Nepal, Bangladesh e Mianmar.

Elas são, geralmente, vendidas para bordéis em Mumbai. Algumas vão para o Oriente Médio, África e Europa.

Bordel

Aklina Khatoom, de 15 anos, é de uma vila fora de Calcutá.

Com uma voz suave, ela lembra como, há um ano, uma mulher a drogou, a raptou e lhe vendeu para uma outra mulher em Mumbai.

"Fui então informada que iria me tornar uma prostituta. Eu disse que não faria isso. Mas apanhei muito, todo o meu corpo era coberto de hematomas. Eles usaram varas de ferro quentes para me bater. Eventualmente, tive que concordar", contou.

Aklina não podia escapar, já que era vigiada pela irmã da mulher que a vendeu.

"Meu dia começava às seis horas da manhã e tinha de 12 a 14 clientes diariamente, terminando às três da madrugada."

Sua sorte mudou quando um cliente permitiu que ela usasse seu telefone para ligar para os pais.



Aklina Khatoom teve sorte e não foi infectada com o vírus HIV

Finalmente, ela foi resgatada, mas seu sofrimento não havia terminado – havia o risco de infecção de Aids.

De acordo com uma estimativa, 70% das prostitutas em Mumbai são infectadas pelo vírus.

"Não sabia o que era Aids antes de ir para Mumbai", disse Aklina. "Uma vez que cheguei lá e fui para o bordel, fiquei sabendo e tinha medo que seria uma coisa que eu pegaria."

"Depois que fui resgatada, voltei para casa e contei tudo para minha mãe. Ela me levou para o teste e, felizmente, foi negativo."

Estigma

Aklina é uma das mais de 300 jovens resgatadas dos traficantes por Swapan Mukherjee e sua organização, baseada em Calcutá, o Centro para Comunicação e Desenvolvimento.

Pobreza e analfabetismo, geralmente, forçam famílias a levarem suas filhas a falsas promessas de trabalho ou casamento, disse Mukherjee.

Em retorno, as famílias recebem menos de US$ 10 (R$ 27).

Mesmo depois que elas são resgatadas, garotas como Aklina enfrentam o estigma de terem sido forçadas a trabalhar como prostitutas.

Mas aquelas que são infectadas com o vírus HIV são completamente ignoradas.


Toda a família estava sendo terrivelmente ignorada, então, para salvar sua família, ela voltou para o bordel em Mumbai


Swapan Mukherjee

Quando Mukherjee permitiu que jornalistas entrevistassem algumas das mulheres resgatadas, suas franquezas tiveram resultados desastrosos.

"Naquela época, eram 34 meninas que tínhamos resgatado. Uma das garotas que era analfabeta simplesmente disse 'sim, eu sou HIV positiva'. Quando isso apareceu nos jornais, os moradores da vila isolaram a família", contou Mukherjee.

"Toda a família estava sendo terrivelmente ignorada, então, para salvar sua família, ela voltou para o bordel em Mumbai."

A menina está agora morrendo. Recentemente, ela chamou Mukherjee, mas ele diz que é muito tarde para salvá-la.

Medo

Ainda pode haver tempo para ajudar garotas que estão trabalhando como prostitutas na Índia, mas será uma tarefa difícil.

Em Sonagachi, em Calcutá, os esforços para promover o uso de camisinhas receberam atenção mundial.

Swapna Gayen, uma das pessoas envolvidas no projeto, disse que as mulheres se negam a ter relação sexual com homens sem o uso do preservativo.

Mas em uma visita a uma clínica no coração de Sonagachi, é possível verificar que esse não é bem o caso.

Uma prostituta chamada Mitural, que disse ter 20 anos, embora aparentasse menos, estava lá para receber tratamento para sífilis. Ela nunca fez um teste de HIV.

"Tenho medo de Aids. Sei o que é, mas o que acontece é que não temos clientes se usamos camisinhas", disse.

"Já aconteceu comigo de ficar três ou quatro dias sem clientes, então tive que aceitar sexo sem camisinha."

A má notícia é que a doença não está confinada apenas aos distritos de prostituição.

O vírus está espalhando-se por toda a Índia – enquanto o tráfico de jovens continuar, haverá pouca esperança de que o número de infectados irá parar de crescer.




Em imagens
Fotógrafo registra impacto da Aids no continente africano.




Corpo em evidência
Clique para ver imagens ampliadas do corpo humano.




Em vídeo
Mais de cem baleias morrem encalhadas na Austrália.




NOTÍCIAS RELACIONADAS

Vacina contra Aids é promissora, diz estudo no Brasil
29 novembro, 2004 | BBC Report
Comissão interna propõe ONU mais ágil e intervencionista
29 novembro, 2004 | BBC Report
Autores famosos escrevem livro para combater a Aids
29 de novembro, 2004 | Cultura & Entretenimento
Fatores biológicos e sociais tornam mulher mais vulnerável à Aids
30 de novembro, 2004 | Ciência & Saúde



LINKS EXTERNOS
Governo da Índia (em inglês)
Unaids (em inglês)

A BBC não se responsabiliza pelo conteúdo dos links externos indicados.
Portugal na rota do tráfico de mulheres vindas do Brasil

Por Daniela Assunção - ljcc05086@icicom.up.pt e Inês Figueiras - ljcc05045@icicom.up.pt
Publicado: 20.03.2008 | 08:30 (GMT)
Marcadores: Brasil , Portugal , Prostituição , Tráfico , Violência doméstica
Portugal é um dos países de transição e destino de tráfico sexual e laboral. Brasileiras são as principais vítimas.

Do outro lado do Atlântico, sonham com uma vida melhor na Europa. A falta de condições financeiras ou a fuga à violência doméstica leva muitas brasileiras a viajar para Portugal, descobrindo os perigos do tráfico de mulheres.

Pernambuco, no nordeste brasileiro, é um dos locais de origem das mulheres traficadas em Portugal. Ricardo Lins, chefe da unidade de Prevenção e Enfrentamento de Tráfico de Seres Humanos do estado, calcula que existam, desde 2002, em Pernambuco, cerca de 150 casos de tráfico. 70% destas mulheres são exploradas na Europa (Portugal, Espanha, Alemanha). Os restantes 30% correspondem a tráfico interno.

Tráfico humano no feminino

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (em PDF), mulheres e raparigas são as mais afectadas:
- tráfico sexual: 98%
- tráfico laboral: 56%
Embora algumas jovens mulheres sejam vítimas de tráfico laboral, os casos de exploração sexual são mais comuns. Aliciadas por intermédio de “vizinhos e parentes”, através de estabelecimentos nocturnos ou até de “agências de emprego”, as vítimas sabem, “na grande maioria”, que se vão prostituir. Outras acreditam que vão “trabalhar em turismo ou dançar”, exemplifica Ricardo Lins.

Passaportes falsos facilitam tráfico
Geralmente, os traficantes são homens vindos de fora do Brasil, mas também podem ser “mulheres mais velhas”, ou “mulheres que já se prostituíram na Europa e que falam nas vantagens”, conta o chefe da unidade de combate ao tráfico de Pernambuco. “O traficante estrangeiro vem poucas vezes ao Brasil”, explica. Normalmente opta pela época de Verão, ou seja, os meses de Janeiro e Fevereiro.

Para além dos traficantes e intermediários, existem “agentes públicos que facilitam” o funcionamento das redes de tráfico. Ricardo Lins aponta como exemplo a falsificação de passaportes.

Quando o destino é Portugal, as vítimas viajam para “estados que não são tão fiscalizados” e atravessam o Atlântico directamente a partir daí. Segundo o chefe da unidade de combate ao tráfico de Pernambuco, Portugal é também um país de transição quando o destino são outros países europeus onde a fiscalização é maior.

Ricardo Lins acredita que é fundamental que as vítimas de tráfico não sejam punidas e apela à “cooperação entre países”, no sentido de uma maior divulgação de informação, pois “muitas [mulheres] que vão exercer a prostituição não sabem dos riscos”.
ACABAR COM TRÁFICO DE MULHERES É COMBATER POBREZA

Conclusões da Conferência Episcopal das Organizações Feministas Católicas

Por Chiara Santomiero
VERONA, quinta-feira, 11 de setembro de 2008 (ZENIT.org).- A pobreza extrema e o sonho de uma vida melhor em um país diferente: estes são quase sempre os elementos que levam milhares de mulheres, freqüentemente quase crianças, à angústia do tráfico e da prostituição nas ruas do Ocidente.
Segundo os dados dos organismos internacionais, pelo menos 12,5 milhões de pessoas são vítimas do tráfico no mundo, das quais ao menos meio milhão está na Europa, com um lucro para o crime organizado estimado em cerca de 10 bilhões de euros por ano.
Estes temas foram tratados na Conferência Européia «Libertemos as mulheres da prostituição», que se realizou em Verona entre 3 e 7 de setembro passados, no Centro unitário para a Cooperação Missionária (CUM), por iniciativa da União Mundial das Organizações Feministas Católicas (WUCWO/UMOF).
A WUCWO/UMOF é uma associação internacional que reúne organizações feministas, assim como a parte feminina de associações e movimentos de leigos, que trabalham nas comunidades eclesiais do mundo inteiro.
Seu objetivo é promover a participação e a co-responsabilidade das mulheres católicas na vida da Igreja.
Cerca de 100 associações de todos os continentes pertencem a este organismo. Na Europa fazem parte dele associações da Espanha, França, Suíça, Alemanha, Holanda, Luxemburgo, Dinamarca, Noruega, Finlândia, Grã-Bretanha, Polônia, Lituânia, República Tcheca, Eslováquia, Hungria, Itália, Austrália, Malta e Grécia.
As associações européias decidiram desenvolver o tema das novas pobrezas escolhido na assembléia mundial de 2006, dedicando uma atenção particular ao tema do tráfico de mulheres.
«Nesta praga de nosso tempo – afirma Maria Giovanna Ruggieri, vice-presidente de Umofc Europa – entrecruzam-se duas grandes novas formas de pobreza: a material, de quem se vê obrigado a usar seu próprio corpo para sobreviver, e a moral, de quem está convencido de que tudo pode ser comprado, inclusive as mulheres e, com freqüência, também as crianças.»
«Trata-se de um fenômeno planetário», explica Paola Degani, professora no Centro Interdepartamental de Pesquisa e Serviços sobre os Direitos das Pessoas e dos Povos, da Universidade de Pádua.
«Para enfrentá-lo, é necessária uma coordenação entre os instrumentos legislativos e também métodos de monitoramento para poder confrontar os dados», acrescenta.
É muito importante, sublinha a pesquisadora, «distinguir a noção de tráfico da de imigração clandestina. Nesta última «se estabelece um acordo entre quem não dispõe de meios lícitos para migrar e os traficantes, que se extingue com o pagamento do preço. Trata-se de um delito contra a lei de imigração dos Estados».
Ao contrário, no tráfico de mulheres, «as pessoas são levadas de um país para outro com o propósito de serem utilizadas para trabalho, casamentos forçados ou prostituição. Há uma grave violação dos direitos fundamentais da pessoa e de seu direito à segurança e à proteção».
Neste sentido, a União Européia adotou em 2002 uma decisão na qual motivava os governos a considerarem o tráfico como crime, e depois, em 2004, a diretiva 81 previa uma permissão de residência temporária para as vítimas que colaborassem com as autoridades.
«Deve-se ter presente, contudo – acrescenta a professora – que as leis não são suficientes se não forem atacados os mecanismos que estão na base do fenômeno: por um lado, a persistência, nos países de origem, de situações estruturais de pobreza e a dificuldade legal para migrar.»
Por outro lado, é necessário, acrescentou, «combater a forte demanda de trabalho a baixo custo e a ampla demanda de prestações sexuais» nos países de destino.
Desde o início deste ano, ações policiais que resultaram em desarticulações de quadrilhas indicaram uma presença constante de mulheres envolvidas nas organizações criminosas.
“Posso dizer que é uma estatística nacional: enquanto o índice de criminalidade entre os homens cresceu 4%, entre as mulheres aumentou 11%”, atesta Silvana Selem, há oito anos diretora do Presídio Feminino, no Complexo Penitenciário do Estado, Mata Escura, em Salvador. Segundo Silvana, “os números foram revelados durante encontros nacionais de integrantes do sistema penitenciário”.
No Estado, os dados indicam, como principal causa das condenações, tráfico, posse e uso de entorpecentes – das 336 mulheres que cumprem pena na Bahia, 200 (59,5%) estão enquadradas em ocorrências relacionadas com drogas.
Os números da Secretaria da Segurança Pública (SSP) mais recentes são de novembro do ano passado e, embora indiquem redução no número geral de ocorrências criminosas envolvendo mulheres, confirmam aumento de casos relacionados com entorpecentes.

As prisões são cada vez mais comuns. Como a ocorrida semana passada, em que Diana Louise do Carmo Conceição, 22 anos, foi detida em flagrante por tráfico de entorpecentes. Segundo a polícia, a jovem manteria um relacionamento com um remanescente da quadrilha que vinha mantendo o domínio do tráfico de drogas em Salvador. Este é o tipo de ocorrência criminosa em que a participação de mulheres fica mais evidente.

“Percebo um aumento no número de mulheres no tráfico. Elas estão deixando os crimes contra o patrimônio e indo para o comércio de drogas, onde o risco é maior, mas a rentabilidade também”, avalia o experiente advogado criminalista baiano Osvaldo Emanuel.

Os números da população carcerária feminina no Estado reforçam a colocação do especialista. Além do levantamento da Secretaria da Justiça – do último mês de fevereiro – mostrando o grande número de detentas que cumprem pena por tráfico de drogas, das 20 mulheres presas na Delegacia de Repressão a Crimes Contra a Criança e o Adolescente – cuja carceragem é destinada a abrigar mulheres detidas – 15 (75%) estão lá por flagrantes de tráfico de entorpecentes.

Outra unidade com carceragem ocupada por mulheres é a 6ª CP (Brotas), que não forneceu número de presas nem motivações das prisões.

O delegado Hélio Jorge Paixão, diretor do Departamento de Tóxicos e Entorpecentes da Polícia Civil, confirma que existe envolvimento efetivo de mulheres em organizações do tráfico. “Geralmente, com a prisão do companheiro, que liderava a quadrilha, a mulher é quem assume as atividades”. Porém, na opinião do delegado, não há indicativos concretos do aumento do número de mulheres no crime.

Novidade – Especialista em ciências penais, a criminóloga paulista Doris Maria Frossard entende como “algo novo” a mulher no papel de líder do tráfico.

“A maioria dos casos da participação feminina no tráfico ainda se refere àquelas mulheres que transportam drogas para os companheiros que estão nos presídios. Essas não se sentem criminosas, mas como se fossem usuárias. Justificam o comportamento pelo lado afetivo, seja como mãe, namorada ou filha”, ilustra ela, que desenvolve um estudo sobre a hierarquia no tráfico de drogas.
Este programa trata do enfrentamento do grave problema do tráfico de seres humanos. As vítimas brasileiras são, em geral, jovens e pobres, iludidas com promessas de melhoria na qualidade de sua vida e da família, que acabam exploradas por redes de tráfico para fins de exploração sexual.

Railda Herrero e Mario de Freitas

Representantes de diversas instituições que combatem ou tentam prevenir o problema, ou familiares de vítimas alertam como não cair nas redes ou como buscar ajuda. Explicam como funcionam os esquemas e relatam casos de vítimas que pagaram com a vida pela ingenuidade em acreditar em aliciadores.

Medidas
Em 2007, foi publicada uma Portaria que designou os membros do Grupo de Trabalho Interministerial encarregado de elaborar o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas. Os trabalhos foram coordenados pela Secretaria Nacional de Justiça, Secretaria Especial dos Direitos Humanos e Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres.

Um ano depois, o presidente Lula instituiu o Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, com o objetivo de prevenir e reprimir esse crime, responsabilizar seus autores e garantir atenção e suporte às vítimas.

SMM
O Serviço à Mulher Marginalizada (SMM) tem um sólido programa de prevenção do tráfico e exploração sexual comercial de mulheres e meninas. Esta ONG atua desde 1991 em defesa dos direitos humanos. Desenvolve trabalho de formação junto a escolas e mantém um centro de informação e de ações de sensibilização da sociedade em geral. Nesse programa da série “Vozes das Mulheres do Brasil” Maria do Socorro Nunes da Silva, diretora-executiva do SMM, apresenta um perfil das vítimas e as rotas mais comuns.

O enfrentamento do tráfico de pessoas para fins de exploração sexual deve começar, de acordo com Maria do Socorro, combatendo a imagem que o Brasil possui no exterior de um paraíso do chamado “turismo sexual”. Esta “porta de entrada” era, até há pouco tempo, estimulada pelo próprio governo em campanhas de divulgação internacional de turismo para o Brasil.

Para Maria do Socorro, as regiões mais vulneráveis à ação dos aliciadores estão no nordeste, norte e centro-oeste do país, principalmente “pela beleza das meninas, considerada exótica pelos europeus”.

Medo e enfrentamento
Em São Paulo, o Núcleo de Enfrentamento do Tráfico de Pessoas, vinculado à Secretária de Justiça, visa prevenir e reprimir esse tipo de crime. Já mapeou 14 regiões do Estado, constatando que o maior fluxo de vítimas para a Europa está no pobre Vale do Ribeira, no litoral sul. Nesse programa, a coordenadora do Núcleo, a psicóloga Anália Ribeiro, conta quais são os motivos mais freqüentes que levam as mulheres a se envolver com as redes de aliciadores.

A psicóloga explica que, além da vergonha e da culpa, as mulheres também têm medo de denunciar as pessoas que integram as redes de tráfico.

Ao longo dos últimos anos, as autoridades de São Paulo vêm mapeando os principais pontos e rotas utilizados pelas redes de tráfico de pessoas para movimentação dentro e fora do Brasil. Portugal e Espanha são duas maiores portas de entrada de vítimas do tráfico, principalmente por causa da facilidade com o idioma. A Holanda já chegou a ser considerada o terceiro destino das vítimas do tráfico na Europa.

De acordo com Anália Ribeiro, a maioria das mulheres aliciadas sabem que vão trabalhar como profissionais do sexo, porém, elas ignoram completamente as condições que as esperam em seus destinos. “Ficam cegas pelo sonho de buscar melhoria de vida fora do Brasil. Dificilmente elas se consideram vítimas. Isso, segundo Anália, dificulta a punição dos aliciadores e o desmantelamento de redes de tráfico.”

Porta de saída
Em Guarulhos, estado de São Paulo, está localizado o maior aeroporto da América do Sul, Cumbica. Com um movimento anual de mais de dez milhões de usuários, esse aeroporto é importante porta de saída de mulheres que são aliciadas pelas redes de tráfico de pessoas.

Nesse aeroporto funciona o posto avançado da Asbrad, Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude. Essa Organização Não-Governamental apóia vítimas do tráfico de pessoas e atende a pessoas que foram barradas em outro país, ao tentar sair do Brasil. Nesse programa especial, Débora Donadel, integrante da Asbrad, dá detalhes sobre o trabalho da Associação no aeroporto, que envolve diversos voluntários.

Segundo Débora, “no contato direto com pessoas no aeroporto, fica claro que muitas mulheres não possuem informações mínimas sobre como agir no caso de situações inesperadas”. Segundo a representante da Asbrad, a mulher brasileira que possui baixa instrução e viaja sozinha para Europa “já ficou associada, em muitos países, à imagem de prostituta”.

Ajuda a vítimas
Em diversos países da Europa há instituições que ajudam pessoas vítimas de redes do tráfico de seres humanos. As embaixadas e consulados brasileiros devem ser procurados.

Em Portugal, disque 808 257 257.

Na Holanda, 06 19192898, Campanha Joana. www.casasbrasilholanda.nl

Consulado Geral de Roterdã (emergência) 06 51554836. Denúncia anônima à polícia holandesa: 0800 7000.

No Brasil, disque 180, ou à Polícia Federal: 61 3311 8705. Ou ainda, SMM 011 3228-4955; Asbrad: 11 8451 0047.

A Radio Nederland, com o apoio da agência holandesa de cooperação para o desenvolvimento Cordaid, apresenta a série de programas especiais Vozes das Mulheres do Brasil.

Com quase trinta minutos cada, esta nova série de quinze programas visa aprofundar temas como a desigualdade, o tráfico de seres humanos, a violência doméstica e o abuso de meninas. Mostra um perfil das mulheres brasileiras levadas à prostituição e sua organização para garantir a cidadania e o controle da Aids.

As rotas e as formas de aliciamento do tráfico de mulheres também são temas desta série de programas. Alternativas e projetos para superação da miséria em diferentes regiões do país são apresentados como modelos de inserção social que fazem a diferença, principalmente onde não há emprego formal.

As séries produzidas anteriormente pelos repórteres Railda Herrero e Mario de Freitas conquistaram dois prêmios Vladimir Herzog de Jornalismo e Direitos Humanos e dois prêmios no Festival Internacional de Nova York.
Crime organizado: tráfico de mulheres na Europa movimenta 2,5 bilhões de euros por ano
Jul 2nd, 2010 by Marco Aurélio Weissheimer.
O relatório “Tráfico de Pessoas para a Europa para fins de Exploração Sexual”, divulgado dia 29 de junho, pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), revelou que, somente na Europa, existem atualmente cerca de 140 mil mulheres vítimas do tráfico humano relacionado ao mercado da exploração sexual. Por ano, avalia o documento, são feitas pelo menos 70 mil novas vítimas do crime organizado para exploração sexual. A ONU estima ainda que estas 140 mil mulheres vítimas de tráfico e exploração façam juntas cerca de 50 milhões de programas sexuais por ano, a um valor médio de 50 euros cada. No total, isso representa um lucro anual que atinge cerca de 2,5 bilhões euros, ou seja, o equivalente a R$ 5,5 bilhões.

Esses dados se referem só à Europa Ocidental e mostram que a maior parte das vítimas do tráfico vem dos Bálcãs (32%) e de países da antiga União Soviética (19%). A América do Sul aparece em terceiro lugar neste ranking, com 13%. Em seguida, vem a Europa Central (7%), a África (5%) e o Leste Asiático (3%). O estudo aponta a Espanha como o principal destino das vítimas, seguida por Portugal, Holanda e Alemanha. Entre as vítimas sul-americanas, brasileiras e paraguaias são destinadas, principalmente, para Espanha, Itália, Portugal, França, Holanda, Alemanha, Áustria e Suíça. A estimativa da ONU toma como base o número de 7.300 vítimas detectadas na Europa Ocidental em 2006. Segundo a entidade só 1 em cada 20 vítimas é detectada, o que leva ao número de 140 mil mulheres.

12 de julho de 2009
Oito brasileiras foram assassinadas este ano vítimas da exploração sexual no exterior. Aliciadores de 10 países atuam no território nacional. Investigação da Polícia Civil brasiliense mostrou o tamanho do esquema no Brasil. Ficou comprovado que o homicídio da ex-prostituta Letícia Mourão, 31 anos, em março deste ano, ocorreu a mando de uma organização criminosa dona de seis prostíbulos na Espanha.


Guilherme Goulart - Correio Braziliense


As organizações criminosas especializadas em tráfico de seres humanos mataram pelo menos oito brasileiras em 2009. Houve seis assassinatos na Espanha e um nos Estados Unidos. As vítimas são mulheres que deixaram o país para tentar a vida por meio da prostituição. O crime mais surpreendente, no entanto, ocorreu em território brasileiro, especificamente na capital do país. A morte de uma goiana no Guará revelou que as máfias europeias vinculadas à prostituição internacional não temem a segurança nacional. E dão ordens para aliciadores tirarem a vida daqueles que as ameaçam.

Investigação da Polícia Civil brasiliense mostrou o tamanho do esquema no Brasil. Ficou comprovado que o homicídio da ex-prostituta Letícia Mourão, 31 anos, em março deste ano, ocorreu a mando de uma organização criminosa dona de seis prostíbulos na Espanha. Órgãos federais e estaduais também têm informações de que aliciadores de outros 10 países — Portugal, França, Suíça, Irlanda, Holanda, Bélgica, Reino Unido, Israel e Estados Unidos — têm influência dentro das fronteiras brasileiras. Movimentam dinheiro, convencem novas vítimas e matam, se preciso.

Goiás aparece como o estado que mais exporta brasileiros. Há 250 mil goianos no exterior. Boa parte vive da prostituição. Alguns voltam ao país como recrutadores. “Esses grupos criminosos são organizados e estruturados. Enviam pessoas principalmente para Espanha e Portugal, pela facilidade da língua, e para a Suíça. Depois, vêm de fora para dentro”, explicou o procurador da República Daniel de Resende Salgado, do Ministério Público Federal de Goiás. O órgão se dedica ao combate à prostituição internacional desde 2004. Atuou na condenação de 20 pessoas por exploração sexual no exterior.

Vulnerabilidade
A experiência no assunto levou o Ministério Público Federal goiano a traçar o perfil das vítimas e dos aliciadores (veja quadro ao lado). “Elas (as organizações mafiosas) elegem algumas prostitutas para voltar ao Brasil e fazer a propaganda positiva da vida no exterior. Usam a condição de vulnerabilidade das pessoas e trabalham com certa sutileza”, detalhou Salgado.

O problema no estado vizinho ao DF levou à criação da Assessoria de Assuntos Internacionais do Estado de Goiás. Desde 2000, o órgão, comandado por Elie Chidiac, presta assistência aos familiares e às vítimas de prostituição. O trabalho passa por três pilares: repressão, assistência e conscientização. “Só assim podemos fazer um escudo psicológico para conscientizar e alertar dos perigos que há neste meio”, explicou. Segundo ele, uma média de 20 goianos são assassinados por ano na Europa devido à exploração sexual.

A proposta da assessoria goiana segue a iniciativa do governo federal para combater a prostituição internacional a partir do Brasil. “Estamos focados em campanhas educativas, repressão e capacitação de profissionais”, disse o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior.



O alvo

A maioria das mulheres atraídas pelas máfias estrangeiras é goiana. Organizações criminosas internacionais
enviam aliciadores ao Brasil para convencê-las a viver da prostituição na Europa. Veja o perfil delas:

Têm entre 18 e 26 anos

O grau de instrução não passa do ensino fundamental

Não têm condições de arcar com pacotes de turismo sequer para um local no interior do país. Por isso, desembarcam endividadas na Europa

São de famílias de baixa renda, residentes na periferia. A maior parte é de cidades do interior de Goiás
Boa parte se encontra desempregada antes da partida para o exterior

A maioria tem um ou dois filhos, geralmente de pais diferentes

Tiveram relacionamentos frustrados



Três perguntas para

ELIE CHIDIAC,

chefe da Assessoria para Assuntos Internacionais do Governo de Goiás
Edilson Rodrigues/CB/D.A Press - 19/3/09



Além das máfias espanhola e russa, que organizações criminosas estrangeiras atuam no Brasil e para que países encaminham a mão de obra?
Itália, Portugal, França, Suíça, Irlanda, Holanda, Bélgica, Reino Unido, países da União Europeia em geral e do Oriente Médio, como Israel. Todos esses lugares mandam aliciadores para o Brasil e exploram a prostituição. Nos Estados Unidos, tem prostituição, mas nunca ouvimos ou registramos queixas de lá.

A ex-prostituta goiana Letícia Mourão foi assassinada em
Brasília em março deste ano, a mando de uma organização
criminosa da Espanha. Até que ponto esses grupos estão
organizados no Brasil?
As máfias mandam meninas que fazem parte da organização criminosa e esbanjam dinheiro, comprando casas, carros e dando dinheiro para a família. Não ficam na esquina oferecendo serviço lá fora. Compram os bens, às vezes pagos pelas próprias máfias, para fazer propaganda. Às vezes, contam com auxílio de cabeleireiros, agências de viagens, bancas de revistas, agências de modelo.

Letícia morreu ao denunciar exploração sexual e escravidão na Espanha. Casos de assassinatos, ameaças e intimidações contra ex-prostitutas brasileiras são comuns no Brasil?
Muitas famílias nos procuram e pedem ajuda para trazer essas meninas que estão sendo exploradas e querem sair desta vida. Às vezes, a família descobriu que o trabalho dela não era babá ou garçonete. Muitas estão desaparecidas, em especial nas ilhas de Mallorca, na Espanha. Acabaram jogadas no mar. Antes desse assassinato em Brasília, não havia notícias de assassinatos no Brasil. É um alerta. O assassino estrangeiro está atuando na nossa casa. Isso fere a soberania e a segurança nacional.

Em regime de escravidão

Regras impostas pelas organizações que exploram a prostituição incluem jornada de até 22 horas de trabalho e multas pesadas

GUILHERME GOULART - Correio Braziliense

Cadu Gomes/CB/D.A Press - 3/7/09

Lúcio Flávio, preso na semana passada, é acusado de ter recebido R$ 4 mil para matar brasileira que denunciou esquema de prostituição na Espanha

Jornada que em alguns casos chegam a 22 horas. Pagamento de 40 euros (cerca de R$ 120) por programa de 30 minutos —metade para a mulher, metade para o dono do prostíbulo. No máximo 45 minutos para descanso e alimentação em toda a labuta diária. E, por fim, multas em caso de atraso, cochilo ou rejeição de parceiro sexual. A rotina de trabalho de uma prostituta brasileira na Europa se aproxima da escravidão e lembra o século 19. Funciona de acordo com as ordens de organizações criminosas especializadas em tráfico de seres humanos e exploração sexual, que lucram principalmente com a mão de obra saída do Brasil.

A mais recente vítima dessas quadrilhas internacionais morava no Distrito Federal. A goiana Letícia Peres Mourão, 31 anos, morreu assassinada a tiro na capital do país ao denunciar esquema de prostituição de brasileiras à Justiça da Espanha. O Correio teve acesso ao depoimento dado por ela à polícia federal espanhola, em Tarragona, a 100km de Barcelona (veja fac-símile). A mulher desafiou a máfia local ao contar detalhes do horror vivido como garota de programa. “Soube que poderia descansar de quatro a cinco horas, que logo isso não ocorreu, trabalhando praticamente as 24 horas”, diz um dos trechos.

As declarações são de 15 de novembro de 2005. Foram confirmadas ao Juizado de Instrução nº 5 de Tarragona em 7 de abril de 2006. Letícia contou que não suportou as condições impostas pela organização. Ao ser apresentada a Miguel Arufe Martinez, o Antonio, dono do cabaré, aceitou passar 21 dias no prostíbulo da Calle Gasometro, 38-2. Ouviu dele que o serviço seria duro, além de ter de pagar 200 euros (cerca de R$ 600) de depósito. Concordou com as regras. Mas não aguentou 10 dias de relações sexuais. A carga de trabalho obriga as mulheres a ter até 44 programas em um único dia.

Letícia não se limitou a denunciar a rotina de escravidão sexual. Forneceu nomes e endereços. O grupo comandado por Antonio, por exemplo, mantém três prostíbulos em Tarragona — o de Letícia usa como fachada a ONG Andando Sin Fronteras —, dois em Vilanova Y La Geltrú e outro recém-inaugurado em Barcelona. A goiana também revelou que o dinheiro pago pela clientela era arrecadado diariamente por Antonio e funcionários. Acrescentou que a casa noturna onde ela trabalhou explorava nove mulheres. Todas brasileiras.

A goiana ficou no exterior até 2008. Voltou ao Brasil em dezembro e, desde então, morava com o filho no Guará. Retornaria à Espanha em junho, data prevista para novo depoimento à Justiça. Mas acabou assassinada em março a mando da mesma organização alvo da denúncia. O acusado pelo crime, Lúcio Flávio Barbosa, recebeu R$ 4 mil para matá-la. Está preso desde a semana passada. “Saiu uma ordem da Espanha dizendo para executar. A morte, então, passou a ser arquitetada por alguém com elos com os criminosos espanhóis”, afirmou o delegado-chefe da 4ª DP (Guará), Jefferson Lisboa.

Suspeito foragido
O brasileiro que planejou o crime, identificado como Clênio Otacílio da Silva, mora no Espírito Santo e está foragido. Trabalhou como garoto de programa para o grupo de Antonio. E esteve no DF em 6 de fevereiro para observar a rotina de Letícia. Hospedou-se em um hotel de Taguatinga, o mesmo onde mais tarde ficou o atirador. “Ela seria assassinada em fevereiro, mas na época ela viajou”, disse Lisboa. Lúcio Flávio chegou a Brasília em 5 de março. O crime ocorreu na noite seguinte em um bar do Setor Habitacional Lucio Costa. O acusado sacou a arma e atirou no rosto da vítima. Os dois, que não se conheciam, marcaram o encontro pelo MSN.

O secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, classificou o caso com “triste e profundamente lamentável”. “Esse assassinato ocorre em um momento no qual o Brasil intensifica a política internacional contra o tráfico de pessoas. Não era para ser assim”, reclamou. A investigação sobre a quadrilha internacional de prostituição espanhola ficará por conta da Superintendência da Polícia Federal, em Brasília. Cópia do inquérito da 4ª DP seguirá para o Ministério da Justiça brasileiro, que o encaminhará à Justiça da Espanha.


Praia

Tarragona é uma cidade pertencente à comunidade autonôma da Catalunha. Situa-se cerca de 100 km a sudoeste de Barcelona e
é capital da província com o mesmo nome. É banhada pelo Mar Mediterrâneo.

Tempo real

MSN é um programa de mensagens instantâneas criado pela Microsoft. O programa permite que um usuário da Internet se relacione em tempo real com outro que possua o mesmo programa, podendo criar uma lista de amigos virtuais e acompanhar quando eles entram e saem da rede.




Depoimento de Letícia à polícia federal espanhola: detalhes do horror vivido como garota de programa



Memória
Na rota da prostituição internacional


12 de março de 2009


24 de março de 2009


28 de junho de 2009

O Correio iniciou série de reportagens sobre a prostituição internacional no Brasil em março deste ano, quando Brasília passou a fazer parte da mais nova rota de tráfico de seres humanos. Descobriu-se que, a partir do Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, mulheres, a maioria goianas, seguem rumo à Europa. Portugal, Espanha, Bélgica e Suíça aparecem como os principais destinos de garotas que deixam o país para arriscar a vida em prostíbulos e casas noturnas. São Paulo e Rio de Janeiro também são portas de saída.

A maioria das futuras garotas de programa são convencidas por aliciadores instalados no Brasil. E embarcam com a esperança de vencer na vida. Ao chegar, porém, deparam-se com condições próximas à escravidão. Elas têm o passaporte confiscado pelas organizações criminosas e muitas acabam obrigadas a atender de 10 a 12 clientes por noite. A primeira sequência de reportagens, publicada entre 22 e 24 de março, detalhou o perfil dessas mulheres. A maioria tem menos de 30 anos. Algumas são exploradas inclusive pela máfia russa.

No fim de junho deste ano, o Correio também revelou a participação de Anápolis no tráfico de seres humanos a partir do Brasil. A cidade goiana, distante 140km de Brasília, vive hoje o drama de exportar milhares de mulheres para se prostituírem no Velho Continente. Enquanto mães jovens e solteiras se tornam escravas sexuais em bordéis da Irlanda, Suíça, Espanha e Portugal, os filhos acabam na marginalidade. As matérias foram publicadas em 28 e 29 de junho.




A vítima

Letícia Peres Mourão, 31 anos,
Kléber Lima/CB/D.A Press - 7/3/09



Nasceu em Goiânia (GO). Como tantas outras goianas de famílias de baixa renda, engravidou cedo, aos 19 anos, e, poucos depois, optou por tentar a vida na Europa. Deixou o Brasil no início dos anos 2000, quando desembarcou na Espanha — o filho ficou com parentes. Contou para alguns familiares que trabalhava em uma clínica de idosos. Mas também vivia da prostituição. Viveu oito anos em pelo menos três cidades espanholas — Tarragona, Vilanova Y La Geltrú e Barcelona.

Sofreu rotina de escravidão sexual ao conhecer Miguel Arufe Martinez, o Antonio, líder de organização criminosa responsável por seis prostíbulos espanhóis. Chegou até ele por meio de outras garotas de programa. Acertou os detalhes pessoalmente, sabendo da dureza do serviço. Mas, depois do horror vivido durante 10 dias como prostituta em um dos bordéis dele, denunciou-o à polícia e à Justiça da Espanha. Também processou o patrão por trabalho escravo.

A goiana voltou ao Brasil em dezembro de 2008. Escolheu o Guará para morar com o filho, mesma cidade onde vive o ex-marido. Ele não quis dar entrevistas. Letícia tinha planos de ficar na capital do país, apesar de possuir mais um depoimento marcado para junho deste ano na Espanha. A maioria dos familiares mora em Goiânia.

A mãe vive em Miami, nos Estados Unidos. E não voltou ao Brasil para acompanhar o enterro da filha, na capital goiana.

Convenção para a supressão do tráfico de mulheres maiores
Genebra, 1933,


Protocolo de Emenda da Convenção para a Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças, concluído em Genebra, a 30 de setembro de 1921, e da Convenção para a Repressão de Tráfico de Mulheres Maiores, concluída em Genebra , a 11 de outubro de 1933.

Os Estados Partes no presente Protocolo, considerando que a Convenção para a Repressão do Tráfico de Mulheres e de Crianças, concluída em Genebra, a 30 de Setembro de 1921, e da Convenção para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores, concluída em Genebra, a 11 de Outubro de 1933, confiaram à Liga das Nações certos poderes e funções, e que, em face da dissolução da Liga das Nações, e necessária a adoção de medidas com o fim de assegurar o exercício contínuo desses poderes e funções, e considerando que é oportuno que eles sejam assumidos, doravante, pela Organização das Nações Unidas, convieram no seguinte:

Artigo I

Os Estados Partes, no presente Protocolo, assumem o compromisso, entre si, cada qual no que diz respeito aos instrumentos nos quais é Parte, e de acordo com as disposições do presente Protocolo, de atribuir pleno valor jurídico às emendas aos mencionados instrumentos contidos no Anexo ao presente Protocolo, de as pôr em vigor e de assegurar sua aplicação.

Artigo II

O Secretário Geral preparará o texto das Convenções revistas de conformidade com o presente Protocolo e transmitirá, a título informativo, cópias do mesmo ao Governo de cada membro da Organização das Nações Unidas, bem como ao Governo de cada Estado não-membro, à assinatura ou aceitação do qual fica o presente Protocolo aberto. Convidará igualmente as Partes em qualquer dos instrumentos emendados pelo presente Protocolo a aplicar os textos emendados desses instrumentos logo que entrem em vigor essas emendas, mesmo se não se tiverem ainda tornado Partes no presente Protocolo.



Artigo III

O presente Protocolo ficará aberto à assinatura ou à aceitação de todos os Estados Partes na Convenção de 30 de setembro de 1921 para a Repressão do Tráfico de Mulheres e de Crianças ou na Convenção de 11 de outubro de 1933 para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores, aos quais o Secretário Geral houver transmitido cópia do presente Protocolo.

Artigo IV

Os Estados poderão tornar-se Partes no presente Protocolo:



pela assinatura sem reserva quanto à aprovação; ou




pela aceitação; a aceitação se efetuará pelo depósito de um instrumento formal junto ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas.


Artigo V



O presente Protocolo entrará em vigor na data na qual dois ou mais Estados se tornarem Partes no mencionado Protocolo.




As emendas contidas no Anexo ao presente Protocolo entrarão em vigor, no que diz respeito a cada Convenção, desde que a maioria das Partes na Convenção se tenham tornado Partes no presente Protocolo e, em conseqüência todo o Estado se tornar Parte em uma ou outra das Convenções após a entrada em vigor das emendas que à mesma se referem, se tornará parte na Convenção assim emendada.


Artigo VI

De acordo com o parágrafo primeiro do Artigo 102 da Carta das Nações Unidas e com regulamento adotado pela Assembléia Geral para a aplicação deste texto, o Secretário Geral da Organização das Nações Unidas fica autorizado a registrar o presente Protocolo bem como as emendas feitas em cada Convenção pelo presente Protocolo, nas respectivas datas da sua entrada em vigor, e a publicar o Protocolo e as Convenções emendadas logo que possível após seu registro.



Artigo VII

O presente Protocolo, cujos textos chinês, inglês, francês e espanhol são igualmente autênticos será depositado nos arquivos do Secretariado da Organização das Nações Unidas. Considerando que as Convenções emendadas, de acordo com o Anexo, estão redigidas apenas em inglês e em francês, os textos inglês e francos do Anexo serão igualmente autênticos, e os textos chinês, russo e espanhol serão traduções.

Uma cópia autenticada do Protocolo, com o Anexo, será enviada pelo Secretário Geral a cada um dos Estados Partes na Convenção de 30 de setembro de 1921 para a Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças ou na Convenção de 11 de outubro de 1933 para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores, bem como a todos os membros da Organização das Nações Unidas.

Em fé do que, os abaixo-assinados, devidamente autorizados pêlos seus respectivos Governos, assinaram o presente Protocolo, na data que figura junto de suas respectivas assinaturas.

Feito em Lake Success, Nova Iorque, a doze de novembro de mil novecentos e quarenta e sete.

Pelo Afeganistão:

Hosayn Aziz
12 de novembro de 1947

Pela Argentina:

José Arce

12 de novembro de 1947

Pela Austrália:

Herbert V. Evatt

13 de novembro de 1947

Pelo Reino da Bélgica:

F. Van Langennove

12 de novembro de 1947

Pela Bolívia:

Pelo Brasil:

" ad referendum"

João Carlos Muniz

17 de março de 1948

Pela República Socialista Soviética da Bielo-rússia:

Pelo Canadá:

J. L. Ilsley

24 de novembro de 1947

Pelo Chile:

Pela China:

Peng Chung Chang

12 de novembro de 1947

Pela Colômbia:

Por Costa Rica:

Por Cuba:

Pela Tchecoeslováquia:

Jan Masaryk

12 de novembro de 1947

Pela Dinamarca:

" ad referendum"

Bodil Begtrup

12 de novembro de 1947

Pela República Dominicana:

Pelo Equador:

Pelo Egito:

M. H. Haykal Pasha

12 de novembro de 1947

Por El Salvador:

Pela Etiópia:

Pela França:

Pela Grécia:

Pela Guatemala:

Por Haiti:

Por Honduras:

Pela Islândia:

Pela Índia:

M. K. Vellodi

12 de novembro de 1947

Pelo Irã:

Pelo Iraque:

Pelo Líbano:

Chamoun
12 de novembro de 1947

Pela Libéria:

Pelo Grão Ducado De Luxemburgo:

sob reserva de aprovação:

Pierre Pescatore

12 de novembro de 1947

Pelo México:

L. Padilla Nervo

12 de novembro de 1947

Pelo Reino dos Países Baixos:

"ad referendum"

J. H. Van Royen

12 de novembro de 1947

Pela Nova Zelândia:

Pela Nicarágua:

"ad referendum"

G. Sevilla-Sacassa

12 de novembro de 1947

Pelo Reino da Noruega

sob reserva de ratificação:

Finn Moe

12 de novembro de 1947

Pelo Paquistão:

O representante do Paquistão deseja fazer constar que, de acordo com o parágrafo 4 do Anexo à Indian Independence Order, 19476, o Paquistão se considera Parte na Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças , concluída em Genebra, a 30 de setembro de 1921, por ter-se a Índia tornado parte na mencionada Convenção Internacional antes de 15 de agosto de 1947.

Zafrullan Khan

12 de novembro de 1947

Pelo Panamá:

R. J. Alfaro

20 de ovembro de 1947

Pelo Paraguai:

Pelo Peru:

Pela República das Filipinas:

Pela Polônia:

Pela Arábia Saudita:

Pelo Sião:

Pela Suécia:

Pela Síria:

Faris El-Khouri

17 de novembro de 1947

Pela Turquia:

Selim Sarper

12 de novembro de 1947

Pela República Socialista Soviética da Ucrânia:

Pela União Sul-Africana:

H. T. Andrews

12 de novembro de 1947

Pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas:

A.Gromyko

18 de dezembro de 1947

Pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte:

Pêlos Estados Unidos da América:

Pelo Uruguai:

Pela Venezuela:

Pelo Iemen:

Pela Iugoslávia:

Dr. Josa Vilfran

12 de novembro de 1947

Anexo ao Protocolo de Emenda da Convenção para Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças, concluído em Genebra a 30 de setembro de 1921, e da Convenção para repressão do Tráfico de Mulheres Maiores, concluído em Genebra a 11 de outubro de 1933.

Convenção para Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças aberta a assinatura, em Genebra, a 30 de setembro de 1921.
O parágrafo primeiro do Artigo 9 ficará assim redigido:

A presente Convenção está sujeita a ratificação. A partir de 1º de janeiro de 1948, os instrumentos de ratificação serão transmitidos ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas que notificará o recebimento dos mesmos aos membros da Organização das Nações Unidas e aos Estados não-membros aos quais houver enviado cópia da Convenção. Os instrumentos de ratificação depositados nos arquivos do Secretariado da Organização das Nações Unidas.

O Artigo 10 ficará assim redigido:

Os membros da Organização das Nações Unidas poderão aderir à presente Convenção.

O mesmo se aplica aos Estados não-membros aos quais o Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas resolver comunicar oficialmente a presente Convenção.

As adesões serão notificadas ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, que as comunicará a todos os Estados Membros, bem como aos Estados não-membros aos quais houver enviado cópias da Convenção.

O Artigo 12 ficará assim redigido:

Todo o Estado parte da Convenção poderá denunciá-la, mediante um aviso prévio de doze meses.

A denúncia será feita por uma notificação escrita ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, o qual transmitirá imediatamente cópias da mesma, com a data de seu recebimento, a todos os membros da Organização das Nações Unidas e aos Estados não-membros aos quais houver enviado cópia da Convenção. A denúncia vigorará após um ano a contar da data de notificação do Secretário Geral da Organização das Nações Unidas e só valerá com relação ao Estado que a tiver efetuado,

O Artigo 13 ficará assim redigido:

O Secretário Geral da Organização das Nações Unidas manterá uma relação especial de todas as Partes que assinaram, ratificaram ou denunciaram a presente Convenção ou aderiram à mesma. Essa relação poderá ser consultada, a qualquer tempo, por qualquer membro da Organização das Nações Unidas ou por qualquer Estado não-membro ao qual o Secretário Geral tenha enviado cópia da Convenção e será publicada o mais freqüentemente possível, de acordo com as instruções do Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas.

O Artigo 14 será suprimido.

Convenção Internacional para a Repressão do Tráfico de Mulheres Maiores, assinada em Genebra, a 11 de Outubro de 1933.
No Artigo 4, as palavras "Corte Permanente de Justiça Internacional", e as palavras "ao Protocolo de 16 de dezembro de 1930, relativo ao Estatuto da mencionada Corte".

O Artigo 6 ficará assim redigido:

A presente Convenção será ratificada. A partir de 1º de janeiro de 1948, os instrumentos de ratificação serão transmitidos ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas que notificará o depósito dos mesmos a todos os membros da Organização das Nações Unidas e aos Estados não-membros aos quais houver enviado cópia da Convenção.

O Artigo 7 ficará assim redigido: Os Membros da Organização das Nações Unidas poderão aderir à presente Convenção. O mesmo se aplica aos Estados não-membros aos quais o Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas resolver comunicar oficialmente a presente Convenção.

Os instrumentos de adesão serão transmitidos ao Secretário Geral da Organização das Nações Unidas, que notificará o depósito dos mesmos a todos os Estados Membros, bem como aos Estados não-membros aos quais o Secretario Geral houver enviado cópia da Convenção.
01/08/2009 às 08:10:16 - Atualizado em 01/08/2009 às 18:16:43

Desmantelada quadrilha de tráfico de mulheres
Janaina Monteiro e agências
A Polícia Federal (PF) deflagrou ontem a Operação Harém para desarticular uma quadrilha que atuava no tráfico de mulheres brasileiras para o exterior. Foram expedidos 15 mandados de prisão e dez de busca e apreensão a serem cumpridos em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, além de Las Vegas, nos Estados Unidos, Paris, na França, e Santo Domingo/Punta Cana, na República Dominicana.

Até a tarde de ontem, foram presas 12 pessoas, entre elas uma mulher, detida pela manhã em Curitiba, suspeita de atuar como agenciadora de mulheres e intermediar o contato de clientes com as garotas de programa.

Seis pessoas foram presas em São Paulo - entre elas um americano que foi detido quando se preparava para viajar-, três no Rio de Janeiro, e duas nos Estados Unidos. Ainda faltam dois mandados de prisão na República Dominicana e um na França para serem cumpridos.

Os presos responderão por crimes de favorecimento à prostituição, rufianismo, tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição, além do delito de quadrilha ou bando.

Pelo menos 200 mulheres por ano foram aliciadas pelo esquema e cada uma renderia US$ 40 mil por mês, conforme estimativa da PF. As investigações duraram seis meses e apontaram que as mulheres eram levadas para os Estados Unidos, França e República Dominicana.

Muitas delas seguiam para Las Vegas, após serem agenciadas por pessoas aqui no Brasil, e acabavam trabalhando em cassinos de grande porte. A polícia procura descobrir há quanto tempo o grupo agia e se o valor ficava com a quadrilha. Durante a investigação, foram bloqueadas dez contas bancárias e computadores foram apreendidos para investigação.

Promessas

Boa parte das mulheres, aliciadas no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Rio, Minas e Bahia, sabia que iriam trabalhar com a prostituição. Outras, segundo a PF, eram atraídas com falsas promessas de emprego. Aquelas que retornaram ao Brasil estão sendo ouvidas pela PF, que não sabe informar se as brasileiras que continuam no estrangeiro serão extraditadas.



As investigações começaram a partir do Espírito Santo, onde foi desvendado o esquema de envio de brasileiras ao exterior, com a finalidade de serem exploradas sexualmente pelo mercado de prostituição de alto luxo.

Notícias Relacionadas
31/07/2009
PF procura envolvidos com tráfico de pessoas em Curitiba
Investigação

Durante o processo de investigação, a PF teve a colaboração da Agência de Imigração Americana (ICE), da Defense Security Service, Interpol, policiais da República Dominicana e dos Estados Unidos, que também realizaram prisões.
ESPÍRITO SANTO: ATRATIVO PARA O TRÁFICO DE MULHERES.

Eduardo Veronese da Silva[1]

Matéria publicada no jornal A Tribuna em 19/05/09, registrou a prisão de duas mulheres que, segundo a Polícia Federal, estariam envolvidas no tráfico de mulheres para países da Europa, principalmente Itália e Portugal. Frise-se que o tráfico de mulheres acontece em várias partes do mundo, podendo ocorrer dentro de um mesmo país, entre países vizinhos e até entre continentes.

Na semana passada (08/04/10), a Polícia Federal prendeu parte de uma quadrilha no município da Serra/ES, envolvida com o tráfico de mulheres para serem empregadas no turismo sexual em países da Europa. Para surpresa da Delegacia de Defesa Institucional, os integrantes dessa quadrilha faziam parte de uma mesma família: pai, mãe e filha aliciavam mulheres no Espírito Santo e as levavam para a Suíça. Durante os cinco meses de investigação, constatou-se que as vítimas da quadrilha ficavam presas aos criminosos, que pagavam suas passagens aéreas, mas, depois eram obrigadas a fazer programas sexuais para quitar a divida com eles. Nesse sentido, registra-se trecho da informação passada pelo Delegado Rabelo, da Policia Federal, em matéria disposta no site do jornal gazeta on line:

"A principal dívida era relativa à passagem para a Suíça, que era financiada pela quadrilha. Com os programas, as mulheres pagavam a dívida. Claro que os passaportes delas ficavam em poder dos criminosos".

O tráfico de pessoas remonta um passado nebuloso da história da civilização humana, quando negros africanos foram tirados a força de sua terra natal e trazidos como escravos para trabalharem nas lavouras e residências da classe burguesa, principalmente européia. Desta forma, confirma-se o adágio popular de que a "história é cíclica", pois em pleno Século XXI, volta-se a repetir ações criminosas desta natureza.

A caracterização do tráfico de pessoas, nos termos do Protocolo de Palermo, ratificado pelo Brasil através dos Decretos 5.015 e 5.017, de 2004, se dá pelo "recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou ao acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso de força e a outras formas de coação, rapto, fraude, engano ou abuso de autoridade, a situação de vulnerabilidade e a aceitação de pagamentos para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração".

Destaca-se que essa forma de comercialização da vida humana inclui, no mínimo, a prostituição ou outras formas de exploração sexual, como por exemplo, o emprego em serviços ou trabalhos forçados; a escravatura ou práticas similares à escravidão; ou, ainda, a remoção de órgãos humanos. Este comércio de órgãos, além de movimentar grande soma em dinheiro, tem aumentado muito nos dias atuais.

O tráfico humano é considerado para o traficante uma atividade de baixo risco e de alta lucratividade. É a terceira maior fonte de lucro do crime organizado, perdendo somente para o tráfico de drogas e tráfico de armas. Assim, de vital importância é a informação, a integração e a articulação de todas as instituições policiais, públicas e sociais para o enfrentamento desse crime nefasto.

No caso especifico do tráfico de mulheres, buscam-se as originárias do Leste Europeu (Rússia, Ucrânia, Polônia, Kosovo) e do Sudeste Asiático e África (Gana, Nigéria e Marrocos). Pessoas pertencentes a essas etnias são facilmente encontradas em prostíbulos da Europa Ocidental. No território brasileiro, a preferência dos agenciadores é por mulheres de cidades litorâneas, como Rio de Janeiro, Vitória, Salvador, Recife e Fortaleza. Entretanto, há registros consideráveis de casos no Estado de Minas Gerais, São Paulo, Pará e Goiás.

O governo dos EUA estima que a cada ano cerca de 600 a 800 mil pessoas são tiradas de suas famílias e comunidades para serem exploradas em outros países. Desse total, 80% (oitenta por cento) são mulheres e 70% (setenta por cento) acabam na indústria do sexo. Matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, no ano de 2005, registrava que cerca de 75.000 (setenta e cinco mil) mulheres brasileiras estavam se prostituindo em países da Europa, segundo estatísticas da Fundação Helsinque.

A idade dessas mulheres varia entre 15 a 28 anos, e são transportadas especialmente para países da Europa, detendo certa predominância a Espanha, a Itália e Portugal. Outros países fazem parte da rota do trafico de mulheres, principalmente os países concentrados na América Latina, como Paraguai, Suriname, Venezuela e República Dominicana.

Relatório divulgado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), registrou que o lucro anual com o tráfico humano gira em torno de 31,6 bilhões de dólares. Estima-se que, para cada mulher transportada ilegalmente de um país para outro, o lucro chegue a 13 mil dólares ao ano. Assim, constata-se que pessoas poderosas e influentes dos países envolvidos, como integrantes dos poderes executivo, legislativo e judiciário; grandes empresários, chefes de quadrilhas internacionais (trafico de drogas e armas, entre outros) fazem parte desta grande rede criminosa, colocando em grande dificuldade o aparato de segurança nacional para combater esse tipo criminal.

EDUARDO VERONESE DA SILVA


Segunda-Feira, 08 de novembro de 2010
09.04.10 - BRASIL
PF e MPF investigam tráfico de pessoas no Noroeste Paulista


A- A+

Tatiana Félix *

Adital -
Em fevereiro deste ano, o Ministério Público Federal em Jales, na região noroeste do estado de São Paulo, denunciou quatro homens por tráfico de mulheres na região. As vítimas eram jovens mulheres que após aliciadas, eram transportadas até Portugal, para que fossem exploradas sexualmente na boate Palm Beach localizada em Figueira da Foz. Os casos teriam acontecido entre os anos 2000 e 2002.
A investigação começou em Portugal através de denúncia feita entre 2000 e 2001. Com a intervenção da Interpol (Organização Internacional de Polícia Criminal) a Polícia Federal Brasileira foi acionada, e junto com o Ministério Público Federal iniciou investigação.

Os quatro acusados no Brasil são Luiz Cláudio Pereira, Aldrolando Matos, conhecido como "Wando", Fabrício Alexandre dos Santos, o "Bibiu", e Cleber da Anunciação Alves. De acordo com a denúncia, a quadrilha contava com a colaboração da agência de turismo Albano’s Viagens e Turismo Ltda. (Ilha Solteira Turismo Ltda.), que era de propriedade de Carlos Roberto Gomes, morto em 2007, irmão de Luiz Cláudio, um dos aliciadores. Carlos Roberto seria o mandante da quadrilha.

O proprietário da boate, José Manuel Ferreira Coimbra Barreira, já foi condenado pela justiça portuguesa a 4 anos e 9 meses de prisão pelo crime de tráfico de mulheres, em abril de 2004.
Segundo o Procurador da República Thiago Lacerda Nobre, oito vítimas foram confirmadas e todas mencionaram o nome dos acusados, mas, de acordo com a investigação, há ainda outras pessoas envolvidas no esquema. "Segundo o inquérito pode ser de 15 a 16 meninas que foram vítimas da quadrilha, e há também o nome de outros aliciadores".

Apesar de a agência de turismo, que facilitava a saída das vítimas do país, não existir mais, outros aliciadores podem continuar atuando na região. "Há indícios de que existam outros aliciadores, a Polícia Federal continua investigando o caso", informou o procurador. Ele disse que as vítimas tiveram papel decisivo na indicação dos acusados.

Mas, este, não é o único caso de tráfico de pessoas em Jales. Segundo Thiago, há cerca de dois anos, um caso semelhante ocorreu, envolvendo travestis. A ação de quadrilhas na região, que alimentam a rede de tráfico humano, é facilitada pela situação de vulnerabilidade social apresentada pela população local. Segundo o procurador, "85% da população dessa região é de classe D e E". Ele observou que o noroeste do estado é uma região que apresenta concentração de riqueza, na mão de uma minoria de fazendeiros.

Para enfrentar e prevenir o tráfico de pessoas em Jales e nas cidades vizinhas, Thiago disse que está planejando um evento para o segundo semestre deste ano, em parceria com poder público local e entidades da capital, São Paulo, que atuam no combate e prevenção ao crime. A ideia é desenvolver ações sociais e de conscientização com a população. "É preciso dar um tratamento preventivo e desenvolver ações sociais, porque o problema não é só criminal, mas, principalmente, social", enfatizou.
Continuação da Série de Reportagens sobre o Tráfico de Mulheres

Capa do CD da Pestraf
Março 2008
Discriminação dificulta combate ao tráfico de mulheres
Os preconceitos e a sexualidade como tema tabu fazem com que as mulheres usadas pelo mercado de tráfico de seres humanos sejam vistas como criminosas. Todo o sofrimento vivenciado por elas parece não ser suficiente para que a sociedade as reconheça como vítimas, o que é mais um dificultador no combate a esse tipo de crime.
O texto da Pesquisa Sobre Trafico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil (Pestraf) resume bem a visão refletida por grande parte da sociedade: “algumas vozes justificam que o consentimento e sua inserção na prostituição não as fazem vítimas, mas, sim, co-participantes nesse processo. Isso banaliza a situação e favorece o crescimento de um comércio lucrativo e a impunidade das organizações criminosas do sexo”.
A advogada e professora de Relações Internacionais, que também é mestra em União Européia e coordenadora executiva do Observatório Negro, Aurenice Nascimento Lima, comenta: “é preciso ficar claro que, mesmo que a mulher saiba que irá se prostituir, dificilmente fará idéia de que estará sujeita ao cárcere privado, terá seu passaporte recolhido pelo aliciador, será ameaçada de morte pelos traficantes e utilizada no comércio de drogas ilícitas.”
Tomando como referência a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os direitos não podem ser vendidos e, mesmo tendo concordado com a prostituição e assinado um contrato, essas mulheres são vítimas que precisam do cuidado do Estado e da Sociedade Civil.
O combate - Aliciadores e, algumas vezes, até as vítimas, não se entenderem como tal, é só uma das dificuldades encontradas no combate ao tráfico de mulheres. Muitos outros fatores, como a invisibilidade do crime, a discriminação de prostitutas e o silêncio social, tornam ainda mais difíceis a captura dos criminosos. Tráfico de mulheres ainda é um tema tabu, semelhante à violência doméstica. A afirmação feita por muitos é: “o que acontece no campo privado, a sociedade não deve se meter”.
A coordenadora do Grupo de Pesquisa sobre Violência e Exploração Sexual Comercial (Violes), da Universidade de Brasília, entidade parceira do DED, Maria Lúcia Leal, comenta que, embora tráfico de mulheres, crianças e adolescentes “esteja politicamente agendado pelas organizações mundiais de defesa dos direitos humanos, como um crime contra a humanidade, esta questão não é vista da mesma forma pelo conjunto da sociedade”.
No Prólogo da pesquisa PESTRAF, ela acrescenta: “este tema está imbuído de visões conservadoras, principalmente por se tratar de uma violação relacionada à sexualidade e formas distintas de prostituição, assunto de âmbito privado que, culturalmente, esteve sob uma racionalidade moral-repressiva, objeto de tabu e de discriminação pela sociedade e suas instituições. Tratar publicamente esta temática requer confrontar os diferentes projetos de sexualidade e a sua relação com a violência sexual e os projetos societários.”
Grandes rotas
As regiões mais atingidas pelo tráfico de mulheres, crianças e adolescentes são a Norte e a Nordeste, as mais pobres do Brasil.
Amazônia
A Amazônia apresenta o maior número de rotas de tráfico. O Relatório da Região Norte da pesquisa PESTRAF cita as características geográficas e culturais da Amazônia como fatores que favorecem o processo de tráfico de seres humanos. A história da região e os planos para seu desenvolvimento, através de fronteiras extensas, com sete países vizinhos; seu isolamento geográfico e precária infra-estrutura, sem fiscalização nas fronteiras; e a migração desordenada, entre outros elementos são apresentados como grandes problemas.
Na região, acontece o tráfico interno, internacional (Guiana Francesa, Venezuela, Bolívia e Suriname) e o transcontinental (países mais apontados: Holanda, Alemanha e Espanha). Este último ainda não ratificou o Convênio Europeu contra o Tráfico de Seres Humanos, que entrou em vigor no dia 1º de fevereiro de 2008, assinado por 37 países.
Uma característica particular do tráfico de mulheres na Amazônia é a existência de minas de ouros e projetos de desenvolvimento, áreas onde têm muitos homens trabalhando longe das famílias, o que provoca tráfico com o fim de prostituição.
O “Observatório da Cidadania – Controle Social sobre as Políticas na Amazônia Oriental, 2006/2007”, lançado pelo FAOR (Fórum da Amazônia Oriental), parceiro do DED, contendo 31 relatórios sobre as Políticas Publicas na Amazônia Oriental, traz um capítulo sobre tráfico de mulheres na Amazônia. Os autores vêem a falta de políticas públicas para mulheres como um dos motivos para esse processo: “na Amazônia, a mulher sempre foi percebida em segundo plano. Os programas de desenvolvimento, os investimentos, as políticas socioeconômicas sempre foram direcionadas para o agronegócio e mineração, que procuram trabalhadores masculinos. A presença da mulher e as questões da sua sobrevivência foram consideradas uma conseqüência do trabalho masculino. Nessa lógica, as mulheres migram para dentro da Amazônia atrás dos homens pioneiros, seringueiros, garimpeiros, trabalhadores de construção, marinheiros e caminheiros para ocupar os serviços por eles desejados: trabalhadoras domésticas, prostitutas e/ou para um eventual casamento, muitas vezes através de aliciadores e traficantes. Esse dinamismo fragilizou a posição da mulher na Amazônia e produziu uma cultura permissiva à exploração sexual”, diz um texto do documento
Nordeste
A região do Nordeste fica em segundo lugar no ranking do tráfico de seres humanos no Brasil. Nela, os Estados do Maranhão e de Pernambuco apresentam o maior fluxo de tráfico.
A maioria das mulheres traficadas no Maranhão, segundo a Pestraf, é levada para zonas de garimpos. Em Pernambuco, por outro lado, existe uma grande conexão entre turismo sexual e tráfico. Na verdade, o turismo sexual funciona como uma forma de recrutamento para o tráfico na região Nordeste, além do tráfico para o exterior.
A pesquisa identificou como favorecedores do tráfico nacional e internacional “a presença de aeroportos internacionais, grandes portos, a existência de facilidades para o enraizamento das redes criminosas na vida econômica e social local, a corrupção e a fragilidade das políticas de segurança e justiça nos níveis estadual e municipal.”

Parcerias do DED são exemplos de atuação contra essa realidade
Coletivo Mulher Vida
O Coletivo Mulher Vida, parceiro do DED em Pernambuco dentro da campanha “Coletivo contra tráfico de mulheres”, atua há muitos anos na área metropolitana do Recife com essa temática.
Entre as ações de prevenção a esse tipo de crime, a entidade promove a distribuição de panfletos da Campanha na praia de Boa Viagem, um dos pontos turísticos da cidade, no Aeroporto Internacional de Guararapes e em boates. Isso, sem contar, as várias oficinas, publicações e a mobilização da mídia (rádio, televisão, jornais e rádio comunitária) para a abordagem qualificada sobre esse tema.
Grupo de Pesquisa sobre Violência e Exploração Sexual de Crianças, Adolescentes e Mulheres (Violes)
Mais uma iniciativa que conta com o apoio do DED é a do Grupo de Pesquisa Violes – no projeto “Sistema de Informações sobre tráfico de pessoas e exploração sexual de crianças, adolescentes e mulheres – Banco de Dados”.
O Banco de Dados vai ser acessível pela Internet, provavelmente a partir do segundo semestre deste ano, e tem como objetivo “socializar, democratizar, divulgar e promover o intercâmbio de conhecimentos, informações, metodologias, experiências e estratégias para o enfrentamento do tráfico de pessoas e exploração sexual de crianças, adolescentes e mulheres, visando a conscientização, capacitação e integração dos diversos segmentos que atuam no enfrentamento do fenômeno em nível nacional e internacional.”
Questão de direitos humanos
O tráfico de mulheres, crianças e adolescentes não é um fenômeno isolado, mas o fruto de uma sociedade com desigualdades de gênero, raça, etnia e nacionalidade. Simplesmente denunciar não vai resolver o problema, é o que dizem alguns especialistas.
A Professora Doutora da Universidade de Brasília e coordenadora do Grupo de Pesquisa VIOLES Maria Lúcia Leal, comenta: “o desafio da sociedade civil, do poder público, da mídia, da academia a das agências multilaterais é o fortalecimento da correlação de forças em nível local e global, para interferir nos planos e estratégias dos blocos hegemônicos, a fim de diminuir as disparidades sociais entre países; dar visibilidade ao fenômeno para desmobilizar as redes de crime organizado; e criar instrumentos legais e formas democráticas de regular a ação do mercado global do sexo”.
Para a advogada e professora de Relações Internacionais , Aurenice Nascimento Lima, a sociedade deve denunciar casos de tráfico de mulheres, porque é uma violação aos direitos humanos. “O tráfico de pessoas, independentemente de sexo ou motivação, é crime. Pode-se denunciar à Polícia Federal, que possui delegacias espalhadas em quase todo o Brasil. Quando isso não for possível, é necessário recorrer à delegacia de polícia mais próxima”, explica.
“Não existe paraíso aqui nessa terra, o que existe é a enorme satisfação de nos sentirmos com o poder sobre nós, e a total responsabilidade de decidir o que é melhor ou pior para cada um de nós, reconhecer que é possível ser feliz, só depende unicamente de nós, acreditar e lutar por essa possibilidade.” - Coletivo Mulher Vida
Canais de denúncias
SOS Tortura 0800 707-5551
Disque Sistema Nacional de Denúncia: 0800 99-0500
FIA – Crianças Desaparecidas: (0xx21) 2286 – 8337
Programa “Sentinela”: (0xx61) 315 – 1639
Comitê de Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil:
(0xx61) 347 – 8524
Conselhos Tutelares
Delegacia da Mulher e Delegacias de Policia da Criança e do Adolescente
Programas SOS – Criança
Centros de Defesa
Polícia Rodoviária
Polícia Federal
INTERPOL

Tráfico de mulheres: uma situação inaceitável
Março 2008
Neste 08 de março – Dia Internacional da Mulher – o DED abre espaço para abordar, de forma mais profunda, um tema pautado por seus parceiros, que se apresenta como uma problemática mundial: o tráfico de mulheres. Durante duas semanas, vamos veicular reportagens sobre o assunto, produzidas pela comunicadora Joana Stümpfig, que servem como um alerta para toda a sociedade.
Aspectos econômicos e sociais, visões conservadoras sobre sexualidade, gênero, raça/etnia colocam a mulher em situação de vulnerabilidade e a torna presa fácil para os diferentes mercados do crime, entre eles o tráfico de seres humanos, que se apóiam nessa desigualdade social para faturar alto. Uma situação que demanda o combate a essas desigualdades, por meio de políticas de ação afirmativa e consideração das experiências das mulheres na formulação, implementação, monitoramento e avaliação das políticas públicas.
A PESTRAF (Pesquisa Sobre Trafico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para Fins de Exploração Sexual Comercial no Brasil), realizada pelo Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (CECRIA), entre 2001 e 2002, aponta uma conexão direta entre pobreza e tráfico de mulheres, adolescentes e crianças, cujo fluxo ocorre das zonas rurais para as zonas urbanas e das regiões menos desenvolvidas para as mais desenvolvidas, assim como dos paises periféricos para os centrais.
A palavra tráfico significa comércio ilegal. Logo, o trafico de seres humanos é o transporte e a comercialização de seres humanos com distintos fins, nacional ou internacional. O Secretário-geral do Conselho da Europa para a Luta contra o Tráfico de Seres Humanos, Terry Davis, comentou durante uma entrevista à Agência Lusa: “depois do tráfico de armas e de drogas, o trafico de seres humanos é a terceira atividade criminal mais lucrativa no mundo inteiro”. Ele explica que 80% das vítimas são mulheres e crianças, das quais cerca de 70% são exploradas sexualmente. Outras vítimas são traficadas para exploração laboral, adoções ilegais e transplantes de órgãos.
Segundo o relatório “Uma Aliança Global Contra o Trabalho Forçado”, lançado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), 2,4 milhões de pessoas foram traficadas em 2005, o que gerou um lucro para os criminosos de US$ 31,6 bilhões.
Sem limites - O trafico de mulheres acontece dentro de um universo de globalização e de violência estrutural (Estado e sociedade), física e psicológica, indicadores de uma cultura machista, que se utiliza das novas tecnologias para facilitar a articulação dos traficantes em nível internacional.
No texto da PESTRAF, um comentário esclarece como se estrutura esse tipo de crime: ”o tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para fins de exploração sexual é determinado, por um lado, pelas relações contraditórias entre capital e trabalho e, por outro, pelas relações culturais que sustentam uma ideologia classista e patriarcal, que reduz esses segmentos a um processo histórico de subalternidade e de violação de direitos.”
Ainda favorecem o tráfico questões como lacunas na legislação nacional e internacional, corrupção e falta de controle migratório nas fronteiras. O Brasil tem aproximadamente 16 mil quilômetros de fronteira, que abrangem divisas com 10 países. Muitas vezes, essas fronteiras ficam em áreas remotas e desertas, com pouco ou nenhum controle, o que facilita a circulação dos criminosos e vítimas.
A pesquisa PESTRAF identificou 241 rotas de tráfico para fins de exploração sexual no Brasil, 131 delas internacionais, 78 interestaduais e 32 intermunicipais.
Alguns dados
GEOGRAFIA DAS ROTAS
Região de Origem Interna-cional Interesta-dual Intermu-nicipal Total
Sul 15 09 04 28
Sudeste 28 05 02 35
Centro-Oeste 22 08 03 33
Nordeste 35 20 14 69
Norte 31 36 09 76
Total 131 78 32 241
Fontes: Pesquisa de Mídia – PESTRAF – Banco de Matérias Jornalísticas 2002 / Relatórios Regionais da PESTRAF
POBREZA E DESIGUALDADES REGIONAIS / GEOGRAFIA DAS ROTAS
Regiões Proporção de pobre (%) Rotas de tráfico (nacional e internacional)
Região Norte 43,2 76
Região Nordeste 45,8 69
Região Sudeste 23,0 35
Região Sul 20,1 28
Região Centro-Oeste 24,8 33
Brasil 30,2 241
Fontes: PESTRAF – Banco de Matérias Jornalísticas / 2002; Relatórios Regionais da PESTRAF; Departamento de Policia Federal – DPF - SAIP/CGMAF/DPJ/DPF –MJ - Brasília/DF e IBGE - 1999/2000.
Perfil
Das vítimas
Ø A grande maioria das vitimas de exploração sexual, turismo e trafico é do sexo feminino e negra;
Ø As mulheres e adolescentes em situação de trafico são da classe popular, de baixa renda, com baixa escolaridade, habitam espaços urbanos periféricos com carência de saneamento, transporte etc., moram com algum familiar e têm filhos;
Ø Muitas nunca trabalharam como profissionais do sexo antes de serem traficadas, mas a maioria traz na sua história de vida experiências de violência física e psicológica como estupro, abandono, negligência, maus-tratos, abuso e exploração sexual, muitas vezes intrafamiliar.
Dos aliciadores
Ø A maioria dos aliciadores é do sexo masculino, entre 20 e 56 anos, e brasileiro (de 161 aliciadores identificados na pesquisa, 52 eram estrangeiros, 109 brasileiros)
Ø Os aliciadores brasileiros vêm de todas as classes sociais, alguns pertencem às elites econômicas, são proprietários ou funcionários de boates, e muitos “exercem funções públicas nas cidades de origem ou de destino do tráfico de mulheres, crianças e adolescentes”.
Ø Existem também aliciadoras, muitas vezes vítimas de tráfico que foram forçadas ou convencidas a chamar outras mulheres.
Fontes: Pestraf e Guia de Referência para a Cobertura Jornalística, da Andi
Sonho que vira pesadelo
Num livro do Coletivo Mulher Vida, entidade parceira do DED em Pernambuco, intitulado: “Turismo, Sexual, Tráfico, Imigração - o que nós temos a ver com isso?”, foram entrevistadas mulheres nas praias e boates de Boa Viagem, bairro turístico do Recife (PE). Nos depoimentos, a realidade de quem passa dias e noites no contato direto com o turismo sexual
“Meu sonho maior é conhecer outros mundos, encontrar o meu príncipe encantado (...). Lá na Alemanha, não há miséria, nem sujeira como aqui. Tudo é muito limpo, todo mundo é muito educado. (...) Eu vivo porque sei que um dia tudo isso vai acontecer. Tenho amigas que se deram muito bem lá na Europa. Por que o mesmo não pode acontecer comigo?” Paula
“Já namorei um italiano maravilhoso, carinhoso e lindo, pena que esses europeus só estão de passagem. Queria muito conhecer outro lugar. Nunca viajei e penso que estar na Europa deva ser um sonho. Tudo limpo, muito dinheiro e muita fartura.” Flor
“A única saída para o Brasil é o aeroporto. Por isso eu quero ir embora para a Europa. Lá que é terra para pessoa viver. Tudo mundo vive bem, as ruas são limpas. As pessoas na Alemanha têm muito mais cultura que as mulheres aqui. É um povo muito mais bonito, elegante, educado. Por tudo isso é que eu transo com gringo.” Débora
”Homens de verdade são os estrangeiros. Nunca mais quero um homem brasileiro, eles são muito violentos. (....) Meu maior sonho é casar e sair do Brasil.” Gabriela
“Estou arriscando a minha vida para ser feliz um dia. Não só eu, mas a minha família. (...) O amor de uma menina que arrisca a sua vida só para procurar a felicidade. Que Deus nos ajude.” Carmita
São esses sonhos que fazem de algumas mulheres vítimas fáceis. Os aliciadores têm muitas caras: estrangeiros que prometem um casamento lindo, brasileiros que oferecem um emprego legal, amigas que falam de uma só chance na vida. As redes de exploração muitas vezes escondem-se sob as fachadas de empreses comerciais (legais e ilegais) do ramo do turismo, da moda, do entretenimento, da indústria pornográfica, entre outras.
No entanto, o sonho vira pesadelo logo na chegada. Os donos de boates pagam a viagem, a hospedagem, as drogas. Só que eles querem tudo de volta, e num valor muito maior do que eles realmente gastaram. As mulheres chegam “na terra prometida” com uma dívida enorme e são obrigadas a fazerem programas para sair dessa situação.
As condições reais são muito precárias. As mulheres ficam sem a liberdade de ir e vir, muitas vezes presas em cárceres privados, os passaportes são tomados, elas são ameaçadas e separadas de suas famílias. Num outro país, fica difícil para elas procurar ajuda e denunciar , por causa da sua condição de imigrante ilegal no país de acolhimento e pela falta de conhecimento da língua.
“Conheci um alemão que prometeu me tirar desta vida. Viajei com ele, mas não era nada do que ele tinha me prometido. Tive que trabalhar muito, fazer, inclusive, alguns programas para poder voltar para o Brasil, porque não suportava suas agressões. Ele me violentava demais.” Cláudia
Apesar de todo esse sofrimento, as mulheres que vivenciam esse tipo de violência não são vistas, muitas vezes, como vítimas, e como se não bastasse, também são alvos de muitos preconceitos. Nas próximas matérias dessa série sobre Tráfico de Mulheres, que serão publicadas no dia 17/03, conheça as realidades do Nordeste e Amazônia e quais são os instrumentos de denúncia.


Tráfico de mulheres - Sonho que vira pesadelo
A vulnerabilidade social tem empurrado cada vez mais brasileiras para a rota do tráfico de mulheres com destino a países como o Suriname. Os especialistas afirmam que o problema acontece há mais de 40 anos no Brasil, mas pela primeira vez o perfil dessas mulheres foi traçado através de estudo aprofundado. As informações compõem a Pesquisa Trinacional Sobre o Tráfico de Mulheres do Brasil e da República Dominicana para o Suriname, lançada ontem em Belém. É o resultado de dois anos de pesquisa de campo feito por ONGs dos três países. A parte brasileira do levantamento foi feita a partir dos depoimentos de paraenses vítimas do tráfico. Na pesquisa qualitativa foram ouvidas 23 mulheres, oito famílias e 22 instituições governamentais e não-governamentais. Na última pesquisa quantitativa, de 2004, feita pela fundação Max Linder, em apenas oito das 35 casas de prostituição registradas na época no Suriname, trabalhavam 308 brasileiras e 108 dominicanas. Uma infância sem oportunidades e marcada pela violência está no passado da maioria delas. São mulheres geralmente solteiras, entre 14 e 34 anos, vindas de famílias pobres que vivem em condições precárias. Em casa muitas eram agredidas pelos próprios pais ou sofriam abuso sexual pelos padrastos. A maioria é negra, tem pouco estudo, e possui mais de um filho, fruto de gravidez precoce. “Dívida” prende vítimas aos traficantes Sem perspectivas e para fugir de ambiente de opressão elas abandonam o lar e se tornam presas fáceis para o tráfico. É o momento em que os aliciadores fazem propostas de trabalho no Suriname. Com sonhos de melhorar de vida “acabam deixando o país de origem para enfrentar uma realidade pior do que estavam. Além de estarem ilegais as mulheres ficam sem documento, sem passaporte, com dívidas e trabalham em condições desumanas”, relata Solange Aparecida, do Grupo de Mulheres Brasileiras. Nas casas de prostituição acontece um processo de escravidão por dívida, já que a maioria já chega ao Suriname devendo entre US$ 1.000 a US$1.500. Foi o que aconteceu com uma das vítimas, mostrada em vídeo. A cobrança do aliciador seria para cobrir despesas de passagem e alimentação. “Quando disse que não sabia que seria assim e não tinha dinheiro, ele disse: ‘Então meu amor, você só vai sair daqui quando me pagar’”, contou. Também havia cobranças de “multas” “por descer atrasada para o clube, pagamento de limpeza do quarto”, conta a vítima, que afirma ter sofrido ameaças de morte e ter ficado trancada, sem comida, como forma de punição. O estudo sugere a criação de um fundo oficial para cobrir despesas de retorno das vítimas, criação de um centro de apoio a migrantes do Suriname e garantia de atenção aos filhos das mulheres traficadas. “Um problema que muitos faziam questão de não enxergar”, define Andreza Smith, advogada da Sodireitos, ONG que coordenou a pesquisa. Marta Cardoso ---Publicado no Diário do Pará, 07/05/08.

Operação Madri prende envolvidos com o tráfico de mulheres
04/03/2008
Fonte:
http://www.dpf.gov.br/DCS/noticias/2008/Marco/04032008_operacaomadri.html
Autor:
Delegacia de Polícia Federal em Barra do Garças/MT
BARRA DO GARÇAS/MT - A Delegacia de Polícia Federal em Barra do Garças desencadeou na manhã desta terça-feira, 04, a Operação Madri, que resultou na prisão de seis pessoas envolvidas com o aliciamento e o tráfico internacional de mulheres para fins de prostituição na Espanha. As ordens de prisão e de busca e apreensão foram expedidas pelo Juiz Federal da 3ª Vara de Cuiabá.

A investigação sobre o aliciamento e o tráfico internacional de mulheres iniciou há cerca de 10 meses, a partir de depoimentos de vítimas e parentes de vítimas da organização criminosa prestados na Delegacia de Defesa da Mulher de Barra do Garças e na própria Delegacia de Polícia Federal.

O esquema criminoso, que, segundo a investigação, envolve uma organização internacional, cooptava mulheres na cidade de Barra do Garças e nos municípios vizinhos, com a promessa de que as mesmas ganhariam bastante dinheiro pela realização de $programas" no exterior. As vítimas eram convencidas a se desfazerem de seus bens e a abandonarem suas famílias para se prostituírem na cidade de Madri. Os aliciadores antecipavam os valores necessários à retirada de passaportes, à compra das passagens aéreas e às demais despesas de viagem, como forma de incentivar o aliciamento. A seleção das brasileiras aliciadas contava, inclusive, com um esquema que envolvia o uso da internet, onde as cooptadas postavam fotografias em páginas do $orkut", as quais eram avaliadas por membros da organização criminosa visando à seleção daquelas consideradas mais bonitas.

Na Espanha as brasileiras aliciadas eram submetidas a uma situação de semi-escravidão, pois tinham seus passaportes retidos pelos proprietários de boates, eram obrigadas a se prostituírem para custear sua alimentação e estadia, além de serem coagidas a ressarcirem os custos relativos à viagem. Algumas conseguiram escapar e retornar ao Brasil. Outras sequer chegaram a ingressar na Espanha, tendo sido deportadas. A maioria, no entanto, lá permanece sob o domínio dos donos de boates.

Das seis prisões realizadas, quatro foram realizadas na cidade de Barra do Garças, responsáveis pelo aliciamento e seleção prévia das brasileiras. Uma agente de turismo na cidade de Pontalina (GO), responsável pela emissão das passagens aéreas utilizadas para o transporte das aliciadas, também foi detida.

O sexto preso foi um cidadão de nacionalidade espanhola, tido como o responsável pela escolha das brasileiras e por acompanhá-las do Brasil até os locais de prostituição na Espanha. Ele foi detido dentro de uma aeronave no Aeroporto Internacional de Goiânia, oportunidade em que estava acompanhado de três vítimas do esquema, todas procedentes de Barra do Garças, em um vôo que tinha como destino final a cidade de Madri.

Além das prisões, foram apreendidos diversos documentos que comprovariam a prática do crime, além de outras provas que podem revelar a identidade dos demais integrantes da organização.

As pessoas presas foram autuadas por tráfico internacional de pessoas e formação de quadrilha. Após o interrogatório todos serão encaminhados à Cadeia Pública de Barra do Garças, onde permanecerão à disposição da Justiça Federal.

Por:Delegacia de Polícia Federal em Barra do Garças/MT
Tráfico de Mulheres: uma reflexão inicial
Autor: Elizabeth do Nascimento Mateus
Período: Acadêmica do 9º Período de Direito da Escola Superior Dom Helder Câmara

A discussão do tráfico internacional de mulheres não pode ser realizada fora do âmbito histórico, político-ideológico, social e jurídico que estrutura as relações de poder e gênero nas sociedades contemporâneas. Nesse contexto, a vítima do tráfico são mulheres pobres, negras/afrodescendentes, trabalhadoras de baixa-renda/desempregadas, chefes de família, se encontram em situação degradante e, em geral dos países pobres.

Muitos compromissos foram assumidos pelos Estados nas principais Conferências Internacionais da ONU - especialmente a Conferência Mundial dos Direitos Humanos de Viena (1993); a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento do Cairo (1994) e a Conferência Mundial sobre a Mulher de Beijing (1995), são de fundamental importância para os direitos humanos das mulheres. Foi na Conferência de Viena que, pela primeira vez, se reconheceu expressamente que “os direitos humanos das mulheres e meninas são parte integrante, indivisível e inalienável dos direitos humanos universais e que a violência de gênero é incompatível com a dignidade e o valor da pessoa humana”.

Contudo, as iniciativas públicas dos governos, embora tenham avançado no plano normativo, ainda estão distantes de resolver o tráfico de mulheres. O relatório da OIT publicado em 27 de março de 2007 aponta o Brasil como campeão mundial em tráfico de mulheres e funciona como grande fornecedor de capital humano para alimentar uma crescente demanda, localizada principalmente em países da Europa como Espanha, Holanda, Itália, Suíça, Alemanha e França. E que aqui existem 110 rotas domésticas e 131 internacionais, além de, falta de controle e de informação sobre a extensão do problema.

Dados das Nações Unidas e da Federação Internacional Helsinque de Direitos Humanos, registram que 75 mil brasileiras estariam sendo obrigadas a se prostituir, somente nos países da União Européia representando 15% de todas as "escravas" do continente.

Na perspectiva da relação capital x trabalho, constata-se nos países industrializados uma tendência em utilizar mão-de-obra barata e clandestina como também, a exploração de mulheres e crianças para fins de prostituição e pornografia. Assim o que antes era abordado como "tráfico de escravas brancas" (isto é, mulheres na prostituição) é agora visto como um problema de migração internacional do trabalho e exploração do trabalho, que ficam além do controle ou do alcance do Estado.

BIBLIOGRAFIA
A miséria por trás da fantasia: da pobreza à escravatura sexual. Uma Estratégia Européia Global. Disponível em:
Acesso em: 8 jan. 2008.

BRASIL. SECRETARIA ESPECIAL PARA ASSUNTOS DA MULHER. Disponível em: Acesso em: 8 jan. 2008.

Convenção para a supressão do tráfico de mulheres e crianças (Genebra)
emendada pelo Protocolo de Lake Sucess, assinado em 1947. Disponível em:
Acesso em: 8 jan. 2008.

OIT aponta o Brasil como campeão mundial em tráfico de mulheres. Disponível em:
< http://www.direitos.org.br > Acesso em: 9 jan.2008.
TRÁFICO DE MULHERESO tráfico internacional de mulheres, um comercio ilegal que movimenta mais de US$ 9 bilhões por ano so perde para o tráfico de drogas e armas


As mulheres são convidadas para trabalhar no exterior para mudar de vida. Recebe propostas dos aliciadores maioria mulheres pois facilita o contato, ou propostas amorosas súbitas se for convidada com esse artificios desconfie.
Os maiores importadores de mulheres são; Espanha,Holanda,Venezuela,Noruega,Portugal,Italia e EUA, elas são exportadas pensando que vão trabalhar mas na verdade será presa no país e explorada sexualmente, na maioria das vezes não voltam para sua familia.
Dicas para alerta sobre esse tipo de crime:
Nunca entregue seu passaporte a ninguém, mantenha sempre contato com familiares,informa-se dos telefones da embaixadas ou consulados do seu destino e em caso de emergência no exterior, procure a embaixada ou consulado do Brasil ou autoridades policiais locais.
Se você supeitar de alguém que possa estar comentendo esse crime e aliciando mulheres denuncie: 0800990500 ou a polícia Federal (0xx61) 311 8705 ou 3118270 a sua ligação é muito importante.

Veja abaixo o mais caso de Tráfico Internacioal de mulheres.

Quadrilha aliciava até adolescentes para trabalho com prostituição no exterior

Três apartamentos no bairro de Copacabana, a princípio acima de qualquer suspeita, eram usados para aliciar mulheres e adolescentes para prostituição no exterior. Com a prisão do paulista Iwan Borusewski, de 47 anos, a polícia descobriu que pelo menos 10 meninas, algumas menores de idade, foram enviadas para o exterior. A abordagem das vítimas era feita até pela internet, por meio de chats comuns, acessíveis a qualquer pessoa. Na investida batizada de Operação América, a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) desmontou o esquema internacional.
Dois homens e uma mulher foram presos, acusados de aliciar e enviar para países da Europa, América Latina e para Estados Unidos pelo menos 10 meninas. A abordagem das vítimas - meninas pobres, a maioria da Baixada Fluminense e afastada da família - era feita por Iwan, o Russo.
denúncia da mãe de uma das menores aliciadas deflagrou a investigação, em junho. Desesperada, ela forneceu o telefone de Iwan para que os policiais impedissem que sua filha fosse levada para o México. Com autorização judicial, as ligações telefônicas do aliciador foram monitoradas por três meses.
A aquisição de documento e passaporte ficava a cargo de Paulo Roberto Machado Freire, que dispunha dos recursos financeiros. Dono de uma casa lotérica em Santa Cruz, na Zona Oeste, ele foi preso na manhã de ontem, no mesmo bairro. A única integrante da quadrilha que ainda não foi presa é Jaqueline Viana Nunes Vitório, 18 anos. Garota de programa, ela vive na Alemanha e auxilia na arregimentação das mulheres que seriam encaminhadas para a Europa.

Fonte da notícia da prisão da quadrilha:

http://noticias.cardiol.br
Autor: Vinicius Viana
Nuevo Mundo Mundos
Nuevos
Debates, 2009
.............................................................................................................................................................................................................................................................................................
Anamaria Marcon Venson
Rotas do desejo: tráfico de mulheres
e prostituição como estratégia
migratória no Brasil e na Espanha na
virada dos séculos XX e XXI
.............................................................................................................................................................................................................................................................................................
Avertissement
Le contenu de ce site relève de la législation française sur la propriété intellectuelle et est la propriété exclusive de
l'éditeur.
Les oeuvres figurant sur ce site peuvent être consultées et reproduites sur un support papier ou numérique sous
réserve qu'elles soient strictement réservées à un usage soit personnel, soit scientifique ou pédagogique excluant
toute exploitation commerciale. La reproduction devra obligatoirement mentionner l'éditeur, le nom de la revue,
l'auteur et la référence du document.
Toute autre reproduction est interdite sauf accord préalable de l'éditeur, en dehors des cas prévus par la législation
en vigueur en France.
Revues.org est un portail de revues en sciences humaines et sociales développé par le Cléo, Centre pour l'édition
électronique ouverte (CNRS, EHESS, UP, UAPV).
.............................................................................................................................................................................................................................................................................................
Referencia electrónica
Anamaria Marcon Venson, « Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no
Brasil e na Espanha na virada dos séculos XX e XXI », Nuevo Mundo Mundos Nuevos [En línea], Debates, 2009,
Puesto en línea el 03 febrero 2009. URL : http://nuevomundo.revues.org/52653
DOI : en cours d'attribution
Éditeur : EHESS
http://nuevomundo.revues.org
http://www.revues.org
Document accessible en ligne sur :
http://nuevomundo.revues.org/52653
Document généré automatiquement le 30 octubre 2010.
© Todos los derechos reservados
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 2
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
Anamaria Marcon Venson
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e
prostituição como estratégia migratória no
Brasil e na Espanha na virada dos séculos
XX e XXI
“Se a Polícia Federal colocar isso na mídia,
aí tem que dizer que foi enganada...
foi levada daqui pra lá, que não sabia!”
[Assim falou S., 34 anos, brasileira,
profissão striper e garota de programa1.]
1 Este artigo se insere em certa perspectiva feminista que entende prostituição como um espaço
de agência no qual se faz um uso ativo da ordem sexual existente2. Quando falo de agência,
refiro-me à autonomia, refiro-me ao poder do sujeito no exercício de constituir a si mesmo,
de controlar suas próprias atividades e ser responsável por aquilo que faz.
2 Quando pensava em tráfico de mulheres, associava imagens de mulheres seqüestradas e
presas em casas de prostituição. Atormentada por essa idéia de violação grosseira de direitos
humanos, e sem lembrar ao certo como eu a tinha concebido, decidi saber mais sobre tráfico
de mulheres para exploração sexual. Chamou-me a atenção o fato de que tráfico de mulheres
e tráfico de pessoas emergiram como discurso e como preocupação histórica em tempos
bem recentes. Na virada dos séculos XX e XXI, uma explosão de tratados internacionais,
programas de cooperação entre países, relatórios oficiais, ONGs, pesquisas acadêmicas,
notícias jornalísticas e outras produções discursivas trataram de constituir o tráfico de pessoas
como um problema.
3 Em outro trabalho3, submeti à análise, em abordagem comparativa, textos publicados na Folha
de São Paulo, jornal produzido no Brasil, e textos publicados no El País, jornal espanhol
de maior difusão, recortando notícias publicadas entre 1997 e 2007, momento em que as
referências ao tráfico ganharam regularidade no discurso midiático. Elegi um jornal produzido
na Espanha ao saber dos resultados da PESTRAF (2003), Pesquisa sobre tráfico de mulheres,
crianças e adolescentes para fins de exploração sexual comercial no Brasil4, primeiro relatório
que mapeou as principais rotas de tráfico no país. Este extenso relatório apontou que a maior
parte das brasileiras “aliciadas” para o comércio de sexo seriam mulheres e adultas, e que o
principal destino internacional das rotas de tráfico seria a Espanha.
4 Em âmbito supranacional, o conceito mais recente de tráfico de pessoas foi elaborado
na Convenção de Palermo, assinada em Assembléia Geral da ONU em 2000, vigorando
internacionalmente desde 20035. Essa Convenção, movida por preocupações com o crime
organizado internacional, deliberou três tratados sobre técnicas de prevenção, controle e
combate ao tráfico de pessoas, ao contrabando de migrantes e à produção ilícita e tráfico
de armas de fogo. Esse conjunto normativo, conhecido como “Protocolo de Palermo”, foi
acolhido, em diferentes datas e de parte em parte, tanto pelo Brasil quanto pela Espanha.
Conforme o Protocolo Adicional para Prevenir e Punir o Tráfico de Pessoas, especialmente
de Mulheres e Crianças, tráfico é atividade com fins de exploração que pode incluir
recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento de pessoas, sob ameaça
ou sob uso de força ou coação, rapto, fraude, abuso de autoridade, abuso de situação de
vulnerabilidade, por meio de entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter
o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra. Por exploração, está
textualmente entendido “exploração da prostituição ou outras formas de exploração sexual, os
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 3
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
trabalhos ou serviços forçados, escravaturas ou práticas similares à escravatura, a servidão ou
remoção de órgãos”. Segundo esse conjunto normativo, o contrabando de migrantes, definido
no Protocolo Adicional contra o Contrabando de Pessoas por Terra, Mar e Ar, é uma prática
distinta do tráfico e diz respeito ao cruzamento de fronteiras nacionais sem permissão estatal
com a ajuda de “atravessadores” que cobram pelo serviço6. “Traficantes” e “atravessadores”
são penalizados no Protocolo, ao passo que pessoas “traficadas” e pessoas que atravessam
fronteiras nacionais sem documentação autorizada são consideradas vítimas. Mas isso não
impede que elas sejam deportadas, que sofram abusos e humilhações, mesmo por parte da
polícia ou de funcionários estatais.
5 Neste artigo, estou desdobrando meu projeto inicial sobre discursos de mídia em uma
outra pesquisa cuja fonte são depoimentos orais, individuais, pois entendo que este embate
discursivo me permite uma leitura historiográfica mais abrangente da questão. A PESTRAF
(2003), além de mapear as principais rotas de tráfico no Brasil, inclui trechos de depoimentos
de mulheres implicadas e de seus familiares. Selecionei aqueles que narram viagens à Espanha
para pensar o que estava sendo entendido como “casos de tráfico” naquela data.
6 Para contar uma história dessas narrativas, escolhi utilizar o arsenal teórico foucaultiano, que
sugere a desconstrução dos discursos que deram visibilidade e que tornaram dizível certa
prática. Em tal metodologia aplicada à pesquisa histórica, discurso tem um sentido técnico
particular. Não significa o que é dito7. Discurso, aqui, é entendido como prática, pois é a
prática que determina os objetos, e não o contrário; e só existe o que é determinado, afinal, as
coisas não existem fora das práticas8 . Por este ângulo, tráfico de mulheres, mercado sexual
e prostituição são práticas datadas e dimensionadas por relações de poder. Estou entendendo
relações de poder como aparecem em Foucault: instáveis e possíveis de reversibilidade,
disputas, embates, jogos estratégicos pelos quais indivíduos livres procuram se conduzir e
determinar a conduta dos outros9.
7 Para pensar como os sujeitos escapam como produto e efeito dessas formulações discursivas
e perceber dentro de quais jogos e disputas estão dimensionadas essas relações de poder, o
gênero será operacionalizado como categoria de análise central, entendido naquela definição,
já bastante citada, proposta pela afamada historiadora Joan Scott10. Joana Maria Pedro explica
que a categoria gênero não é estável e fixa11. A noção de Scott de que gênero é o que constitui
as “relações sociais fundadas sobre diferenças percebidas entre os sexos” pode sugerir que há
um corpo a priori que é percebido e que significa as relações de poder. Entendo – apropriandome
de Judith Butler12, Thomas Laqueur13, Anne Fausto-Sterling14, Linda Nicholson15 - que tudo
que se produz sobre o corpo e o sexo já contém em si uma reivindicação sobre gênero. Ainda
assim, a definição de Joan Scott continua muito útil para pensar o gênero não só nas relações
entre mulheres e homens e nas articulações sobre sexualidade, mas também para compreender
a dinâmica social e política. Não é simplesmente porque estou falando de mulheres que a
categoria gênero será operacionalizada, mas porque estou falando de um discurso generificado
que produz sujeitos.
8 Apesar de não contarmos com estatísticas confiáveis, fala-se, com freqüência, que as mulheres,
ao lado de crianças, são as pessoas mais afetadas pelo tráfico, ao passo que se fala que nos
processos de movimento clandestino/ contrabando de pessoas são os homens a maioria dos
implicados. Essas referências são efeito e reforço de um modelo de gênero muito problemático,
em que se imagina que homens são mais capazes de decidir migrar voluntariamente, enquanto
mulheres são construídas como vítimas passivas16. O próprio Protocolo de Palermo, datado e
carregado de historicidade, coloca mulheres ao lado de crianças como pessoas que precisam
de proteção especial, oficializando certa idéia de vulnerabilidade feminina. Esse entendimento
tem sérias implicações práticas, pois, ao mesmo tempo que mulheres são infantilizadas,
violências contra migrantes homens são apagadas e mesmo negadas. Por certo que esse
modo de conceber as mulheres é estrategicamente utilizado tanto pelos governos para
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 4
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
justificar políticas de controle, quanto pelas organizações de combate ao tráfico para arrecadar
financiamento, quanto pelos traficantes e mesmo pelas mulheres que se envolvem nessa
atividade, que jogam o jogo da vítima quando julgam conveniente.
9 É também de Joan Scott que empresto o significado do conceito de experiência para o estudo
da História17. Para ela, experiência já é uma interpretação e precisa de interpretação, e o que
se conta como experiência não é nem auto-evidente, nem definido, mas sempre contestável
e político. E, ainda a partir de Scott, compreendo que ao analisar a memória da experiência,
não há como encontrar uma narrativa sobre a sociedade, o público, o político; e outra, sobre
o indivíduo, o privado, o psicológico; porque a experiência se dá no imbricamento de todos
esses âmbitos, e é na experiência que se constituem os sujeitos.
10 As preocupações deste trabalho percebem o presente também como história. No século
XIX, a prostituição foi incorporada aos objetos de saber da comunidade médica. Nessa
época, marcada por teorias eugenistas e evolucionistas, constituiu-se uma ciência sexual e
a prostituição foi considerada uma ameaça ao corpo, à família, ao casamento, ao trabalho,
à propriedade, foi entendida como “doença” e tornou-se alvo de planos de profilaxia18. As
prostitutas eram perseguidas por serem consideradas empecilhos à civilização, à “limpeza
moral” da cidade, e, por isso, sua circulação deveria ser controlada e suas casas deveriam
ser afastadas para espaços confinados definidos por reformas urbanas19. E, naquela época,
já se falava de prostituição através de fronteiras nacionais20. É possível estabelecer relações
entre a intensa preocupação pela problemática do mercado do sexo transnacional nas viradas
dos séculos XIX-XX e XX-XXI, dois momentos marcados pela inquietação em relação à
migração. No entanto, é preciso ficar claro que não se trata do mesmo fenômeno, como se a
história se fizesse em ciclos, mas de acontecimentos distintos, tramados por diferentes relações
de poder, não obstante se possa elaborar comparações. Assim como as prostitutas foram alvos
exemplares de políticas públicas voltadas para a disciplinarização das camadas populares no
século XIX e inícios do século XX, migrantes hoje funcionam como o outro nas cidades
globais. E a situação se complica quando elas se envolvem em atividades sexuais comerciais,
pois essas práticas são ainda socialmente associadas a práticas delitivas, mesmo em lugares
em que prostituição não é penalizada21.
11 Laura Augustín mostrou, em 2005, como o uso de categorias como prostituição, turismo sexual
e tráfico, tanto por parte do governo, quanto por parte de projetos sociais e acadêmicos, apaga a
diversidade dessas situações e as motivações de migrantes, especialmente daquelas que vivem
do comércio sexual, reproduzindo discursos estigmatizantes e controladores22. Kempadoo
referenciou, em 2005, pesquisas realizadas por organizações não-governamentais contra o
tráfico que mostram que além da prisão, detenção e deportação, as pessoas “traficadas” são
em geral devolvidas aos seus países de origem como migrantes sem documentos, e têm que
enfrentar a vergonha e a humilhação que acompanha tal status de “deportadas”, além do medo
de represálias dos traficantes ou do estigma de mulher envolvida em atividades sexuais tidas
como criminosas23. Resultados de pesquisa de campo realizada nos anos 2004 e 2005 por
Adriana Piscitelli mostraram que brasileiras consideradas “traficadas” são de fato expulsas da
Espanha e não necessariamente protegidas, bem como o tratamento dado a casos considerados
de tráfico se assemelha a medidas contra a migração irregular24. Ausserer fez uma análise da
lógica discursiva sobre tráfico internacional de seres humanos como uma forma de imigração
forçada, mostrando como, no âmbito das relações internacionais, migrantes são moldados
como perigo, ao invés de em perigo25. Anderson propõe, em 2007, que ao invés de somente
nos preocuparmos em salvar vítimas e prender traficantes, deveríamos nos dedicar a apontar
questões de controle da imigração que encorajam racismos e exacerbam nacionalismos, que
são, para ela, causas reais de condições desumanas de trabalho e injustiças26.
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 5
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
12 Sempre em jogo com as expectativas dos leitores, os discursos midiáticos que deram
visibilidade ao tráfico de mulheres na última década irradiaram-se em torno do jogo
dicotômico vítima-débil/puta-infratora27.É difícil colocar em discurso a responsabilidade de
pessoas implicadas em prostituição e em tráfico sem cair naquela armadilha dicotômica,
tão arraigada na cultura. No entanto, pesquisas sobre comércio sexual em tempos recentes
têm mostrado mulheres envolvidas neste mercado como sujeitos atuantes, auto-determinados,
capazes de negociar, concordar ou opor-se e transformar relações de poder. Martha Nussbaum
argumentava, em 1999, que os problemas em geral associados à prostituição são também
componentes de outros tipos de trabalho e práticas sociais, e que, portanto, não são
problemas inerentes ao trabalho sexual, mas que dependem das condições de trabalho28.
Kamala Kempadoo e Jo Doezema organizaram uma coletânea de trabalhos, publicada em
1998, sugerindo que ao invés de conceituar prostituição como objetificação e degradação
das mulheres, entenda-se prostituição como um tipo de trabalho que é freqüentemente
oferecido por pessoas marginalizadas29. Outras pesquisas apontam como a prostituição é usada
também pelas elites sociais em países pobres para promover o turismo e atrair investimento
estrangeiro30. Mas parece que a maior parte das pesquisas tem enfatizado a agência feminina
nas atividades no mercado sexual e em contextos de migração31.
13 A partir dos apontamentos dessas pesquisas, rejeito a noção de que trabalhadoras do sexo em
processos migratórios sejam apenas submissas e passivas, pois reconheço sua subjetividade e
agência pessoal, e estou entendendo esses sujeitos como pessoas capazes de fazer escolhas e
tomar decisões que levam a transformações conscientes que mudam suas vidas.
14 Muitas pesquisas sobre tráfico de pessoas têm sido conduzidas nos últimos anos. O tráfico
de mulheres se redefine constantemente a partir de diferentes discursos, datados e carregados
de historicidade, que lhe atribuem determinadas características, investe seus atores de
atributos morais, explicam-no através de referências sociais e culturais, apontam causas
e conseqüências. Minha intenção é analisar os mecanismos de poder/saber presentes nas
narrativas de mulheres implicadas em tráfico para mostrar, sem deixar de reconhecer exclusões
e violências, que há um espaço de agência, um espaço de poder do sujeito no exercício de
constituir a si mesmo, de controlar suas atividades e de ser responsável por aquilo que faz.
15 O primeiro caso que escolhi foi o de Simone, que morreu aos 25 anos, na Espanha, em 1996.
Era natural da região norte de Goiânia, escolaridade “não identificada”, “profissão balconista”,
cujas “condições socioeconômicas” foram assim descritas: “morava com a família composta
por cinco pessoas e sustentada pelo salário de R$ 128,00 do pai.” O trabalho sexual aparece
no discurso como a última oportunidade daquelas pessoas que querem e precisam escapar da
miséria econômica: é como se elas sempre o fizessem coagidas, ou forçadas, obrigadas, por
alguém ou por seu próprio infortúnio econômico. O pai de Simone disse que “[duas irmãs que
trabalhavam como prostitutas na Espanha] convidaram a Simone e a levaram para a Espanha,
prometendo que ela iria trabalhar como garçonete”32. Uma dessas irmãs, Eleuza, 23 anos, disse
o seguinte:
“quando cheguei em Goiânia toda vizinhança sabia em que eu estava trabalhando e o papo que
corria é que eu estava ganhando muito dinheiro. Imediatamente, todas as nossas amigas, inclusive
a Simone, foram lá pra casa. Queriam explicações de como fazer para virem também para a
Espanha”33.
16 A outra Irmã, Elicia, 31 anos, costureira foi a profissão apontada, assim falou: “todas nós
vamos pra lá pensando que vamos ganhar muito dinheiro. Dá pra ganhar, mas não é tanto
assim. Todas nós sabíamos que estávamos indo para nos prostituir. Elas sabiam, assim como
todas as famílias” 34. A mãe de Simone depõe também: “[Simone] sempre foi muito respeitosa!
Não teve coragem de falar abertamente que estava sendo obrigada a se prostituir, mas nós
sabemos que foi isso, e também que ela viajou enganada.” O caso de Simone é um caso
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 6
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
extremo, de morte, e, portanto, caso de polícia. As causas da morte de Simone num hospital
de Bilbao, Espanha, não foram esclarecidas pela Polícia Federal; mas a PESTRAF pensou
algumas possibilidades como uso excessivo de droga, ou negligência médica, ou doença nãoidentificada.
Jane, brasileira de 31 anos que trabalhava com Simone em Bilbao, e que a
acompanhou em uma das idas ao hospital, disse: “uma enfermeira chegou a me dizer que eu
era especialista em prostituição e que da doente ela sabia cuidar” 35. A PESTRAF colocou
que a morte de Simone gerou um alerta sanitário em Bilbao, amplamente divulgado pelos
jornais locais, e “a vigilância sanitária solicitou da justiça a retenção no país de possíveis
infectados por tuberculose, que seriam prostitutas e clientes do clube César Palace [no qual
Simone trabalhava]”36.
17 É notável como se articulam no discurso associações entre prostituição, doença e
culpabilidade, e como esse discurso se faz subordinado aos imperativos de uma moral: a honra.
Esse caso foi citado na PESTRAF como um caso de tráfico de pessoas. A Polícia Federal foi
requisitada para resolver um caso de tráfico e também a família de Simone opera o discurso
em torno da idéia de tráfico e trabalho forçado, entrando no jogo da vitimização para reclamar
à polícia e ao governo as causas da morte de Simone. No entanto, o clube é conhecido, sabe-se
o endereço, sabe-se quem trabalha lá, sabe-se o que se faz lá. Letícia, 22 anos, que trabalhou
com Simone em Bilbao, disse que “ninguém viaja enganado” e que “as mal sucedidas seriam
as meninas que adoecem, se arrependem ou caem na ilegalidade. [...] Para aquelas que querem
continuar trabalhando, o clube paga um advogado”37.
18 O cônsul do Brasil na Espanha, cujo nome não foi identificado pela PESTRAF, não apontou
irregularidades nas condições de trabalho das brasileiras nos clubes espanhóis, nem encontrou
indícios de que elas ficassem presas nos clubes38. As dúvidas que gostaria de opor à idéia de
vitimização corrente nos discursos em análise não objetivam apagar as violências no curso
dessa atividade, mas recolocá-la numa certa economia de discursos: as narrativas são sempre
estratégicas.
19 O segundo caso que proponho para análise é o de M.S., 31 anos, natural de Natal, Rio
Grande do Norte, escolaridade “ensino fundamental”, profissão assim descrita; “nos meses que
antecederam o embarque para Espanha, tinha trabalhado como faxineira em casa de família
e em outros serviços”. E “condições socioeconômicas: quando do aliciamento, precárias”.
Aparece novamente a preocupação em justificar o envolvimento dessas mulheres no mercado
sexual por sua vulnerabilidade socioeconômica. No caso de M.S., são citados também
problemas familiares e problemas com sua sexualidade na adolescência, colocando a questão
numa ordem de vítimas e vilões. M.S. conta que foi abordada por um taxista, que a convidou
pra viajar pra Espanha para trabalhar como acompanhante:
“o taxista disse que eu ia trabalhar em clube e ia ganhar muito bem, e não explicou nada mais... Eu
sabia que era prostituição... Não sabia das condições desse trabalho! Quando eu entrei no avião,
eu pensei: eu estou indo, mas não sei se volto!”39.
20 Não pretendo negar que aconteçam violências extremas no exercício dessas atividades, mas
refletir sobre a vitimização como elemento fundamental e constituinte a partir do qual se
poderia escrever uma história do tráfico de mulheres. M.S. fala, ainda, de uma rede de serviços
em torno da venda se sexo: o taxista, a pessoa encarregada de controlar o tempo do programa,
uma outra para fazer a comida, uma para levar ao hospital, outra que levava em lojas de roupas,
um gerente, etc; rede de serviços que poderia ser chamada de máfia.
21 Os casos que estou analisando trazem à cena relações de poder, que são relações negociadas.
M.S. conta que ficou “nervosa” e “com medo” quando chegou na Espanha e foi informada
de que teria que pagar a passagem. Sem saber que estava com a passagem de volta na mão,
pois os bilhetes são sempre emitidos em dupla via, ela conta que se submeteu a trabalhar nas
condições que ofereceram a ela: muitas horas de trabalho diárias e preço pré-estabelecido. Seu
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 7
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
“desespero” foi ter que pagar a passagem, pois “não queria ter problemas com essa gente”40. É
importante notar que não foi o trabalho em si que foi problematizado por ela, mas as condições
de trabalho.
22 Na Espanha, prostituição não é regulamentada, o que faz com essas mulheres, e também
homens, em especial aquelas imigrantes que não têm permissão de trabalho, desenvolvam suas
atividades na informalidade, muitas vezes, tendo que se submeter a condições muito injustas
de trabalho. M.S. diz que voltou ao Brasil e que, quando contou para as amigas sobre sua
situação na Espanha, todas quiseram viajar para lá:
“eu mandei umas amigas, só que eu não sabia que isso era tráfico, que era um delito. Eu não
sabia. Eu viajei para Bilbao e, quando eu ligo pra (minha) mãe... ela diz que a mãe de uma das
meninas tinha ido lá em casa e disse... que eu estava traficando mulheres. Eu fiquei louca! [...]
Falei com a mãe da menina: ‘também, sua filha veio com a roupa curta! Quando chegou em Paris,
a polícia mandou ela de volta!’ Nessa história, a mãe da menina já queria tirar dinheiro de mim!
Disse que ia me denunciar. [...] Eles [?] disseram: ‘não se preocupe. Se você tiver problemas, nós
resolvemos’. [...] Eles já tinham confiança em mim... disseram que se as coisas ficassem difícil
pra mim, colocavam um advogado”41.
23 Fiquei a imaginar em qual categoria M.S. seria entendida pela polícia. Afinal, ela é traficante
ou é vítima? Esse caso mostra como essas categorias são insuficientes para explicar a
complexidade das relações de poder no mercado do sexo. M.S. embaraça a lei. E esse caso de
“tráfico”, confunde-se com uma rede organizada de imigração ilegal.
24 O terceiro caso é o de S., 34 anos, que mora no Rio de Janeiro, profissão “striper e garota
de programa”, condição socioeconômica “não especificada”, trabalhou no mercado sexual em
vários países, incluindo Espanha, faz trabalho voluntário em uma ONG. Ela disse assim:
“já fiz de tudo um pouco. [...] Na prostituição [...] eu páro, volto, páro, volto... [...] Nunca gostei
de trabalhar com carteira assinada! [...] Eu pago minha autonomia... [...] às vezes, deixo de ganhar
dinheiro para ir ao teatro, para ir ao cinema... [...] ir à praia, ficar com as minhas filhas. Eu curto
a vida familiar. Adoro ficar em casa, lendo um bom livro”42.
25 O discurso de S. contrasta aqueles discursos que tecem uma rede de causalidade simplista
para explicar o trabalho sexual – ou a vitimização pela pobreza ou a coação pelos traficantes/
agenciadores. Sua fala me ajuda a pensar relações causais múltiplas para esse fenômeno. Ela
diz que “sabia exatamente o que estava indo fazer [...] prostituição, que eu também faço aqui”
e explica que as condições colocadas pelos agenciadores da viagem são justas porque:
“para assinar contrato, tem que estar com a passagem na mão, para poder marcar a data. E para
você pagar do seu bolso, você tem? [...] Ele cobra a mais, muito mais do que ele gasta realmente.
[...] Mas eu também não tenho pra ir sozinha. Fazia cinco refeições diárias, tinha toda liberdade
pra passear, fazer o que quisesse, desde que, na hora combinada, estivesse de volta. [...] Violência,
(já sofri) duas vezes aqui no Brasil. Lá fora, nunca! E nem me senti explorada! Tem um contrato...
Se você não cumpre a sua parte, não pode exigir que a outra cumpra a parte dela”43.
26 S. problematiza a questão associando noções de escolha, contrato, agência pessoal. Estou
tentando mostrar nessa pesquisa como, muitas vezes, discursos sobre tráfico de mulheres e
prostituição se misturam, apontando uma complexidade de relações. Ela conta, ainda, que:
“Muitas idiotas, que pagam pelo casamento [...] o cara passa a cafetizá-la! Porque não é os donos
do estabelecimento que fazem o tráfico! Não é eles que exploram a mulher! [...] é quando a idiota
quer ficar no país e casa com um cliente! [e conta o caso de uma mulher que foi enterrada no
quintal pelo marido] Não são os agenciadores que fazem esse tipo de coisa! Pelo menos, eu nunca
vi! Para fins sexuais, eu não acredito no tráfico, exceto o de crianças e adolescentes. O máximo
que existe de tráfico é por causa de órgãos. [...] Pra mulher, não existe a questão do envolvimento
ou do aliciamento. A não ser para pessoas muito bitoladas, lá do fim do mundo! Mas aqui nas
metrópoles, sinceramente, não. Eu lido com a noite. [...] Será que a mulher é tão idiota? Ou é o
famoso estereótipo da... loira burra? [...] Eu acho que quando ela vai contar a história, ela conta
a versão que ela foi instruída a contar. [...] Na hora que ela quer ajuda do consulado, na hora de
voltar, ela tem que contar a versão que o nosso governo quer! Nem sempre pode falar a verdade!
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 8
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
[...] Aí as pessoas dizem; ‘é uma máfia!’ Mas onde não existe máfia? Se você não sabe, no Brasil
tem máfia até pra banca de jornal! Você não pode simplesmente mandar fabricar uma banca e
dizer que você vai ser distribuidora de tais e tais revistas! Existe uma máfia! Onde não existe
máfia? [...] Primeiro, eu não vou buscar uma menininha dentro da casa dela! [...] Quando chamam
a gente pra trabalhar no exterior, chamam de outras boates! [...] Mas pode até existir tráfico de
crianças lá para aqueles cantos! Lá no meio do mato, na Amazônia, em Rondônia! Lá elas são
totalmente despreparadas para a vida! Aqui, nas metrópoles, não tem isso!”44.
27 O caso de S. não foi um caso de polícia, nem foi anunciado em manchetes de jornal. Ela não
joga o jogo da vítima, e é difícil identificar que tipo de serviço ela oferece no mercado – se é
“agenciadora” ou se é contratada - mostrando que há variedade e complexidade no universo
do comércio sexual.
28 O último caso que escolhi para análise é o de Sukie, 25 anos, profissão “freqüentadora
das boates do Centro de Manaus”, “não há informação” sobre sua escolaridade, “condições
socioeconômicas: a mãe vende churrasquinho para sustentar os filhos”. De acordo com
informações da Polícia Federal citadas pela PESTRAF, Sukie foi levada para a Galícia, na
Espanha, pensando que iria trabalhar na área de turismo, mas, quando chegou lá, foi informada
que trabalharia em “programas ou como acompanhante de homens com dinheiro [...] se não
trabalhasse não comia” 45. O depoimento de Sukie diz assim: “(eu me) sentia muito baixa...
humilhada, porque a vida de mulher de programa é muito humilhante, mesmo! Tinha homens
que, por exemplo, não gostavam muito das brasileiras. Eles pegavam elas para fazer maldade”
46. O desfecho do “caso Sukie” é dramático. Segundo a PESTRAF, ela fugiu com uma amiga
para Portugal e continuou a trabalhar em casas noturnas, até que a Polícia Federal organizou a
operação “Pérola Negra”, prendendo as garotas de programa, sobretudo aquelas que estavam
sem documentação. Ela foi mandada para o Rio de Janeiro, e somente voltou para sua casa,
em Manaus, porque um certo português pagou sua passagem47. E Sukie, que de acordo com a
polícia foi coagida a trabalhar com prostituição, foi presa e voltou obrigada para casa.
29 A confissão é para sujeitar, no dizer de Foucault48. Sukie começou como vítima, terminou
como criminosa. A “traficada” foi tratada como criminosa: foi deportada. Não só é criminosa
na ordem religiosa, moral, da família, mas também na ordem da lei. Parece embaraçar a
lei. Vejo, aqui, que o discurso de vitimização que constitui essas mulheres e que é, muitas
vezes, reinventado por elas mesmas, acaba sendo cúmplice daquilo que pretende denunciar:
a intenção era resgatá-las de certa situação na qual estariam sendo coagidas, mas o efeito
parece ter sido contrário, mostrando que esse tipo de discurso parece não ajudar em situação
alguma. Em nome de um certo “humanismo”, de certa urgência humanitária de salvar as
“pobres mulheres oprimidas” no mercado do sexo, o discurso vitimista justifica outros tipos
de opressão e violência, como nos casos de deportação, por exemplo. Por certo que há casos
de tráfico que se fazem através de coação ou força, e que estas relações de poder muitas vezes
se constituam através de violência. Mas a questão, nesse artigo, não é essa. O propósito, aqui,
é mostrar a diversidade e a complexidade desse universo. A questão é reconhecer a agência,
o desejo, o cinismo estratégico dessas mulheres.
Bibliografía
Anderson, B., “Motherhood, apple pie and slavery. Reflections on trafficking debates”, Oxford, Centre
on Migration, Policy and Society, 2007, Sem página, http://www.compas.ox.ac.uk/, acessado em
novembro de 2007.
Anderson, B., O’Connell Davidson, J., Trafficking. A demand led a problem?A Multi-Country Pilot
Study, Save the children, Stockolm, 2002.
Agustín, L., “La industria del sexo, los migrantes y la família europea”, Cadernos Pagu nº 25, julhodezembro
de 2005.
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 9
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
Ausserer, C., Controle em nome da proteção. Análise crítica dos discursos sobre tráfico internacional
de pessoas, Dissertação (mestrado em relações internacionais), Rio de Janerio, PUC, 2007.
Blanchette, T., Silva, A. P. da, “Nossa Senhora da Help: Sexo, turismo e deslocamento transnacional em
Copacabana”, Cadernos Pagu, nº 25, Campinas jul/dez 2005.
Butler, J., Gender Trouble. Feminism and the subversion of identity, Nova Iorque e Londres, Routledge,
1990.
Davida, “Prostitutas, “traficadas” e pânicos morais: uma análise da produção de fatos em pesquisas sobre
o “tráfico de seres humanos”, Cadernos Pagu nº 25, Campinas-SP, Núcleo de Estudos de Gênero Pagu,
Unicamp, 2005.
Engel, M., Meretrizes e doutores, São Paulo, Editora Brasiliense, 1989.
Fausto-Sterling, A., “Dualismos em duelo”, Cadernos Pagu: desafios da eqüidade, v. 17/18, Campinas,
UNICAMP, 2001/2.
Flores, M. Ramos, B., “A medicalização do sexo ou o amor perfeito”, Revista de Ciências Humanas.
Florianópolis, UFSC, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, nº29, 2001.
Foucault, M., A ordem do discurso, São Paulo, Loyola, 1996.
, História da Sexualidade 1. A vontade de saber, Rio de Janeiro, Edições Graal, 1988.
, Sexo, poder e indivíduoEntrevistas selecionadas, Trad. Jason de Lima & Davi de Souza-
Desterro, Edições Nefelibata, 2003.
Juliano, D., Excluidas y marginales, Universitat de València, Instituto de la mujer, 2006.
Kempadoo, K., Doezema, J. (Orgs.), Global Sex Workers. Rights, Resistance, and Redefinition, New
York & London, Routledge, 1998.
Kempadoo, K., “Mudando o debate sobre o tráfico de mulheres (Shifting the debate on the traffic of
women)”, Cadernos Pag, nº 25, Campinas jul/dez 2005.
Kushnir, B., Baile de máscaras: Mulheres judias e prostituição. As polacas e suas associações de ajuda
mútua, Rio de Janeiro, E. Imago, 1996.
Laqueur, T., Inventando o sexo. Corpo e gênero dos gregos a Freud, Rio de Janeiro, Relume Dumará,
2001.
Leal, M. L., Leal, M. de F. (Coords.), Pesquisa sobre tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para
fins de exploração sexual comercial no Brasil, PESTRAF, Relatório Nacional Brasil, Brasília, CECRIA,
2003.
Marcon Venson, A. M., Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória
no El País e na Folha de São Paulo (1997-2007), Dissertação de mestrado, Universidade Federal de
Santa Catarina / UFSC, fevereiro de 2009.
Menezes, L. M. de, Os estrangeiros e o comércio do prazer nas ruas do Rio(1890-1930), Rio de Janeiro,
Arquivo Nacional, 1992.
Nicholson, L., “Interpretando o gênero”, Estudos Feministas, Florianópolis, CFH/CCE/UFSC, Vol.8,
nº2, 2000.
Nussbaum, M., “Whether for reason or prejudice: Taking money for bodily services”, Spector, Jessica
(Org), Prostitution and pornography. Philosophical Debate about the Sex Industry, Stanford, Stanford
University Press, 2006.
O’Connell Davidson, J., Prostitution, Power and Freedom, Michigam, Michigan, 1998.
Pedro, J. M., “Traduzindo o debate: o uso da categoria gênero na pesquisa histórica”, História, São
Paulo, Vol.24, nº1, 2005.
, Mulheres honestas, mulheres faladas:Uma questão de classe, Florianópolis, Ed. da
UFSC, 1994.
Pereira, I., “As decaídas”: prostituição em Florianópolis (1890-1940), Florianópolis, Ed. da UFSC,
2004.
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 10
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
Piscitelli, A.,“Brasileiras na indústria transnacional do sexo. Migrações, direitos humanos
e antropologia”, Nuevo Mundo Mundos Nuevos, N°7, Sección Debates, 2007, http://
nuevomundo.revues.org
Prins, B., Meijer, I. C., “Como os corpos se tornam matéria: entrevista com Judith Butler”, Estudos
Feministas, Florianópolis, CFH/CCE/UFSC, Vol.10, nº 1, 2002.
Rago, M., Do cabaré ao lar. A utopia da cidade disciplinar, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985.
, Os prazeres da noite.Prostituição e códigos da sexualidade feminina em São Paulo (1890-1930),
Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991.
Scott, J., “Gênero: Uma categoria útil de análise histórica”, Educação e realidade, Porto Alegre, 16 (2),
5-22, jul/dez. 1990.
, “Experiência”, en Silva, A. Leite da, Lago, M. C. de S., Ramos, T.R.O. (Orgs), Falas de gênero:
teorias, análises e leituras, Florianópolis, Mulheres, 1999.
Veyne, P., Como se escreve a História / Foucault revoluciona a história, Brasília, Ed. UNB, 1982.
Notas
1 Apud Leal, M.L., Leal, M.de F. (Coords.), Pesquisa sobre tráfico de mulheres, crianças e adolescentes
para fins de exploração sexual comercial no Brasil-PESTRAF: Relatório Nacional-Brasil, Brasília,
CECRIA, 2003.
2 Este artigo é parte de minha dissertação de mestrado intitulada “Rotas do desejo: Tráfico de mulheres
e prostituição como estratégia migratória no El País e na Folha de São Paulo (1997-2007)”, orientada
pela professora Doutora Joana Maria Pedro e financiada pela Capes, Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior.
3 Marcon Venson, A., “Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória
no El País e na Folha de São Paulo (1997-2007)”, Dissertação de mestrado, UFSC, 2009.
4 Leal, M.L.; Leal, M.de F., op. cit.
5 Protocol to Prevent, Suppress and Punish Trafficking in Persons, Especially Women and Children,
supplementing the United Nations Convention against Transnational Organized Crime A/AC.254/4/
Add.3/Rev.1, Acessado em outubro de 2006.
6 Protocol against the Smuggling of Migrants by Land, Sea and Air, supplementing the
United Nations Convention against Transnational Organized Crime A/AC.254/4/Add.3/Rev.1. www.unodc.org/unodc/index.html> Acessado em outubro de 2006.
7 Veyne, P., Como se escreve a História / Foucault revoluciona a história, Brasília, Ed. UNB, 1982.
8 Foucault, M., A ordem do discurs, São Paulo, Loyola, 1996.
9 Foucault, M., História da Sexualidade 1. A vontade de saber, Rio de Janeiro, Edições Graal, 1988.
Sexo, poder e indivíduo. Entrevistas selecionadas, Desterro, Edições Nefelibata, 2003.
10 Scott, J., “Gênero: uma categoria útil de análise histórica”, Educação e realidade, Porto Alegre, 16
(2): 5-22, jul/dez. 1990.
11 Pedro, J., “Maria Traduzindo o debate: o uso da categoria gênero na pesquisa histórica”, História,
São Paulo, Vol. 24, nº1, 2005, p. 77-98.
12 Butler, J., Gender Trouble. Feminism and the subversion of identity, Londres, Routledge, 1990;
Prins, B., e Meijer, I.C., “Como os corpos se tornam matéria: entrevista com Judith Butler”, Estudos
Feministas, Florianópolis, CFH/CCE/UFSC, Vol.10, nº1, 2002, p.155-167.
13 Laqueur, T., Inventando o sexo. Corpo e gênero dos gregos a Freud, Rio de Janeiro, Relume Dumará,
2001, p. 13-40.
14 Fausto-Sterling, A., “Dualismos em duelo”, Cadernos Pagu: desafios da eqüidade, Vol. 17/18,
Campinas, UNICAMP, 2001/2.
15 Nicholson, L., “Interpretando o gênero”, Estudos Feministas, Florianópolis, CFH/CCE/UFSC, Vol.
8, nº 2, 2000, p.9-41.
16 Outras autoras também notaram a mesma questão em suas pesquisas: Anderson, B. & O’Connell
Davidson, J., Trafficking: A demand led a problem? Save the children, Stockholm, 2002, p. 13-14;
Juliano, D., Excluidas y marginales, Universitat de València, Instituto de la mujer, 2006, p.125 -184.
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 11
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
17 Scott, J.W. “Experiência”, Silva, A. L. da Lago, M. C. de Souza, Rampos, T. R. Oliveira (orgs),
Falas de gênero: Teorias, análises e leituras, Florianópolis, Mulheres, 1999.
18 Engel, M., Meretrizes e doutores, São Paulo, Editora Brasiliense, 1989; Flores, M.B. Ramos, “A
medicalização do sexo ou o amor perfeito”, Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, UFSC, Centro
de Filosofia e Ciências Humanas nº29 (abr.2001); Rago, M., Do cabaré ao lar. A utopia da cidade
disciplinar, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985.
19 Pereira, I., “As decaídas”: prostituição em Florianópolis (1890-1940), Florianópolis, Ed. da UFSC,
2004. Pedro, J.M., Mulheres honestas, mulheres faladas: uma questão de classe, Florianópolis, Ed. da
UFSC, 1994.
20 Ver Rago, M., Os prazeres da noite. Prostituição e códigos da sexualidade feminina em São Paulo
(1890-1930), Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991; Menezes, L.M., Os estrangeiros e o comércio do prazer
nas ruas do Rio (1890-1930), Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, 1992; Kushnir, B., Baile de máscaras:
Mulheres judias e prostituição. As polacas e suas associações de ajuda mútua, Rio de Janeiro, E. Imago,
1996.
21 Sobre essa problemática ver Juliano, D., op. cit.
22 Augustín, L., La industria del sexo, los migrantes y la família europea, Cadernos Pagu nº25, julhodezembro
de 2005.
23 Kempadoo, K., “Mudando o debate sobre o tráfico de mulheres”, Cadernos Pagu, nº25, Campinas
jul/dez 2005.
24 Piscitelli, A., “Brasileiras na indústria transnacional do sexo”, Nuevo Mundo Mundos Nuevos n°7,
sección Debates, 2007, http://nuevomundo.revues.org
25 Ausserer, C., Controle em nome da proteção. Análise crítica dos discursos sobre tráfico internacional
de pessoas, Dissertação (mestrado em relações internacionais), Rio de Janeiro, PUC, 2007.
26 Anderson, B., Motherhood, apple pie and slavery. Reflections on trafficking debates, Oxford, Centre
on Migration, Policy and Society, 2007, http://www.compas.ox.ac.uk/ Acessado em novembro de 2007.
27 Marcon Venson, A.M., op. cit.
28 Nussbaum, M., “Whether for reason or prejudice: taking money for bodily services”, Spector, Jessica
(Org), Prostitution and pornography. Philosophical Debate about the Sex Industry, Stanford, Stanford
University Press, 2006.
29 Kempadoo, K.; Doezema, J. (Orgs), Global Sex Workers. Rights, Resistance, and Redefinition, New
York & London, Routledge, 1998.
30 O’Connell Davidson, J., Prostitution, Power and Freedom, Michigan, Michigan, 1998, p. 75.
31 Ver também: Davida, “Prostitutas, “traficadas” e pânicos morais: uma análise da produção de fatos
em pesquisas sobre o “tráfico de seres humanos”, Cadernos Pagu nº25, Campinas-SP, Núcleo de Estudos
de Gênero Pagu-Unicamp, 2005, p. 135-185; Blanchette, T., Silva, A. P. da, “Nossa Senhora da Help:
Sexo, turismo e deslocamento transnacional em Copacabana”, Cadernos Pagu nº25, Campinas jul/dez
2005.
32 PESTRAF, op. cit., p. 120.
33 Ibid., p. 121.
34 Ibid.
35 Ibid. p. 123.
36 Ibid. p. 124.
37 Ibid. p. 125.
38 Ibid.
39 Ibid. p. 130.
40 Ibid. p. 131.
41 Ibid. p. 132.
42 Ibid. p. 134.
43 Ibid. p. 136-137.
44 Ibid. p. 138-139.
45 Ibid. p. 161.
46 Ibid. p. 162.
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 12
Nuevo Mundo Mundos Nuevos
47 Ibid.
48 Foucault, M., 1988, op. cit.
Para citar este artículo
Referencia electrónica
Anamaria Marcon Venson, « Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como
estratégia migratória no Brasil e na Espanha na virada dos séculos XX e XXI », Nuevo Mundo
Mundos Nuevos [En línea], Debates, 2009, Puesto en línea el 03 febrero 2009. URL : http://
nuevomundo.revues.org/52653
@apropos
Anamaria Marcon Venson
Graduada em História na Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestranda em História na
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil, Membro do Instituto de Estudos de Gênero da
Universidade Federal de Santa Catarina,anamariamarcon[at]yahoo[point]com[point]br
Licencia
© Tous droits réservés
Résumé / Abstract / Sumário
Cet article repose sur les témoignages de femmes brésiliennes qui ont émigré en Espagne
et y ont exercé des métiers du sexe au tournant du XXIe siècle. Dans une perspective
méthodologique historique embrassant les catégories de genre et d’expérience, il analyse les
récits de ces femmes impliquées dans des réseaux de trafic de personnes et de marché du sexe.
Il interroge et problématise alors certaines perspectives féministes qui voient la prostitution
comme un espace fortement agencé à partir de l’ordre sexuel existant.
Mots clés : trafic humain, sexe, prostitution, migration, genre, expérience, femme
Routes of desire: Women trafficking and prostitution as migratory
strategies in Brazil and Spain in the turn of XX and XXI centuries
This article explores testimonies of Brazilian women who have migrated to Spain and have
experienced sex work. It debates certain feminist perspectives that view prostitution as a site of
agency which occurs within existing sexual orders. From the perspective of historical methods,
and encompassing the categories of gender and experience, the article analyses narratives of
Brazilian women involved in networks of trafficking in persons and the sex trade in Spain in
the turn of XX and XXI centuries.
Keywords : experience, gender, migration, prostitution as a migration strategy, women trafficking
Este artigo discute depoimentos de migrantes brasileiras em suas experiências de trabalho
sexual na Espanha. Problematiza certa perspectiva feminista que entende prostituição como
um espaço de agência no qual se faz um uso ativo da ordem sexual existente. Sob perspectiva
historiográfica e com aporte reflexivo das categorias gênero e experiência, analiso narrativas
de brasileiras implicadas em redes de tráfico na virada dos séculos XX e XXI.
Palavras chaves : experiência, gênero, tráfico internacional de mulheres, prostituição como estratégia
migratória, migrações
Rotas do desejo: tráfico de mulheres e prostituição como estratégia migratória no Brasil (...) 13
Nuevo MundoArtigos, Pareceres, Memoriais e Petições

Tráfico de Mulheres: Prevenção, Punição e Proteção

Mônica de Melo
Procuradora do Estado de São Paulo, Professora Assistente Mestre da PUC/SP de Direito Constitucional, Diretora do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública – IBAP e
Coordenadora da ONG “Oficina dos Direitos da Mulher”.

Letícia Massula
Advogada. Assessora Técnica da AGENDE Ações em Gênero Cidadania e Desenvolvimento e integrante do CLADEM Brasil – seção nacional do Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher, Diretora Executiva da ONG Centro Dandara de Promotoras Legais Populares.

Sumário: 1- Tráfico de Mulheres: dados, causas, conseqüências e vulnerabilidade das mulheres. 2- Proteção Internacional: conceito de tráfico de mulheres do Protocolo Adicional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças. 3- Proteção Interna. 4- Conclusão e Propostas.

1- Tráfico de Mulheres: dados, causas, conseqüências e vulnerabilidade das mulheres.

O Congresso Nacional, através do Senado Federal aprovou, através da Resolução n. 231 de 29/5/03, o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças. Falta apenas o Decreto do Presidente da República para que a ratificação seja enviada à Organização das Nações Unidas (ONU) e o Protocolo possa ser aplicado no Brasil.

O Protocolo representa um avanço fundamental na proteção das mulheres vítimas do tráfico internacional de pessoas, reconhecendo a necessidade de especial proteção às mulheres que representam o grupo mais vulnerável ao tráfico e a exploração sexual bem como às modernas formas de escravidão.

O Protocolo reconhece a necessidade de proteção global e internacional dos direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos que se ressentem da falta de um instrumento universal que trate de todos os aspectos relativos ao tráfico de pessoas, apesar da existência de uma variedade de instrumentos internacionais que contém normas e medidas práticas para combater a exploração de pessoas, especialmente mulheres e crianças. Daí sua importância ímpar na proteção de centenas de mulheres, jovens e crianças que são verdadeiramente comercializadas para fins de exploração sexual inclusive internamente, no Brasil, e não só para o exterior.

Pesquisa Nacional sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de Exploração Sexual Comercial(1) realizada entre 2001 e 2002 identificou, no Brasil, 241 rotas de tráfico, sendo 131 internacionais, 78 interestaduais e 32 intermunicipais. As mulheres e adolescentes vítimas do tráfico internacional são levadas para a Espanha (destino mais frequente com 32 rotas), Holanda (11 rotas), Venezuela (10 rotas), Itália, Portugal, Paraguai, Suíça, Estados Unidos, Alemanha e Suriname. A Região Norte apresenta o maior número de origem das rotas, seguida de perto pela Região Nordeste e, um pouco mais distante, pela Sudeste, pela Centro-Oeste e pela Sul, no tráfico nacional. No tráfico internacional predomina a Região Nordeste.

São vários os casos de mulheres que são convidadas para trabalhar no exterior e lá descobrem que foram levadas para casas de prostituição, ou mesmo de mulheres que são atraídas para se prostituírem no exterior e lá têm documentos confiscados pelos aliciadores, sob o pretexto de que têm que pagar pela estadia, comida e roupas, ficando em cárcere privado por deverem mais do que conseguem ganhar.

Mais de 700.000 pessoas são traficadas todo o ano com o propósito de exploração sexual e trabalho forçado. Elas são levadas para fora de seus países e vendidas para o que poderíamos chamar de "novo mercado da escravidão" segundo dados da divisão das Nações Unidas para Drogas e Crimes.(2)

Foi identificado que, no Brasil, o tráfico para fins sexuais é, predominantemente, de mulheres e garotas negras e morenas, com idade entre 15 e 27 anos.

É inegável, historicamente, que a construção legal dos direitos fundamentais da pessoa, se deu, inicialmente, com a exclusão da mulher.

Um dos documentos históricos paradigma de todas as cartas de direitos contemporâneas é a clássica "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão" da Revolução Francesa de 1789. Na ocasião a célebre Olimpe de Gouges foi guilhotinada por reclamar igualdade política para ambos os sexos. Escritora, ela elaborou a "Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã" (1791), na qual pedia que fossem abolidos todos os privilégios masculinos. O primeiro artigo dessa declaração proclama que "a mulher nasce livre e permanece igual ao homem em seus direitos". Na condenação de Olimpe de Gouges consta a acusação "de ter querido ser um homem de Estado e ter esquecido as virtudes próprias do seu sexo" (3)

Embora os principais documentos internacionais de proteção dos direitos humanos e praticamente todas as Constituições da era moderna proclamem a igualdade de todos, essa igualdade, foi em um primeiro momento compreendida apenas em seu aspecto formal, de vedação de discriminação por parte da lei. E só muito recentemente é que se passou a refletir sobre a insuficiência dessa fórmula, desse conteúdo jurídico para garantir a igualdade real, a igualdade de fato. Assim, logo se instalou um abismo entre o que se poderia esperar da igualdade formal e a igualdade real, almejada.

Em 1997 o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) criou dois índices para medir as diferenças por gênero: o Índice de Desenvolvimento por Gênero (IDG) que leva em conta as diferenças de esperança de vida, alfabetização, matrícula na escola e renda entre homens e mulheres e o Índice de Poder por Gênero (IPG) que mede o grau de participação das mulheres na força de trabalho, nos cargos de chefia, na política e em profissões técnicas. Quando pela primeira vez os dados sobre as mulheres foram analisados de forma separada o PNUD sustentou em seu Relatório do Desenvolvimento Humano de 1997 que "Nenhuma sociedade trata suas mulheres tão bem quanto seus homens".

O processo de globalização econômica tem gerado um agravamento da desigualdade econômica e social e um fenômeno específico que tem sido designado internacionalmente de "feminização da pobreza",(4) pois a maioria das um milhão e quinhentas mil (1.500.000) pessoas que vivem com 1 dólar ou menos por dia são mulheres.

Relatório do Banco Mundial de 2.000(5) divulgado por ocasião da reunião mundial destinada a avaliar os avanços e retrocessos após cinco anos da Conferência Internacional das Nações Unidas sobre a Mulher (Pequim+5), argumenta que o desenvolvimento econômico é uma questão de gênero e países que diminuem as desigualdades entre homens e mulheres têm índices menores de corrupção e taxas de crescimento econômico mais elevadas. Portanto, onde os direitos das mulheres são mais respeitados e onde elas têm mais acesso ao poder, ao trabalho, à saúde e à educação, o desenvolvimento econômico ganha outra dimensão.

Em todo o mundo, segundo dados divulgados pela ONU, por ocasião do encontro mundial de avaliação dos cinco anos da Conferência Mundial de Pequim, as mulheres ganham um pouco mais de 50% do que recebem os homens. Ou seja, a pobreza no mundo, afeta sobretudo as mulheres e os efeitos negativos do processo de globalização da economia repercutem desproporcionalmente sobre a mulher.

Enfim, vivemos uma situação de desigualdade de fato entre mulheres e homens que se camufla na formula jurídica constitucional: "Todos são iguais perante a lei". Esta situação de desigualdade e de discriminação, cumpre destacar, é a base para outros abusos e para a prática de violência contra a mulher.

A maior parte das pessoas que migram de países em desenvolvimento em busca de trabalho são mulheres. Paralelamente às razões de ordem econômica e pobreza, as mulheres enfrentam o problema da discriminação e da violência que as forçam a fugir de seus países. Muitas acreditam estar migrando em busca de emprego e melhores condições de vida, mas a grande maioria é explorada por redes internacionais de tráfico para a prostituição forçada. Como a grande maioria vive na ilegalidade, quase não há dados sobre essas mulheres e elas acabam sofrendo dupla discriminação ao se verem impedidas de denunciarem sua situação.

Segundo Relatório da Anistia Internacional, divulgado em março de 2.001(6), o tráfico de seres humanos é a terceira maior fonte de lucro(7) do crime organizado internacional, depois das drogas e armas, movimentando bilhões de dólares, sendo que a Organização das Nações Unidas (ONU) acredita que quatro milhões de pessoas são traficadas todo ano. Relatório do Departamento de Estado dos EUA de 2.000 afirmou que entre 45.000 e 50.000 mulheres e crianças traficadas ingressam no país por ano.

Relatório divulgado a propósito do Dia Internacional da Mulher de 2001 pelo órgão executivo da União Européia (UE) destacou que 120 mil mulheres e crianças são introduzidas ilegalmente, por ano, na UE. A maior parte é do Leste Europeu. Há estimativas de que os bandos transportam até 500 mil mulheres para a UE a cada ano. A meta do tráfico de pessoas é não somente a prostituição, mas também a exploração de mão-de-obra sob condições semelhantes às da escravidão, diz o relatório.

De acordo com o grupo de pesquisa norte-americano Protection Project,(8) dois milhões de mulheres e crianças são "vendidas" a cada ano.

Todos os anos, pelo menos 120 mil mulheres são contrabandeadas para a Europa ocidental, a maioria procedente das regiões leste e central do continente, e obrigadas a trabalhar como prostitutas. São números que assombram. Outros fatos denunciados pelo Protection Project:

- As asiáticas são "vendidas" para bordéis da América do Norte por 16 mil dólares, cada;

- Cerca de 200 mil meninas do Nepal, a maioria menor de 14 anos, trabalham como escravas sexuais na Índia;

- Pelo menos 10 mil mulheres da antiga União Soviética transformaram-se, forçosamente, em prostitutas em Israel;

- O governo tailandês relatou a venda de 60 mil crianças para o mercado da prostituição;

- Dez mil crianças, entre seis e 14 anos de idade, passaram a trabalhar como escravas sexuais em bordéis de Sri Lanka;

- Cerca de 20 mil mulheres e crianças de Mianmar foram obrigadas a se converter à prostituição na Tailândia.

O grupo norte-americano diz, ainda, que, dos 155 casos de prostituição involuntária ou forçada levados perante tribunais na Holanda, apenas quatro resultaram na condenação dos traficantes sexuais. O Protection Project está compilando dados relativos a leis sobre tráfico de mulheres, prostituição forçada e escravidão em 190 países e 63 territórios.

Na Grã-Bretanha, estão surgindo detalhes sobre dezenas de adolescentes que estavam em custódia de serviços sociais e foram seqüestradas por gangues organizadas e obrigadas a trabalhar como prostitutas, principalmente na Itália.

As meninas em questão eram africanas, que haviam chegado à Grã-Bretanha em busca de asilo. Depois que chegavam ao aeroporto de Gatwick, no sul da Inglaterra, internavam-se em serviços sociais de West Sussex.

A ONU e a Federação Internacional Helsinque de Direitos Humanos dizem que 75 mil brasileiras estariam sendo obrigadas a se prostituir nos países da União Européia. De acordo com as Nações Unidas, o Brasil é hoje o maior "exportador" de mulheres escravas da América do Sul. Segundo o governo brasileiro, há uma estimativa de que a maioria das mulheres nessa situação vêm, pela ordem, de Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo. São moças que vão para o exterior em busca de uma vida melhor e acabam sendo vítimas de quadrilhas organizadas.

O tráfico de mulheres, diz Lená Medeiros de Menezes, (9)pode ser caracterizado sempre que são preenchidas quatro condições básicas: o cruzamento de uma fronteira, a existência de um intermediário que forneça transporte e carteira de identidade - seja esta falsa ou roubada -, a caracterização de uma relação comercial, e, finalmente, a entrada ou permanência ilegal da mulher no país de destino. O tráfico, dessa forma, define-se como um "processo migratório marginal" que acompanha os grandes fluxos internacionais, variando em suas rotas e impulsos, mas conservando um elemento básico propulsor: as crises internas que aquecem os movimentos populacionais sejam elas de ordem política, econômica ou social. Nesse sentido, a proximidade dos processos vividos nos idos de 1900 e na virada dos 2000 mostra-se surpreendente. Ontem como hoje, os deslocamentos populacionais contemplam em seus bastidores o tráfico de mulheres. Ontem como hoje, o Brasil figura como um dos países envolvidos: no passado, como lugar de chegada, no presente, como lugar de partida.

2- Proteção Internacional: conceito de tráfico de mulheres do Protocolo Adicional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças.

O tráfico de mulheres tem sido objeto de preocupação da comunidade internacional. "O primeiro documento internacional contra o tráfico (1904) mostrou-se ineficaz não somente porque não era propriamente universal, como também porque revelava uma visão do fato centrada na Europa. O segundo documento, de 1910, complementou o primeiro na medida em que incluía provisões para punir aliciadores, mas obteve apenas 13 ratificações. Os instrumentos seguintes, de 1921 e 1933, que foram elaborados no contexto da Liga das Nações, eram mais abrangentes, mas definiam o tráfico independentemente do consentimento da mulher.

Esses quatro instrumentos foram consolidados pela Convenção de 1949, que permaneceu como o único instrumento especificamente voltado ao problema do tráfico de pessoas até a adoção da Convenção de Palermo e de seus Protocolos".(10) Ainda, segundo o autor, a Convenção e Protocolo Final para a Supressão do Tráfico de Pessoas e do Lenocínio (Convenção de 1949), que foi ratificada pelo Brasil em 1958, partiu de uma perspectiva proibicionista da prostituição. Estava centrada na questão da prostituição e procurou criminalizar os atos com ela relacionados, embora excluísse a própria prostituição da criminalização. Não trazia uma definição de tráfico de pessoas e excluía um vasto espectro de mulheres de sua proteção ao se confinar ao tema da prostituição.(11) O instrumento ainda vigora e iguala tráfico e a exploração da prostituição. O mais grave era que a Convenção permitia a expulsão de mulheres que tinham sido submetidas ao tráfico e que viviam da prostituição.

Sem tratar especificamente da punição do tráfico de pessoas, o sistema de proteção internacional dos direitos humanos foi se aperfeiçoando e um marco dessa proteção ocorreu em Viena, em 1993, por ocasião da Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, para a qual o movimento de mulheres levou a bandeira de luta: "os direitos da mulher também são direitos humanos", ficando consignado na Declaração e Programa de Ação de Viena (item 18) que:

"Os direitos humanos das mulheres e das meninas são inalienáveis e constituem parte integral e indivisível dos direitos humanos universais".

Reflexão que foi renovada por ocasião do quinquagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948).

No plano de proteção internacional dos direitos da mulher no qual o Brasil também se insere, uma vez que a própria Constituição estabelece (§ 2o do art. 5.o) que os direitos e garantias nela expressos não excluem outros decorrentes do regime e princípios por ela adotados e dos tratados internacionais de que o Brasil seja parte, queremos ressaltar dois Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil que tratam especificamente dos direitos das mulheres: Convenção da ONU sobre Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher ratificada em 1984 e Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher ratificada em 1995.

Os Tratados Internacionais que o Brasil ratifica, além de criarem obrigações para o Brasil perante a Comunidade Internacional, também criam obrigações internas gerando novos direitos para as mulheres que passam a contar com uma última instância internacional de decisão quando todos os recursos disponíveis no Brasil falharem na realização da justiça.

Mas, a resistência de todos os países em assegurar direitos às mulheres é muito grande. A Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) foi dentre as Convenções da ONU a que mais recebeu reservas por parte dos países que a ratificaram.

O artigo 6o da CEDAW estabelece que os Estados-partes tomarão as medidas apropriadas, inclusive de caráter legislativo, para suprimir todas as formas de tráfico de mulheres e exploração de prostituição da mulher. Essa Convenção foi fortalecida pela ratificação pelo Brasil, em 28 de junho de 2002, de seu Protocolo Facultativo que permite a apresentação de denúncias de sua violação ante o Comitê da ONU que monitora a Convenção. A Plataforma de Ação da Conferência Internacional da Mulher de Pequim de 1995 também determina que os países tomem medidas apropriadas para atacar as raízes do tráfico: a desigualdade, a discriminação, a falta de acesso às fontes de sobrevivência entre outros.

Entretanto é a Convenção da ONU, de Palermo, contra o Crime Organizado Transnacional que foi adotada em novembro de 2000, que vai tratar especificamente do tráfico de mulheres ao incluir o Protocolo para Prevenir, Punir e Erradicar o Tráfico de Pessoas, especialmente de Mulheres e Crianças.(12)

O tráfico de mulheres favorece uma ampla violação dos direitos humanos das mulheres. Mulheres que são traficadas com a finalidade de serem exploradas sexualmente são frequentemente torturadas, sexualmente abusadas, estupradas. São punidas se tentam escapar ou se recusam a ter relações sexuais com os clientes além dos riscos das doenças sexualmente transmissíveis e a AIDS.(13) Costumam ter seus documentos e passaportes apreendidos e tem que pagar para obtê-los de volta, o que nunca conseguem, vivendo presas, reduzidas à condição de escravas.

A definição do Protocolo da Convenção de Palermo é bastante ampla para abarcar as mais diversas atividades e finalidades envolvidas no tráfico de mulheres. O artigo 3º do Protocolo define o tráfico de pessoas, ressaltando a especificidade do tráfico de mulheres e crianças, como o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, à escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos.

A questão do consentimento da vítima é irrelevante para a caracterização do tráfico, uma vez que a vítima pode até ter concordado em trabalhar para a prostituição,(14) mas jamais imaginou que seria escravizada, explorada sexual e economicamente e violada em seus direitos fundamentais. Portanto, a partir do momento em que ocorre uma situação de exploração sexual ou econômica, através de alguma das formas especificadas no artigo 3o do Protocolo, a vítima merece proteção. Ou seja, para a caracterização do tráfico de mulheres é necessário que se realize alguma espécie de locomoção da pessoa envolvida através de ameaças, coação, falsas promessas, abuso de poder, abuso de uma situação de fragilidade sempre para fins de exploração. Essa exploração pode ser de natureza sexual, para fins de prostituição ou outras formas de exploração sexual ou para que a mulher seja explorada economicamente, através de trabalho sem remuneração ou com remuneração sempre inferior às dívidas que é obrigada a contrair com o receptor que a mantém, envolvendo práticas similares à escravidão ou de serviços forçados, ou ainda para remoção de órgãos.

O Protocolo revela especial preocupação com as vítimas de tráfico de pessoas em mais de um momento, sendo que o princípio orientador do atendimento às vítimas é o da não discriminação internacionalmente reconhecido (artigo 14). No primeiro momento o Protocolo é claro ao não considerar relevante o consentimento da vítima para a configuração do tráfico, já que objetiva protegê-las da exploração. Também inclui a preservação da privacidade das vítimas. O artigo 6o determina que nos casos em que seja apropriado e na medida em que seja permitido pela legislação interna de cada país, deve-se proteger a privacidade e a identidade das vítimas de tráfico de pessoas, inclusive a confidencialidade dos procedimentos judiciais relacionados.

Outra importante medida para as vítimas diz respeito à previsão de orientação e assistência jurídica, ou seja, deve-se garantir às vítimas de tráfico informações sobre os procedimentos judiciais e administrativos e assistência para permitir que suas opiniões e preocupações sejam levadas em consideração nas fases adequadas do processo penal, sem prejuízo do direito de defesa. Também se prevê (artigo 6.3) que o Brasil deva adotar medidas que permitam a recuperação física, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas. Podendo, nesse aspecto, estabelecer convênios e parcerias com organizações não governamentais e outras da sociedade civil para garantir e incluir, se for o caso, alojamento adequado, aconselhamento e informação no tocante aos direitos reconhecidos em lei, em língua que as mulheres vítimas compreendam, assistência médica, psicológica e material e oportunidades de emprego, educação e formação. Sendo que toda essa assistência deverá observar as especificidades de idade, sexo e as necessidades específicas das vítimas de tráfico de pessoas, inclusive das crianças.

Há, ainda, a necessidade de cada Estado Parte desenvolver todos os esforços possíveis para garantir a segurança física das vítimas de tráfico enquanto se encontrarem em seu território e de assegurar que o seu sistema jurídico contenha medidas que ofereçam às vítimas de tráfico de pessoas a possibilidade de obterem indenização pelos danos sofridos.

Por fim, o Protocolo pede que os Estados-partes considerem a possibilidade de adotar medidas legislativas e outras que permitam às vítimas de tráfico de pessoas permanecerem em seu território a título temporário ou permanente, tendo-se em vista fatores de ordem humanitária e pessoais. Ainda sob esse aspecto, o país de nacionalidade ou de residência permanente da pessoa vítima de tráfico deve facilitar e aceitar, sem demora indevida ou injustificada o seu retorno, tendo em vista a segurança da mesma.

Quando se tratar de tráfico de crianças, basta apenas o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento para a caracterização de tráfico, sem a necessidade de comprovar ameaça, uso de força, rapto, fraude, engano e as demais formas previstas no artigo 3o do Protocolo, ou seja, há uma presunção do uso de meios ilícitos que favorece as crianças, que nos termos do Protocolo significa qualquer pessoa, menina ou menino com idade inferior a dezoito anos.

O Protocolo exige medidas de prevenção, investigação e repressão, ou seja, o Brasil se obriga a implementar políticas públicas capazes de prevenir (artigo 9o) o tráfico de mulheres e de proteger as pessoas vítimas de tráfico de nova ocorrência, através de pesquisas, campanhas de informação e de difusão através de órgãos de comunicação, divulgação de informações, publicações, orientação, debates, seminários, iniciativas sociais e econômicas dentre outras. Entretanto, se ainda assim ocorrer o tráfico, o Brasil se obriga a ter uma legislação adequada para sua punição, aparato policial e judiciário capaz de apurar e punir os infratores das condutas descritas no artigo terceiro. Para tanto os países deverão assegurar ou reforçar a formação dos agentes dos serviços competentes para a aplicação da lei, dos serviços de imigração ou de outros serviços competentes na punição e prevenção do tráfico de pessoas. Essa formação deverá levar em conta a proteção dos direitos humanos e os problemas específicos das mulheres e das crianças.

Por fim, também deve haver a preocupação com a adoção de medidas que a médio e longo prazo possam contribuir para a eliminação do tráfico de mulheres, ou seja, medidas que possam avançar no sentido da sua erradicação.

O Protocolo avança muito após mais de 50 anos da adoção da Convenção de 1949. Entretanto, nos parece ainda precário o seu sistema de monitoramento, já que não conta com a possibilidade do oferecimento de denúncias de sua violação por parte dos Estados-partes e pelas vítimas protegidas pelo Protocolo.

Ou seja, faltam mecanismos concretos para que as vítimas possam acessar o sistema internacional de proteção quando o País não estiver cumprindo o Protocolo, ou mesmo no caso de órgãos internacionais são responsáveis pelo monitoramento do cumprimento do Protocolo.

3- Proteção Interna

No âmbito interno o Código Penal Brasileiro trata apenas do tráfico internacional de mulheres (artigo 231). Quando o tráfico ocorre internamente, normalmente o enquadramento legal é o do crime de "favorecimento à prostituição" (artigo 228), já que não há um tipo penal específico para o tráfico interno de mulheres. Esse é um ponto no qual o Brasil deve se centrar se quiser realmente enfrentar o grave problema do tráfico de mulheres, já que a pesquisa do CECRIA identificou 110 rotas internas de tráfico.

Como o Código Penal Brasileiro não define como crime o tráfico interno, esse crime acaba não sendo punido adequadamente e, nos termos do Protocolo, o Brasil acaba por não adotar medidas concretas para punir, prevenir e reprimir o tráfico interno de mulheres.

O Protocolo determina que os Estados-partes deverão adotar as medidas legislativas internas necessárias à efetivação do Protocolo inclusive para estabelecer os tipos penais internos. O artigo 5o determina que o Brasil deve adotar medidas legislativas e outras que considere necessárias, de forma a estabelecer como infrações penais os atos descritos no artigo 3º que caracterizam o tráfico de mulheres, quando praticados intencionalmente.

O Protocolo assinala a necessidade de ser punida a "tentativa" de prática dos atos descritos como tráfico de mulheres, bem como a participação de todos os envolvidos, seja na qualidade de autor, co-autor, cúmplice, partícipe, mentor, organizador entre outros. Ou seja, o Protocolo obriga a punição não somente dos diretamente envolvidos, mas também dos indiretamente envolvidos. É claro que, cada um na medida de sua participação e responsabilidade.

Com a ratificação do Protocolo, por parte do Brasil, espera-se que a legislação interna seja aperfeiçoada de modo a cumprir o estatuído.

4- Conclusão e Propostas

Importantes avanços foram conquistados do ponto de vista da proteção internacional dos direitos humanos das mulheres com a adoção da CEDAW, da Plataforma de Ação de Pequim e, finalmente, do Protocolo da Convenção de Palermo para a repressão do tráfico de pessoas, em especial o de mulheres. Os avanços obtidos permitem afirmar que as vítimas do tráfico já não podem mais ser consideradas como criminosas e cúmplices do tráfico, mas sim como pessoas que sofreram sérias violações em seus direitos humanos fundamentais. Para tanto se torna irrelevante que a mulher tenha consentido em exercer a prostituição fora de seu país. Esse fato, por si só, não a torna ré do crime de tráfico de pessoas, pois com o Protocolo se reconhece expressamente sua vulnerabilidade e a necessidade de apoiá-la e protegê-la nessa situação.

Entretanto, a legislação interna não trata do tráfico interno de mulheres existente, o que nos leva a constatar a necessidade urgente de adequar a proteção interna aos padrões internacionais de proteção dos direitos humanos das mulheres.

____________________________________________________

(1) CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes. Relatório da Pesquisa Nacional sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescentes para fins de Exploração Sexual Comercial. Brasília, 2002.

(2) Dados coletados pelo United Nations Office for Drugs and Crimes e divulgados na página da Internet do escritório.

(3) ALAMBERT, Zuleika. Mulher: uma trajetória épica. p. 79.

(4) A esse respeito, sob uma ótica mais ampla, é relevante a análise de Gilberto Dupas, Economia global e exclusão social, pobreza, emprego, Estado e o futuro do capitalismo. São Paulo: Paz e Terra, 1999, p. 34 que coloca a pobreza como a principal dimensão da exclusão, vista como dificuldade de acesso real aos bens e serviços mínimos adequados a uma sobrevivência digna. Nas sociedades contemporâneas, esse acesso é balizado por duas vertentes: a renda disponível, normalmente fruto do trabalho, e as oportunidades abertas pelos programas públicos de bem estar social (welfare state).

(5) “Engendering Development”, mimeo, Banco Mundial, 2000.

(6) “Broken bodies, shattered minds: torture and ill-treatment of women”, 2001, p.16.

(7) Damásio Evangelista de Jesus aponta que o tráfico é uma atividade lucrativa e dentre as atividades do crime organizado perde em lucros apenas para o tráfico de drogas e para o contrabando de armas e que está inscrito no contexto da globalização com a agilização das trocas comerciais ao mesmo tempo em que se flexibiliza o controle de fronteiras. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças: Brasil: aspectos regionais e nacionais, São Paulo:Saraiva, 2003. p. 2 e 14.

(8)John Hopkins University School of Advanced International Studies, Washington, DC, mimeo, 2002.

(9) Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, “Com Ciência” (www.comciencia.br), Brasil: migrações internacionais e identidade, dez 2000/jan 2001.

(10) Damásio Evangelista de Jesus. Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças: Brasil: aspectos regionais e nacionais. São Paulo:Saraiva, 2003. p. 27.

(11) Op. Cit. p. 28.

(12) Até novembro de 2002 cento e quarenta e três países haviam assinado e dezenove ratificado o Protocolo.

(13) Relatório da Anistia

(14) Que em muitos países, assim como no Brasil, não configura crime nem nenhuma atividade ilícita.

Nenhum comentário:

Postar um comentário